Magrelov Bastosoievsky Balisov



Para começo de prosa, uma história, para merecer ser contada, deve ter alguns ingredientes que atraiam o gosto do leitor, de si tão ocupado na luta pela sobrevivência cotidiana, que não quer desperdiçar seu precioso tempo a não ser com o absolutamente relevante, não obstante a subjetividade da questão, visto que destoem as opiniões sobre o que é e o que não é relevante. No entanto, temos a convicção de que as pessoas de bom senso fruirão esta narrativa e sentir-se-ão contagiadas pelo que esta reflete de magia e realismo ao mesmo tempo, pelo inusitado mesmo do fato, pela curiosidade, pelo humor leve e, lógico, pela veracidade, visto estar baseadaem coisa sabida e já corriqueira da maioria dos moradores locais, sem falar que (garantimos!) não é uma historieta qualquer, tem sabor, não é sem graça, não é, principalmente, não é insossa.

Iniciemos, pois, nosso relato, antes que se canse o leitor amigo, e vá pôr vistas em outra coisa que lhe pareça mais interessante. Bem, tudo começa quando Lov (assim os íntimos o chamam) deixa sua terra natal para tentar mudar de vida na grande cidade. Trabalhava como um louco para juntar dinheiro. Teve muitas ocupações. Contudo, sua vida deu uma guinada positiva quando começou a trabalhar numa panificadora. O trabalho era árduo, embora menos que seus anteriores, bem menos. O problema era dormir fora de hora e a vida social, que lhe parecia praticamente impossível ter, pois trabalhava de madrugada e dormia de dia, na contramão dos hábitos gerais. Mas foi levando a vida. Aprendeu bastante do ofício e com extrema rapidez, tanto que já costumava ensinar aos outros e dar boas sugestões ao dono da panificadora.

Com o passar do tempo, Mag (outra alcunha do rapaz) tornou-se sócio do negócio e, meses depois, com a aposentadoria do outro sócio, comprou sua parte e tornou-se, finalmente, senhor de sua própria vida, senhor de seu destino, que lhe fora anteriormente tão opressor, e sua vida tão... tão... solitária. Faria agora uma reviravolta na vida, aquela peste de vida não seria a mesma, seria agora época de preamar em sua vida social. Adeus baixa-mar, adeus maré de quebra...

Mas não introduzamos a carroça antes dos bois, mostremos a vara (digo, o pau... bem, não melhorou quase nada...) antes de exterminar a serpente. Magrov (outro de seus codinomes) nascera na cidade de San Sebastianov, de economia precária, mal se sustentando de produtos agropecuários e fruticultura. De família extensa, ele, ainda pequeno, mostrava pendores artísticos, mais pela escultura e cerâmica, já demonstrando com a massa para modelar o inato talento manual... digo, artesanal; entretanto, não teve como desenvolver seu talento. Assim que pôde, partiu para a cidade grande: Moscou. Depois de anos é que se empregou na Padeirevna Massarovna Grossovna. Sempre achou de mau gosto tal nome. Foi quando assumiu a frente dos negócios (posição que mantém até hoje) e permutou-o para Paniskovsky Balisov, nome de família. Manteve os funcionários, já seus conhecidos, amigos ─ íntimos até, diríamos ─ de anos, bons anos. Seus nomes: Tchwlov e Myawkovsky. Eles sempre trabalharam duro, daí porque Basilovme (mais um codinome, parecendo até um anagrama) manteve-os (e ainda hoje os mantém), e mesmo em época de maior dureza da clientela, em face da crise que vive o país, depois da Perestroyka e Glasnost, e da queda do Muro de Berlim. Ah, quantas recordacyones Lov tinha daquele muro, quantas fantasias ideológicas... Mas não ficara de pé. De pé têm que ficar os negócios, que Magrelov aprendera a amar e que passaram a ser a razão última de sua vida. Tinham que ficar de pé.

Mag, então, refletiu sobre a vida que antes levara e chegou à conclusão de que seria necessária uma ação dinâmica e radical, para evitar a crise que surgia por detrás de seu negócio, e quase que já totalmente implantada. Mas não ficaria nessa sem lutar para sair. Planejou-se, pôs em prática antigos projetos inovadores no ramo da panificação. Entre tudo o que planejou, o que foi de maior en-verga-dura tem a ver com modalidades novas de pão, no que espantou, surpreendeu a todos, criando os seguintes paniskovis: pão balisov, pão cassetinhoev, pão cassetaneylev, pão brylhossoff, e por aí vai... glasseiev, molhadovsky, leityevsky, roskov, roskeadoffy, karekoff, bolachov, milheyevny, lizovv, viskosov, biskoytovsky, e muitos outros, todos de muito boa saída, digamos que, economicamente falando, com boa introdução no gosto do consumidor, principalmente o roskeadoemtiev, pão de maior preferência popular, responsável este pãozov não só por manter de pé os negócios de Mag, mas também por fazê-lo sentir-se mais ali-viado em suas transações pendentes. Nem tudo era moleza, mas já se podia considerar tudo mais ali-viado, sem dúvida nenhuma.

Foi aí que um fato mudou tudo, para cima, isto é, para melhor: Tchwlov e Myawkovsky, num dia de muita ressaca, erraram (ou será acertaram?) na receita e esqueceram de acrescentar sal na mistura que originaria a massa do já divulgadíssimo pão roskeadoemtyev. A clientela era bem agigantada naquela manhã. Centenas e centenas de clientes adquiriram o tal famoso pãozov. Lá por dentro de seu negócio, Magrelov já instruía os seus funcionários sobre as receitas dos pães da fornada da tarde, quando ouviu uma voz exaltada e um tanto cavernosa que vinha do balcão do negócio. Dirigiu-se incontinenti até lá para ficar a par de tudo e resolver o problema, se fosse o caso. Lá chegando, deu de frente com um seu cliente antigo, homem de seus 1,90m, forte e um tanto truculento.

─ Que se passa, hombre? , perguntou em portunhol, já sabendo tratar-se de um imigrante do Peru, de nome Purrudones.

─ Hirros de la pueta, unstede non passarom el sal en el pon. Estom issossov, puerra!, foi o que respondeu Purrudones, mostrando um pon que agarrava com uma das mãos, enquanto com a outra segurava o saco com outros pães.

Aquilo excitou-o a ponto de, iritadíssimo, declarar:

─ Ah, é?! Pois entonces se achegue aqui y passe el sal unstede mesmo!

E foi o que Purrudones fez. Tal confusão continuou a se suceder durante todo o resto do expediente de Mag: era cliente e mais cliente que tinha que passar o sal. Foi uma experiência que mudou a vidade Magrelov, além de fazer nascer ali, imediatamente após ele perceber as possibilidades comerciais em jogo, uma nova modadidade de pão, o pão inssosov, hoje sucesso absoluto e únicamodalidade de pãozov produzida pela tão afamada panificadora Balisov.


Autor: Alcir de Vasconcelos Alvarez Rodrigues


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