O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO NO CANTO CORAL



O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO NO CANTO CORAL
Projeto Coral na Comunidade-Vozes da Pulquéria 18 anos

Resumo: Este projeto busca analisar as dimensões: pessoal, interpessoal e comunitária – presentes no processo de socialização no canto coral. A hipótese de que a atividade do canto coral implica no desenvolvimento humano enquanto agente socializador é fundamentada por um referencial teórico que tem por base a sociologia, a psicologia educacional e a pedagogia musical. Propomos, além da reflexão teórica, um estudo de campo no qual serão relatados os contatos do Coral Vozes da Pulquéria junto à comunidade sepeense, na ocasião em que completa 18 anos de atividades. O Grupo foi fundado em abril de 1990. Até o momento é regido pelo bacharel em canto pela UFSM, maestro Nei Beck.
Palavras-chave: Canto coral, Socialidade.

Introdução
A prática de canto coral é uma das mais remotas formas de integração social. Isto é possível de ser verificado nos escritos sobre a formação do homem grego e nas atividades sócio-musicais nas demais civilizações antigas (BEYER, 1999; JAEGER, 2001). Na história da humanidade o canto em grupo comumente foi uma prática constante e engendrada de socialização. Na história da igreja cristã, por exemplo, desde seus primórdios esta prática foi uma atividade sempre presente na liturgia (PALISCA, 1988).
O canto coral, em seus diversos aspectos e manifestações, está presente na grande maioria das culturas mundiais, o que mostra que esta atividade é um tipo de ação especificamente social, cultural e humana (VIGOTSKY, 1998). Na história do Brasil a presença do canto coral enquanto agente social pôde ser verificada com a chegada dos jesuítas, mas mesmo nas atividades vocais em grupo dos índios brasileiros e dos africanos trazidos para o Brasil já era possível constatar o canto enquanto prática social-cultural (MARIZ, 1994). Posteriormente, já no século XX, o principal movimento que focou e abriu espaço para o canto coral no Brasil enquanto prática cultural e educativa de sucesso foi o movimento do Canto Orfeônico desenvolvido por Villa Lobos (1976).

O canto coral, enquanto prática social e enquanto atividade educativa-musical é estudado por alguns autores que enfatizam os aspectos relacionados aos benefícios desta atividade para o desenvolvimento de seus integrantes nas dimensões pessoal, interpessoal e comunitária (MATHIAS, 1986; GROSSO, 2004; ANDRADE, 2003). Estes pesquisadores confirmam a hipótese de que a atividade coral é uma trama rica de possibilidades formadoras de humanização e socialização.
Por outro lado, verifica-se que os programas educativos da atualidade não têm dado a atenção devida para o potencial formativo da atividade coral (PENNA, 1999, 2001). Acredita-se que pesquisas que revelem os potenciais sócio-educativos desta prática possam colaborar para fortalecer o desenvolvimento de projetos e ações ligadas à educação musical, cultural e social.
Diante desta contextualização propomos analisar os aspectos do processo de socialização no canto coral nas dimensões pessoais, interpessoais e comunitária. A hipótese de que a atividade de canto coral implica no desenvolvimento do humano enquanto ser social é verificável em função de um referencial teórico que tem por base a sociologia (OLIVEIRA, 2001; NANNI, 2000), a psicologia educacional (VIGOTSKY, 1998) e a pedagogia musical (MATHIAS, 1986; SOUZA, 1996, 2004). Nesse sentido, além da busca pelo referencial teórico, ainda serão realizadas entrevistas junto às entidades visitadas pelo Coral. Esta pesquisa de campo contribuirá para verificar aspectos importantes como o nível de consciência dos entrevistados sobre o potencial de socialização presente no canto coral, aqui devidamente confrontados com o referencial teórico em nossas análises de cunho qualitativo.
1. Sociologia e pedagogia musical no canto coral
Acredita-se que a sociologia, a psicologia educacional e a pedagogia musical possuam abordagens teóricas comuns e complementares que podem clarear questões relacionadas ao desenvolvimento de competências de socialização e sociabilização presentes na atividade coral. Segundo Brunner e Zeltner (1994. p. 241), socialização é o “processo pelo qual um indivíduo desenvolve suas formas específicas e socialmente relevantes de comportamento e de vivência, convivendo ativamente com outras pessoas”. Fend (1969) distingue, neste processo, o “fazer social” e o “tornar-se social”. No caso do fazer social, trata-se de como as diversas instancias da socialização influem no comportamento e vida dos indivíduos e os modificam. O “tornar-se social” considera o processo da socialização do ponto de vista do indivíduo: de que forma o indivíduo experiencia as medidas de socialização e de que forma se realizam nesta ocasião as modificações de vida e de comportamento. Neste contexto, se evidencia que o processo da influência das instâncias de socialização sobre o indivíduo se dá em forma de mútua interdependência.
É nesse sentido que Brunner e Zeltner (1994) afirmam que socialização e educação se situam lado a lado. O processo de socialização, assim como o de aprendizagem, é algo que dura a vida toda. Oliveira (2001) esclarece que as principais instâncias de socialização são: a família, a escola, o grupo de companheiros, as instituições de formação profissional e o campo social do “local de trabalho”.

