A influência da formação educacional na vida profissional do surdo



1. Considerações iniciais

É necessário promover uma reflexão a respeito da educação dos surdos analisando possíveis falhas que, posteriormente acabam por prejudicar o desenvolvimento pessoal e social do surdo, afetando assim, a sua atuação no mercado de trabalho.A família tem um papel muito importante na formação do filho surdo, pois, é através dela que o surdo chega até a escola e, recebe uma formação de acordo com suas necessidades especiais. Por isso, a escolha da escola é de fundamental importância para a capacitação do surdo. Portanto, proporcionar apoio às famílias, sem excluir do direito a uma escola de qualidade a todos aqueles que necessitam de uma educação especial, é o papel de todo e qualquer educador que visa aproximar cada vez mais ao ideal do processo inclusivo brasileiro.

2. A participação da família na educação do filho surdo

É na família o lugar ideal para se iniciar o atendimento de base para os surdos. É a primeira escola onde as capacidades das crianças são desenvolvidas.

Quando pais detectam surdez na família, a primeira reação é de proteção, pois acreditam que o surdo, por apresentar inicialmente dificuldade de comunicação, não conseguirá socializar-se com os demais.

Conforme Sole[1] "o sujeito surdo, por permanecer muito mais tempo sem uma fala efetiva para expressar seus pensamentos favorece que a mãe suponha queele ainda não pensa por si próprio e a estimula a pensar por ele".

É baseando-se nesse contexto que se levanta questionamentos sobre o investimento que se faz na independência dos surdos.

    Sabe-se que, quanto mais precoce é o trabalho com a criança e a família, melhor será a adaptação dos pais à diferença que seu filho apresenta diante das crianças normais e maiores chances terão as crianças de se desenvolver de forma equilibrada.

"Os pais bem orientados pelos serviços educacionais, sabem que precisam desenvolver a linguagemde seus filhos, ou seja, sabem que as crianças mesmo surdas, já nascem com capacidade para expressar o que quiserem, por meio do corpo, principalmente dos gestos, e até por meio das palavras. A família passa a agir normalmente com a criança surda (...) Se o surdo profundo for estimulado desde cedo, reagirá auditivamente por vários sons ambientais e até mesmo poderá, com o tempo codificar alguns sons da palavra falada". (Brasil, MEC/SEESP,1997, p.114)

Resta, porém, identificar qual a melhor forma de trabalho a ser realizada com o conjunto criança surda/escola/família.

3. Escola e surdez

Podemos identificar, em linhas gerais, duas grandes linhas educacionais quanto à pessoa surda:

A primeira e mais tradicional, considera a pessoa surda como portadora de um déficit de audição, associado a um déficit cognitivo e lingüístico, como portador de deficiência, no sentido de não-eficiente. Necessita passar por um processo de reeducação, ou seja, aprender a falar, a inserir-se na cultura ouvinte, integrar-se às salas de aulas de ouvintes.

A outra linha procura se despir dos modelos da sociedade ouvinte e considera o surdo como membro de uma minoria lingüística e cultural, com possibilidades de desenvolvimento semelhantes a qualquer ouvinte. Os argumentos desse ponto de vista têm como base estudos sobre língua de sinais, a história dos surdos e experiências de diferentes países. O surdo é respeitado como possuidor de uma língua natural gestual-visual. A aquisição e desenvolvimento dessa língua lhes garantem os desenvolvimentos cognitivos, lingüísticos e afetivos. O surdo tem o direito de se organizar em grupo, mantendo sua identidade lingüística e cultural, como qualquer grupo minoritário.

Os defensores daposiçãogestualistapura (queraramenteéutilizadaem sua forma radical)propõemàcriança surdadesdea infância ummeio de comunicação isomanual, que lhe seja facilmente acessível.

Essa escolha e a necessidade de colocar a criança precocemente dentro de um contexto comunicativo rico e estimulante são justificadas nos primeiros anos de vida pelos psicólogos do desenvolvimento. Para eles, é necessário fornecer à criança surda um meio de comunicação eficaz para que seu desenvolvimento seja o mais próxima possível ao da criança ouvinte, mesmo que ela execute outra modalidade comunicativa.

Se nós educadores, concordamos que não há nenhuma razão para educar a criança surda dentro de uma modalidade oral pura, não vemos também nenhuma razão para que haja uma prática única e isolada da linguagem gestual.

