Crítica da Forma do Novo Testamento



A Crítica da Forma (tradução do termo alemão Formgeschichte) é um método que faz parte de um universo de Metodologias Críticas que, impelidas pelo racionalismo, surgiram com a proposta de fomentar uma hermenêutica despida de pressupostos e chancelada pela ciência e pelo racionalismo. Outros métodos críticos além da Forma, são a das Fontes e a da Redação.

O trabalho da Crítica da Forma consiste em buscar identificar as formas literárias do material, estruturas, desígnios e exposições para a compreensão das etapas pré-literárias (oral) de sua progressão. Nesse labor, os adeptos de tal método atuam para detectar a influência de fontes estranhas na formação do texto bíblico.

No pensamento dos críticos da forma, alguns dos livros do Antigo Testamento e do Novo Testamento, no que tange à sua completude final, são "o resultado de um processo de coleção, edição e harmonização de tradições antigas, fontes anteriores… por parte de editores e escribas"[1]. Para os teóricos da Crítica da Forma, muitos dos livros canônicos estão repletos de mitos, lendas, contos tribais, exortações, narrativas históricas, etc.

A Crítica da Forma surgiu na Alemanha pós Primeira Guerra Mundial. Herman Gunkel foi o primeiro estudioso a aplicar a Crítica da Forma ao Antigo Testamento. Quanto ao Novo Testamento, coube a Karl L. Schmidt (1919), Martin Dibelius (1919) e Rudolf Bultmann (1921) o trabalho de aplicar ao mesmo a Crítica da Forma.

Crítica da Forma do Novo Testamento

Para os críticos da forma, os Evangelhos são, originariamente, produtos de pequenas unidades autônomas que gradativamente assumiram formatos de lendas, mitos, contos, etc. Segundo dizem, as unidades independentes foram confeccionadas e mantidas em preservação pela comunidade a partir de sua vicissitude comunal (Sitz im Leben). O trabalho do hermenêuta consiste exatamente em recompor essa "situação de vida" na qual as unidades foram fabricadas. McDowell[2] informa-nos que a Crítica da Forma propõe que

"quando a comunidade cristã enfrentava algum problema, os cristãos criavam ou preservavam alguma declaração ou episódio acerca de Jesus, para enfrentar aquele problema particular."

Desta maneira, boa parte do conteúdo dos Evangelhos não passa de crendices e práticas da Igreja Primitiva; muito do que há sobre a vida e ministério de Jesus Cristo não condizem com a vida prática do Jesus histórico. Para os teóricos da Crítica da Forma, a transmissão oral da tradição dos Evangelhos encontra paralelo na literatura popular antiga e isso depõe contra as narrativas que temos sobre Jesus Cristo nos Evangelhos. Para eles, há uma necessidade de depurar os Evangelhos, de trás para frente, para que se possa objetar o "Jesus mítico" afim de chegar a um conhecimento mais preciso sobre o Jesus histórico. O teólogo alemão Rudolf Bultmann, o mais radical dos críticos da forma, adotava o chamado "método religioso comparativo" em suas análises. Por essa via, ele buscava reconstituir os primórdios da história do cristianismo bem como destacar a historicidade de Jesus Cristo. Tal método insinua que todo e qualquer fenômeno religioso tem que ser compreendido em seu ambiente religioso.

Para Bultmann, os Evangelhos, bem como todo o Novo Testamento, foi influenciado pelas religiões não-cristãs e, por isso, deveriam ser "desmitologizados" [leia os seguintes textos: Jesus Cristo, Deus, e os deuses salvadores pagãos 1, 2, 3 e Cristianismo e as Religiões de Mistério].

