Diário De Classe
Não compartilho inteiramente do pessimismo de Wilde, expresso nas palavras aí em cima. Fosse assim, eu não continuaria a ser professor. Entretanto, admito que a profissão docente tem lá seus espinhos. E eu os nomeio e procuro combatê-los – isso quando essas possibilidades existem.
Um espinho imenso diretamente ligado ao que-fazer de professor é o tal “Diário de Classe”. Ainda há pouco me vi brincando com uma amiga, usando as seguintes palavras: Meu único desejo macabro: enforcar o inventor do diário de classe com a tripa daquele que insiste que somos obrigados a preenchê-lo.
Ao levar a coisa com bom humor, na verdade eu estava tentando buscar ânimo para suportar o “Diário de Classe” – suas datas, quadrinhos, nomes, notas, faltas, presenças e quejandos... Se você é professor, sabe do que estou falando. Sabe, ainda, que quando estamos lidando com ele para fechá-lo no final do bimestre letivo, então “estamos nos nossos dias”, razão pela qual é realmente chato sentar ao nosso lado em quaisquer mesas de bar e da vida.
Fale a verdade: existe chatice pior do que esta, a do “Diário de Classe”?
São “neuras” e “nóias”, umas atrás das outras: “não pode rasurar”, “a soma das notas tem de bater”, “é preciso arredondar”, “a data para apresentar tudo fechado é...” Meu cristo! Pode tanta coisa relacionada a um só instrumento burocrático?
Burocracia. Esse é o nome da coisa. Não fosse ela, possivelmente nada disso nos deixaria cansados. Mas, não! Nossa mania de registrar tudo, com “n” detalhes, regrinhas e outros infernais, acaba sobrecarregando-nos o ofício. Burocracia foi feita para emperrar!
Espero pelo dia em que essa atividade estressante seja minimamente amenizada. Presença, por exemplo, será que tecnologia virá a dispor em todas as salas de aula aquele instrumento da auto-indicação? E os outros detalhezinhos do “Diário de Classe”, também não poderiam ir nesse mesmo caminho? Se é que dos esquemas de controle a educação não se livrará de todo, tomara que essas “melhorias” não tardem.
Quem sabe assim, quando esses benefícios forem inteligentemente empregados, nós possamos ter tempo para nos dedicarmos mais à nossa autoeducação, como louvou Oscar Wilde. Sim, porque se a tecnologia pode ser bem empregada, melhor o será se estiver a favor da nossa liberdade, da potencialização do nosso ser, no nosso viver mais e intensamente, sem os expedientes mediocrizantes que nos diminuem e tolhem nosso modo de ser e estar.
Quando esse tempo chegar, talvez sentar ao nosso lado em uma mesa qualquer não seja um perigo, mas uma alegriazinha mais vibrante do que a que hoje posso registrar em meu diário de professor, tudo por causa deste “Diário” aqui, que nunca foi da classe, mas um verdadeiro meu espinho.
Wilson Correia
Autor: Wilson Correia
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