Único Amor



Não há como enunciar nome mais doce. E ainda mais tocar uma pele mais tenra e aromática. Um encanto de menina, uma ninfeta, um acorde dos mais melodiosos. Assim poder-se-ia caracterizar a mais bela e encantadora donzelinha que abrandou o meu coração de tal forma que após a sua morte nunca mais fitei uma figura feminina com veleidade.

Sinto-lhe ainda as mãos trêmulas pelo desejo de mim. Ela sorria e se deliciava em dizer-me o quanto me amava, e conduzido pela sua extremada feminidade e beleza retrucava-lhe com as mais intensas e sinceras palavras de amor. Tocava-lhe as mãos, porque ainda éramos crianças. Beijávamo-nos os lábios delicadamente, com suma puerilidade e paixão.

Hoje sou um sacerdote de Deus, pois jurei a ela que nunca me casaria se não fosse consigo. As minhas lembranças estão cruas e irrigadas de pecado: desejava-lhe tão intensamente que dela tirava a minha seiva para viver. Porém ela era um anjo de tão divina e encantada.

Certa noite disse-me ela mirando-me com um olhar circunspecto:

— Jure uma coisa.

Pedi que me dissesse o que eu juraria em seu nome, que já estava integralmente confessado.

— Jure que há de se casar somente comigo e com mais ninguém. Mesmo que me falhe a vida — prosseguiu a minha princesa.

Temeroso pelas suas palavras últimas, respondi:

— Juro se prometeres não me abandonar jamais.

Uma lágrima desapontou de um dos seus olhos inertes ao meu fitar.

— Prometo que nunca hei de abandoná-lo, tal como hão de dizer em sinceros votos do nosso matrimônio — disse ela ao me abraçar.

Confiei, pois, em suas palavras tão francas e movidas a emoções platônicas. Beijei-lhe o cenho e confirmei:

— Amo-te como me amou os céus ao criá-la para mim.

Ela sorriu e secou-me algumas poucas lágrimas que me cobriam os lábios. Beijamos-nos de uma maneira ímpar e inesquecível, como o último beijo, como a última sinfonia.

Fez-se a noite e, conduzidos pela mesma sensação, abraçados ficamos por um longo tempo, observando as constelações e a lua. No outro dia fui à casa da minha eterna companheira. Sua mãe estava ao pé de si na cama, disse-me que a filha estava enferma. Perguntou-me o que havíamos feito noite passada, ao que respondi:

— Nada, dona Helena. Nós ficamos a apreciar as estrelas.

Ela chorou dizendo:

— Ore por ela, meu rapaz, ela está com uma febre muito alta. Disse-me o médico que não há nada a fazer nestas circunstâncias senão dar-lhe os remédios necessários e esperar que ela cesse.

Senti ferir-me o peito. Respirei mais intensamente, mas ainda assim faltava-me fôlego para consolar a mulher. Toquei as tépidas mãos da minha amada e fiquei ali até vir o crepúsculo. Ao soltar-lhe uma mão, ela despertara sussurrando-me:

— Meu amor, estás aqui, comigo?

A sua senhora correu a acudir-lhe felicíssima. A mulher, em pranto, emocionou-se com o descontinuar daquela febre. Disse-me que ficasse, que o pai da minha princesa avisaria à minha mãe sobre a decisão. De tão contente, implorou que ficasse e repousasse por ali. Havia escutado as palavras da filha, por isso decidiu que eu ficaria a fazer-lhe companhia. Sua mãe era romântica e hilária.

Conversamos durante um longo tempo naquela noite e ao fim do crepúsculo despertei de um sono leve e divino. Todavia o meu amor estava cáustico, espasmódico e emudecido. Pedi a Deus que a salvasse para mim, ao que chegou o médico envolvido por uma penumbra. Examinou-lhe todo o corpo, fez diagnósticos precisos, segredou algumas palavras, perambulou pela alcova e por fim disse:

— Sinto muito. Não podemos ajudá-la mais. Resta-lhe poucas horas de vitalidade. — Depois sussurrou: — Uma cefaléia seguida de uma febre intensa!

A graciosa menina agonizava sobre o leito. Preso em mim ruminava e derramava as minhas sóbrias lamúrias. Não me contendo, aproximei-me dela, ainda perplexo e disse-lhe aos ouvidos, sentindo-lhe o néctar:

— Prometo, meu amor.

Veio-me ela em um devaneio sorrindo-me e sussurrando-me: "Amo-te, amo-te."

Não queria sair de casa após a morte da minha donzela. Ficava taciturno. Muitos dos meus amigos diziam que eu era alienado, indigno de vida. Fiz-me padre ainda sonhando encontrá-la; porém é certo que não mais a verei nesta vida. "Prometo", a palavra vem aos meus ouvidos todas as manhãs. E não posso escrever mais, pois não consigo. Sinto-lhe a presença todos os dias. E prometido ficou, a minha sina era esta, tê-la em minha memória como um anjo meu, com o seu sorriso faceiro, com as suas mãos delgadas e encantadoras, e os seus lábios cujo néctar me atrai desesperadamente.

Ronyvaldo Barros dos Santos


Autor: Ronyvaldo Barros dos Santos


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