DIREITO DO CONSUMIDOR – O ACIONAMENTO INDEVIDO DO ALARME ANTIFURTO E O DANO MORAL



O consumidor entra em um supermercado ou loja, faz suas compras, paga, e ao tentar sair do estabelecimento o alarme antifurto toca, em alto e bom som, sendo o cliente abordado pelos seguranças e sua mochila ou sacola revistadas em frente a vários outros clientes ou, se não tiver mochila ou sacola, tendo o cliente que levantar sua camiseta para mostrar que não escondeu nenhum produto do fornecedor .

Nesse caso o cliente/consumidor sofre danos morais pelo constrangimento indevido? Sim, pois inadmissível a atitude acima exposta, caracterizando abuso do direito de segurança, ademais quando o cliente é revistado em frente a todos os outros clientes da loja.

Digo que existe direito a indenização pelo acionamento indevido do alarme antifurto nesses casos em razão de existir uma abordagem indevida dos seguranças (1), sendo importante esclarecer que parte da jurisprudência entende que o simples acionamento indevido do alarme antifurto, apesar de causar algum aborrecimento, não é suficiente para gerar o dever de indenizar.

Pessoalmente acredito que o simples acionamento indevido do alarme antifurto de uma loja ou supermercado é suficiente para gerar o dever de indenizar, pois todos sabem que quando a sirene toca – e muitos desse alarmes possuem até mesmo luzes que ficam piscando – a atenção de todos os clientes da loja ou passantes na parte de fora do estabelecimento é atraída para o consumidor que sofreu o acionamento indevido.

Nesses casos diversos olhares incriminadores e curiosos são lançados para o cliente que nada fez para estar nessa situação, isso quando alguns comentários indevidos não são lançados no ar, como por exemplo, “nossa, hoje em dia não se pode confiar em ninguém”.

Primeiramente, transcrevo alguns julgados que entendem que o simples fato do alarme soar indevidamente não caracteriza abuso, não causa o dever de indenizar, nem nenhum dano extrapatrimonial, ademais quando a abordagem dos seguranças é educada e cordial, não havendo, portanto, o dano presumível ou “in re ipsa”.

Nesse sentido, são os seguintes precedentes:

“APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIONAMENTO DE ALARME ANTIFURTO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE ABUSO NA CONDUTA DO FUNCIONÁRIO DA LOJA. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. SIMPLES ABORRECIMENTO. PROVA TESTEMUNHAL QUE NEM SEQUER PRESENCIOU O FATO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. APELO DA AUTORA REQUERENDO A MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO NO PRIMEIRO GRAU PREJUDICADO. APELO DA RÉ PROVIDO E APELO DA AUTORA PREJUDICADO.” (Apelação Cível Nº 70015954209, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, Julgado em 17/04/2008)

“Ação de indenização por dano moral. Abordagem em estabelecimento comercial. Sentença de improcedência da ação. Recurso da parte demandante. Mérito da demanda. O fato de ser abordada por seguranças quando da saída da loja da demandada, em razão do acionamento do alarme antifurto, não é o bastante para caracterizar dano moral indenizável. No caso, ao contrário do que se alega, os depoimentos da demandante e das testemunhas não demonstram o excesso ou o abuso de direito no procedimento adotado pelo segurança da loja, ao ter a apelante e sua irmã as bolsas examinadas, além de terem que passar novamente pelas antenas do sistema antifurto. O mero desconforto ou aborrecimento não gera dano moral indenizável. Assim, inexistindo dano moral, descaracteriza-se a pretensão ressarcitória.” (Apelação Cível Nº 70020533105, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 19/12/2007)

“APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. DISPARO DE ALARME ANTIFURTO DE LOJA NA SAÍDA DO CONSUMIDOR. ABORDAGEM DOS FUNCIONÁRIOS. AUSÊNCIA DE ATITUDES GROSSEIRAS OU DESELEGANTES POR PARTE DOS PREPOSTOS DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO.
Inexistente a abordagem agressiva ou deselegante por parte dos prepostos da ré, o simples fato de disparar o alarme antifurto no momento da saída do consumidor da loja não é situação, por si só, para caracterizar dano moral. Situação em concreto que se amolda como mero dissabor, não suscetível de indenização.
APELAÇÃO DESPROVIDA.”
(Apelação Cível Nº 70017062407, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 28/02/2008)


Acredito não ser razoável nem mesmo a abordagem educada dos seguranças de uma loja, pois entendo que basta o soar indevido do alarme para que fique caracterizado o constrangimento ilegal ao cidadão. A má atuação dos prepostos da loja ou supermercado servirá apenas para aumentar o valor da indenização a ser paga.

Apesar de o fornecedor ter o direito de proteger e de guardar o patrimônio da empresa, ali representado pelas mercadorias expostas à venda, entendo que se esse mal diligencia, abusa do direito, age com negligência, deve responder pelos danos causados (2).

