O Direito Recíproco Entre Pais E Filhos Na Obrigação De Prestar Alimentos



Introdução

Desde nossos primórdios sabemos o quanto é importante os alimentos em nossas vidas; são essenciais à nossa subsistência.

Assim, percebida tal importância, a obrigação de prestar alimentos consagrou-se em nossa legislação precipuamente na Constituição Federal e no Código Civil, prevendo a possibilidade dos parentes exigirem uns dos outros alimentos quando não puderem provê-los por seus próprios meios.

Vale ressaltar que existem várias outras legislações que abordam a respeito da prestação de alimentos, no entanto, aquela que trata especificamente do assunto é a Lei 5.478/68, regula o procedimento da ação de alimentos nos casos onde já exista prova documental do parentesco, que se fundam na necessidade do ser humano em desenvolver-se e manter sua existência, de modo que o legislador apenas regulamentou, tornando obrigação jurídica o que já considerava-seuma obrigação moral.

Desta forma, a clareza da legislação nesse sentido torna inquestionável o direito dos filhos menores pleitearem de seus pais à prestação de alimentos quando não estejam cumprindo sua obrigação, por tê-los abandonados ou qualquer outra razão. É dever dos pais sustentar seus filhos até que eles possam prover por seus próprios meios sua mantença.

Contudo, ocorrerá também o inverso quando os pais na velhice encontrarem-se abandonados, carentes ou enfermos, é dever dos filhos ajudar os mesmos, conforme expresso na Carta Maior.

1. Obrigação Alimentar

1.1Histórico

No Direito Romano clássico, a concepção de alimentos não era conhecida. A própria estrutura da família romana, sob a direção do pater famílias, que tinha sob seu manto e condução todos os demais membros, os alieni juris, não permitia o reconhecimento dessa obrigação. Não há precisão histórica para definir quando a noção alimentícia passou a ser conhecida. Na época de Justiniano, já era conhecida uma obrigação recíproca entre ascendentes e descendentes em linha reta, que pode ser vista como ponto de partida (CAHALI 1979, 47).

O Direito Canônico alargou o conceito de obrigação alimentar. A legislação comparada regula a obrigação de prestar alimentos com extensão variada, segundo suas respectivas tradições e costumes (VENOZA, 2004, p. 386).

Em Roma chamava-se officium pietatis, idéia que aproxima a obrigação alimentar da noção de caridade. É óbvio, entretanto, que, desde o instante em que o legislador deu ação ao alimentário para exigir o socorro, surgiu para o alimentante uma obrigação de caráter estritamente jurídico, e não apenas moral.

1.2. Conceito

Alimentos, em Direito, denomina-se a prestação fornecida a uma pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades da vida. A palavra tem conotação muito mais ampla do que na linguagem vulgar, em que significa o necessário para o sustento. Aqui se trata não só do sustento, como também de vestuário, habitação, assistência médica em caso de doença, enfim de todo o necessário para atender às necessidades da vida; e, em se tratando de criança, abrange o que for preciso para sua instrução.

No direito material, quando se fala em alimentos fala-se no direito de exigi-los e na obrigação de prestá-los, marcando, desse modo, o caráter assistencial do instituto.

Essa obrigação é personalíssima, devida pelo alimentante em função do parentesco que o liga ao alimentando. Por conseguinte, não se transmite aos herdeiros daquele.

Dada à importância que a questão de alimentos apresenta para o ordenamento jurídico, as regras que a disciplinam são de ordem pública e, por conseguinte, inderrogáveis por convenção entre os particulares. De modo que não se pode renunciar ao direito de exigir alimentos oriundos do parentesco, nem se pode ajustar que seu montante jamais será alterado, nem fazer qualquer espécie de convenção que possa, direta ou indiretamente, suspender a aplicação de uma das normas cogentes constantes deste capítulo. A prestação alimentícia tem um fim precípuo, isto é, atender à necessidade de uma pessoa que não pode prover à sua subsistência. Dessa circunstância, ou seja, do fato de tratar-se de um socorro, decorrem algumas conseqüências de alta relevância.

