OS TROVADORES: DE FONTE LUSITANA PARA O NORDESTE BRASILEIRO



OS TROVADORES: DE FONTE LUSITANA PARA O NORDESTE BRASILEIRO

Profª Maria de Lourdes Bezerra, (2001)

Postado em julho de 2009

Filosofa, poetisa.

RESUMO

A literatura de cordeltraz umaleituramusical de épocas passadas, que a memória popular nordestina propaga através dos seus poetas trovadores, versando numa linguagem muito própria, sua alma, sua historia e seus valores. Este artigo tem o objetivo de apresentarestas raízes históricas na poesia nordestina, ligada a literatura portuguesa, remontando em suas origens, desde a poesiatrovadoresca, que floresceu entre os séculos XI e XIII de fontes Ibéricas, até a contemporaneidade. Retratando as relações pertinentes a essa tradição, como resultado de uma herança literária que ascendeu e reuniu essas culturas em seus aspectos literários e culturais, para a construção da uma identidade, ressaltando ainda os valores, dessa poética trovadoresca do nordeste. Apresentando também, na arte dos trovadores do nordeste, as formas brilhantes da literatura do cordel e suas particulares características. Para isso foram consultadas obras literárias de alguns desses poetas e de estudiosos do assunto, bem como: Patativa do Assaré, poeta popular. Abdala Junior estudioso da Literatura Portuguesa. Anísio Melhor, folclorista. Aparício Fernandes, escritor critico dos poetas brasileiros. Entre outros literatos e teóricos, destacamos poemas de cordel de alguns cordelistas da região e da própria autora.

Quando Afonso VI de Leão constituiu o Condado Portucalense em 1097, a literatura oral em galego-português já existia ali há cerca de dois séculos, como em outras regiões da península. Eram poesias em torno de motivos amorosos, compostas por pessoas de diversos estados sociais e apresentadas por jograis e trovadores em espetáculos que incluíam música e dança. No entanto,os documentários só existem a partir do século XII. Assim afirma ABDALA JUNIOR:

O primeiro documento galego portuguêsfoide Paio SoaresTaveirós "Cantiga de Ribeirinha",de 1189 ou 1198. Muito outros trovadores se destacaram: D.Dinis o rei trovador,João soares de Paiva, João Garcia de Guilhade, Martim Codfax, Nun Fernandes Torneol e outros.(ABDALA JUNIOR , 1990, p:18)

Os poetas galego-portugueses estavam também presentes no século XIII tanto na Corte Portuguesa de D. Afonso III como na Corte do rei de Castela. O próprio Afonso X, o Sábio, foi autor de cantigas em galego-português. Os três gêneros praticados eram: a cantiga de amor, na qual o poeta se dirige a uma mulher; a cantiga de amigo, em que uma mulher, no texto, se dirige a seu amado e a cantiga de escárnio e maldizer.

A cantiga de amor era, em geral, de caráter mais culto, de âmbito palaciano, e sua tradição remontava às raízes provençais.

Na cantiga de amor o trovadorfaladas emoçõesdo "eu"masculino. Diferentementedas cantigas de amigo, é aqui que o trovador assume o idealdo amor cortês. O amor não é a experiência vivida ou aguardada as margens da fonte masé – acima de tudo – a experiência de amar sem ser correspondido, de sonharcomo o objeto inacessível. E quanto mais inatingível se torna a figura feminina, mais ela é símbolo de perfeição e pureza. .(ABDALAJUNIOR , 1990, p:16)

Na cantiga de amigo percebem-se também tons de fundo popular, a liberdade bucólica, aldeã, as circunstâncias do dia-a-dia e a paroquial, em que se refere a lugares onde se marcavam os encontros sinalizando as expectativas e pretensões da mensagem sentimental, como igrejas, bosques e lagos.

Ascantigas de amigo se caracterizam pelo fato de o trovador cantar a realidade da mulher: o "eu" feminino exterioriza suas emoções., aflições expectativas, encontros amorosos, desencontros etc. Nesse tipo de canção há formas e objetivosbastante particulares. Observa-se quea cantiga é comumente construída em paralelismos, a saber: a unidade rítmica não é a estrofe mas o conjunto de estrofes ou um par dedísticos (duas estrofes de dois versos). Esse par de dísticos sempre procura dizer a mesma idéia . E o ultimo verso de cada estrofe é o primeiro verso da estrofe seguinte. .(ABDALAJUNIOR , 1990, p:14)

Bem diferentes ainda, eram as cantigas de escárnio e maldizer, na qual o poeta, no primeiro caso, satiriza uma pessoa sem identificá-la e, no segundo, a ataca diretamente.

