Por que o Brasil não cresce ?



Por que o Brasil não cresce?

Segundo o Goldman & Sachs, de Nova York, se o Brasil crescesse a 4% aa daqui até o ano 2050 ele se tornaria a 5ª maior economia do mundo, passando à frente de todas as economias européias. O Brasil tem potencial para crescer 4,5% aa considerando os atuais fatores de produção.
O Brasil não cresce porque possui uma enorme dívida pública que não para de crescer. E não pára de crescer porque temos a mais alta taxa de juros do mundo. FHC deixou que essa dívida chegasse a 64% do PIB, quando era 30% no início do seu governo. No momento que a dívida externa se estabilizava FHC aumentava a taxa de juros para estabilizar o Real. Ao manter as taxas na estratosfera a dívida cresceu de R$60 bi para R$890 bilhões. O governo Lula conseguiu estabilizar a dívida pública em torno de 50% do PIB mas às custas de elevado superávit primário, mantendo as taxas de juros elevadas (mas muito menos que o governo anterior). Resultado disso tudo : baixas taxas de crescimento do PIB, desde a explosão da dívida externa dos anos 80.
Ou seja, desde que elevadas dívidas (no início : setor privado, depois pública) externas e internas, se tornaram graves problemas para o Estado brasileiro, o Brasil parou de crescer. Dívidas que foram contraídas pelos governos militares nos anos 70 e estouraram como bola de neve a partir dos 80 quando o governo Reagan sobe artificialmente as taxas de juros (passaram de uma média de -3,4% nos anos 70 para até +27,5% aa em 1982), provocando recessão na América Latina e comprometendo o crescimento econômico do Terceiro Mundo. A partir daí o Terceiro Mundo fica nas mãos dos banqueiros internacionais.
Em 1980, segundo o Banco Mundial, os países do Terceiro Mundo totalizavam uma dívida externa de cerca de 530 bilhões de dólares. Vinte anos mais tarde, no fim do ano 2000, esta atingia cerca de 2,05 trilhões de dólares : quatro vezes mais.
Entre 1980 e 2000, o Terceiro Mundo pagou a seus credores um pouco mais de 3,45 trilhões de dólares (se considerarmos os países do ex-bloco do Leste europeu são mais 640 bilhões) ou 4,1 trilhões para o conjunto da Periferia, o total do Terceiro Mundo. Logo, o Terceiro Mundo pagou mais de seis vezes o que devia, para ficar quatro vezes mais endividados. O Plano Marshall, plano de ajuda econômica dos EUA aos países destruídos pela Segunda Grande Guerra, representava 12,5 bilhões de dólares de 1948, o que significa hoje, com dólares de 2001, cerca de 78,5 bilhões de dólares. Entre 1980 e 2000 os povos do Terceiro Mundo enviaram aos credores do Centro (países desenvolvidos) 43 Planos Marshall. O montante total da ajuda pública ao desenvolvimento – APD (doações ou empréstimos concedidos pelos países da OCDE aos países do Terceiro Mundo em condições mais favoráveis, ou seja, inferior às taxas de mercado) oscila entre 40 e 50 bilhões de dólares. Em 2000, o serviço da dívida do Terceiro Mundo elevou-se a cerca de 315 bilhões (+61 bilhões do bloco Leste). O desequilíbrio é gritante : o Terceiro Mundo pagou seis vezes o que recebeu em APD.
A partir dos anos 90, as taxas de juros internacionais estabilizam-se e o montante da dívida externa pára de crescer ou cresce muito pouco, mas também não diminui. O que aconteceu foi que boa parte da dívida externa se transformou em dívida interna e agora nós devemos aos nossos próprios banqueiros. Antes nossos esforços estavam concentrados em conseguir dólares para pagar a dívida externa: tínhamos que gerar excedentes exportáveis sacrificando o consumo interno e até aumentando nossos problemas sociais (a taxa de mortalidade infantil chega a aumentar nos anos 80). Agora nossos esforços estão concentrados no governo federal (que assumiu a dívida do setor privado e dos Estados) para pagar a dívida pública. E o governo federal foi aumentando a carga tributária para fazer frente às despesas desta maldita dívida.