A prestação alimentícia é exigível no presente e não no futuro, o que implica a idéia de sua atualidade, pois a necessidade que a justifica é, por sua vez, ordinariamente inadiável. Por essa razão, entre outras, a lei confere ao credor meios coativos de grande eficácia, todos destinados a facilitar-lhe o pronto recebimento da prestação alimentícia. Tais meios, vão do desconto em folha de pagamento à prisão administrativa.

Por isso que a prestação alimentícia visa socorrer o alimentando ela não se compensa com dívida que este último, porventura, tenha para com o alimentante. Por essa mesma razão os créditos por alimentos são impenhoráveis; ainda por esse motivo, as apelações interpostas das sentenças que condenarem à prestação de alimentos são apenas recebidas no efeito devolutivo, e não no suspensivo, pois a suspensão do julgado poderia conduzir o alimentando a perecer à míngua.

A prestação de alimentos pode provir de várias fontes, quais sejam: da vontade das partes, que manifestada através de contrato, quer através de testamento; de ato ilícito (que é a hipótese em que o causador do dano fica obrigado a pensionar a vítima); da lei.

1.3. Espécies

Diversos critérios se prestam à taxinomia das obrigações alimentares. Mas a natureza causa, finalidade e o momento da prestação se revelam os mais importantes ao estudo em questão.

1.3.1 Alimentos naturais e civis

Os alimentos naturais compreendem as notas mínimas da obrigação: alimentação, cura, vestuário e habitação: equivalem a necessidades básicas do ser humano. Eles se situam, portanto, nos limites do necessarium vitae.

Segundo Miranda (1971), se considera "naturais" só os alimentos provetidos, que se tenha de regular pelo direito das obrigações (ditos voluntários), porque, no direito antigo, alimentos "legítimos" equivaliam a "civis".

1.3.2 Alimentos legítimos ou voluntários

As classes de alimentos legítimos, voluntários ou indenizatórios se atrelam à fonte da obrigação alimentar.

Os alimentos legítimos são aqueles devidos por força de norma legal, tanto por vínculo sangüíneo, como o dever do filho de prestar auxílio alimentar ao pai, quanto em decorrência do matrimônio. Ditos alimentos se acham disciplinados, conseguintemente, no direito de família, porque de fonte parental ou matrimonial.

De outro lado, os alimentos voluntários, que Pontes de Miranda (1971, p. 84) designa de alimentos deixados, provetidos ou obrigacionais, se constituem por negócio jurídico inter vivos ou mortis causa.

1.3.3 Alimentos definitivos e provisionais

No que concerne à finalidade, existem alimentos ad litem, que, considerando semelhante razão, se distinguem dos alimentos arbitrados pelas partes ou pelo juiz depois de cognição plenária.

De tal sorte, os alimentos definitivos, também chamados de regulares, decorrem de acordo ou de ato decisório "final" do juiz, e ostentam "caráter permanente, ainda que sujeitos a eventual revisão".

Enquanto isso, os alimentos provisionais são fixados, prévia ou concomitantemente às ações de separação, de divórcio, de nulidade ou de anulação do matrimônio ou à própria ação alimentícia, para manutenção do autor da demanda e de sua prole durante a litispendência. Essa relação instrumental com lide pendente é que caracteriza seu conceito. E, por isso, na maioria das vezes, os alimentos provisionais incluem verba suplementar, destinada às despesas do processo.

Dos alimentos provisionais se distinguem os provisórios. É certo que ambos pertencem à categoria de alimentos antecipados, tendo em conta a fase procedimental em que ocorre seu deferimento pelo juiz: desde a postulação, sob forma liminar, e, freqüentemente, sem audiência da parte contrária. Mas a diferença não é apenas terminológica e procedimental, exceto, talvez quanto à última hipótese, no sentido limitado de se submeterem aos ritos formalmente distintos.