Assim, as ciências sociais se ocupam do estudo sistemático do comportamento social do ser humano. O objeto das ciências sociais, neste caso, é o homem e, suas relações sociais. A ciência social preocupa-se em contribuir para o melhor entendimento dos fatos e processos sociais. Está dividida em disciplinas, como a sociologia, economia, antropologia e política. Nesse sentido, além das especificidades citadas, nos interessa o ponto que liga as ciências sociais aos processos de socialização e como se realizam estudos voltados para busca de dados e evidências no âmbito da sociologia.
O método científico em sociologia, segundo Oliveira (2001), vai além do simples empirismo. Para ele, apesar de que, a atual fase é a da técnica, da precisão, do planejamento; o método tem seus limites e não substitui o talento, a busca por grandes hipóteses e a reflexão. Buscam-se evidências nas relações entre processos sociais e resultados individuais ou grupais e uma interpretação destas evidências pelo viés reflexivo precedido pela busca à seleção e coleta de dados por meio de observações dos materiais concretos produzidos no âmbito social.
Fica evidente, deste modo, a necessidade de se partir de fatos constatáveis em análises sociológicas. Èmile Durkheim (1973) explica que é necessário ter os fatos sociais como princípios e é necessário determinar quais são estes fatos. Segundo ele certos fatos apresentam características especiais, estas consistem em maneiras de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo e dotadas de poder coercitivo. Constituem, portanto, uma espécie de fatos que devem ser qualificados como fatos sociais.
Nesse sentido, acreditamos que há um processo de socialização no canto coral e, consequentemente, um desenvolvimento favorável ao participante desta atividade. Este desenvolvimento acredita-se, é propiciado pelas relações travadas entre as pessoas, porém tendo como canal e vínculo entre elas aquilo que seria o elemento principal – a música, que traz novas formas de agir, pensar e sentir. Necessariamente, parte-se do pressuposto que esta arte é essencialmente uma manifestação social e que, no canto coral, a música contextualiza as relações sociais influenciando o processo de formação dos participantes.
Faz-se necessário, desse modo, procurar neste contexto as relações que se estabelecem entre corista/coristas, corista/regente, corista/comunidade e corista/música. A consciência sobre este universo de relações é importante, pois é nele que se dá o dia-a-dia de um coral e se constitui novas possibilidades de construção de novos saberes e atitudes. Assim, interessa-nos compreender como se dá neste contexto o processo de socialização (maneiras de agir, pensar e sentir; representações e ações; fenômenos psíquicos; fatos sociais). Mas, o que é socializar?

2. O processo de socialização
Segundo Oliveira (2001), a sociologia clássica salienta a diferença entre socialização primária e secundária: a primeira inicia com o nascimento e pode-se dizer que se conclui depois de uma série de passagens até o início da vida adulta. A segunda compreende todo o aprendizado que o indivíduo deve realizar no trabalho, no relacionamento com os colegas, em casa, na relação a dois, no tornar-se pai ou mãe até a terceira idade. Segundo Lev Vigotsky (1998) o processo de socialização é o que o capacita psicológica e culturalmente o homem em formação a ser um cidadão de uma coletividade e de uma cultura.
Nanni (2000), afirma que o processo de tornar-se membro de uma coletividade e a contínua adaptação que este ato requer, abarca fenômenos, que tradicionalmente, pertencem à psicologia e à sociologia. Segundo o autor este dito fenômeno “socialização”, não pode ser fechado dentro dos limites disciplinares. O primeiro evento que ocorre, no desenvolvimento do ser humano, referente ao processo de socialização é a consciência sobre a existência de um EU (si mesmo) e posteriormente sobre o OUTRO (que não eu). Mas, o trabalho da formação do EU não pode amadurecer senão com a progressiva aquisição da linguagem. Com este recurso novos estratos, mediados por símbolos, apoiar-se-ão para formar um indivíduo.
Nanni (2000, p. 113) aponta uma série de fatores desenvolvidos no processo de socialização primária, que são discutidos pela psicologia educacional. É importante salientarmos que estes eventos construídos na primeira infância reorientam as relações sociais, o processo de desenvolvimento e o processo de aquisição de conhecimentos. Nanni (2000) chama de modelo geral de socialização os seguintes fatores: a) A linguagem; b) O saber natural ou “senso comum”; c) As regularidades sociais; d) A consciência sobre papéis e representações; e) A construção da identidade; f) Valores. Porém, também nos interessa o conhecimento sobre os aspectos relacionados à forma de vida musical de terminado grupo ou de determinada pessoa.

