O USO DE LIGUAGENS EM SALA DE AULA – GEOGRAFIA



Valtey Martins de Souza

Nilene Ferreira Cardoso Souza

Antonio Félix da Silva

Odailde de Souza Oliveira

O presente trabalho tem como objetivo principal, trabalhar uma linguagem diferente (a música) da usualmente utilizada em sala de aula, que é aquela que privilegia o uso do livro didático. Assim como o manual didático se apresenta como um recurso pedagógico, a música também pode se tornar um instrumento bastante valioso no tocante ao processo ensino aprendizagem.

Desse modo, entendemos que a escolha das letras das músicas a serem trabalhadas em sala de aula deva contemplar uma gama de questões existentes no mundo e no nosso cotidiano, pois, a partir delas devem ser suscitados debates e levantados novos temas, que tornem o processo pedagógico mais sintonizado com o universo do aluno. Dessa maneira, entendemos que a utilização desse recurso é de fundamental importância para que a construção do conhecimento aconteça.

Nessas condições, elaboramos o nosso trabalho a partir de uma revisão teórica do assunto, onde Viana (2000) entende a música como um recurso didático em geografia, podendo ser trabalhada como elemento para análise de conjunturas sociais e geográficas.

Assim sendo, procuramos durante o desenvolvimento de nosso trabalho, fazer a ligação entre a letra da música e o processo migratório, que no entendimento de Moreira (2004), pode ser percebido como os movimentos ou deslocamentos de uma população de um lugar para outro. No final do desenvolvimento, procuramos apontar uma "nova" maneira de possibilitar o processo ensino aprendizagem através do nosso Plano de Aula.

Nas notas conclusivas, revisamos nossos escritos e discutimos, de forma breve, o alcance do objetivo principal.


2. A música como recurso didático em Geografia: breve análise pedagógica

Para Viana (2000), a música como recurso didático em Geografia, consiste em uma abordagem pedagógica na qual, letras de músicas são trabalhadas como elemento para a análise/reflexão de conjunturas sociais e geográficas. Para essa autora, a escolha das letras das canções não deve ser escolhida aleatoriamente, mas sim, vinculada a idéia de relações entre globalização e mudanças na cotidianidade vivida, ou resistências desta frente a uma globalização homogeneizadora.

Na percepção de Mesquita, citado pela autora em pauta, a música se encontra entranhada no nosso cotidiano[2] e pode traduzir sentimentos sobre nosso espaço vivido. Logo, trata-se de uma ferramenta importantíssima que auxilia professores e alunos tornando o processo pedagógico mais prazeroso.

Dessa forma, pode-se observar que a música é um veículo de expressão que atinge as pessoas maciçamente, especialmente os jovens, público-alvo da nossa prática discente. Assim, é possível observar nosso cotidiano através das letras de músicas populares que os jovens estão acostumados a ouvir, estabelecendo relações sociais e espaciais a partir delas. A apreciação das letras de canções permite ao professor um instrumento e referencial a mais, capaz de auxiliá-lo no incremento de seu processo pedagógico e na sistematização dos conteúdos e informações de forma criativa.

Nessas condições, Viana (2000) ao analisar Mesquita (1994), nos revela que as letras das canções nos mandam a espaços sociais que podem ser lugares. No entanto, segundo a autora citada, é necessário ser um bom observador para que se possa entrever através do cotidiano a compreensão e a dimensão da realidade.

Desse modo, os autores nas letras das canções procuram retratar a vida cotidiana, nos conduzindo a reconhecer e identificar nelas, questões como exclusão/segregação, caos urbano, topofilia, transformação do espaço. Essas são questões prementes do nosso tempo que estão ligadas a nossa cotidianidade e espacialidade e as quais, devemos dar mais atenção em nossas aulas de geografia, pois, o reconhecimento do espaço e sua representação simbólica se processa no dia-dia.

Assim, Mesquita (apud VIANA, 2000) entende que através das letras das canções se torna possível desvelar todo um universo social edificado através do imaginário coletivo da sociedade, que nos auxilia a melhor compreender quem somos na conjuntura de nossa contemporaneidade e do nosso passado recente de que fomos participadores.

Nesse contexto, propomos aqui uma análise geográfica que privilegia a leitura do cotidiano que os compositores fazem e como podemos trazer esse olhar, essa percepção, para nossas aulas. Para tanto, Santos (1996) citado por Viana (2000), desvenda que através do entendimento desse conteúdo geográfico do cotidiano podemos, talvez, cooperar para o necessário entendimento dessa relação entre espaço e movimentos sociais, distinguindo um convite à ação.

Além do que expusemos até agora, Viana (2000) ainda nos sugere que cada professor deve escolher as letras das músicas a partir da realidade de sua escola e do perfil de sua turma, pois, as letras nos proporcionam temas geradores que autorizam a textualização a partir de códigos que os alunos já possuem de suas experiências cotidianas.