Em primeiro lugar, os alimentos "provisórios ", concedidos com base no art. 4º, caput, da Lei nº 5.478/68, são os definitivos, conquanto antecipados à fase postulatória da demanda; os "provisionais" permitem, como já assinalado, a inclusão de verba para custeio da demanda.

Porém, a nota fundamental da distinção reside em que a concessão de alimentos provisórios depende de prova pré-constituída do parentesco ou da obrigação alimentar (art. 2º da Lei nº 5.478/68), incumbe ao juiz aquilatar o perigo de dano, ou seja, à subsistência do postulante, e a verossimilhança do direito alegado, vale dizer, se o desfecho provável da ação ajuizada não implicará a perda do direito à percepção de alimentos pelo demandante.

Embora os alimentos provisionais e provisórios tenham a mesma função antecipatória, em nome do princípio venter non patitur dilationem ("a barriga não pode esperar"), divergem na estrutura quanto àquele dado antes apontado. Nenhum deles é cautelar.

1.3.4 Alimentos futuros e pretéritos

O momento a que se referem os alimentos inspira a divisão destes em futuros e pretéritos.

Os alimentos futuros, conforme Assis (1998, p. 682), são os que se "prestam em virtude de sentença transitada em julgado e a partir da coisa julgada, ou em virtude de acordo e a partir deste'. Seguindo a classificação, o referido autor, diz que, os pretéritos "são alimentos anteriores a esses momentos, e acumulados, considerando a oportunidade da sua constituição e da exigência mediante demanda executiva."

Cahali (1999, p.29), por sua vez, assim destaca:

Alimenta futura são os alimentos que se prestam em virtude de decisão judicial ou de acordo, e a partir dela: alimenta praeterita são os anteriores a qualquer desses momentos. A distinção tem relevância na determinação do termo a quo a partir do qual os alimentos se tornam exigíveis.

2. Obrigação Alimentar no Direito de Família

2.1. Pressupostos

Dispõe o artigo 1.695 do Código Civil: "São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento" ( BRASIL, 2005, p. 392).

Vindo a complementar o artigo 1.695 do Código Civil, vejamos o que dispõe o artigo 1.694, § 1º: "Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada" ( BRASIL, 2005, p. 391).

Este artigo considerado como o princípio básico da obrigação alimentar, pois diz expressamente que o montante dos alimentos deve ser fixado de acordo com as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante.

Dessa forma, para poder pleitear em juízo os alimentos, deve-se primeiramente comprovar que não pode sustentar-se com esforço próprio. Tenta-se evitar com esta conduta, o locupletamento ilícito do necessitado às custas do fornecedor de alimentos. Mesmo, o necessitado sendo culpado da sua situação de penúria, pode este, reclamar alimentos, desde que tenha o alimentante condições de fornecê-lo.

Sobre o assunto, vejamos o artigo 1.694, § 2º: "Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia" (BRASIL, 2005, p. 392).

Contudo, pode a qualquer momento ser modificado o montante de alimentos fixados. Tal modificação deve-se ao fato de ser as condições financeiras do alimentando e alimentante serem mutáveis. Nesses, casos podem acontecer de o alimentando ter condições de prover a própria subsistência, assim como o alimentante pode ter reduzida a sua fortuna e ficar, dessa forma, impossibilitado de prestá-lo. Assim, sempre que possível, admite-se a ação revisional ou de exoneração de alimentos.

Acerca desta questão, dispõe o artigo 1.699 do Código Civil: "Se fixados os alimentos, sobrevier mudança na fortuna de quem ao supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar do juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou agravação do encargo" (BRASIL, 2005, 392).

