A PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA E A EVIDENTE FALTA DE INTERESSE DE AGIR



Com a Constituição Federal, pode-se dizer que a prescrição foi erigida ao posto constitucional, na qualidade de garantia fundamental.

Assim conclui-se que somente em casos excepcionais, tais como nos crimes previstos nos artigo 5º, incisos XLII e XLIV, não se opera a prescrição, sendo, pois, regra que esta ocorra em todos os demais.

Ademais, deve-se seguir a preleção do professor René Ariel Dotti, para que:

"... A imprescritibilidade, tanto da pretensão punitiva como da pretensão executória, atenta contra o espírito da própria Constituição na medida em que proíbe a pena de caráter perpétuo (artigo 5º, XLVII, b), assim considerada não somente aquela que é cominada, aplicada ou executada, mas toda a reação estatal contra o delito que configure uma ameaça eterna de sacrifício de bens jurídicos do infrator...".

O artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal é claro ao dispor que:

"... A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação...".

Ao acusado em processo crime deve ser igualmente assegurado o término desta condição, ainda que tal implique em condenação ou indiciamento.

É dever tanto dos órgãos de persecução criminal – Policia Judiciária, Ministério Público e Poder Judiciário, quanto dos órgãos da Administração Pública – Receita Federal, Banco Central, etc, combater eficazmente a criminalidade.

No entanto, não se pode, todavia, buscar suprir estas situações deficitárias mediante a supressão de garantias individuais, dentre as quais se inserem, certamente, os limites às pretensões punitiva e executória.

Dado o início à investigação criminal propriamente dita, o que via de regra se consubstancia com a abertura do inquérito policial, deve começar também o lapso prescricional. Isso por uma razão lógica: se o legislador fixa o prazo máximo para que a legislação penal possa alcançar o agente e a prescrição é um meio legal de livra-lo da pretensão estatal punitiva ou executória, quando se principia a perseguição deve também iniciar a possibilidade do acusado dela escapar.

Incumbe as instituições de controle zelar para que o tempo não ponha a perder os esforços envidados na responsabilização pelo cometimento de crimes.

O Ministério Público é o dono da ação penal "dominus litis", a ele cabendo aferir, com absoluta exclusividade, se há ou não elementos para promover a ação penal pública.

O exercício da ação penal está ligado a certas condições, chamadas condições da ação, que são os requisitos mínimos indispensáveis para o ajuizamento da ação, quais são: legitimidade de parte, possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e justa causa.

Interessa particularmente neste trabalho o estudo do interesse de agir, cujo conceito está ligado às idéias de necessidade e utilidade do processo. A necessidade está diretamente relacionada a imposição de uma pena. Já a utilidade vincula-se a efetividade da persecução penal.

Tal modalidade de prescrição baseia-se essencialmente na perda do direito material de punir pelo Estado, já que faltará a este uma das condições para a propositura da ação penal, qual seja, o interesse de agir, posto que não se alcançará com a propositura da ação penal o resultado que dela se espera, no caso, a punição de indivíduo que praticou ato ilícito.

Uma das hipóteses de inutilidade da persecução penal é quando se vislumbra, pela quantidade de pena que provavelmente irá ser imposta numa eventual condenação, o possível advento da prescrição da pretensão punitiva. Trata-se da chamada prescrição perspectiva, que embora não tenha previsão legal, vem sendo admitida pela doutrina e por nossos tribunais.

Com a prescrição em perspectiva a movimentação da máquina judicial não teria qualquer utilidade e de nenhum efeito ou eficácia seria a persecução penal. Características esses que onera de forma desnecessária o judiciário, atrapalha a sua celeridade e despendem gastos desnecessários.

Sobre o tema, o Professor Fernando Capez aduz que:

"... se de plano, for possível perceber a inutilidade da persecução penal aos fins a que se presta, dir-se-á que inexiste interesse de agir...".

Deste modo, com base na prescrição deve o processo ser arquivado e também pela ausência de utilidade de um provimento jurisdicional materialmente eficaz, resultante de uma persecução penal inútil e onerosa.

Esse também vem sendo o entendimento de nossos mais abalizados tribunais senão vejamos:

"... PRESCRIÇÃO ANTECIPADA - Validade do raciocínio judicial que antecipa o cálculo prescricional para rejeitar a denúncia.

Ementa Oficial: Princípio do direito administrativo, voltado para a boa aplicação do dinheiro público, também recomenda que não seja instaurada a ação penal por falta de interesse, quando, em razão da provável pena, que é uma realidade objetivamente identificável pelo Ministério Público e pelo juiz, a partir das considerações inerentes ao artigo 59 do CP, for possível perceber que a sentença condenatória não se revestirá de força executória, em face das regras que regulam a prescrição..." (Ap. 295.059.257 - 3º Câm. - j. 12.03.1.996 - Rel. Juiz José Antônio Paganella Boschi).

"... De nenhum efeito a persecução penal com dispêndio de tempo e desgaste do prestígio da Justiça Pública, se, considerando-se a pena em perspectiva, diante das circunstâncias do caso concreto, se antevê o reconhecimento da prescrição retroativa na eventualidade de futura condenação. Falta, na hipótese, o interesse teleológico de agir, a justificar a concessão ex officio de habeas corpus para trancar a ação penal...". (TACRIM/SP - HC - Rel. Sérgio Carvalhosa - RT 669/315).

Dessa forma, levando em conta a exposição fática acima invocada, bem como o entendimento de nossos doutrinadores, de nossa jurisprudência pacificada e refletindo sobre os princípios da economia processual e da razoabilidade e sem apegos a formalismos exacerbados, devem os operadores do direito, especialmente os promotores de justiça e os magistrados, acolher e aplicar o instituto da prescrição em perspectiva, que na prática, conforme ressaltado, redunda em economia de tempo e dinheiro.

Referências Bibliográficas

Capez, Fernando; Curso de Processo Penal; Saraiva; 2008, página 116;

Dotti, René Ariel; Curso de direito penal – parte geral; Forense; 2005, página 682;

Oliveira, Eugênio Pacelli; Curso de Processo Penal; Del Rey, 2004, página 78.

Regiane Munhoz
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Advogada
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PABX: (11) 3037-8500 (Perto da Fco Morato e da Vital Br


Autor: Bento Jr Advogados


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