Muitas foram às formas de comunicação adotadas, ou melhor, impostas para a pessoa surda. Entre elas podemos destacar o oralismo, a comunicação total e finalmente o bilingüismo.Este último, mais aceito e difundido nos últimos anos. Isto pode ser observado no artigo de Eulália Fernandes (2005 pg.35):

 "A educação de surdos na perspectiva bilíngüe toma uma forma que transcenda as questões puramente lingüísticas. Para além da língua de sinais e do português, esta educação situa-se no contexto de garantia de acesso e de permanência na escola".

Em pleno século XXI, deve-se deixar de ter a idéia de que o país se entenda como monolingue. Para que seja possível uma educação com qualidade e sobre tudo verdadeira, aceitar a diferença seja ela cultural, racial, lingüística torna-se essencial.

É preciso difundir a LIBRAS, acreditar que fazemos parte de um Brasil bilingüista ou por que não multilingue. Ai sim se pode afirmar que o surdo estará inserido no contexto social, familiar e principalmente escolar.

Até o momento, a educação inclusiva da rede pública, baseia-se no ato de inserir o surdo na escola regular, onde o mesmo terá direito a uma educação semelhante aos demais colegas ouvintes, oferecendo-o uma igualdade de oportunidades. Porém, a escola pública não está apta para tratar esses alunos com igualdade, até porque estes não são iguais, precisam de um atendimento especializado para assim atingirem o objetivo proposto, aquele pautado na igualdade.

De acordo com Danesi (2002, p. 2) os censos educacionais indicam que de 1998 para cá o número de alunos incluídos aumentou 150%. Esse dado parece compensador a primeira vista, porém, Caetano ( apud Danesi, 2002, p. 2) alega que osalunos com necessidades especiais vivem no interior da sala de aula tendo uma precária aprendizagem. Ainda sobre isso, percebe-se também que os alunos incluídos continuam a depender muito mais de suas famílias para continuarem acompanhando as séries.

A exclusão social não ocorre por acaso. Uma série de fatores, entre eles, a família eescola são responsáveis pelas dificuldades de inserção do surdo na sociedade. Diante dessa abordagem nos perguntamos: de que forma os surdos se sentem excluídos? Será que a sociedade os exclui pela surdez ou pela falta de conhecimento, resultado de uma educação de má qualidade? Qual a participação da família do surdo nesse processo de exclusão?

4. O surdo e o mercado de trabalho

A importância de uma boa escola para o surdo, reflete em oportunidades no mercado de trabalho.

A capacitação profissional da pessoa surda deve ser pensada a partir de uma contextualização do mundo do trabalho, da realidade político-econômico-social em que o País vive.

Manoel Palhares[2] alega que a capacitação para o trabalho dos surdos se inicia quando o ser humano começa a se relacionar com o mundo, com as outras pessoas, e esse processo começa pela escola.Portanto, acredita-se que quanto mais cedo for essa integração do surdo com a sociedade, antes este irá iniciar o seu processo de profissionalização.

Palhares[3] diz ainda que:

"a escola é um importante elemento de iniciação ao mundo do trabalho, onde se procura desenvolver valores e atitudes que promovam a sociabilidade, a criatividade, o potencial cognitivo, estimulando a vontade de aprender e buscando o desenvolvimento da autonomia e da cidadania, pressupostos estes para a formação de um trabalho qualificado".­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­

No contexto atual, são poucas as escolas que atendem surdos e que se enquadram nessa descrição acima, principalmente em se tratando de escolas públicas.   

Gramsci (1991 apud Manoel Palhares)[4], define a relação da escola com a capacitação para o trabalho dizendo que a escola tem o compromisso com o trabalho de maneira não imediata, ou seja, é uma escola formativa, de culturas gerais, humanistas, do trabalho.

Enquanto a inclusão ainda é moda, cabe às escolas definirem quais são as melhores estratégias de formação dos alunos surdos para que esses possam atuar no mercado de trabalho de forma competitiva.

Apesar de muito lenta, a informática vem chegando até a escola pública e, portanto, novos desafios para o setor educacional surgem com a acelerada evolução dessa tecnologia, o que segundo Plácido (2004, p. 71), possibilita o desenvolvimento da capacidade cognitiva e do rompimento das tradicionais metodologias empregadas nas escolas em relação a aluno e professor dentro de uma sala de aula, facilitando a integração social e profissional.

Conforme Rosa e Cruz (2001, p. 39), a internet proporciona um local de profunda igualdade entre todos os seus membros. Através de bate-papos virtuais, identifica-se a diversidade de pessoas e informações que se encontra na rede, sem haver qualquer tipo de preconceito com as diferenças que a pessoa apresenta.