Empregando uma linguagem bastante popular , os trovadores preocuparam-se em denunciar os falsos valores morais de todas as classes da época: senhores feudais, clérigos, povo e eles próprios. Pelo seu conteúdo informativo, essas cantigas apresentam valor mais histórico do queliterário" (MOURA,1998, p.414)

Tais cantigas chegavam com freqüência ao obsceno ou investida à política já que assumiam um sentido mais pessoal, de crítica e ironia. Uma alusão, ou uma referência declarada, aos fatos reais, muitas vezes com pormenores grosseiros e até obscenos, explica-se talvez pelo fato de serem obra de jograis, homens de condição social inferior. Já a poesia idealizada das cantigas de amor e de amigo é obra de trovadores, quase sempre fidalgos.

A poesia trovadoresca se desenvolveu apartir do centro cultural de Santiago e Compostela e se irradiou por toda a Galizae nortede Portugal. Julga-seque sua fase de maior esplendor foi no Reinado de AfonsoIII.

É necessário ressaltar que, na produção poética dessa primeira época da Literatura Portuguesa, a influência dos árabes na Andaluzia, dos trovadores da Alemanha (Minnesänger) e da Itália e, principalmente, dos autores provençais, cuja poesia pode ser considerada a matriz de toda a lírica européia medieval.

A atividade dos autores que hoje se conhecem através da compilação dos cancioneiros foi, portanto, precedida de uma tradição oral, cultivada principalmente pelos jograis (ou segréis, como também foram conhecidos na península ibérica), trovadores ambulantes cuja existência se registra em todos os povos românicos medievais.

Grande parte desses cancioneiros são dedicados à poesia satírica, cantigas de escárnio e maldizer, que se caracterizavam pela linguagem obscena, criados na sua maioria pelos jograis, A Sanha jogralesca, desenvolvia uma licenciosidade pontilhada de malícias e rivalidades advindas eram desculpadas pelos excessos de embriagues, boemias e marginalidades e graças às suas origens bem populares denotavam a libertinagemdas intrigas. Seus versos eram alternados com refrões viciados e maledicentes e queposteriormente fora também cultivado pelos reis como foi o caso de D. Diniz e D. Afonso X. :

A grande época da cultura trovadoresca ou das cantigas foi entre 1250 e 1350. Essa literatura cantada foi registrada em coleções. Os cancioneiros. Eles nos dão mostra de uma literatura peninsular, em língua galego-portuguesa, e não propriamente de uma literatura portuguesa, como se houvesse na época uma só literatura romântica peninsular .(ABDALAJUNIOR , 1990, p:18)

Essa diferença identificavaum jogral como uma figura emblemática do ambiente cultural mas que muito divertia, com seus textos e suas músicas, inumeráveis povoados e cortes. Erampessoas que se dedicavam a entreter, tanto a população em geral quanto os nobres e monarcas. Vestia-se de forma extravagante e quase sempre eram portadores de instrumentos musicais como harpas, saltérios, alaúdes, gaitas etc., Acompanhado sempre de algum animal, viajavam de cidade em cidade, de corte em corte, e em cada lugar mostrava aos habitantes seus saberes e destrezas. Relatavam fatos históricos célebres ou notícias recentes, narravam contos épicos protagonizados por heróis míticos, cantavam, apresentavam números de prestidigitação e acrobacias. Em troca, recebia algum dinheiro, mas, sobretudo víveres e hospedagem.

Segundo BUENO:

Eram boêmios, sem moradia fixa nomais das vezes, vivendo das larguezas dos senhores nobres, dos clérigos quando não ficavam ao serviço de um trovador. O pagamento era feito sob espécie, em panos para a roupa e em cevada, nome em geral da alimentação na época medieval. (..) O trovador era nobre ou como tal considerado; tinha posses,pois devia manterjogral ou segrel que lhe executasse as composições. Não era de boa nota que o trovador ensoassee muito menos executasses as suas cantigas; ele a apenas as compunha. (BUENO, 21)

 

Muitas vezes comparou-se o jogral ao trovador, o que não é certo, pois o segundo pertencia às classes altas e recitava composições originais, enquanto o jogral, procedente de uma camada social mais baixa, recebia pagamento por seu trabalho e não recitava versos próprios, mas alheios. Assim, converteu-se no principal transmissor de numerosos textos poéticos e relatos, que constituiriam o chamado mester de juglaría, expressão espanhola antiga equivalente a mister ou ofício de jogral, em oposição a mester de clerecía, arte literária própria dos clérigos medievais cultos. (Bueno, 1965, p: 22). Os jograis desenvolveram métodos próprios, caracterizados pelas improvisações e o estilo livre e narrativo. ABDALA JUNIOR também confirma a posição de destaque de um trovador:

O jogral cantava a poesia ( a poesia estava ligada à musica), que era composta pelo trovador, mediante soldo. O trovador, de nível social superior, era em geral representante da nobreza . (ABDALAJUNIOR , 1990, p:13)

O que corresponde ao jogralista, tão presente na nossa cultura nordestino-brasileira é o nosso cordelista. As características são as mesmas, tanto nas suas formas extravagantes de apresentar os versos como nas reproduções das histórias, ora de forma poética, ora cômica, ora dramática, ora crítica, que vai desde As Proezas de Cancão de Fogo aofim trágico e heróico de Lampião, passando pelas criticas da dupla atuação de Padre Cícero, entre o clérigo e o político, bem como a sua santificação em "carne e osso".

Tanto quanto o Jogral da Idade Média o nosso Cordelista viaja pelas cidades do Brasil vendendo sua literatura, declamando e cantandorepentes nas feiras do sertão nordestino. Os místicos e as grandes histórias de amor também são parte do seu acervo, alguns muito famosos até hoje, encontrados também nos grandes centros e nas feiras culturais, como " O Pavão misterioso",O homem que enganou o Diabo" e de tantas reproduções muitos perderam sua autonomia e já se publica como autor desconhecido.

Quadros em sua obra: Literatura Brasileira faz referências das reminiscênciaslusitanas na literatura do cordel nordestino.

A literatura popular, bem como a música, não se individualizaram, ao revés, embora possa ser conhecida a autoria se coletivizaram e percorrem vastas regiões para servirem de traço de união com a encantadora alma do povo. (...).É a presença da carne da alma coletiva, produzindo uma obra de arte perpetuadora do sentimentode um povo. É o denominador comum entre a criação artística e a psicologia da massa popular.. Citemos ainda uma quadrinha de cantadores baianos, que representa uma modificação e adaptação de outra que Carolina Michaelis*e Alberto Faria demonstram pertenceraa vários povos que remonta a Petrus Lombardus, falecido em 1164: Como a luz trevessa o vidro/ Sem ele nada sofrer,/O Cristo nasceu da Virgem,/ Sem ela deixar de ser. (QUADROS,247)

Fluxograma: Processo: *Carolina Michaelis de Vasconcelos, nasceu em  1851, em Berlim. Adquiriu a nacionalidade portuguesa ao casar-se, em 1876, foi catedrática da Universidade de Lisboa e lecionou filologia portuguesa na Universidade de Coimbra. Segundo documentos biográficos e de cancioneiros  de Larousse, foi a referida, quem principiou o levantamento das cantigas de escárnio e maldizer entre outras.
*Petrus Lombardus  - Sua  biografia não foi encontrada. Pela origem  do nome, supõe-se  italiano, já que  os provençais são de origens francesa, espanhola e italiana).

As palavras descritas em Quadros traduzem uma face da nossa literatura que remontade uma literatura folclorista portuguesa que porsua vez trouxe a influência dosprovençais e de outros comoPetrus Lombardus*.

Entre os jograis e trovadores na Idade Média, em Portugal se destacavam de fato grandes diferenças sendo este ultimo parte de camadas mais privilegiadas da sociedade, como já foi dito. Já em nossos dias os nossos trovadores e cordelistassão os mesmos, eles em geral cantam canções, criam os seus repentes e recitam as literaturas de composições próprias ou alheias, assim como reproduzem e criam ao mesmo tempo suas próprias histórias ora de gênero épico, lírico ou satírico. A maioria deles são escritores, poetas, cantores e compositores.

A poesia trovadoresca nordestinas reflete em suas tradições o épico e o lirismo da poesia portuguesa embora com característica muito próprias do seu povo, carregando uma autentica identificação das múltiplas expressões, traduzidas pelas suas raízes culturais históricas egeográficas.

Valdomiro Silveira Escritor, pioneiro no gênero regionalista, (1873-1941) numa Conferência em Santos, conforme o fragmentoabaixo descrito extraído de textos preliminares da obra de Leonardo Mota: Violeiros do Norte; teceelogios aos trovadores do Brasil e os exalta perante os provençais da Idade Média.