Acredita-se que este modelo geral é relevante, porque o mesmo esclarece, por exemplo, como e em que níveis acontecem as relações sociais e os processos de internalização de padrões sociais. Os padrões, presentes no âmbito do canto coral, interessa-nos à medida que é possível identificar aqueles que contribuem para o desenvolvimento dos seus participantes, ou seja, interessa-nos identificar o que contribui como contribui e para quem contribui.
3. Um modelo de socialização musical
De acordo com o modelo de socialização exposto acima, Nanni (2000) formula uma hipótese dedicada à formação de conhecimentos relacionados ao que ele chama de uma “forma de vida” musical. Entre as infinitas informações, que a partir do nascimento adquirimos, algumas dizem respeito, em modo mais ou menos direto à música, aos músicos, aos concertos, aos discos. Acredita-se que estes conhecimentos e todo desenvolvimento que o canto coral propicia, tem sido subestimado. O autor complementa este nosso raciocínio:
(...) neste caso, os conhecimentos que a pessoa absorve sem uma instrução explícita são muitos (freqüentemente subvalorizados)... Com efeito, o modelo de competência musical pode funcionar muito bem para descrever o que a pessoa sabe de música, mas não tem consciência. (Nanni, 2000, p. 124)
O autor enfatiza, então, o próprio processo de formação deste saber, a troca constante entre sujeitos e cultura-ambiente e a criação de expectativas e motivações relativas à música. Este processo ocorre de maneira implícita, automática e involuntária, onde a criança, por exemplo, começa a elaborar sua consciência do mundo e, também, da música.
Mesmo na ausência de uma intervenção claramente didática, como no caso, por exemplo, do canto coral de uma empresa, ou entidade cultural (que não seja educativa), as crianças, adolescentes ou adultos são levados a contatos episódicos com a música e com os músicos. Estes participantes entram em um nível de “um saber musical possível”, como um conjunto de expectativas e conhecimentos que todos os cidadãos da nossa sociedade podem ter acesso simplesmente vivendo, comunicando e observando.

Nanni (2000, p. 125) divide este saber musical possível (SMP), em: 1) Saber de referência: O que é música? Quem é o músico? Quem se tornará um músico? Como se tornar músico? 2) Saber de orientação: O que é uma peça musical? Que tipo de sentido posso esperar escutando uma peça musical? O que um gênero, um estilo, uma forma? O que posso esperar de um gênero, estilo e forma musical? 3) Saber do objeto: O que me diz? Que efeito exerce sobre mim? Que sentido ou significado tem esta peça musical?
O autor defende que esta tipologia de conhecimento musical é aberta porque tenta compreender tudo o que compõe uma forma de vida musical, e porque tenta dar conta de certa variabilidade subjetiva. Nesse sentido, complementa:
Grande parte destes conhecimentos são, na realidade, conhecimentos / expectativas e são absorvidos pelos indivíduos por meio de trocas com a cultura-ambiente, através dos processos de assimilação e revelação de regularidade (...). (Nanni, 2000, p. 125)
Desse modo, aparecem dois conceitos essenciais, o de REGULARIDADE (ou padrões), e o de TROCA(s). Enfatizamos que os contextos referentes a determinados ambientes culturais (modo de vida musical), por suas peculiaridades específicas, potencializarão trocas diferenciadas e regularidades diferentes também serão observáveis.
Nesse sentido, interessa-nos identificar quais regularidades possíveis estão presentes no contexto do canto coral e como é a troca social destes padrões de conhecimento e comportamento. Verifica-se então, que há um processo educativo não formal presente no canto coral, que possui um conteúdo específico (regularidades de informações e comportamentos), uma didática ou pedagogia própria (troca social).
4. Contribuições da sociologia para a educação musical
Souza (1996, 2004), apresenta um balanço das contribuições teóricas e metodológicas da perspectiva sociológica para a educação musical. Explicita as vinculações das investigações em educação musical com os contextos em que se desenvolvem as ações educativas, mostrando as possibilidades de diálogo que a sociologia tem aberta à educação musical.