Dede, Fontana e White (apud Plácido, 2004, p. 77) compreendem que esses ambientes de aprendizagem não devem apenas aumentar a quantidade de informações transmitidas ao aluno como no ensino convencional, mas viabilizar um novo modelo de ensino e de aprendizagem, buscando mobilizar as estratégias cognitivas de nível superior.

Rosa e Cruz (2001, p. 39), alegam que "a Internet surge com mais uma ferramenta que potencializa ao surdo analisar a realidade com menos intermediários do que antes, conferindo a ela os julgamentos que lhes parecem pertinentes".

5. Considerações finais

Por fim, constata-se que a tecnologia contribui muito para a inserção do surdo na sociedade, assim como no mercado de trabalho. "A Internet possibilita ao surdo uma independência quase total em relação ao ouvinte" (Rosa e Cruz, 2001,p.48). Além de contribuir para a integração social, também auxilia na busca de qualificação profissional.

Mas apesar das vantagens, o surdo, hoje, só consegue se comunicar pela Internet através de escrita/leitura. O que nos desafia a pensar em encontrar novas alternativas que favoreçam ainda mais os surdos.

A acessibilidade digital é uma variável que pode contribuir para o desenvolvimento cognitivo de pessoas surdas, oferecendo assim, mais condições desses indivíduos competirem no mercado de trabalho.

Por conta desta progressiva mudança de postura, já se consegue vislumbrar, para um futuro não mais tão longínquo, um mundo onde a diferença lingüística, não seja mais encarada como deficiência, mas como particularidade que em nada diminui a pessoa que a apresenta. Mas para que este mundo possa ser de fato conseguido, não basta unicamente uma mudança de paradigmas educacionais: é necessário que se faça também uma profunda reflexão sobre o modo de ver e agir da sociedade extremamente produtivista e superficial dos tempos de hoje.

Enquanto educadores temos que promover o sucesso de nossos alunos. Sejam eles ditos "normais" ou não. Temos enquanto profissionais, a obrigação de buscarmos um constante aperfeiçoamento. E já dizia uma famosa poeta: "Feliz é aquele que ensina o que sabe e aprende o que ensina". Cora Coralina.


 

Bibliografia Consultada

BRASIL, MEC/SEESP. Relatório de avaliações: políticas e programas governamentais em educação especial - EFT 1997 Disponível em <http:/www.mec.gov.br/seesp/publicações>. Acesso em 20/06/07.

DANESI, Marlene Canarim. Políticas públicas de atendimento a surdez.2002

FERNANDES. Eulália. Surdes e bilingüismo. Porto Alegre. Ed: mediações. 2005 104 pg.

PALHARES, Manoel. A capacitação profissional do surdo.Disponível em: < www.portalppgci.marilia.unesp.br>Acesso em 08-08-2007.

PERLIN, Gladis T. T. Identidades surdas. . IN: Skliar, Carlos (org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: ed Mediação, 2001. Cap. 3.

PLÁCIDO, Elza Geanne Rocha. Uma reflexão sobre a influência das novas tecnologias na educação e integração social dos surdos. 2004. 150 f. Monografia (Especialização em engenharia de produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Disponível em: http://teses.eps.ufsc.br/defesa/pdf/13590.pdf. Acesso em 20 de agosto de 2007.

ROSA, Andréia da Silva; CRUZ, Cristiano Cordeiro. Internet: fator de inclusão da pessoa surda. Disponível em<http://www.decom.fee.unicamp.br> Acesso em13-08-2007.

SOLÉ, Maria Cristina. A conseqüência da dor dos pais diante do diagnóstico de surdezna escolaridade de sujeitos surdo.. Curso de especializaçãopara educadores desurdos.BentoGonçalves:IPA, 2007

SOLÉ, Maria Cristina. O contrato narcisista na constituição do Eu de sujeitos surdos..Curso de especializaçãopara educadores desurdos.BentoGonçalves:IPA, 2007


[1]Autora dotexto " O contrato narcisista na constituição do eu de sujeitos surdos" .

[2]Autor do texto "A capacitação profissional do surdo" disponível em http://www.ines.org.br/ines_livros/33/33_PRINCIPAL.HTM

[3]id.

[4]Citado por Manoel Palhares na obra "A capacitação profissional do surdo" disponível em http://www.ines.org.br/ines_livros/33/33_PRINCIPAL.HTM


Autor: Fabiane Masiero


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