O NEPOTISMO DO SÉCULO XXI



O nepotismo caracteriza-se por ser a nomeação de pessoas sem vínculo algum com o serviço público, mas cuja principal ou única "qualificação" seja o parentesco com quem o nomeou. É a própria utilização do Estado como prolongamento do convívio familiar.

O fato de inserirem-se parentes no serviço público é prática habitual desde priscas eras. O Brasil foi marcado por uma estrutura que incentivou a inserção de pessoas desqualificadas e ligadas com família que muitas vezes serviu para descaracterizar o trabalho objetivo e de finalidade pública com uma rede de pessoas voltadas ao interesse pessoal gerando corrupção e mal-estar social por haver alguém integrando um posto que poderia ser ocupado por outro agente mais competente e livre para desempenhar seu trabalho de modo que melhor atenda à coisa pública. A Constituição Federal atendeu à seriedade exigida pelo serviço público quando pontuou os princípios que regeriam a Administração. Contudo, por ainda haver grande revolta social pelo retrato demonstrado, bem como entendimentos jurídicos já consolidados a fim de que houvesse alguma regulamentação mais específica a respeito, em 7 de novembro 2008, o Diário de Justiça publicou a Súmula Vinculante nº 13, aprovada pelo STF que trata dos casos de nepotismo no serviço público nos seguintes termos:

"A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta, em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal".

Quando a Súmula foi editada ela apenas afirmou o que a Constituição Federal já alude. É notório que os conceitos dos princípios da moralidade e da impessoalidade induzem à praticidade da ética moral no âmbito de todas as esferas da Administração Pública no que concerne à contratação de agentes que não pelo modelo tradicional do concurso público. Ora, os fatores subjetivos como os elos familiares e de amizade não podem ser requisito de escolha de alguém que será revestido de uma função pública. Há que se ter a adequação das normas que seguem o ethos público para admitir quaisquer que sejam os novos entes que prestarão seus serviços à Federação. Cabe salientar que esta nota se aterá aos agentes que têm função de confiança ou cargo comissionado embora já existam entendimentos quanto ao caso de terceirizados.

Caio Tácito afirma que "o princípio da impessoalidade repele atos discriminatórios que importam favorecimento ou desprezo a membros da sociedade em detrimento da finalidade objetiva da norma de direito a ser aplicada" (TÁCITO, Caio. Princípio da Legalidade e Poder de Polícia. In: Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar e Fundação Getúlio Vargas, jan./mar./2002. p. 45.) Desatendido o fim de interesse público estar-se-á perante o vício de desvio de finalidade, definido no art. 2º, parágrafo único, e, da Lei nº 4.717/65 como aquele que se verifica quando "o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explicita ou implicitamente, na regra de competência".

Há que se observar o princípio da máxima efetividade da Constituição Federal, assim, torna-se direta a aplicação das vertentes já estabelecidas na CF. O próprio sistema jurídico absorve normas morais que foram incorporadas do próprio inconsciente coletivo. Na Reclamação nº 6702 cujo Relator foi o  Ministro Ricardo Lewandowski, julgada em 4 de março de 2009, foi pacífico que não há necessidade de Súmula para regulamentar o nepotismo vez que já estão estabelecidos os princípios relativos ao tema, já comentados, na Constituição.

Interpretando a Súmula, seguindo as disposições do Código Civil, não poderão ser nomeados os parentes naturais, consangüíneos de: a) Linha reta: 1º grau: filho (a) / pai-mãe; 2º grau: neto (a) /avô (ó) e 3º grau: bisneto (a) /bisavô (ó). b) Linha colateral: 2º grau: irmãos (ãs) e 3º grau: tio (a) /sobrinho (a). Os parentes por afinidade: a) Linha reta: 1º grau: genro/sogro-sogra e nora/sogro-sogra; 2º grau: genros / noras com genros / noras de um mesmo sogro/sogra e 3º grau: cônjuges com os avós de seus cônjuges (adquire-se o mesmo grau de parentesco em linha reta do cônjuge consangüíneo considerado) e b) Linha colateral: cunhado, somente (2º grau).

O CNJ elaborou a Resolução nº 7/2005 especificando a proibição de nepotismo no âmbito do poder judiciário, entretanto, a própria Súmula, mais recente, e outros diversos julgados como do RE 579951 quando em 20 de agosto de 2008 o ministro já referido relatou "(...)I - Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita." Ademais, o art. 103-A tratando das Súmulas Vinculantes apregoa uma abrangência mais ampla ao que for sumulado, nestes termos: "O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei." Tal, já confere uma maior convicção de que a Súmula nº 13 está diretamente vinculada a esta Empresa Pública, sendo o seguimento de seus termos de cunho obrigatório.

Ora, resta claro que cabe ao órgão agir em conformidade com as normas e princípios já elucidados vez que a não adequação a essas disposições além de acarretar consequências ao andamento do trabalho interno também pode incidir em sanções diversas por parte do Estado.

Conforme o disposto no art. 37 da Carta magna, a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência sendo que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração com Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998. Assim, se o agente é ingresso no sistema por concurso público há que se orientar caso a caso, observando o seu desempenho no trabalho e capacidade pessoal mesmo que indicado a ocupar cargo superior indicado por cônjuge ou parente.

Por fim, os que ocupam cargos em comissão em quaisquer órgãos da administração pública direta ou indireta, que não vinculados à carreira técnica ou superior, não poderão estar ligados familiarmente com quem os tenha indicado. Ademais, quando da ocupação de cargos por aqueles integrantes da carreira, a verificação deve ser atinente aos princípios da Carta Magna tendo em vista critérios objetivos a fim de selecionar o profissional mais apto a ocupar determinada função. Ante a extensão do tema aqui explicitado, cabe a cada órgão do executivo também dispor em normas internas a fim de vedar, explicar e especificar as formas de nepotismo que se enquadrariam no órgão.


Autor: Priscila Almeida Carvalho


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