Críticas à Crítica da Forma

•Pressuposto Naturalista

A Crítica da Forma é essencialmente naturalista. Ela parte de uma cosmovisão pós-Iluminista e não bíblica, fato que faz com a sua abordagem da Bíblia busque uma compreensão a parte dos próprios termos bíblicos. O que é narrativa histórica na Bíblia é relegada à mito ou lenda. Bultmann diz:

"A comunidade cristã estava convencida de que Jesus havia realizado milagres, e contaram muitas histórias de milagres sobre ele. A maioria das estórias sobre milagres que estão nos Evangelhos são lendas, ou pelo menos estão revestidas de caráter lendário…"[3]

Ao impor um modelo de compreensão externo, Bultmann e os demias proponentes da Crítica da Forma não fazem "justiça à essência da mensagem bíblica" Greidanus[4].

"A noção de história do século 19, por si mesma, não pode ser o padrão para uma teologia do Antigo Testamento porque a priori ela exclui um ato de Deus como uma parte integral da História" Claus Westermann[5]

•Capacidade Criativa Improvável

McDowell[6] registra o seguinte texto de Alfred Wikenhauser:

"Um defeito sério da Crítica da Forma consiste em atribuir à comunidade cristã um poder realmente criativo, o que é perpetrado por muitos de seus defensores – notavelmente Bultmann e Bertram, e, menos radicalmente, por Dibelius. Eles asseveram que certas porções dos evangelhos sinópticos foram criações espontâneas da comunidade cristã, histórias sobre milagres ou novelas, e também sobre lendas – coisas essas tomadas por empréstimos do judaísmo, e, mais particularmente ainda, do helenismo."

•Aproximação Atomista

Por aproximação atomista referimo-nos à inclinação da Crítica da Forma em desprezar o contexto mais amplo de um dado texto. Por, de maneira equivocada, considerar os livros da Bíblia como unidades separadas, independentes, os críticos da forma acabam por concentrarem-se nas árvores em detrimento da floresta inteira Carl Armeding tece um comentário interessante sobre tal prática dos eruditos vinculados à Crítica da Forma.

"A pesquisa da crítica da forma nunca pode, substituir o estudo teológico, histórico e gramatical do texto. Se uma forma particular é usada consciente ou inconscientemente, ela é meramente o veículo pelo qual o escritor inspirado deseja comunicar. O meio certamente é importante, mas o meio não é toda a mensagem."[7]

•Pré-História do Texto

D. A. Carson diz que

"a crítica da forma radical afirma que nós temos um conhecimento muito maior da situação de vida da igreja do que na verdade temos. Tudo o que pensamos saber sobre tais situações é derivado de especulação baseada em teorias da crítica da forma e imaginações férteis."[8]

O que Carson está argumentando é que muito do que constrói a Crítica da Forma quanto ao Sitz im Leben, está mais próximo da pura conjectura do que da verdade do ambiente de vida comunal. Os teóricos que se opõem a essa premissa dos críticos da forma, questionam o quanto a pré-história do texto pode lançar de luz sobre o texto final. Para eles, o que caracteriza a pesquisa da pré-história do texto é uma natureza hipotética.

Finalmente, de acordo com Greidanus, nos círculos acadêmicos, é crescente o número de eruditos que estão optando pelo estudo dos textos em sua presente forma literária. Algumas razões para isso podem ser assim alistadas:

1 – A forma escrita final é mais segura;
2 – Os textos finais não são entidades imaginárias;
3 – Reduz-se sensivelmente as especulações;
4 – Tem-se um material perfeitamente exposto à retina do pesquisador;
5 – Esse material é disposto em uma posição onde se é possível provar ou desaprovar.

Pr. Zwinglio Rodrigues

__________________

[1] LOPES, Augustos Nicodemus. A Bíblia e Seus Intérpretes. São Paulo: Editora Cultura Cristã, p. 192, 2004.
[2]MCDOWELL, Josh. Evidência Que Exige Um Veredito. São Paulo: Editora Candeia, vol. 2, p. 271, 1997.
[3]Citado em Lopes, p. 208
[4]GREIDANUS, Sidney. O Pregador Contemporâneo e o Texto Antigo. São Paulo: Editora Cultura Cristã, p. 54, 2006.
[5]idem, p. 54
[6]Citado em McDowell, p. 285.
[7]Citado em Greidanus, p. 76.
[8]idem, p. 76.


Autor: zwinglio rodrigues


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