No início do governo FHC a carga era de cerca de 26% do PIB (histórica desde os anos 70) – no final de seu governo a carga tributária chegava a 36% do PIB, aumentando sobremaneira os impostos indiretos (que representam 2/3 da receita do governo) e, portanto passando estes encargos para a maioria da população brasileira (a classe média e a população mais pobre paga mais impostos do que os mais ricos – aumentando a regressividade dos impostos e contribuindo para a maior concentração de renda). O item de maior despesa do governo são os serviços da dívida (juros e amortização). Enquanto o governo federal paga cerca de R$160 bilhões com estes serviços (uma espécie de transferência de renda às avessas – são os 7 milhões mais ricos que recebem), ele gasta R$40 bilhões com os aposentados, R$20 bilhões com a saúde e R$10 bilhões com a educação. Os cerca de 40 milhões de brasileiros que são beneficiados com o Bolsa-Família recebem cerca de 5% dos gastos com a dívida. O governo Lula alterou muito pouco este quadro, mas pelo menos não o agravou. Em seus 3,5 anos de governo a dívida interna cresceu de R$890 bilhões para R$1 trilhão – apenas R$110 bilhões – e a carga tributária aumentou para cerca de 37% do PIB, muito pouco em relação ao crescimento do governo anterior. O problema é que a dívida pública continua sendo o maior pepino para ser resolvido e, como vimos a sua importância e impacto sobre as políticas públicas compromete toda a sociedade. Como o governo tem grande peso na economia, ao aumentar suas despesas com os serviços da dívida pública (que não pára de crescer) , provoca em conseqüência corte em seu orçamento; daí acaba por diminuir os investimentos produtivos que poderia realizar em energia, transportes, infra-estrutura, etc.
Enfim, o governo para manter estáveis os “fundamentos macroeconômicos” atuais, necessita manter certos indicadores que acabam comprometendo o crescimento econômico. Por exemplo, para atingir as metas de inflação em um ambiente de câmbio flutuante e livre mobilidade de capitais, o governo “necessita” de manter altas taxas de juros, para evitar fuga de capitais. A combinação de altas taxas de juros com baixo crescimento econômico do PIB, faz com que a estabilização da dívida como proporção do PIB (em torno de 50%) só seja possível se se obtiver um elevado superávit primário. Para manter alto superávit primário é necessário que a carga tributária continue alta. Daí o governo fica preso nesta armadilha – para manter um superávit primário alto, em torno de 4,5% do PIB, os juros reais continuam em torno de 10% - e aí a economia cresce pouco, não passa dos 3,5% aa. Dentro desta lógica interna, ceteris paribus, pode-se dizer então que se quiséssemos um crescimento do PIB em torno de 4,5% aa, teríamos que afrouxar a política fiscal e monetária, reduzindo o superávit primário para 3% e a taxa de juros real para 6% aa, mantendo ou até reduzindo a dívida pública como proporção do PIB a longo prazo. Esta é uma estratégia keynesiana que poderia dar sustentabilidade à alternativa do crescimento econômico, usando a fórmula s = [ ( r – g) / (1 + g) ] b4 (sendo r a taxa real de juros, g a taxa de crescimento real do PIB e b o superávit primário como proporção do PIB) defendida por dois professores pesquisadores do CNPq (José Luís Oreiro – UFPR e Luiz F. Paula – UERJ). Esta alternativa ainda acena com a possibilidade de redução da carga tributária a longo prazo, o que poderia dar mais sustentabilidade à política macroeconômica do próximo governo.

Daniel Miranda Soares – economista, mestre pela UFMG e UFV, professor do Unilestemg
Autor: Daniel Miranda Soares


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