2.2. Características

De acordo com Venosa (2004, p.392-395), analisaremos as características básicas da obrigação alimentar:

a) Direito pessoal e intransferível. Sua titularidade não se transfere, nem se cede a outrem. Embora de natureza pública, o direito é personalíssimo, pois visa preservar a vida do necessitado. O direito não se transfere, mas uma vez materializadas as prestações periódicas como objeto da obrigação, podem elas ser cedidas.

b) Irrenunciabilidade. O direito pode deixar de ser exercido, mas não pode ser renunciado, mormente quanto aos alimentos derivados do parentesco.

c) Impossibilidade de restituição. Não há direito à repetição dos alimentos pagos, tanto os provisionais como os definitivos. Desse modo, o pagamento dos alimentos é sempre bom e perfeito, ainda que recurso venha modificar decisão anterior, suprimindo-se ou reduzindo seu montante. No entanto, como sempre, toda afirmação peremptória em Direito é perigosa: nos casos patológicos, com pagamento feitos com evidente erro quanto à pessoa, por exemplo, é evidente que o solvens terá direito à restituição.

d) Incompensabilidade. A lei expressamente ressalva que as obrigações alimentícias não se compensam. Tendo em vista a finalidade dos alimentos, qual seja a subsistência do necessitado, a eventual compensação dos alimentos com outra obrigação anularia esse desiderato, lançando o alimentando no infortúnio. Temos entendido, contudo, que se admite compensação com prestações de alimentos pagas a mais, tanto para os provisórios, como para os definitivos.

e) Impenhorabilidade. Destinados à sobrevivência, os créditos de alimentos não podem ser penhorados. Essa impenhorabilidade, no entanto, não atinge os frutos.

f) Impossibilidade de transação. Assim como não se admite renúncia ao direito de alimentos, também não se admite transação. O quantum dos alimentos já devidos pode ser transigido, pois se trata de direito disponível. O direito, em si, não o é. O caráter personalíssimo desse direito afasta a transação. O artigo 841 somente admite transação para os direitos patrimoniais de caráter privado. O direito a alimentos é direito privado, mas de caráter pessoal e com interesse público.

g) Imprescritibilidade. As prestações prescrevem em dois anos pelo Código de 2002. O direito a alimentos, contudo, é imprescritível. A qualquer momento, na vida da pessoa, pode esta vir a necessitar de alimentos. A necessidade do momento rege o instituto e faz nascer o direito à ação. Não se subordina, portanto, a um prazo de propositura. No entanto, uma vez fixado judicialmente o quantum, a partir de então se inicia o lapso prescricional. A prescrição atinge paulatinamente cada prestação, à medida que cada uma delas vai atingindo o qüinqüênio, ou o biênio, a partir da vigência do Código de 2002.

h) Variabilidade. A pensão alimentícia é variável, segundo as circunstâncias dos envolvidos na época do pagamento. Modificadas as situações econômicas e as necessidades das partes, deve ser alterado o montante da prestação, podendo ocorrer sua extinção. Daí por que o art. 1699 permite revisão, redução, majoração ou exoneração do encargo.

i) Periodicidade. O pagamento da obrigação alimentícia deve ser periódico, pois assim se atende à necessidade de se prover a subsistência. Geralmente, cuida-se de prestação mensal, mas outros períodos podem ser fixados. Porém, não se admite que um valor único seja pago, nem que o período seja longo, anual ou semestral, porque isso não se coaduna com a natureza da obrigação. O pagamento único poderia ocasionar novamente a penúria do alimentando, que não tivesse condições de administrar o numerário.

j) Divisibilidade.A obrigação alimentar é divisível entre vários parentes, de acordo com os arts. 1.696 e 1.697. Desse modo, vários parentes podem contribuir com uma quota para os alimentos, de acordo com sua capacidade econômica, sem que ocorra solidariedade entre eles.

2.3. Modos de Extinção

Estatui a vigente Constituição Federal, em seu art. 229, que "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade" (BRASIL, 2005, p. 142). Deste modo, estabelecendo, assim, de forma recíproca, o dever de sustento dos pais em relação aos filhos, e destes em relação aos pais.

O Código Civil, por sua vez, ao dispor acerca dos efeitos jurídicos do casamento e referindo-se apenas aos encargos conferidos aos cônjuges, inclui, entre os deveres de ambos, os de sustento, guarda e educação dos filhos, importando em perda do pátrio poder deixá-los em abandono.

