O Serviço Do Júri E A Maioridade Civil Aos 18 Anos



O SERVIÇO DO JÚRI E A MAIORIDADE CIVIL AOS 18 ANOS

Mariana Pretel e PRETEL*

Resumo: Com o presente artigo, procura-se discutir a possibilidade de os menores de 21 e maiores de 18 anos prestarem o serviço obrigatório do júri, inobstante o disposto no artigo 434 do Código de Processo Penal.

Palavras- chave: Maioridade Civil. Código de Processo Penal. Serviço do Júri.

Introdução

Com a entrada em vigor do novo Código Civil (lei 10.406/ 02), na data de 10 de janeiro de 2003, iniciou-se uma série de mudanças, mormente no que tange à maioridade civil, que, nos termos do artigo 5o deste diploma, inicia-se aos 18 (dezoito) anos completos.

Desta forma, pode se afirmar que a maioridade civil se igualou a penal (ex vi do artigo 27 do diploma substancial penal).

Tal inovação, todavia, não ficou restrita ao domínio do direito privado, e, inobstante à disposição do já citado artigo 27 do Código Penal, ocasionou reflexos tanto na órbita penal quanto processual penal.

Gerou-se uma grande polêmica no com relação a diversos dispositivos dos referidos diplomas, que, mereceram atenção especial dos estudiosos do direito. Exemplos desses seriam a necessidade de curador ao menor de 21 e maior de 18 anos, a possibilidade de o maior de 18 anos exercer por si só os direitos de queixa e representação, a aplicação da atenuante genérica ao menor de 21 anos, a redução do prazo do prazo prescricional em se tratando de agente menor de 21 anos na data da prática do delito, a oportunidade de um maior de 18 anos atuar como perito no processo penal, a possibilidade de um maior de 18 anos e menor de 21 integrar o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, entre outros.

A possibilidade de um maior de 18 e menor de 21 anos integrar o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri

Dispõe o artigo 434 do Código de Processo Penal:

“Art. 434. O serviço do júri será obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 21 (vinte e um) anos, isentos os maiores de 60 (sessenta)”.

 

Embora muitos sejam os assuntos relacionados à diminuição da maioridade civil, o objetivo do presente trabalho é o estudo da possibilidade de um maior de 18 e menor de 21 anos integrar o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, em outras palavras, o serviço do júri por um indivíduo que, sob a égide do Código Civil de 1916 era considerado relativamente incapaz.

A partir da vigência do novo diploma substancial civil, pode se afirmar que uma pessoa é considerada plenamente capaz, maior, adulta, podendo exercer todos os atos da vida civil, sem a necessidade de assistência ou representação de seus pais, exceto se for deficiente mental, aos 18 anos.

Como a imputabilidade penal se inicia aos 18 anos, os estatutos penal e processual penal precisavam se adequar à antiga legislação civil, sendo que era estabelecida uma certa “proteção” aos menores de 21 anos e, por outro lado, por não serem considerados plenamente maduros, também contavam com uma série de restrições (como já citado, a impossibilidade de atuarem como perito, de integrarem o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, etc).

A questão que paira no momento se relaciona ao fato de terem ou não sido afetados todos os dispositivos pelo novo estatuto. Se sim, não mais subsistirá a proibição para o menor de 21 anos atuar no Tribunal do Júri, se não, esta persistirá.

Para o doutrinador Damásio Evangelista de Jesus, o qual coordenara um debate (Mesa de Ciências Criminais), em que participaram os professores Gianpallo Poggio Smanio, Ricardo Cunha Chimenti, Fernando Capez, Victor Eduardo Rios Gonçalves, Vitor Frederico Kumpel e André Estefam Araújo Lima, e escrevera o artigo “A nova maioridade civil: reflexos penais e processuais penais”, embora o diploma substancial civil tenha interferido na legislação penal e processual penal, não ocorrera qualquer modificação no que tange ao serviço do Júri.

Segundo ele, o artigo 434 do Código de Processo Penal, em sua segunda parte, não foi alterado pelo artigo 5o do novo Código Civil, uma vez que não se trata da antiga menoridade relativa processual penal. Reza, a fim de corroborar o seu entendimento, que o menor de 21 anos, casado ou emancipado civil não podiam ser jurados, sob a égide do antigo estatuto, ainda que contassem com plena capacidade civil.

Neste sentido, a jurisprudência de nossos tribunais:

“Júri – Nulidade – Irregular composição do Conselho de Sentença – Menor de 21 anos de idade que dele participa – Inadmissibilidade, ainda que se trate de pessoa casada ou emancipada – Novo julgamento ordenado – Declaração de voto – Inteligência do art. 434 do CPP.  Pressuposto da validade do julgamento do júri é a regular formação do Conselho de Sentença. É questão de ordem pública, que independe de protesto ou reclamação oportunos. Dele não pode participar jurado menor de 21 anos de idade, ainda que casado ou emancipado, sob pena de nulidade do julgamento”. (RT 596/ 314- TJSP- Ap. 32.891-3 – 1a C – Julgamento em 28/12/84 – rel. Dês. Lauro Alves).

