BALANÇAS ATREVIDAS



Tecnologias desempregam, engordam e criam dependência. Com tal modo de pensar, eu lutei bravamente contra o uso do computador, até que no ano de 2.000, acabei sucumbindo, eis que descobri que se prosseguisse teimando, não teria condições de continuar exercendo a minha profissão. Cada petição datilografada que eu levava até o fórum, era vista como uma peça de museu. As pessoas olhavam e sorriam disfarçadamente. Assim sendo, acabei cedendo e aderindo a essa nova tecnologia, sob pena de ser visto como um dinossauro do direito.

 

Com tal adesão, eu acabei pagando um preço bastante caro. Eu, que nos meus tempos de músico tinha o apelido de Magrão, já que pesava normalmente 65 quilos, passei a pesar mais de oitenta, ficando no limite para quem mede um metro e oitenta e sete de altura. Tudo em função de passar horas na frente dessa máquina demoníaca que acabou triunfando e nos escravizando. Assim, tudo aquilo que me obrigava a caminhar ou me movimentar, acabou sendo executado pelo computador conectado à internet.

 

Hoje, estou tentando diminuir os prejuízos que podem advir para a minha saúde em virtude do aumento de peso. Diuturnamente ouço e leio por todos os lados que a obesidade é o grande mal que assola a humanidade em nossos dias. Como já tenho uma idade avançada, todos me aconselham a fazer caminhadas diárias ao menos cinco vezes por semana. E é o que eu faço. Quase todos os dias vou até o centro e volto à pé, aproveitando para tomar contato com as pessoas e as ruas da cidade.

 

Por muito tempo, ao chegar ao centro, eu procurava estabelecimentos farmacêuticos que possuem balanças onde as pessoas podem verificar o peso. É claro que acabei descobrindo que elas não devem estar todas aferidas corretamente. Assim, existem algumas nas quais pesamos mais e outras em que pesamos menos algumas gramas. Às últimas eu dei a denominação de “balanças amigas”.

 

Pois bem. De uns tempos para cá, notei que surgiram novos modelos de balança cheias de “nove horas”. A primeira vez que fui tentar me pesar em uma delas, ela acabou me pedindo um real. Como eu não carrego dinheiro em minhas caminhadas, acabei desistindo.

 

Acontece que agora as tais máquinas desistiram de cobrar, até porque eu acredito que os usuários as haviam abandonados. Onde é que se viu pagar para ter más notícias a respeito de nosso peso? Mesmo porque no estabelecimento farmacêutico em que eu aferia meu peso, possuía duas balanças: uma dessas modernas e outra das antigas, daquelas que servem apenas para pesar. É claro que eu preferia a antiga, olhando com um misto de desconfiança e curiosidade para a outra mais moderna, até porque eu tinha medo de “pagar mico” por não saber utiliza-la.

 

Eis que dia desses, ao entrar em uma drogaria, um senhor muito sorridente e atencioso que trabalha no próprio estabelecimento, estava explicando aos usuários como utilizar a indigitada balança. Ao ver que eu me dirigia para a mais antiga, ele me chamou, convencendo-me a experimentar a outra, afirmando que ela além do peso, fornecia a altura e pressão arterial de quem a utiliza corretamente. Para matar a curiosidade, aceitei e segui todas as explicações que o senhor me dava. Terminado o procedimento, a balança deu sua sentença: eu estava com a pressão um pouco acima do recomendado e o meu peso estava um pouco além do limite recomendável para a minha altura. O gentil senhor então me ofereceu uma caixa de chá (caríssimo) que, segundo ele, teria o condão de diminuir a pressão arterial e fazer com que meu peso também diminuísse sem muito esforço.

 

Como nós sempre procurando justificativas para nossos pecados da gula e por não mudarmos nossos hábitos de vida para fazermos frente à passagem dos anos, fiquei elocubrando que ali devia haver um conluio entre a balança acusadora e inconveniente e o funcionário da farmácia. Eles ajustaram que ela criaria o pânico nos usuários, e o sorridente senhor acenaria com a salvação.

 

É claro que isso é coisa da minha mente imaginativa. De qualquer maneira, eu peguei antipatia pelas tais balanças atrevidas, afinal, aonde é que se viu uma máquina ficar nos acusando de obesos e hipertensos? Já não chega o fato de eu ter sido escravizado por um computador? É uma total inversão de valores; a criatura comandando o criador.

 

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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Autor: Jorge André Irion Jobim


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