E deixar, sem justa causa, de prover à subsistência do filho menor pode dar ensejo à configuração do crime de abandono material, previsto no art. 244 do Código Penal.

Resulta, pois, diretamente do pátrio poder e se constitui em responsabilidade comum dos genitores, o dever de prestar aos filhos, enquanto civilmente menores, o necessário ao seu sustento, proporcionando-lhes, com tal escopo, alimentação, vestuário, educação, moradia, lazer, assistência à saúde e medicamentos etc. Essa obrigação específica, dos pais em relação aos filhos menores, que encontra sua origem no pátrio poder, é resultante do denominado "dever de sustento". Difere, portanto, daquela obrigação que, ainda que alusiva a pais e filhos, é disciplinada pelo Código Civil, e é identificada e fundamenta-se puramente em relações de parentesco, já não importando a subsistência do pátrio poder, mas sim a necessidade de quem pleiteia a verba alimentar.

Certo que, na vigência do pátrio poder, subsiste a obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos, enquanto civilmente menores, fundada única e exclusivamente no dever de sustento a que alude a lei civil. Enquanto que, a obrigação baseada em laços de parentesco nasce diretamente do fato de não possuir o beneficiário meios próprios para o seu sustento e remanesce até a cessação da necessidade que justificou a concessão.

Considerando especificamente a obrigação embasada no "pátrio poder", surge questão de natureza prática que visa, a saber, como operar-se-á a cessação da obrigação dos pais em relação aos filhos que, ao alcançarem a maioridade civil, deixam de fazer jus legalmente à prestação de alimentos com fundamento do "dever de sustento".

Tornar-se-á relevante a questão posta quando, em decorrência de determinação judicial específica, houver o comprometimento de qualquer dos genitores, competindo-lhe fornecer, mediante prestações periódicas, os alimentos de que necessita o filho para o seu sustento.

Considere o fato de que as disposições legais antes mencionadas impõem aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos enquanto menores, pressupondo-se que, a partir de então estarão eles, salvo eventual incapacidade física ou mental, plenamente aptos a buscar meios que lhes permitam prover o próprio sustento, estabelecendo-se dai em diante obrigação em sentido inverso, pois para o filho surgirá o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, consoante expressamente preceituado em dispositivo da vigente Carta Política.

Visa-se claramente, mediante tais regras, desestimular o ócio e a subsistência de uma relação de dependência sem limites que, de forma indesejável, geraria para os pais, de modo injusto e descabido, a preservação de um encargo que, a rigor, já não mais lhes competiria atender.

Ora, se é certo que cessará o denominado dever de sustento, como anteriormente já restou dito, com o simples fato de haver o beneficiário alcançado a maioridade civil, de se concluir, em princípio, que a extinção do encargo operar-se-á independentemente de qualquer avaliação de necessidades do alimentando. Não mais subsistirá, a partir de então, com suporte no dever de sustento, a obrigação de prestar alimentos ao filho por qualquer dos genitores.

Óbvio, no entanto, que os pais continuarão (em razão das relações de parentesco) vinculados ao dever de prestar ao filho incapaz ou inválido o necessário ao seu sustento, enquanto subsistente a situação que o incapacita para o trabalho.

De concluir-se, assim, que em conformidade com os argumentos e fundamentos anteriormente expostos, tendo o filho alcançado a maioridade civil, cessa para o genitor vinculado à prestação de alimentos a obrigação correspondente, transparecendo induvidoso, ademais, que a cessação pura e simples dos pagamentos devidos em decorrência do dever de sustento não significará abandono do credor e não importará em afronta ao dever de sustento, guarda e educação dos filhos a que alude a lei civil. Também não ensejará tal atitude, a configuração do crime de abandono material, previsto no art. 244 do Código Penal.

