A TERCEIRIZAÇÃO DA COBRANÇA DA DÍVIDA ATIVA DO MUNICÍPIO



Sergio Miranda Amaral [1]

Sumário: O artigo trata do exame da constitucionalidade da Resolução nº 33/2006, do Senado Federal, que autoriza a cessão da dívida dos municípios a instituições financeiras, com a utilização de instituto do direito privado.

Summary:  The article deals with the examination of the constitutionality of the Resolution nº 33/2006, of the Federal Senate, that authorizes the cession of the debt of the cities the financial institutions, with the use of institute of the private law .

As execuções e cobranças da dívida ativa de natureza tributária estão reservadas a órgãos integrantes da administração pública dos entes da federação (Procuradorias Jurídicas) e também as competências de representação judicial e consultoria (artigos 131 e 132 da CF/1988). Não podem, pois, os municípios delegar a correspondente competência a órgãos não pertencentes às suas estruturas administrativas, sob pena de violação ao modelo previsto pelo poder constituinte originário, afrontando, pois, o princípio da simetria.

A cobrança da dívida ativa[2] (definida como tributária ou não tributária) do município não pode, pois, ser objeto de concessão ou permissão de serviço público, por ser atividade típica de Estado, prestada uti universi e, portanto, insuscetível de exploração comercial, pois a delegação de serviços públicos a particulares,para

exploração por conta e risco deles, pressupõe a possibilidade de obtenção de "lucro", a partir da gestão da atividade, segundo postulados de direito privado. A cobrança judicial de dívida consolidada, portanto, é serviço exclusivo do município, independentemente de existir disposição legal expressa conferindo essa atribuição à Procuradoria do Município. É, induvidosamente, atividade plenamente vinculada.

Entrementes, resolução do Senado recentemente aprovada[3] autorizou os Estados, Municípios e Distrito Federal a ceder[4] a instituições privadas a dívida consolidada, para cobrança por endosso-mandato, mediante a antecipação de receita até o valor de face dos créditos, o que é. Como se disse, absolutamente inviável, pois afronta o princípio constitucional da simetria, art. 29 caput e os artigos 37 XXI (licitação); artigo 146, III; artigo 163 I c/c 165, § 9º, I e II, da C.F., e violação dos artigos 3º e 7º, do Código Tributário. Deve-se acrescer, ainda, que a autorização genérica dada pelo Senado aos municípios para terceirizar a cobrança de sua dívida ativa, seja tributária ou não, caracteriza-se como norma geral de direito tributário (no que diz respeito à dívida de natureza tributária) e norma geral de direito financeiro (no que diz respeito à dívida ativa não tributária), devendo assim ser, necessariamente, viabilizada mediante lei complementar. A edição dessa resolução implica, também, em invasão pelo Senado do campo de competências reservado constitucionalmente ao Presidente da República (artigo 61, § 1º, II, "b" e artigo 66) e à Câmara dos Deputados (artigo 65).

Igualmente, veja-se a este respeito que a matéria relacionada à dívida ativa encontra tratamento em diplomas normativos recepcionados pela Carta de 1988 como leis complementares: a lei nº 5172 de 25 de outubro de 1966(Código Tributário Nacional), artigos 201 a 204 e a lei nº 432, de 17 de março de 1964 (finanças públicas), artigo 39. Uma estabelece normas gerais de direito tributário e a outra de direito financeiro, sendo que ambas possuem campo em comum, que é justamente o trato da dívida de natureza tributária. Assim, não há como omitir que o assunto é de lei complementar, não podendo ser tratado mediante resolução do Senado. Aliás, já em dezembro de 2003, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional havia se manifestado nesses termos pela inconstitucionalidade do projeto que resultou no ato questionado.




Autor: SERGIO MIRANDA AMARAL


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