Zona Norte E Zona Sul: A Afirmação Da Contradição De Valores No Rio De Janeiro
O governo Lacerda vem dar ênfase a uma questão dentro da cidade do Rio de Janeiro que, a muito, já estava implícita: a diferenciação das zonas de concentração populacional pelo seu aspecto social e financeiro.
Osório (2005) cita Heiborn (1999) sobre esse assunto:
Heilborn (1999) também apresenta a cidade segundo a divisão nativa Zona Norte/Zona Sul, não muito diferente das concepções dos autores anteriores, mas chama a atenção para antigas análises em que às zonas geográficas sobrepunham-se zonas morais, isto é, estilos de vida distintos. O crescimento da cidade e a melhora nas redes de comunicação internas, sobretudo viária, não permitem mais pensar o eixo sul/norte em termos de espaços encerrados em si e sem contato. As visões de Zona Sul como vanguarda e Zona Norte como tradição e conservadorismo podem não corresponder mais à realidade. Ainda assim, a autora apresenta elementos que demonstram que estas fronteiras morais ainda são significativas, o que reforça a repartição da cidade em dois blocos distantes.
Até o governo Getúlio, o que se considera por Zona Norte e Zona Sul era um pouco diferente. A Zona Sul também abrangia bairros importantes que hoje pertencem a Zona Norte como Tijuca e Grajaú. Os dois por ter populações de mesmo poderio financeiro que os dos bairros da Zona Sul. Na Tijuca moravam muitos funcionários do Banco do Brasil e no Grajaú moravam muitos militares e era considerada uma área bucólica que tinha ligação com a Zona Sul pelo alto da Boa Vista.
Com a implementação desse modelo de territorialização do município em zonas, ficou claro a intenção do plano Lacerda: valorização e a composição de uma zona de vanguarda, onde tudo que era de mais moderno na cidade estaria disponível para experimentação, tanto no aspecto das inovações das relações sociais e experimentações para construção do indíviduo quanto naquilo que cabia ao dinheiro proporcionar (moda, tecnologia, moradia, decoração, arte) . Essa população que lá residisse deveria estar preparada para essa vivência ou senão teria de procurar outro lugar que se encaixasse melhor na sua maneira de viver. Segundo Velho (2002): “As pessoas, quando se mudam para Copacabana, em pouco tempo adquirem os sinais exteriores que identificam, ou que elas pensam que identificam, os copacabanenses e passam a ostenta-los como símbolos de sua adesão a um estilo de vida ‘moderno’.” Algo que sempre foi perceptível foi essa distinção, Tijuca e Grajaú já compunham, anteriormente ao governo Lacerda, uma área igual e diferente, o que diferia não era o poderio financeiro mas o motivo pelo qual iam morar lá, geralmente pela calma, tranqüilidade, esse aspecto bucólico, diferente da agitação dos bairros próximos a praia.
Esse é o momento da bossa nova, do life way e todas essas explorações de individualidade e de afirmação de um estilo de vida diferente que só se encontra na zona sul. Forma-se uma identidade para os moradores de cada bairro. Há uma extrema valorização do trecho Ipanema – Leblon – Barra e desvalorização do bairro de Copacabana, acontecendo uma migração do último para os primeiros. Copacabana se torna um lugar da promiscuidade e também sai desse imaginário como desejo da classe média alta, muito devido a “invasão” de pessoas de classe baixa ou média baixa que vem morar lá nesse período, em estado precário, mas pelo status de morar em Copacabana. A imagem cada vez mais icônica e significativa no estado da zona sul do município faz com que esse movimento de migração se torne mais intenso.
Gilberto Velho, em “A utopia urbana”, colhe alguma dessas perspectivas através de trabalho etnográfico: “O fato é que a mobilidade residencial desempenha um papel fundamental para a constituição de uma imagem da sociedade, em que as pessoas circulam entre os diferentes estratos espacialmente localizados.” (...) “As pessoas de camadas medias superiores que saíram de Copacabana, que entrevistamos, revelaram que viver em Copacabana tinha sido aspiração sua e que, agora, havia mudado. Mas novas aspirações haviam sido geradas, fazendo com que sempre houvesse um lócus melhor onde valesse a pena comprar ou alugar uma residência.”
Cada zona trouxe essas características de classificação, foram taxadas pela presença de algum tipo de população e de vivência urbana. Sendo assim, a Zona Sul era o local das vanguardas e a Zona Norte, o local da tradição.
O objetivo em reafirmar a Zona Sul como vanguarda, era afirmar a posição de território de maior importância na cidade, captador e espelho de experiências do e para o mundo. Já a Zona Norte era a concentração de bairros de classe média que ficaram fora do eixo dos bairros da Zona Sul e que não tinham uma movimentação social muito grande. São bairros residenciais em sua maioria, sem muita opção de vida noturna e por isso mesmo calmos. Dando um exemplo comparativo, o local de desejo das famílias que queriam um maior isolamento dessa efervescência urbana característica, na zona Norte, era o Grajaú e, na Zona Sul, era o Jardim Botânico.
A dicotomia entre esses espaços se tornou bastante acentuada e os discursos da população um tanto preconceituosos. Reforçando bastante a divisão de classes e a segregação espacial no município.
Bibliografia:
- http://www.aguaforte.com/osurbanitas2/andreaosorio2005-a.html
Revista de Antropologia Urbana – os urbanistas
Ano 2, volume 2, número 1, fevereiro de 2005
Andréa Osório
Data de acesso: 06/08/07
- http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/58_desenvolvimento%20humano%20e%20condi%C3%A7%C3%B5es%20de%20vida%20na%20cidade.PDF
Coleção estudos da cidade / junho 2002
DESENVOLVIMENTO HUMANO E CONDIÇÕES DE VIDA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO E SEUS BAIRROS
Prefeitura do Rio/PNUD/ONU/IPEA/IBEG
Data de acesso: 06/08/07
- http://www.portalbrasil.net/brasil_cidades_riodejaneiro.htm
Cidades brasileiras
Rio de Janeiro
Data de acesso: 06/08/07
- O processo ‘barbarizador’ : reflexões sobre a desigualdade e a violência urbanas no Brasil
Pedro Paulo de Oliveira
Artigo apresentado no VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais (CES) – Coimbra/2004
- Velho, Gilberto
A utopia urbana: um estudo de antropologia social – Gilberto Velho – 6 ed – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2002.
Autor: Letícia de Lima Viana
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