Também cessará o direito a alimentos se o cônjuge alimentando unir-se em casamento, união estável ou concubinato. Acrescenta ainda o parágrafo único desse artigo que o procedimento indigno do credor de alimentos, nessa situação, faz cessar o direito a alimentos. A indignidade do procedimento deve ser aferida no caso concreto. O alimentando que se entrega à delinqüência ou à prostituição, por exemplo, pode perder o direito à pensão alimentícia. A norma possui evidente conteúdo ético e moral.

De acordo com o artigo 1.708 do Código Civil:

Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa odever de prestar alimentos.

Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor (BRASIL, 2005, p. 393).

Portanto, o direito a percepção dos alimentos persistirá enquanto deles necessitar, e puder honrá-los o devedor, e até que não seja constituída nova união, seja matrimonial ou não, quando então cessará automática e definitivamente o direito à prestação alimentícia.

3. Reciprocidade da obrigação alimentar entre pais e filhos no Direito de Família

Como sabemos todo ser humano possui o direito à sobrevivência. Contudo, para que isso ocorra de modo digno, é necessário que o indivíduo possua uma boa condição social, entretanto, por vezes, as pessoas não conseguem seu próprio sustento, tendo em vista que, são muito novos, não conseguem emprego, apresentam alguma deficiência que os impede, possuem idade avançada, enfim, e para tanto, o indivíduo irá necessitar da ajuda de outras pessoas para que possam prover o seu sustento.

Assim, se consentidos certos pressupostos, nasce o direito a alimentos por quem o solicita com a correspondente obrigação alimentar de quem deve oferecer a ajuda.

A obrigação alimentar constituída no parentesco, também decorre de lei, ficando restrita aos ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau, com reciprocidade.

3.1. A obrigação alimentar entre pais e filhos no novo Código Civil

Conforme expressa o artigo 1.694, do Código Civil: "Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades da educação" (BRASIL, 2006, p.297). Como percebe-se, há reciprocidade na obrigação alimentar entre os parentescos citados.

Por mera vontade, não pode o alimentando escolher o parente que deverá prover o seu sustento. Quem carecer de alimentos deverá requerê-los, inicialmente, de seus pais e, na ausência destes, a seus avós paternos ou maternos e, na falta destes aos bisavós, assim por diante.

A obrigação alimentar, diferentemente do dever de sustento, possui o caráter de reciprocidade, como cita o artigo 1.696, quando menciona que "Art.1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros" (BRASIL, 2006, p. 297).

Vale ressaltar, que os filhos havidos fora do casamento não estão excluídos da obrigação alimentar. Estabelecido o vínculo de parentesco entre estes e seus pais, são gerados importantes efeitos especialmente no que diz respeito aos alimentos, ao poder familiar e a guarda enquanto menores.

Assim, preceitua a Constituição Federal/88 em seu artigo 227, § 6º:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

[...]

§6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação (BRASIL, 2006, p.68-69 ).

Para que se possa determinar a obrigação de prestar alimentos, é necessário que haja existência de vínculo familiar entre alimentante e alimentando, enfatizando que nem todas as pessoas ligadas pelo troco familiar estão sujeitas a esse encargo, como os parentes afins.

O direito aos alimentos, surge com o fato da impossibilidade do alimentando manter-se por seu trabalho, não apresentando condições financeiras, físicas de prover seu sustento, segundo enfatiza o artigo 1.695, do Código Civil:

Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento (BRASIL, 2006, p. 297).

A análise destes dispositivos legais exige indiscutivelmente, que se considere o fato de que impõem-se aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos enquanto menores, pressupondo-se que, a partir de então, estarão eles, salvo eventual incapacidade física ou mental, plenamente aptos a buscar meios que lhes permitam prover o próprio sustento, estabelecendo-se deste momento em diante obrigação em sentido inverso, pois para o filho surgirá o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, consoante expressamente preceituado em dispositivo da vigente Carta Política.