3. Conteúdo escolhido para ser trabalhado em conjunto com a música

3.1 Movimentos da população brasileira (migrações)

No entendimento de Moreira (2004), os movimentos ou deslocamentos de uma população de um lugar para outro, são percebidas como migrações. Para esse autor, as pessoas que realizam esses movimentos são chamadas de migrantes. Assim, para ele, as migrações são muito variadas e apresentam dois aspectos, a saída de um lugar (emigração) e a entrada em outro (imigração). Esse mesmo autor ainda entende que as migrações podem ocorrer dentro de um mesmo país (migração interna) ou de um país para outro (migração externa ou internacional).

Desse modo, esse escritor entende que as migrações podem ser forçadas ou espontâneas, no entanto, de forma geral, as pessoas se transferem de um lugar para outro por vontade própria, ou seja, de forma espontânea. Quanto aos motivos que as pessoas apresentam para migrarem, se devem a dois fatores que, geralmente, se combinam: causas de expulsão e de atração. Tanto umas como outras costumam ser de ordem econômica.

3.2 Motivos da escolha da música "Meu Reino Encantado" como recurso pedagógico

Nosso principal objetivo com a escolha da mencionada canção, deve-se a intensa migração ocorrida nas últimas décadas para a região amazônica, pois, atuamos como professores em uma cidade da referida região, no município de São Domingos do Araguaia, Pará. Dentre os nossos alunos, muitos são migrantes ou filhos de migrantes, que vieram de outras regiões do país, ou mesmo de outras localidades da Amazônia. A música em pauta faz menção a migração campo-cidade, a percepção que o personagem descrito na letra faz do espaço vivido, os motivos da migração e a formação de uma identidade cultural ligada ao modo como os camponeses vivem e se relacionam com o espaço rural e urbano.

Nessas condições, descobrimos que grande número de nossos alunos é oriundo de outras localidades, pois, o processo de formação territorial do município em questão se encontra ligado a políticas governamentais que visavam atrair pessoas para a Amazônia. Assim, esses alunos apresentam uma história de vida que teve parte do seu desenrolar em outros lugares, portanto, são migrantes ou descendentes deles. Muitos deles vieram da zona rural local ou de outras localidades.

Dessa forma, a música que propomos casa perfeitamente com o assunto em discussão, pois, as seis primeiras estrofes da canção fazem menção ao modo de vida tranqüila no campo (recanto feliz bem distante da povoação), ao espaço vivido, a relação dos personagens da música com o espaço, animais, ferramentas de trabalho (carro de boi e arreios) e o espaço urbano (vila).

Nesse contexto, na sétima estrofe (ou verso) da música o autor faz menção aos motivos da migração, que no nosso entendimento, foi propiciado pela inserção de um novo modo de se produzir ligado às necessidades não locais:

Nosso sitio que era pequeno

Pelas grandes fazendas cercado

Precisamos vender a propriedade

Para um grande criador de gado

Finalmente, as três últimas estrofes (versos) da música fazem relação com o espaço vivido, com a identidade cultural formada pelos personagens, ao modo pelo qual eles interpretam e analisam o espaço e as lembranças e saudades dos mesmos.

Plano de Aula

Disciplina: Geografia

Professores: Valtey Martins de Souza, Nilene Ferreira Cardoso Souza, Antonio Félix da Silva e Odailde de Souza Oliveira

Série:

Nº de aulas: 3

Tema: Migração

Conteúdos: Capítulo 3 – Movimentos da população brasileira (Moreira, 2004)

Música: "Meu reino encantado" – Versão cantada por Daniel com Participação Especial de José Camillo

Objetivos: Relacionar a letra da música ao conteúdo e desvendar o fenômeno da migração a luz da expansão capitalista sob a égide globalizatória.

Encaminhamento:

- O que é migração? Qual o motivo que leva as pessoas a migrarem? O que falta em determinadas localidades que fazem as pessoas se deslocarem para outras? O que as atraem em outras localidades?

- Esse termo, migração, pode ser entendido como sendo o deslocamento de uma população de um lugar para outro. De forma geral, segundo Moreira (2004), as pessoas migram de forma espontânea e, existem motivos que causam a expulsão de determinados lugares, sendo que, outros lugares, apresentam fatores atrativos paras os migrantes.

