Avaliação: Revisitando um mundo desconhecido



Inicialmente algumas considerações em relação a este título. Por que estamos falando em avaliar, revisitar e mundo desconhecido?

Avaliação é um tema recorrente em reunião de professores, na literatura e na prática pedagógica dos professores. Isso quando não extrapolamos o mundo acadêmico-escolar e o levamos para o mundo dos negócios, da vida cotidiana... então, o que é avaliar?

O prefixo "A", agregado à palavra "Valia" ou "Valer", nos arremete à língua latina e à palavra "Valere". O prefixo "A", oferece uma idéia de afastamento e "Valere", tem o significado de vigor, de força, de potência. E tudo isso nos leva à idéia de "valor". Isso significa que devemos nos afastar de algo para perceber sua força ou poder? Podemos dizer que sim. Ou seja, aquele que tem a força ou o vigor de que se está falando é visto por quem não é esse forte ou vigoroso. Então se trata de perceber-lhe o valor. Assim sendo não sou eu quem avalio, mas sou eu quem percebo seu valor. Que é, portanto avaliar? Perceber o valor, reconhecer o valor.

Com a palavra revisitar ocorre algo semelhante. O prefixo "re" indica a idéia de algo que volta a acontecer. Ou seja, a avaliação já foi visitada, ou já foi percebido o valor daquilo que é valoroso, a força do que é forte... mas aquele que avalia volta a avaliar. Ou neste caso, a própria avaliação já foi avaliada. Isso se comprova pelos incontáveis artigos e livros que já se publicou comentando a avaliação ou os processos avaliativos. Só a título de exemplo podemos mencionar o livro organizado por Maria Teresa Esteban "Avaliação: uma prática em busca de novos sentidos". Notemos que no próprio título já podemos perceber que: a avaliação é uma pratica, ou seja, vem ocorrendo cotidianamente; e que essa prática busca "novos sentidos", ou seja a própria avaliação é motivo de avaliação. Portanto trata-se de um tema revisitado.

Mas se ocorrem assim tantas visitas, porque esse é um mundo desconhecido? Esse paradoxo é apenas aparente. De um ponto de vista filosófico, todas as realidades, por mais que convivamos com ela ou a conheçamos, permanece um mundo desconhecido. Sendo assim não é por que nada sabemos de avaliação que vamos procurar entender-la, mas, pelo contrário, justamente porque já sabemos algo é que queremos entender melhor. Não é isso que fazem os amantes? Quanto mais se ama, mais se deseja a proximidade da pessoa amada! De modo semelhante, podemos dizer que porque gostamos – ou amamos – nossa atividade de docência é que queremos cada vez mais saber como descobrir o valor que é subjacente e está presente naqueles que são o motivo de nossa ação: os alunos, os estudantes, os acadêmicos ou seja lá como os queiramos chamar.

Revisitamos o mundo da avaliação, não porque seja um mundo desconhecido, mas porque sabemos que aqueles a quem nos dirigimos possuem o vigor que desejamos descobrir, perceber e mostrar. Com isso fica evidenciado o aspecto positivo da avaliação. Não se trata, portanto de um mecanismo punitivo ou excludente, mas de um processo de inclusão, pois trabalha com a força do avaliado, procurando evidenciá-la em todo o seu valor e vigor.

Nossa questão, entretanto não se resume apenas à avaliação, mas à avaliação da aprendizagem. Com dupla implicação: em sala de aula e no contexto social. E aqui é importante que se diga que nem sempre se entendeu avaliação da forma que acima comentamos. Podemos dizer que, do ponto de vista escolar, nem sempre a avaliação foi avaliação. No mundo escolar antes da avaliação havia prova e exame para verificar a aprendizagem. E a preocupação com a aprendizagem não estava relacionada nem com os méritos do estudante e nem com seu contexto social. A prova e o exame destinavam-se a fazer com que os alunos – aqueles que não possuem luz – mostrassem o que haviam recebido da luz de seu mestre. O ponto de referencia não era o estudante, mas o saber do mestre. Desse saber o aluno deveria receber e ser capaz de provar que o havia assimilado. Em razão disso era examinado. Era posto à prova. Por isso a prova se manteve – e ainda é – um elemento assustador, no processo escolar.