A pesquisadora afirma que, diante das significativas transformações sociais por que passamos atualmente, as ciências da educação são insuficientes aos debates e as interrogações que anteriormente vinham sendo colocadas, fazendo emergir novas construções teóricas que relacionam sociologia e educação. Segundo Souza (1996, p. 11), “uma das contribuições mais recentes dessa área é o paradigma que toma o ensino como prática social”.
Admiti-se, desse modo, a relevância das abordagens plurais do fenômeno educativo. Souza (1996) afirma que se faz necessária a contextualização de todos os atos, seus múltiplos determinantes, a compreensão de que a singularidade das situações educativas necessita de perspectivas, históricas, sociológicas e psicológicas (BEIILLEROT apud SOUZA, 1996, p. 12).
Segundo Souza (2004), o primeiro princípio é saber que a música é um fato social e em segundo lugar é necessária uma abertura às dimensões e funções que o conhecimento em música pode abranger. Nesse sentido, Souza (1996), afirma que é importante saber o que um sociólogo faz. Para Berger (1991, apud SOUZA, 1996, p. 17), o sociólogo é uma pessoa que se ocupa de compreender a sociedade de uma maneira disciplinada. O seu interesse é essencialmente teórico, pois não necessita estar envolvido com a aplicabilidade e conseqüências práticas de suas conclusões, mas sua curiosidade diante do mundo o leva a questionar, procurando respostas no estudo das instituições, da história e das paixões humanas. Ele tenta descobrir o que está por trás e além das fachadas das estruturas sociais procurando uma nova faceta ainda não percebida e nem entendida.
Algumas perguntas orientam o questionamento sociológico e sua relação com a educação pode ser complementar. Por exemplo, o que as pessoas estão fazendo umas com as outras aqui? Quais são as relações entre elas? Como essas relações se organizam em instituições? Quais são as idéias coletivas que movem os homens e as instituições?
Outra necessidade presente no ato sociológico é a busca pelo ouvir as pessoas e instituições antes de apresentar suas próprias opiniões, onde esta sensibilidade é mais que uma qualidade. É algo que tem impacto direto sobre a própria percepção sociológica. Então, a sociologia torna-se importante para a pesquisa em educação musical. Em primeiro lugar, destaca-se que a sociologia está sintonizada com o caráter da era moderna justamente por representar a consciência de um mundo em que os valores têm sido radicalmente relativizados. Esta pluralidade cultural, de valores, de intenções, de buscas tende a solicitar sempre uma contextualização ou re-contextualização, quando se muda o local, as pessoas, as instituições. Ou seja, cada universo social possui uma peculiaridade própria nas relações travadas e conseqüentemente ações diferenciadas. Além disso, na pesquisa social são importantes: a lógica-cognitiva, a técnica comunicacional e psicológica que trazem segundo Souza (1996, p. 19) um abalo aos modelos tradicionais de pesquisa em educação musical.