Visa-se claramente, mediante tais regras, desestimular o ócio e a subsistência de uma relação de dependência sem limites que, de forma indesejável, geraria para os pais, de modo injusto e descabido, a preservação de um encargo que, a rigor, já não mais lhes competiria atender.

Discorrendo sobre o assunto, Viana (1998, p. 300) afirma que:

A solidariedade deveria nortear a vida dos seres humanos. Incompletos por natureza, somente quando agrupados podem alcançar objetivos maiores. A vida em regime de interdependência é um fato. É por isso que se localizam no núcleo familiar os alimentos, sob a forma de obrigação ou dever, onde o vínculo de solidariedade é mais intenso e a comunidade de interesse mais significativa, o que leva os que pertencem ao mesmo grupo ao dever de recíproca assistência.

Portanto, o prestador de alimentos em conformidade com a lei civil, são os parentes na linha ascendente (pais) e descendente (filhos e netos) e os irmãos.

Deste modo, o idoso tem a possibilidade de acionar um único prestador, por meio de uma ação de alimentos, de forma rápida e especial, disciplinado pela Lei 5.478/68, e requerer dele o quanto for necessário à manutenção de sua condição social, desde que, o eleito disponha de condições para tal, ainda que possa, posteriormente, ressarcir-se perante os demais coobrigados.

Logo, custeará o prestador totalmente com a obrigação, vez que se trata de obrigação solidária passiva, cuja concepção mostra o preceito de Gonçalves (2006, p. 136):

A obrigação solidária passiva pode ser conceituada como a relação obrigacional, oriunda de lei ou de vontade das partes, com multiplicidade de devedores, sendo que cada um responde in totum et totaliter pelo cumprimento da prestação, como se fosse o único devedor. Cada devedor está obrigado à prestação na sua integralidade, como se tivesse contraído sozinho o débito.

Em outras palavras, denota-se que todos os indicados na lei civil são igualmente responsáveis pelo dever de alimentar, facultando ao idoso eleger quem acionar ao cumprimento dessa obrigação legal.

Conclusão

É evidente a importância que o instituto dos Alimentos possui em nosso ordenamento jurídico. O seu desenvolvimento acompanha a mesma freqüência de mudanças ocorridas na sociedade, no sentido em que amplia seus conceitos, abrangendo um leque maior de orientações, contudo, ainda hoje não é suficiente.

Entretanto, esse processo, bem como tantos outros no mundo jurídico, é lento e gradativo, onde nem sempre as necessidades mais urgentes é a que prevalece.

A necessidade de sobrevivência que tem o ser humano e a obrigação de prover a subsistência entre ascendentes e descendentes, configura o cerne desse instituto. Assim, uma vez constatado o inadimplência de um dever jurídico preexistente, com a violação do direito do alimentando, incumbe ao Estado quando provocado fixar ao alimentante inadimplente uma penalização afim de que se faça cumprir com sua obrigação, evitando ao alimentando maiores prejuízos.

Percebemos que esse instituto diz respeito à situação de exorbitante relevância no Direito de Família e de aplicação constante na prática forense. As questões relativas à obrigação alimentar tocam a necessidades vitais dos seres humanos, haja vista que são atinentes à própria sobrevivência. O direito à vida e o direito à dignidade, essenciais a toda pessoa, são salvaguardados pela prestação de alimentos.

Referências

ASSIS, Araken. Manual do processo de execução. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

BRASIL. Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 2 ed. Atual. E ampl. São Paulo: Saraiva, 2006.

_______. Lei 5.478/68. Dispõe sobre ação de alimentos e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L5478.htm. Acesso em: 26 set. 2006.

_______. Vade Mecum. Acadêmico forense, São Paulo: Ed. Vértices, 2005.

CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. São Paulo: Saraiva, 2000.

_______. Yussef Said. Dos alimentos. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: teoria geral das obrigações. 2. ed. vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2006.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. 3 ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 4 º ed, vol. VI. São Paulo: Atlas, 2004.

VIANA, Marco Aurélio S. Alimentos. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.


Autor: MILENA OLIVEIRA


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