Citando entre outros, Frederic Mistral (1830 -1914) escritor lusitano, que lutou pelo o movimento regional de revitalização da cultura da Provença e esta se estendeu a todo o sul da França, a língua e a literatura provençal nesse período voltaram a ter o brilho que haviam alcançado na Idade Média. (LAROUSSE, vol.6,p.3110.) Mota lamenta que:

Os nossos trovadores matutos não tiveram ainda um Frederic Mistral, de triunfante coragem, que se lhes declarasse igual e viessem por eles, atéos jornais e até os livros, fazendo uma nova 'Mirelle', na linguagem característica da região." (MOTA, 1976XXXIX)

 

Xiquinha Ribeirôa brasileira-baina, tal qual uma Jogralessa lusitana da idade média(Mulheres igualmente dotadas das mesmas qualidades artísticas, mas como eram sempre pagas, recebendo o soldo, denominavam-se também soldadeiras – BUENO, 1965, p.21), viajava pelas cidades do nordeste e cantavamodas de viola. O folclorista Anísio Melhor ao citar Xiquinha Ribeirôa declaracomo:

A mais afamadavioleira do sertão da Bahia, de espírito andeiro não a deixava fazer pousada longa no lugar onde chegava. Sabendo manejar a viola, soltava o xale no ombro, prendia ao canto daboca um cigarro, manchava a negrura docabelo com uma flor qualquer, e estava pronta para vencer léguas e lá ir derramar em oiças alheias a graça e a espontaneidade de seus repentes rústicos. Reveladora do encanto e da alma popular, de agradável sabor lírico: (MELHOR, 1935, p.5)

"Eu quando entrei nesta casa, / Entrei de coração vivo,/ Entrei como os meus olhos fôrro ,/ Sahi com elles captivo. Não pensei que rosa branca /Dentro dagua desmaiasse; / Não pensei que o teu amor / Tão depressa se acabasse."(In: MELHOR, 1935, p.5,)

 

Os versos de Xiquinha Riberôa guardam a mesma sonoridade das cantigasde amor de Sá Miranda, (1481 – 1558) presente no cancioneiro geral, (antes desteviajar para a Itália, quando mudou o estilo para sonetos em decassílabos,). Isoto se explica porque Sá Miranda era famoso não só pelas quadrinhas emversos hexassílabos, mas pelafeição lírica e monótona. (Estas eram também características próprias das cantigas de amor galego-portuguesa) O que limitava também a composição poética, para apenas, entre duas a quatro estrofes. Mas com a mesma sofreguidão dos amores perdidos sentido nos versos de Francisco de Souza brasileiro, e de outros, com as mesmascaracterísticas na versificação e em simetria, similares tambéma muitos lusitanos de famosos cancioneiros:

"Comigo me desavim,/ sou posto em todo perigo;/não posso viver comigo,/ nem posso fugir de mim./. Com dor da gente fugia,/ antes que esta assim crescesse ;/ agora já fugiria /de mim,se de mim pudesse./ Que meio espero ou que fim / do vão trabalho que sigo,/ pois que trago a mim comigo/ tamanho imigo de mim?" (In: CAMPADELLI P,147)

Assi que me deu Deus tudo / para mais meupadecer;/ os olhos- para nos ver,/ coração para sofrer/ e lingua – para ser mudo/ (Francisco de Sousa In: CAPADELLI)

Senhora partem tão tristes/ meus olhos por vós meu bem,/ que nunca tão tristes vistes/ outrosnenhuns por ninguém. (João Ruiz Castelo Branco In: CAPADELLI)

Nesta última estrofe, as rimas em alternância estão também presentes nas cantorias de Xiquinha.

O lirismo,o escárnioe maldizertambém estão presentes em nossos literatos. A poesia de Gregório de Matos seja lírica, sacra, burlesca, erótica e satírica, está profundamente enraizada nessa realidade brasileira, especialmente em suas duas últimas vertentes, a erótica e satírica, que documentam os costumes e a vida moral, social e política da capital da colônia. Padres, freiras, militares, funcionários do governo, comerciantes, proprietários de terra, nobres, judeus, aventureiros, escravos e índios são personagens do vasto painel composto pelo poeta, que tratava sua terratal como era sob os mais variadospontos de vista:Observemos os seus versos:

Político:

O demo a viver se exponha, / por mais que a fama a exalta, / numa cidade onde falta / verdade, honra, vergonha.(>>>) Valha-nos Deus ,o que custa,/ O que El-Rei nos dá de graça./que andaa justiça na praça/ Bastarda,vendida, injusta.

Também romântico:

"Mandai-me Senhores hoje,/

Que em breves rasgos

descreva do Amor ilustre prosápia,/

e do cupido as proezas".