5. Pressupostos psicológicos e pedagógicos
Acredita-se que o objeto desta pesquisa deva ser analisado por meio de abordagens teóricas que possam esclarecer como se dá o desenvolvimento dos participantes do canto coral. Lev Vigotsky (1991, 1998) e as premissas do método dialético relacionam as mudanças qualitativas do comportamento que ocorrem ao longo do desenvolvimento humano com o contexto social. Procuram esclarecer a importância das reflexões sobre a questão da educação e de seu papel no desenvolvimento humano. Dedicando-se ao estudo da aprendizagem e desenvolvimento, integrando aspectos biológicos, psicológicos e antropológicos. Segundo Cole & Scribner (1992, 7), Vigotsky “foi o primeiro psicólogo moderno a sugerir os mecanismos pelos quais a cultura torna-se parte da natureza de cada pessoa”.
Vigotsky (1998) aborda o desenvolvimento dos mecanismos psicológicos desenvolvidos socialmente, que são os mais sofisticados – as chamadas funções psíquicas superiores – típicas da espécie humana: o controle consciente do comportamento, atenção e lembrança voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, capacidade de planejamento. Esta é uma das suas hipóteses principais que aqui é importante para compreendermos que a aprendizagem musical se dá no nível social.
Nesse sentido, suas idéias são aqui vinculadas à hipótese de que o canto coral desenvolva, a partir de sua dimensão social e musical, potencialidades nos sujeitos atores de seu cenário social específico. Desse modo, acredita-se que a música e o fazer musical, seja compondo, arranjando, tocando ou cantando, ouvindo e apreciando, possua esta capacidade. De desenvolver nos indivíduos e nos grupos sociais todas as características do processo de aquisição de conceitos e comportamentos mais elaborados, mais complexos e abstratos, enquanto processo para esse desenvolvimento e enquanto reflexo do desenvolvimento de um dado contexto social. Todo desenvolvimento musical e cultural passa pelas relações sociais contextualizadas.

Segundo Bock (2001), a psicologia sócio-histórica de Lev Vigotsky realiza críticas às posições reducionistas e incentiva a produção de uma psicologia dialética. Carregando consigo a abertura e possibilidade de crítica. A teoria sócio-histórica e a psicologia sócio-histórica “concebe o homem como ativo, social e histórico” (BOCK, 2001, p. 17). Para esta teoria, falar de fenômeno psicológico é obrigatoriamente falar da sociedade. Pois a compreensão do “mundo interno” exige a compreensão do “mundo externo”. Então, o fenômeno psicológico deve ser entendido como construção no nível individual do mundo simbólico que é social (BOCK, 2001).
Bourdieu (1989) propõe, também, que o entendimento de como as “disposições adquiridas” (habitus) no processo de socialização vão se transformando em ações e comportamentos observáveis (explícitos) dos sujeitos. Segundo Vasconcellos (2002, p. 79) essa “matriz determinada pela posição social do indivíduo” encaminha julgamentos estéticos e morais que explicam, embora parcialmente, o gosto manifesto e os juízos de valor emitidos pelas pessoas quanto às práticas musicais. O conceito de habitus ajuda a entender a relação sujeito/sociedade (subjetividade/objetividade) na visão de que não há uma absoluta autonomia, e sim uma independência do indivíduo na apropriação e expressão dos bens culturais uma vez que pelos habitus incorporados acontece a interiorização da exterioridade expressa nas visões de mundo que informam o senso comum.
Compreendendo esta complexidade das relações sociais como essenciais para o desenvolvimento humano, Vigotsky (1998) afirma que todas as funções psicológicas superiores, necessitam ser aprendidas ao longo das interações da pessoa com o ambiente cultural no qual ela se encontra e que essas funções, invariavelmente, seguem uma orientação no sentido fora-dentro, ou seja, descrevem uma trajetória desde o exterior (plano intermental) até o interior do sujeito (plano intramental). Tais funções têm necessariamente que ocorrer antes entre pessoas, no nível interpsicológico ou social, para só então passarem a existir no plano intrapsicológico, individual e subjetivo.

Nesse sentido, todo processo de ensino/aprendizagem ou contato social/cultural implica em uma relação dialética, onde ambiente e sociedade contribuem para construção dos aspectos cognitivos superiores no sujeito. No qual, necessariamente, o pensamento conceitual, valores, normas e o conhecimento são desenvolvidos via processo de internalização mediada pelos signos culturais.
6. Dimensões pessoal, interpessoal e comunitária no canto coral
Mathias (1986, p. 16) demonstra que há três níveis de intervenção da prática da música coral no indivíduo. Explicita estas dimensões em cinco partes principais: pessoal, grupal, comunitária, social e política. No entanto, consideramos mais conveniente tratar neste estudo apenas as dimensões: pessoal, interpessoal e comunitária.
O autor afirma que a música se trata de uma força única, vinda de uma ação comum, capaz de comunicar o concreto do mundo dos sons, o abstrato da beleza da harmonia e a plenitude transcendental. Esta “comum ação do som” nos é dada pela unidade que é o princípio de todas as coisas que se vêem na natureza (MATHIAS, 1986, p. 15). A música atravessa as estruturas de nossas identidades, harmonizando-nos com o nosso eu interior (dimensão pessoal), com o outro social (interpessoal) e com a sociedade em que vivemos.
Acredita-se que o canto coral seja uma prática engendrada de possibilidades relativas a essas dimensões, porque propicia relações com a música de forma direta, relações subjetivas – nas quais podemos nos comunicar conosco mesmos em uma esfera de relação harmonizadora. Temos, também, neste contexto, contato com pessoas com propósitos comuns – a alegria de cantar e de se expressar por meio dos sons – da voz. Juntos podem transmitir mensagens, ideologias e atitudes para a comunidade. Estes valores são internalizados por um processo de intervenção da música. Ou seja, a dimensão (sonora) abre caminhos para a troca e a internalização de conceitos e comportamentos em muitos casos mais harmonizados com a humanização nas relações.