- A princípio, será perguntado aos alunos quem dentre eles nasceu na cidade de São Domingos do Araguaia, e quem migrou de outras localidades, tanto dentro da região amazônica, quanto de outras regiões. Nesse caso, é bem provável que alguns se apresentem como sendo oriundos da zona rural do aventado município e levavam uma vida muito parecida com a do personagem retratado na letra da canção em voga. No entanto, alguns dos alunos podem nos dizer que não são migrantes, que nasceram na mencionada cidade. Por isso, interpelaremos se os pais ou avós nasceram na mesma localidade que eles, pois, a fundação da cidade de São Domingos do Araguaia data do ano de 1951, logo, o crescimento da mesma está atrelado à abertura de estradas, a oferta de terras mais baratas, a oferta de empregos na atividade madeireira, na pecuária, no comércio, etc. Devido ao exposto até agora, acreditamos ainda, que os fatores que provocam a migração campo-cidade, se ligam, de certa forma, a falta de políticas públicas que atendam os anseios dos camponeses e a expansão do capital, que a cada momento insere novas localidades no circuito espacial da produção, tornando assim, objetos que antes tinham valor de troca, em mercadorias que podem ser vendidas em locais muito distantes dos que elas foram produzidas, caracterizando de tal modo, a chamada globalização. Todos esses fatores em conjunto, possibilitaram o movimento das pessoas se deslocando de um lugar para outro e o desafio que nos é colocado, é o de analisar tais movimentos e propor soluções que possibilitem as pessoas melhores condições de sobrevivência.

- As atividades que iremos propor se ligam principalmente a produção de textos. Cada um dos alunos migrantes será instigado a produzir um texto que relate os motivos da migração (tanto os fatores de expulsão, quanto os de atração), o modo de vida que levavam antes e depois da migração, as lembranças que eles têm do espaço que eles viviam, do que eles gostavam em suas antigas localidades, etc. Como nem todo aluno é migrante, os que não fizerem parte dos que se deslocaram de outras localidades, deverão fazer entrevistas com pessoas que migraram, para a partir daí, elaborarem um texto sobre o assunto em baila tendo por base o relato de terceiros.

- A linguagem que utilizaremos será a música.

Material: Livro didático, toca CD, CD, letra da música impressa.

Referências:

MOREIRA, Igor. Geografia: construindo o espaço – 6 série. 2 ed. 1 imp. São Paulo: Ática, 2004.

DANIEL. Meu Reino Encantado. Part. Esp.: José Camillo. In: DANIEL. Manaus: Videolar S. A.: 2006. v. 1 e 2. disco compacto: digital, estéreo. Sistema Globo de Gravações Audiovisuais LTDA – Som Livre.

4. Notas Conclusivas

Neste trabalho nos propusemos a falar do uso de linguagens em sala de aula, principalmente em geografia. Escolhemos a música como linguagem geográfica, pois, entendemos que a utilização desse recurso didático pode proporcionar aos nossos alunos e alunas um novo entendimento do espaço vivido, da percepção que os mesmos fazem do espaço e das relações travadas no mesmo.

Desse modo, estruturamos o nosso trabalho a partir de uma parte introdutória, onde tentamos de maneira muito simples, elencar os nossos objetivos, justificar a importância desse trabalho e descrever a metodologia adotada.

Quanto ao desenvolvimento, procuramos fazer uma revisão teórica acerca do assunto abordado, a música como linguagem em geografia. Falamos também do conteúdo a ser trabalhado na relação com a música escolhida, a migração, ou seja, o movimento ou o deslocamento da população de um lugar para outro.

Nessas condições, acreditamos ter alcançado o nosso objetivo principal, que seria relacionar essa "nova" linguagem ao conteúdo em pauta, a migração, principalmente aquela ligada ao deslocamento populacional entre o campo e a cidade. Como vimos tanto o texto do Igor Moreira (Movimentos da população brasileira), quanto à música cantada por Daniel, com participação especial de José Camillo (Meu reino Encantado), apresentam semelhança que podem ser úteis em nosso fazer pedagógico, pois, tanto uma como a outra linguagem fazem menção ao cotidiano dos nossos alunos e alunas, a maneira como eles analisam e interpretam o espaço vivido e as relações travadas sobre o mesmo.

5. Bibliografia Consultada

DANIEL, Meu Reino Encantado. Part. Esp.: José Camillo. In: DANIEL. Manaus: Videolar S. A.: 2006. v. 1 e 2. disco compacto: digital, estéreo. Sistema Globo de Gravações Audiovisuais LTDA – Som Livre.

MOREIRA, Igor. Geografia: construindo o espaço – 6 série. 2 ed. 1 imp. São Paulo: Ática, 2004.

VIANA, Adriane Monteiro. A Música como Recurso Didático em Geografia: uma abordagem da Geografia do Cotidiano. In: REGO, Nelson; SUERTEGARAY, Dirce e HEINDRICH, Álvaro. (orgs). Geografia e Educação: geração de ambiências. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRG, 2000.




Autor: Valtey Martins de Souza


Artigos Relacionados


Educação Física E Qualidade De Vida

Conteúdos Essenciais Para Uma Metodologia Da Produção De Textos

Educação Física Escolar

Resumo Histórico Sobre Os Médicos Sem Fronteiras

Roraima. Um Estado Em Desenvolvimento.

Os Dez Mandamentos Do Professor

As Pontuais Mudanças Trazidas Pela Lei 11.689/08 = Júri