Considero inegável que a suspeita lançada indevidamente sobre a pessoa, sob a acusação de furto, agride a honra, a dignidade do ser humano, humilha, constrange, sendo a abordagem dos seguranças da loja ou supermercado questão que apenas pode agravar a situação e não excluir o dano já existente.

A empresa, o fornecedor, tem o dever de deixar seus equipamentos de segurança em prefeito estado de conservação e funcionamento e se o alarme soa sem razão esse é de inteira responsabilidade da casa de comércio, e não dos cidadãos, dos consumidores ou dos que por ali passam.

Sobre o dever de indenizar o consumidor pelo acionamento do alarme anti-furto em qualquer hipótese seguem os julgados abaixo:

“DANO MORAL. REVISTA EM SUPERMERCADO. SOAR DE ALARME ANTI FURTO. ABUSIVIDADE DA CONDUTA. QUANTIFICAÇÃO.
É abusiva a conduta da ré que submete os autores à verificação das compras adquiridas e conferência com a nota fiscal, diante de inúmeros curiosos, em função de ter soado o alarme quando deixavam o estabelecimento – o que só foi causado em função de ter ficado preso em um dos produtos adquiridos uma etiqueta magnética de preços. Fato que poderia ser verificado na hora, sem causar situação vexatória. Na quantificação da reparação do dano moral, além de outros critérios, deve ser levada em conta a situação sócio-econômica da ofendida e do ofensor. Ainda, deve ser tal que sirva para coibir a reiteração da prática do ilícito sem, no entanto, proporcionar enriquecimento sem causa para quem recebe. Quantia que, no caso, se mostra adequada e consentânea às circunstâncias e peculiaridades da demanda.
Apelo e recurso adesivos improvidos.”
(Apelação Cível Nº 70003975505, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Marco Aurélio dos Santos Caminha, Julgado em 03/10/2002)

“RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ABORDAGEM DE FUNCIONÁRIO DO PRÓPRIO SUPERMERCADO SOB SUSPEITA DE FURTO. ALARME SONORO ACIONADO. FURTO NÃO COMPROVADO. CONSTRANGIMENTO E HUMILHAÇÃO. DANO MORAL CARACTERIZADO.
Pratica ato ilícito, e responde pelos danos causados, o comerciante que, suspeitando de furto por parte de seu próprio funcionário, por ter soado o alarme anti furto da loja, sujeita-o a constrangimento e humilhação publica, bem como a revista pessoal, sem nada encontrar. Alegação de furto não comprovada. Dano moral caracterizado. Dever de compensar reconhecido. Apelo provido.”
(Apelação Cível Nº 70022090377, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em 28/02/2008)

“RESPONSABILIDADE CIVIL. SUPERMERCADO. ABORDAGEM DE CLIENTE NO INTERIOR DA LOJA. SUSPEITA DE FURTO NÃO CONFIRMADA. ABORDAGEM E REVISTA POLICIAL NA SAÍDA DO ESTABELECIMENTO. PROCEDIMENTO HUMILHANTE QUE COLORE A FIGURA DO DANO MORAL. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. Se a conduta do preposto do supermercado, suspeitando de furto por parte do cliente, ultrapassa a barreira da observação, dando azo a que fosse o consumidor revistado pela polícia militar após sua saída do supermercado, onde efetivamente adquiriu bens, e nada tendo sido constatado em relação à prática de furto, então resta configurada a figura do dano moral, pelo constrangimento e pelas humilhações infligidas ao cliente. Sentença de parcial procedência mantida. Apelo parcialmente provido.” (Apelação Cível Nº 70011605128, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em 04/08/2005)

Assim, apesar de parte da jurisprudência não entender pelo dano “in re ipsa” pelo acionamento indevido do alarme antifurto, ademais quando houver educada e cordial dos seguranças do estabelecimento, a maioria da jurisprudência entende que o fornecedor, o estabelecimento deve indenizar o cliente pelo dano moral sofrido em razão do soar indevido do alarme antifurto, sendo a questão da abordagem dos segurança uma questão que apenas poderá aumentar o valor da indenização se houver truculência, mas nunca excluir o dever de indenizar.


REFERÊNCIAS:

(1) Código Civil “Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.”

(2) Sobre abuso de direito transcrevemos a definição de Carvalho Santos (C.C. Interpretado, vol. 3º, pag. 341, 13ª edição), onde é assim definido:
“O abuso de direito, em face do nosso Código, consiste no exercício irregular, no exercício anormal do direito, no exercício do direito com excessos, intencionais ou involuntários, dolosos ou culposos, nocivos a outrem (Plínio Barreto, Ver. Dos Trib. 79/506). Duas, portanto, são as condições exigidas para a caracterização dessa figura jurídica: a) a falta de moderação no exercício do direito; b) intencionalidade ou imprudência, má-fé ou temeridade, como causas determinantes dessa falta de moderação.”


Autor: Alessandro Fonseca


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