“Nulo é o julgamento do Júri por ter funcionado no Conselho de Sentença menor de 21 anos de idade, conquanto emancipado, pois, sendo cogente a disposição do art. 434 do diploma processual penal, excluída está toda e qualquer discussão sobre a possibilidade de se admitir, como jurados, menores de 21 anos que hajam adquirido a maioridade civil por qualquer motivo” (RT 464/ 412) 

Este entendimento de que o menor, ainda que, civilmente capaz, era impossibilitado de integrar a formação regular do corpo de jurados era endossado pelo professor Tourinho Filho (Processo Penal, Jalvo, 5a ed., vol. 4/ 65):

“O homem, casando-se, mesmo sendo menor de 21 anos, adquire a maioridade. Entretanto, não poderá servir como jurado”.

E também por Mirabete, em seu Código de Processo Penal Interpretado (2003, p. 1168):

“Tratando-se de presunção legal própria da lei processual, fundada exclusivamente em razão da idade cronológica, que diversamente de outras normas contidas no Código de Processo Penal, não se vincula às normas que no direito civil disciplinam a capacidade civil, não restou alterado o dispositivo pelo novo Código Civil, que fixou em 18 anos a idade em que se atinge a maioridade (art 5o), havendo que se aguardar eventual norma adaptadora prevista no art. 2043 do novo estatuto”.

Assim, para tais doutrinadores, se o legislador pátrio não havia se baseado na antiga maioridade civil para a elaboração do dispositivo, não haveria razão para tê-lo como derrogado.

Entretanto, há uma posição divergente, a qual entende que o artigo estaria sim revogado. Esta é a opinião do Promotor de Justiça Francisco Dirceu Barros (2005), o qual dispõe que seria o cúmulo do absurdo a subsistência da antiga visão. Para o mesmo, se um ser humano com 18 anos, teria maturidade suficiente para realizar todos os atos da vida civil, além de escolher o Presidente da República (artigo 14, § 1o, CF), ingressar no mercado de trabalho (artigo 7o, XXXIII, CF), ser vereador (artigo 14, VI da Magna Carta), dirigir automóvel (artigo 140 do Código de Trânsito), ofertar a queixa e a representação, entre muitas outras atitudes, teria, também, por óbvio, amadurecimento suficiente para participar do Conselho de Sentença. E completa, baseando-se no entendimento de Frederico Marques, que o diploma processual penal estabelecia apenas normas diferenciadas ao agente menor de 21 anos por entender que este se encontrava num período de transição, sem o completo discernimento.

Conclusão

Ora, se hoje se admite que o maior de 18 anos pratique todo e qualquer ato da vida civil, e, ademais, diversos outros atos, já mencionados, não é possível se admitir que ele não possa integrar o Conselho de Sentença.

O entendimento de que esta disposição não se relacionava com o antigo diploma civil é equivocado, uma vez que todas as regras do diploma processual penal, no que se refere aos menores, consideravam a própria personalidade e o caráter não totalmente formados de tais indivíduos, os quais, por conseguinte, mereciam tratamento distinto dos adultos. Em que pese o vasto conhecimento jurídico dos citados doutrinadores, a norma não era fixada apenas em razão de idade cronológica (tanto que os próprios estudiosos admitem que poderia existir tal influência diante de eventual norma adaptadora).

Admitir a influência da lei 10.406 em apenas alguns dos dispositivos, caracteriza-se, no mínimo, como incoerente. O direito civil enuncia as regras de hermenêutica e diversos princípios do nosso ordenamento, os quais devem ser manuseados tanto pelo civilista quanto pelo publicista. Por outro lado, esperar a edição de uma norma adaptadora também é desconhecer a realidade brasileira, já tão “abarrotada” de leis e com diversas incompatibilidades entre si. Deve-se, por derradeiro, proceder-se a uma interpretação teleológica das normas do novo diploma civil, concluindo-se pela sua influência em todos os ramos do direito.

Deve ser seguida a norma do Código Civil, primeiramente, por uma razão lógica. Não pode o Código de Processo Penal tratar como relativamente capaz uma pessoa que detém capacidade plena. O ordenamento jurídico deve ser interpretado como um todo, numa evidente interpretação sistemática e teleológica.

Bibliografia:

BARROS, Franciso Dirceu. Os reflexos penais da nova maioridade civil. Disponível em <http://www.editoraimpetus.com.br/art_publicados.php?chave=32>. Acesso em 25.out.2005.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

JESUS, Damásio Evangelista de. A nova maioridade civil: Reflexos penais e processuais penais. Disponível em <http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=3442&>. Acesso em 25.out.2005.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2003.


Autor: Mariana Pretel


Artigos Relacionados


BrevÍssimo Poema Do Amor Que Se Foi

Só Na Hora Da Dor

Ser Como Ser...

Queria Tanto Amar-me Mais

A Criação

A Espera (ii)

Sorrir é Ser Feliz