8. Objetivos do Projeto
-Fazer com que o trabalho do Coral Vozes da Pulquéria seja conhecido por toda a comunidade;
-Integrar o grupo à comunidade e vice-versa;
-Levar a mensagem cultural a diversos ambientes;
-Descobrir novos cantores;
-Propiciar a interação das pessoas com a música;
-ressaltar o trabalho da Fundação Cultural Afif Jorge Simões Filho através de seu apoio aos grupos culturais organizados do município.
-Conscientizar os participantes do Coral da relevância de seu lugar na cultura ou na transmissão de um saber cultural valorado historicamente.

9. A metodologia
Para marcar o 18º aniversário o Coral Vozes da Pulquéria, através deste projeto, pretende interagir com a comunidade sepeense mostrando como é desenvolvido o trabalho do grupo e fazendo com que as pessoas descubram ou aprimorem o gosto pela música. Para isso, com o apoio da Fundação Cultural Afif Jorge Simões Filho entrará em contato com as Associações de Bairros, Escolas, Entidades representativas e Instituições do município para agendamento de apresentações didáticas, respeitando o horário disponível do regente e dos coralistas. Nesses encontros pré-estabelecidos serão distribuídos questionários que, analisados se somarão a esta pesquisa que, deverá ter uma conclusão de todas as atividades bem como dos questionamentos por ela levantados, após a apresentação de Natal.

l.
Referências:
ANDRADE, Margaret Amaral. Avaliação do Canto Coral: critérios e funções. In: HENTSCHKE & SOUZA (Orgs.). Avaliação em música: reflexões e práticas. São Paulo: Moderna, 2003. p. 76-90.
BAQUERO, R. Vigotsky e a aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
BOCK, A. M. B; GONÇALVES, M. G. M; FURTADO, O. Psicologia sócio-histórica
– uma perspectiva crítica em psicologia. São Paulo: Cortez, 2001.
BOURDIEU, P. O poder simbólico. São Paulo: Edifel, 1989.
COLE, Michael. Epílogo um retrato de Luria. In: LURIA, A. R. A construção da mente. São Paulo: Ícone, 1992.
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Abril Cultural, 1973.

GROSSO, Maria Alexandra P. C. (Org.). Sistema de informação e sua utilidade para a administração da arte e da cultura: um estudo de caso no Coral CESUMAR. In: FUCHS, Bernhard. ANAIS II encontro de pesquisa em música da Universidade Estadual de Maringá. Maringá: Massoni, 2004.
GROUT, Donald; PALISCA, Claude. História da música ocidental. Lisboa: Gradiva, 1988.
JAEGER, Werner. Paidéia: a formação do Homem Grego. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
JAPIASSU, Ricardo Ottoni Vaz. Ensino do teatro nas séries iniciais da educação básica: a formação de conceitos sociais no jogo teatral. Dissertação de mestrado. Escola de Comunicações e Artes. USP: São Paulo, 1999.
LA TAILLE, I. et al. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão.
13. ed. São Paulo: Summus 1992.
MARIZ, Vasco. História da música no Brasil. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 1994.
MARTÍ, J. Ser hombre o ser mujer a través de la música: una encuesta a jóvenes de Barcelona. In: Horizontes Antropológicos, ano 5, n. 11, p. 29-51, out. Porto Alegre. 1999.
MATHIAS, Nelson. Coral um canto apaixonante. Brasília: Musimed, 1986.
MOSCOVICI, S. Representação social da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
NANNI, Franco. Mass Media e Socialização musical. In: Revista Em Pauta - v. 11; n. 16-17. p. 108-143. Porto Alegre. 2000.
OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à sociologia. São Paulo: Ática, 2001.
OLIVEIRA, Alda. A pesquisa em psicologia da música – mesa redonda. In: Anais ABEM - V encontro anual. Londrina, p. 59-85, 1996.
PENNA, Maura (Coord.). Caderno de textos: OS Parâmetros curriculares nacionais e as concepções de arte. Grupo de estudos em educação e arte – departamento de artes UFPB. João Pessoa, 1999.
_______. (Coord.). É este o ensino de artes que queremos? – Uma analise das propostas dos parâmetros curriculares nacionais. Editora Universitária – UFPB/CCHLA/ PPGE. João Pessoa, 2001.
PIMENTA, S. G. (Org.). Para uma re-significação da didática. VIII Endipe. – 7-10 de maio, Florianópolis, SC. 1996.
PINTO, M; SARMENTO M. J. Crianças - contextos e identidades. Braga: Tilgráfica, Centro de Estudos da Criança – Universidade do Minho, 1997.
RÊGO, Teresa Cristina. Vigotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

