O Espaço do Desenho: A Educação do Educador



Resumo do texto: O desenho da criança

A criança precisa "marcar" de forma rica e criativa seu espaço, dando vida para as formas que ela deixa no papel. A escola deve permitir que a criança se solte e tenha liberdade nas suas formas e criações. Soltar suas emoções e alegrias quando "marca" seu próprio desenho, tornando-se um sujeito crítico e dinâmico. Precisa viver seu jogo simbólico e não se tornar um sujeito que perdeu seus desenhos na infância.

O desenho da criança

 "Tendo um instrumento que deixe uma marca: a varinha na areia, a pedra na terra, o caco de tijolo no cimento, o carvão nos muros e calçadas, o lápis, o pincel com tinta no papel, a criança vai deixando sua marca, criando jogos, contando histórias." ( MOREIRA,1984,p.15)

A palavra marca na citação acima é muito forte e profunda. Em quantos momentos em nossas classes ouvimos crianças dizendo que não querem desenhar, não sabem o que desenhar. Acaba passando despercebido e ela não desenha. Penso, depois de toda leitura feita que "marca" esta criança quer deixar. Sua história em muitos momentos foi motivo de riso quando a colocou no papel, acabou se fechando e prefere não desenhar, não "marcar" as folhas. 

Uma frase me chamou atenção, onde a autora diz que a criança desenha para brincar. Refletindo e observando minha filha de cinco anos, percebi que o desenho realmente é um grande aliado para ela, por ser sozinha vive brincando através do desenho, projetando para o papel o que vive durante as tardes na escola e em casa. O desenho possibilita para ela falar e colocar para fora o que a incomodou durante o dia.

Assume uma postura individual, onde no ato de desenhar, pensamento e sentimento estão juntos.

A palavra desenho vai além do ato de colocar no papel o que está pensando e sentindo. O brincar da criança é um ato de desenhar. A autora possibilita para nós educadores ampliarmos nossa visão do significado do desenho, que para a criança é o primeiro projetar-se para o mundo. É no brincar que ela organiza seus brinquedos ou mesmo nos jogos que ela desenha seu espaço.

Antes de iniciar suas garatujas ela já transmite deu modo de pensar e acabamos não levando em conta todo esse universo de transformações pelos quais a criança passa.

Quando li, que a criança através do brincar, que também é um ato de desenhar: ela fala de seus medos. Veio-me a mente o dia que minha filha havia ficado de "castigo", com quatro anos, por ter falado durante um filminho, na escola. Através do brincar, ela desenhou o que e como havia acontecido. Agora, entendo o porquê do brincar com a cena que viveu, ela estava projetando um movimento interior para o exterior. Só assim poderia passar para mim o que havia acontecido, para eu poder explicar-lhe porque não poderia falar durante um longo filme.

"O desenho como possibilidade de brincar, o desenho como possibilidade de falar, marca o desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho assume um caráter próprio". (MOREIRA, 1984, p. 26).

Observando alguns desenhos de minha filha em diferentes estágios de sua infância, pude perceber somente depois dessa leitura, o progresso de sua linguagem. Desde o riscar para marcar fortemente o papel, suas primeiras garatujas até agora com seu desenho definido e ampliado, a abertura e visão de mundo que adquiriu as formas dos bonecos, aves, casas... Ela tem no seu interior o que quer desenhar e como desenhar.

Agora não são apenas movimentos, e sim sua forma de ver as coisas e poder tê-las numa folha. Sua linguagem se abriu tanto que durante minha gravidez, desenhou papai, ela, mamãe e o bebê dentro da barriga, foi mágico, fascinante!

Segundo Ostrower, as crianças mesmo sendo de países diferentes na mesma faixa de idade são bem uniformes. O seu universo interior é bem parecido, o que vai diferenciar é como esse universo interno será trabalhado, desenvolvido e como a criança o colocará no momento de brincar usar a folha de papel para marcar sua linguagem.

