SUBURBÔNIBUS... ODISSÉIA DE UM TRABALHADOR



Por: Luiz Tamburro

Bom dia, amigo leitor ! Gostaria de me apresentar: meu nome é Zé. È só Zé mesmo, prefiro assim porque minha história é igual a da maioria dos brasileiros que moram nas cidades grandes, no meu caso no Rio de Janeiro.

Carinhosamente me apelidei de " suburbônibus ", pois tenho a impressão de que passo a maior parte do meu tempo dentro de um ônibus, rsrsrsrrsrs...

Bem, minha odisséia se inicia à cinco horas da manhã no ponto final do ônibus 342, Jardim América x Castelo. Cá estou eu na sexta fila do " em pé ", aliás, nunca entendi porque se faz fila para ir em pé... mas, de qualquer forma teóricamente estou adiantado levando em conta que pego no trabalho às nove horas e vou de  " rápido ", quatro horas são muito mais que suficientes para se chegar ao centro do Rio de Janeiro.

Enfim estou dentro do ônibus... ônibus ??? Tá mais para uma lata de sardinha no óleo, só que estragada... o pessoal já tá suando e o cheirinho não é nada agradável.

Outro mistério que tento desvendar em relação ao 342 – Rápido, é por que ele tem que ir ao bairro que fica do lado oposto para entrar na Av. Brasil, quando só o que deveria fazer era um contorno no trevo do bairro, mas uma de minhas intuições é que o engenheiro de tráfego da prefeitura deve ter raiva de suburbano, ele fez o itinerário para que o motorista percorra mais cinco bairros enchendo ( ou preenchendo ? ) ainda mais o coletivo de pobres coitados com medo de perder o emprego.

Mas, em meio aos meus devaneios, ainda preciso me preocupar em desviar minha " parte traseira " da parte dianteira dos " passantes, tarefa não muito fácil em se lembrando que ao praticar tal exercício passamos a ser " encostantes " nos sentados, sim, aqueles afortunados que pensavam que sentados estariam livres dos passantes e encostantes...

De repente ouço um " splat ! " que associado a gritos femininos, não necessáriamente audíveis ( e melhor que não sejam ), iniciasse a diversão de todo suburbônibus:as brigas e xingamentos. Para quem nunca andou de ônibus ( existe ? ), os " em pé " são como carne no açougue, todos ali, pendurados, expostos, com seus braços para o alto, completamente desprovidos de qualquer segurança ou proteção. O problema é que os " em pé " estão sempre trocando de posições, como eu disse, desta forma a vingança sempre chega !

Ops, alguém me passou a mão ! Olhei com cara feia para o primeiro que meus olhos encontraram, tentei identificar naquele rosto a mão ameaçadora e sem vergonha, mas como saber no meio de tanta gente ?

Lembrei que deveriam exigir que motorista de ônibus soubesse ler ou, pelo menos conhecesse um pouco de matemática, 1 + 1 = 2, já seria ótimo, pois, acima dele tem uma plaquinha que diz: " sentados 42, em pé 60 ", 60 ???? Será que o cartazista não errou e esqueceu um zero ? Deve ser: Em pé 600...

A curva !!!! Pronto, após mais uma curva, o motorista arrumou espaço para parar no próximo ponto e mais uma sardinha estaria entrando. Aperta aqui, espreme ali, encosta, empurra, esfrega, pede desculpa, leva um tapa, ganha " um nome ", há... segunda – feira....

Resolvi fechar os olhos para não me estressar, já tinha muita gente estressada ali dentro. Fechei os olhos, cantarolei mentalmente uma música popular e respirei fundo ... hummmmm... que fedor ! –" Quem foi o peidorento ? ", gritei indignado,_ " Quem está com a mão amarela !, respondeu um engraçadinho para o qual dirigi um elogio não muito saudável ( também não sou de ferro, né ? ).

Creio que deveria haver um estudo profundo dos odores e cheiros misturados dentro de um ônibus cheio, tem de tudo, perfume francês, perfume barato ( tudo em excesso ), desodorante spray, desodorante roll on, suor de toda as raças, classes e tipos, sem contar com os gases, esses sim, cada dia mais diversificados. Há, sim, ainda tem aqueles que passam mal e nos " brindam " com mais um cheirinho... " uáááaá´! ", cheirinho que persiste por toda a viagem com aquele líquido viscoso banhando o coletivo...

