A punição por não pagamento de pensão é humilhante



Como é que poderemos viver realmente bem sabendo que há pessoas sendo enjauladas feito bichos e submetidas a humilhações, como se já não lhes bastasse a suspensão da liberdade? 

Normalmente se fala em superlotação com a grande ênfase. Mas observei que há um fator que torna a superlotação ainda mais degradante.  É a ‘falta de higiene’.   E quando abordo a ‘falta de higiene’ não estou me referindo ao comportamento de presos que não escovam os dentes regularmente ou não cortam as unhas ou não usam desodorante.

Estou me referindo a uma lista de fatores que, além de humilhantes, fragilizam fisicamente as pessoas, tornando-as alvos fáceis de verminoses, doenças de pele e  respiratórias, para ficar apenas no que me pareceu mais evidente durante minha estadia no 18º. DP (na Rua Juventus, no Bairro da Mooca), em SP, onde estive preso até recentemente, por não pagamento de pensão alimentícia à minha ex-esposa, Lícia Contoli.

A ‘falta de higiene’ já é percebida logo de cara ao se notar que a limpeza das celas é  responsabilidade dos presos, desde o momento da aquisição de produtos de limpeza. Sim, são as famílias dos presos que providenciam detergente, desinfetante, sabão, vassoura, ou seja o mínimo necessário para se manter limpo o espaço de 4x3m de cada cela, onde há camas beliche, área comum e cozinha, e mais um anexo de 1x3m, destinado às atividades de higiene do grupo de 28 presos que dividem cada cela dimensionada para 10.

A ‘falta de higiene’ continua sendo percebida pelo cheiro de urina e fezes que paira no ar nos momentos em que os 28 presos da cela estão à espera de sua vez para usar a latrina ou o chuveiro. Cada cela possui  neste anexo de 1x3m apenas 1 vazo sanitário de piso, ao lado do tanque em se lava a louça das refeições, que fica ao lado do chuveiro. O ‘vazo’ não possui descarga própria. A água do tanque é que se destina a esta finalidade, através de seu cano de saída.

Mais ‘falta de higiene’: a área de atividades de higiene é limpa diariamente por presos escolhidos por outros que são líderes de cela.  E essa higienização é feita da mesma forma irregular com que a maioria dos presos toma o seu banho matinal de 2 min, no máximo, para que todos os 28 possam tomar banho no tempo disponível. E quando acabam-se os produtos de limpeza, o jeito é aguardar a próxima data de visita. E então, a situação ainda piora um pouco.

Mais um pouco de ‘falta de higiene’: Nesta prisão, há 2 tanques de roupa no pátio aberto e comum a todos os presos durante o dia.  Nestes mesmos tanques os presos lavam roupa, escarram, fazem a barba, lavam as mãos e escovam os dentes. Ao lado dos tanques é onde pelo menos 50 % dos presos das 6 celas passam o dia fumando, jogando dominó e vendo tv, deitados pelos cantos e beiradas.

Durante os 30 dias de minha permanência neste purgatório, a questão da higiene foi a que mais me tocou. Mas isso não torna menor a gravidade da questão da superlotação. Na prisão administrativa do 18º. DP, cada uma das 6 celas tem capacidade para 10 pessoas, mas mantém quase o triplo.  São 28 pessoas a partilhar a mesma latrina, o mesmo chuveiro, e a mesma área de 4x3m, a maior parte do tempo.  Exceto à noite, quando ficam apenas 10 para dormir no interior de cada cela e os demais 20 infelizes são destinados a dormir na área aberta e descoberta do páteo, a que os presos se referem como ‘a praia’.


Claudio Bezerra
9948.9418


Autor: Claudio Bezerra


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