Em Gregório também aflorou o lirismo e o erótico picaresco, bem como os respectivos poemas: Rompe o poeta com a primeira impaciência querendodeclarar-se e temendo perder por ousado e a uma freira, que satirizando asua fisionomia fria e delgada, e aparentemente ausente de desejos, o poeta lhe chamou "Pica-Flor"

Anjo nonome, Angélica na cara,/ isso é ser flor e anjo juntamente. /Ser Angélica flor e anjo florente, /Em quem ,senão em vós se uniformara?

.......................................................................................

Se Pica flor me chamais,/Pica-flor aceito ser;/ mas resta agora saber;/ se no nome que me dais/ mateis a flor que guardais/ no passarinho melhor! Se me dais este favor/ sendo só de mim o pica, / e o mais vosso, claro fica,/que fico então Pica-flor.

Na atualidade encontramos em nossos poetas e cantores nordestinos, muito deste estilo erótico picaresco. Caetano em seu CD com Jorge Mautner: Eu não peço desculpas, apresenta na faixa 13: "Voa, Voa, Perereca", quelembra o picaresco do Pica Flor de Gregório de Matos. Apesar de não ser uma característica forte desse autor, mas isso prova que essa característica é muito presente na alma de todo o poeta, mesmo quando não lhe é usual, como o nosso Caetano. E mesmo fugindo do estilo habitual, eventualmente ele compõe variantes como esta.

Jessier Quirinotrovador e poeta, contemporâneo nordestino que canta e declama não só as "coisas", mas também os problemas sociais e políticosdo Nordeste e do Brasil. Nascido em Pernambuco, Jessier Quirino é um Jovem aparentando seus quase quarenta anos e pode ser visto nas estradas do sertão entre Bahia e Paraíba oferecendo suas composições aos transeuntes e viajantes. Seu disco de doze composições independentes (outros ainda não são conhecidos nestaregião, mas muito populares em Pernambuco). Algumas já de domínio público entre os que admiram este estilo literário não é difícil obtê-lo. Suas cantigastraduzem também o lirismo bem como, sua prosa e poesia interpretada por ele mesmo numa linguagem muito própria do trovador nordestino, mas também é satírico e na maioria das vezes dirigidas aos políticos bem como esta: "Comício de beco estreito":

Pra se fazer um comício / não carece de arrodeio / nem muito dinheiro não / Basta um F 4000/ Quarqué meio caminhão / Entalado em beco estreito / Um bandeirado mal feito /Cruzando em dez posição / Um locutor tabacudo /de converseiro cumprido / Um alto falante rouco / Que espalhe o alarido/ Microfone com flanela / Ou vermelha ou amarela /Conforme a cor do partido / Uma gambiarra velha /Banguela no acender / Quatro faixa debramante / Escrita quarque dize/ Dois piston e um farol / Pode ate fica melhor/ Uma torcida pra torcer / Aí é só subir pra riba /Meia dúzia de corrupto /Quatro babão, ....... / uns oito capanga bruto /e acunhar na promessa / e a pisadinha e essa /três promessa por minuto./Anunciar a chegança /Do corrupto ganhador /Pedir o V da vitória /Do dedo dos eleitos / E mandar que os vira lata / Do bojo da passeata /Traga o homem no andor/(..) e terminadaa campanha / faturada a votação / ......... povo pistão/ .......... caminhão /meta promessa programa/ é só mergulhar na grana / e curtir a posição.( Jessier Quirino Cd.1 fx 5)

O trovador nordestino anuncia em seus versos, um telurismo muito particular da sua terra, da sua gente e mesmo quando não se fala de seca, ou do apego saudosista, mesmo se falando de amor, há uma associação muito própriacom o cotidiano natural do sertão: Veja em outro de seus poemas:

QUIRINO* - Espasmos de gafieira:

A madrugada sonâmbula, / esperta de cara inchada/ e quando espreguiça os braços, /espalha as brechas de luz/ pelas gretas da janela / assisto uma cena bela/ musicadaa rouxinol/é uma aurora escanchada /de pele rubraborrada/ parindo gema de sol,/ corococóis espaçados /dos galos gogóis de sola / encarrilhados "tô fracos" /dos guinésfrangos de angola / mugidos, silvos,trinados / e restos de conversados/ ruídos de mundo a fora /, canecos da seus tibungos/ lá no fundo da biqueira /e banham lerões de náilon com seus colgates pastosos / de hálito brancos frescosos do céus da bocas quiseiras/ E o sino alegre blomblimba um blomblimbar animado /e velhos de bocas fundas /que insistem em ter pecados/ mastigam seus pai nossos/ e credos bem mastigados. /Cá pra nos os pecadores uma brisa viajeira / traz um cheiro de pão doce, /mas não haverá cafésinto o fervor da fogueira ....

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