Finalmente após uma hora preso ao trânsito, o ônibus entrou na pista seletiva ! Aleluia ! Em menos de duas horas chegaremos ao destino, ainda terei uma hora de lambuja, será que hoje chegarei cedo ? Já estou até vendo a cara do patrão e ouvindo-o dizer: _ " Caiu da cama, Zé ? ". Como " caiu da cama " se já chego quase na hora de voltar para o trabalho ?????

Opa ! Desencosta rapaz, não sou seu tipo.... iiiiiii, será que estou boiolando ? Sai daí, ô meu ! Esse traseiro tem dono! O safado ainda riu da minha cara e perguntou: _ " Quem é meu concorrente ? ". Perdi a estribeira... tentei chuta-lo, mas não consegui levantar nem o pé... ameacei socá-lo, mas o braço estava emaranhado com um monte de outros braços... e depois de todas as tentativas, tive uma reação desesperada e... mostrei a língua para ele ! Foi só o que deu para fazer.

No meio disso tudo esforcei-me entre os suvacos para ver onde estávamos, fiquei feliz em constatar que estávamos parados no trânsito em frente ao Cemitério do Caju... bom sinal, afinal estamos mais perto do que antes e só estou à duas horas e meia no trânsito... Daqui a mais uns... quarenta minutos, estaremos saindo da seletiva e " enfrentaremos " a Estação da Leopoldina ! Bem, pelo menos o coletivo vai esvaziar, uns vinte por cento deverão saltar e haverá " espaço " bastante para esticarmos nossas pernas... em falar em pernas... onde estão as minhas ? Não estou sentindo ! Foram amputadas ?Como não dá para baixar os braços ( cadê meus braços ? – há, estão aqui, estes dão para se ver ), mexi-me daqui, dali e descobri que estavam só dormentes, que alívio...

Estação da Leopoldina, alguns surubônobus começam a descer... ei, eu não vou descer, me deixa aqui, largaaaaaa !!!! Agarrei-me na manete de um banco e resisti o máximo que pude, quando vi estava a um passo da porta... quase sou levado pela multidão a saltar onde não queria... mas até que foi bom... estou mais próximo da porta, vou saltar entre os primeiros sem dificuldade.

O ônibus para de novo num ponto em frente a Cidade Nova e começam a entrar um monte de idosos... e lá ou eu de nove sendo empurrado para trás ! O motorista arranca e uma velhinha cai em cima de um velhinho que já estava sentado: _ " Oba ! Ta chovendo na minha horta... Há quanto tempo... " Splat !!!! Conheço este barulho... iii, carara ! Já ouvi estes elogios também !!!! Bem, pelo meno já estamos na Central do Brasil, agarrei-me de novo na manete de um banco e me preparei para ser arrastado... lá vai minha calça.... devolve !!! Quase fiquei pelado, se fosse a meia veriam os furos ( rsrsrsrsrsrsrssrs )....

Agora sim o ônibus está vazio, em plena Praça de República, vai dar para sentar por uns cinco minutinhos... ufa ! ... Mas que que está acontecendo ? Por que ta parando ? _ " Senhores, passageiros, sinto informa-los que o ônibus enguiçou, todos deverão saltar e aguardar outro coletivo. "

Que raios ! Faltam 10 minutos para expirar meu horário, estou na Praça da República e tenho que chegar no Castelo. Coloquei minha mocila com a marmita, a esta hora estragada, atravessada no peito e saí correndo.... corri, corri, corri e cheguei... três minutos adiantado ! Só gastei três horas e cinquenta e seteminutos para chegar ( bem... numa viagem que dura normalmente quarenta minutos ) !

Entrei na empresa todo impostante e ao avistar o meu patrão, cumprimentei-o cheio de autoridade: _ " Bom dia seu Salomão " ! , ao que ele me respondeu com seu sotaque judeu: _ " Bom dia, senhora Zé, muito bom... veio trabalhar na sua folga ?

Bam ! Há, sim, este som vocês não conheciam... sou eu desmaiando....

Abr/2009


Autor: Luiz Tamburro


Artigos Relacionados


Discípulo Do Relógio

O Chão

ZÉ Pedro E CecÍlia: Uma PaixÃo Secreta

A Senhora Ao Lado

Aos Novos CÃes Da ProvÍncia

Contagem Classificatória De Entrada E Saída De Veículos

Pasma Imaginação