Hoje a percepção é outra. Avaliar aprendizagem é buscar saber das potencialidades do estudante diante daquilo que estudou. E isso pode ocorrer em sala de aula, sim, mas a perspectiva não é nem o mestre nem a escola, mas a aplicabilidade desse conhecimento. Ou seja, o que é ensinado deve ser relevante ao ponto de fazer com que não só o estudante se senta motivado a querer aprender – e nisso já haveria um processo avaliativo, pois o estudante perceberia o valor do que estaria aprendendo – como a sociedade possa saber que aquele estudante, ao sair do ambiente escolar, será possuidor de instrumentos eficazes e utilizáveis não só por parte daquele que estudou, mas também por todos os membros do grupo social em que esse estudante estiver inserido. O sentido da avaliação, portanto, não reside na tentativa de fazer com que o estudante prove que sabe, mas que esse saber seja aplicável e traga benefícios ao grupo social do qual o estudante faz parte.

Desse ponto de vista podemos dizer que a avaliação ocorre dentro da sala de aula, porque faz parte do processo escolar, mas também se manifesta na sociedade. E é o contexto social que determina a validade do que o estudante aprendeu e não a escola. A avaliação, portanto, em última instância, não está voltada para o estudante, mas para a própria instituição escolar, pois se aquilo que ela ensina não for relevante para a sociedade, é a escola e não o estudante que será reprovado.

Essa situação nos leva a outro elemento pouco considerado ou nem sempre comentado, quando se fala em avaliação: sua dimensão ética, como sugere o professor Lukesi em texto disponível em www.luckesi.com.br/textos/avaliacao_base_etica.doc. Quando nos referimosà avaliação dizendo que ela se relaciona com as potencialidades daquele que é avaliado, estamos falando de relação entre pessoas. E quando falamos em relação entre pessoas dizemos que nessa relação estão envolvidos, além da ação, elementos valorativos – e avaliar é estabelecer valores – portanto estamos no campo da ética.

O processo pelo qual o professor, ou a instituição escolar, avalia a aprendizagem não pode se esquivar dessa característica da avaliação. Notando que quando nos referimos à avaliação da aprendizagem, estamos nos referindo à valoração que é conferida à aprendizagem e não ao conhecimento do aluno. O que está em jogo, portanto, é o processo de ensino; a dimensão social desse processo tem implicações no cotidiano do estudante e na sociedade da qual ele faz parte.

Em síntese, podemos dizer que a instituição escolar e o processo avaliativo só tem sentido de existir se forem instrumentos da ética enquanto manifestação da busca do melhor: para o estudante, porque ele é o motivo da existência da escola e de tudo que aí acontece; para a instituição escolar, porque ao ser avaliada no processo de avaliação da aprendizagem do aluno, pode aprender com seus erros e acertos a fim de melhor atender aos alunos que estão inseridos numa sociedade; para o professor, pois o processo avaliativo lhe confere instrumentos pelos quais pode perceber erros e acertos e porque é ele um dos pontos centrais pelo qual passa o processo de percepção do valor do estudante. Avaliar a aprendizagem é, enfim, um eficiente canal de redefinição do valor e da força da sala de aula para que, cada vez mais, ela seja instrumento das potencialidades e possibilidades da inserção social do estudante.

ESTEBAN, Maria Teresa (org) Avaliação: uma prática em busca de novos sentidos. 3 ed. Rio de Janeiro: DP&A. 2001.

LUCKESI, Cipriano Carlos, A base ética da avaliação da aprendizagem na escola disponível em <www.luckesi.com.br/textos/avaliacao_base_etica.doc> acessado em 04/02/2009.

GUIMARÃES Maria Isabel Avaliação como Oportunidade de Aprendizagem, disponível em http://www.escola2000.org.br/pesquise/texto/textos_art.aspx?id=78 – acesso em 02/02/2009

Prof. Ms Neri P. Carneiro

Filósofo, Teólogo, Historiador.

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Autor: NERI P. CARNEIRO


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