Raggomitolarsi



 

 

 

 

RAGGOMITOLARSI

 

Uma das palavras mais feias que já encontrei, mas também uma das mais importantes ao longo da minha vida.

Textualmente,  um “gomítolo” é um novelo; uma linha, um barbante, um fio de lã,  enrolado em forma de  bola. Nada demais.

Partindo do novelo, a lã se desenrola lentamente em trabalhos de tricô e crochê; e você o vê minguar aos poucos, dia após dia , transformando-se numa obra paciente de nós e amarrações, que sua avó, sua mãe ou sua irmã preparam para presentear um neto, um sobrinho, ou o recém nascido de uma amiga.

Partindo do novelo, o fio de algodão ou de fibra é enrolado em  pacotes, volumes,  embrulhos  dando-lhes forma e firmeza, permitindo-nos carregá-los em segurança, de um lado para   outro.        

 

Um novelo faz a festa dos gatos; eles adoram encontrar um e se dedicam a ele com paixão; ficam prontos,  atentos, movem-se rápida e graciosamente, enquanto brincam , empurram e puxam, pegam e largam, agarram e soltam, treinando sua rapidez, com todos os sentidos despertos e aguçados.

 

Mas o verbo, ah! O verbo toma um outro caminho; não encontro uma tradução adequada; “enovelar-se” foi a mais próxima, mas ainda assim, muito distante do gosto, do sabor  do verbo  original.

 

Para começar, é um verbo reflexivo; não é uma  ação realizada sobre um objeto ou sobre alguém; é um movimento em conta própria, feito sobre si mesmo e que depende exclusivamente de quem o faz.

Não posso “enovelar” você; nem você pode “enovelar-nos” - a não ser que estejamos nos enrolando, tapeando, em sentido figurado, abstrato.

 

Mas “raggomitolarsi” é algo muito especial: pode ser causado pelo frio (o urso polar em letargia); ou pelo medo (a raposa acossada pela matilha); ou pelo cansaço (o coelho ao voltar ofegante à toca); ou pela fome, pela sede, por uma ferida mortal (é, nestes casos, um gesto de  submissão, de resignação, de entrega incondicional ao destino).

 

Pensando bem, enrolar-se sobre si mesmo parece ser, para qualquer

animal, uma tentativa de voltar ao útero, à posição fetal, ao calor, à garantia que o seio materno ofereceu, antes do nascimento.

 

De qualquer forma,  muitas vezes, ao longo da vida senti-me assim, fraco, vulnerável, amedrontado. E não encontrei remédio melhor, mais imediato e eficiente, que “raggomitolar-me”, esperando a tempestade passar.

E você ?

 

 


Autor: Romano Dazzi


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