SOUZA, Jusamara. Contribuições teóricas e metodológicas da sociologia para a pesquisa em educação musical – mesa redonda. In: Anais do V encontro anual da ABEM. Londrina, p. 11-39, 1996.
_______. Educação musical e práticas sociais. Revista da ABEM. Porto Alegre, v. 10, p. 7-11, 2004.
_______. (Org.). Música, cotidiano e educação. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2000. SOUZA, M. W. de (Org.). Sujeito, o lado oculto do receptor. São Paulo: Brasiliense, 1995.
SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. São Paulo. Moderna, 2003.
VASCONCELLOS, M. D. Pierre Bourdieu: a herança sociológica. In: CEDES - Educa- ção & sociedade, XXIII, n. 78, p. 77-87, Campinas: abr. 2002. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998. _______. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes. 1991. VILLA-LOBOS. Solfejos originais e sobre temas de cantigas populares, para o ensino


Desenvolvimento do trabalho

O Coral Municipal Vozes da Pulquéria apresentou o Projeto à comunidade de forma oficial na Semana do Município, em Sessão Solene na Câmara de Vereadores de São Sepé.
Abril/2008


Notícias
01/05/2008 - Sessão Solene em prol à 32ª Semana e os 132 de Emancipação Política de São Sepé

A Câmara de Vereadores de São Sepé realizou no Plenário Gaspar da Silveira Martins na última terça-feira, dia 29, uma Sessão Solene em comemoração à 32ª Semana e os 132 de Emancipação Política de São Sepé. Na ocasião, alguns sepeenses receberam o título de Cidadão Sepeense e outros a Medalha Sepé Tiarajú. Após serem destacadas as autoridades presentes na mesa e no Plenário Legislativo, incluindo também os homenageados da noite, o presidente da Câmara, vereador Airo Lima, PTB, declarou aberta a Sessão.
O Hino Nacional Brasileiro soou nos ouvidos dos presentes, que logo puderam prestigiar os homenageados da noite.

Receberam homenagem com o Título de Cidadão Sepeense, Moacir Ruviaro, José Inácio Chinas Machado, Eduardo de Oliveira Vieira, Moacir Seerig e José Eliberto Wegner. Também na Sessão foi entregue a Medalha Sepé Tiaraju para Armando Siqueira da Rosa, Luiz Fernando Calil de Freitas, Cláudio José Mota Cunha e Diomar Fraga Tatsch.

As homenagens terminaram e o prefeito de São Sepé, Cleri Schröder, PP, e o presidente do Legislativo, vereador Airo, fizeram seus pronunciamentos.

O Hino Sepeense tomou conta do ambiente, e depois do seu término, todos os presentes se encantaram com a apresentação do Projeto de aniversário dos 18 anos do Coral Municipal Vozes da Pulquéria.

O coral terminou sua mostra e todos foram convidados para se dirigir até a Galeria dos Presidentes, dentro da Câmara de Vereadores, para prestigiar a inauguração da foto do vereador Nassif Schmidt, PDT, que foi presidente da Casa no ano de 2007.

