O município como centro de decisões e políticas



(by Lucia Czer)

Ao final do regime militar e na implementação do processo de redemocratização do país, a redistribuição das receitas públicas a fim de dotação das sub-unidades federadas de maior autonomia na área financeira, ainda está longe de solucionar plenamente a redefinição da engenharia das políticas setoriais, ainda que o início do caminho em busca de mudanças fundamentais para que o modelo de gestão de Estado centralizado seja superado. As características do processo descentralizador no Brasil, de maneira geral, têm sido a indefinição de competências, a dispersão de esforços e recursos, as dificuldades para a responsabilização das diferentes esferas executivas pela inexistência ou inadequação da prestação de serviços. De qualquer modo, a descentralização tem ocorrido com base na redistribuição de receitas, de um lado, e de outro, com fundamentação em novos arranjos político- institucionais, com a redistribuição de competências entre as diferentes esferas de governo. Como última medida, o processo descentralizador vem de maneira gradativa transferindo as funções do setor público para o setor privado, lucrativo ou não, com base na instauração de parcerias e convênios.

O desenho institucional que se formou na política educacional decorrente de convênios entre estados e municípios é fragmentado e muitas vezes concorrente em vista do Fundeb, consagrando a cultura burocrático-administrativa centralizada dos anos 70. Devido às enormes desigualdades regionais quanto ao tamanho, formas de atendimento, desempenho e capacidade fiscal dos municípios, fica configurada uma engenharia operacional de transição, onde os novos papéis institucionais vêm sendo testados de todas as formas, podendo-se afirmar tranqüilamente, que cada município é um caso à parte. A retirada de cena da esfera federal, substituída, em parte, pelas novas prerrogativas dadas aos estados e municípios para que estes passem a assumir novas competências de gestão, não constitui apenas um problema técnico, mas esbarra exatamente na cultura política institucionalizada em torno de negociações nem sempre pontuais, mas que tendem a se configurar como fisiológicas.Em contexto de mudança institucional nos quais ocorre negociação de transferência de responsabilidades e/ou compartilhamento de poder, pode se constituir um paradoxo. A necessidade de forjar novas formas de desempenho das políticas educacionais exige que as instituições envolvidas em sua implementação adquiram um corpo de informações e de conhecimentos burocráticos-administrativos para assumir suas novas funções, o que sem dúvida, gera um período de tensão política e vácuo no conjunto normativo- legal, pois sua racionalidade não responde mais às necessidades do cotidiano, isto é, entre o que este conjunto propugna para que a gestão da política educacional funcione em outro paradigma, e sua efetiva operacionalização, configura-se um período de instabilidade institucional que imprime rumos inesperados às suas diretrizes na tentativa de romper a cultura fortemente arraigada em seus órgãos gestores gerenciais e nas próprias unidades escolares.

Tendo em vista que nas Secretarias Municipais de Educação não há um aparato burocrático-administrativo financeiro, pois todo o conjunto normativo era de responsabilidades restritas aos governos estaduais, ocorre atualmente um grande aumento dos encargos administrativos e pedagógicos nos municípios. Essa responsabilidade vem sendo assumida pela esfera municipal, com a criação dos Conselhos Municipais de Educação, os quais necessitariam minimamente de alguma infra-estrutura de funcionamento na implementação das políticas descentralizadas. Assim, o redesenho institucional das secretarias municipais de educação e conselhos municipais de educação vêm configurando novas formas de gestão da política educacional. Isso não significa, naturalmente, que seja improvável o acontecimento de alguma reversão das expectativas locais, tendo em vista o legado político e a possibilidade de cooptação dos órgãos, pois a burocratização da participação dos atores é inevitável. Entre alguns dos principais entraves situa-se a manipulação de informações por parte de alguns segmentos locais, alguma indiferença ou desconfiança em relação ao desenvolvimento do poder local; a negociação de influências e níveis de participação nas principais decisões da esfera administrativa municipal. Questões como a tradição política herdada, a inexistência de quadros técnicos capacitados e a ampliação da atuação referente ao financiamento e gestão de recursos educacionais, bem como as diferenças nos níveis de participação dos atores locais, podem aprofundar de forma negativa as relações de comando, estimulando uma outra centralização, que desestimulará o envolvimento e a participação nas propostas de políticas locais.

Todavia, as dificuldades institucionais não podem desfigurar o processo de democratização e de descentralização das políticas públicas sociais e principalmente no que concerne ao desenvolvimento de um novo paradigma que é o da solidariedade, da cooperação e da parceria, previstas na Constituição Federal, na LDB e na Lei do Fundeb. O quadro atual reclama cada vez mais a consolidação do princípio federativo, cuja principal base de sustentação repousa em sua menor unidade, o município, onde atualmente se estimula a participação como mecanismo de desenvolvimento do poder local.


Autor: lucia czer


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