O jogo feito pela criança quando ela desenha pelo prazer do gesto, pelo prazer em deixar uma marca não deixa de ser um exercício, pois ela repete várias vezes para registrar seu domínio sobre o movimento feito.

"Ao olhar esse registro até consideramos como rabiscos que não conseguimos entender, essa garatuja que se inicia sem forma e desordenada vai adquirindo certo ritmo até que este exercício vai assumindo outras formas". (MOREIRA, 1984, p.28).

Quando perguntava para minha filha o que desenhava ela sempre dava um nome diferente para suas garatujas, não entendia porque mudava tanto os nomes, pensava muitas vezes que era indecisa no que fazia. Não podia imaginar que o que interessava para ela não era nomear o desenho e sim apenas o movimento que ela executava com o lápis, conquistar o controle de mão ao rabiscar o papel.

A criança é de uma riqueza tão grande para nós professores, mas na grande maioria das vezes deixamos passar registros, atitudes que nos tenta dizer, o que está pensando e sentindo.

A autora comenta que a partir do momento que a criança nomeia seu registro com a intenção de dizer algo, considera-se o desenho como linguagem. Nesta fase a criança começa a representação de um objeto ausente, faz comparação entre um elemento dado e um imaginado, é um jogo simbólico.

A criança desenha, não para fazer perfeições nos desenhos, mas para utilizar com liberdade suas habilidades individuais, reproduzir suas ações para mostrá-las a si próprias e aos outros.

Stern comenta que não existe na criança a intenção de fazer poesia. A criança para ela pensa poeticamente.

Através de todo desenho da criança podemos notar a transparência de seu pensamento, brinca com os riscos enquanto desenha, cria histórias doces, transmitindo paz e inocência.

A magia poética que vejo nos desenhos de minha filha agora, me faz valorizar cada traço deixado por ela. Acabo colocando em destaque na porta da geladeira cada desenho seu. Analiso o crescimento de seus desenhos, o sol, a flor que agora é menor que a árvore, a casa... Os desenhos vão tendo formas mais definidas e ricas, a linguagem vai conquistando um vocabulário cada vez mais amplo.

Minha filha passa a maior parte do tempo desenhando, fico pensando que ao crescer não desenhará mais com essa segurança, pois durante seu crescimento aparecerão pessoas que dirão que não sabe traçar "corretamente" uma árvore... Como se existissem traços corretos, o que deve acontecer ao desenhar é a transparência dos sentimentos, o gosto pelo brincar.

Os adultos perdem todo o fascínio pelo desenho, fecham suas emoções e diz não saber desenhar, que não são desenhistas. Acabam desenhando o que os outros desenham como máquinas de Xerox, a criatividade fica na infância. Seus desenhos perdem seus traços únicos, acabam uniformizando cada desenho.

"A escola não é uma estrutura eterna funcionando da mesma forma sob qualquer regime: é moldada sempre pelo todo de que participa" (DUARTE, 1991).

Segundo comentário do autor Duarte a escola ainda hoje, prepara os sujeitos que nela estão e que por ela já passaram para se adaptarem a sociedade que aí está. Sujeitos que deixaram na infância suas emoções e alegrias no ato de desenhar, para vestir sem questionar o uniforme da escola.

A criança deixa de ser artista, para se transformar no sujeito que não sabe desenhar ou que desenha corretamente o modelo feito pelo professor. Podemos notar nos murais no fundo das salas, as árvores têm o mesmo traçado, o sol com um enorme sorriso, a casa com chaminé e cheia de flores iguais. Não permitindo que a criança viaje, e continue criando "seu" desenho, que coloque no papel como ela vê as coisas que a cercam. Deixando se levar pela emoção e alegria ao criar seu próprio desenho, "marcar" seu espaço brincando com as formas que vai dando para sua criação, única e original.   

Atenciosamente, Rosania


Autor: ROSANIA SOARES CARMINATI


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