Fonte: Site Oficial da Câmara de Vereadores de São Sepé


Em 2008, 18 anos de Vozes da Pulquéria

Comemorando o décimo oitavo ano de atividades, o Coral Municipal Vozes da Pulquéria lançou o Projeto “Coral na Comunidade”, dia 29 de abril, em sessão solene da Câmara de Vereadores. Nessa ocasião, o grupo apresentou quatro músicas: Trem do Pantanal, Vento Negro, Alguém na Multidão e I will follow him, sendo aplaudido em pé por todos que prestigiaram o evento.
Quanto ao projeto alusivo aos 18 anos de história, cultura e música, o regente Nei Beck explicou que a intenção é levar o grupo às entidades, escolas, instituições, empresas, associações de bairros e demais locais, mostrando o trabalho que é desenvolvido e reafirmando a socialização que a música proporciona aos coralistas, em suas relações intrapessoais e com a sociedade em geral. Nessas apresentações, o grupo fará ainda uma “apresentação didática”, na qual todos os que tiverem assistindo poderão cantar com o Coral, descobrindo como pode ser prazeroso e enriquecedor participar desse tipo de atividade. Esse projeto será desenvolvido ao longo deste ano e servirá de base para pesquisa científica, na qual se busca constatar a aceitação do trabalho desenvolvido, através da interação com os ambientes e pessoas que vierem a conhecer o trabalho. Outro objetivo é reaproximar, ex-integrantes do grupo e, descobrir novos talentos que venham somar suas vozes ao grupo. Para tal, o grupo coloca-se à disposição para agendar apresentações e convida a todos que se interessarem ou tiverem curiosidade sobre como “funciona” um coral que assistam um de seus ensaios, que são realizados sempre às terças-feiras, às 19h, no Centro Cultural.


Jornal A Fonte 2008-05-06
www.jornalafonte.com.br




A Consciência da Comunicação

Na noite de terça-feira, 11, o professor e bacharel em Canto Nei Beck ministrou palestra no auditório Ulisses Guimarães, no Centro Cultural Diolofau Brum, falando sobre o tema "A Consciência da Comunicação". Cantores, coralistas, professores e profissionais da voz assistiram ao evento que teve explanação teórica e prática. Segundo Nei Beck, "o ponto principal para quem canta ou fala é a comunicação. A mensagem deve ser recebida e entendida e, para tanto, é preciso o conhecimento, ou seja, consciência do aparelho responsável por esta comunicação: o corpo", explicou. O trabalho com a voz envolve postura e respiração, trabalhando a capacidade de comunicação que todos possuem, salientou o maestro. O professor esclareceu ao público sobre o aparelho fonador, a forma como a voz é produzida, a articulação e clareza do som, o mau uso da voz, a mitologia em torno do assunto, características vocais, postura correta para quem utiliza a voz como profissional, o sistema respiratório e os cuidados para manter a qualidade vocal. Interagindo com a platéia respondeu às perguntas, esclarecendo dúvidas e ressaltou que a voz pode ser aprimorada através do conhecimento e que todos estão sujeitos à falha e imperfeição, cabendo a cada um procurar desenvolver seu dom, conhecer suas limitações e capacidades. "Para se comunicar não basta apenas falar ou simplesmente cantar, é preciso colocar sentimento na mensagem de uma forma geral", concluiu. A palestra faz parte de um projeto da Fundação Cultural Afif Jorge Simões Filho para envolver a comunidade no aspecto cultural e contou com o apoio dos Corais de São Sepé. Outros eventos como este, deverão ser oferecidos durante o ano.

Jornal A Fonte 2008-03-18
www.jornalafonte.com.br








O Trabalho com o Pelotão Mirim da Brigada Militar

Numa forma de integração, o Coral Vozes da Pulquéria realizou ensaio junto com o Coral do Pelotão Mirim da Brigada Militar de São Sepé, no mês de outubro de 2008, visando às apresentações do Concerto de Natal do Município, do qual o grupo infanto-juvenil foi convidado. O trabalho com o Pelotão Mirim é ministrado por uma coralista e trouxe um elo de união entre os grupos. Como resultado dessa parceria o Coral Vozes da Pulquéria recebeu dois novos coralistas oriundos dessa interação, o que somou positivamente para ambos os Coros.
Autor: Dioneia Morato


Artigos Relacionados


A Aplicação Da Lei 11.769/08 E A Apresentação De Um Conteúdo Programático Em Música.

O Processo De Socialização No Canto Coral

A 1ª Performance Ao Vivo

O Canto Orfeônico

O Ensino Da Música Na Etica Escolar

Fichamento: "aspectos Do Som: Música, Ruído E Paisagem Sonora"

Brasileiro Heitor Villa-lobos-maior Compositor Das