No trevo do km 10



NO TREVO DO KM 10

Acordei radiante e disposta. Enfim o domingo tão esperado!

Saltei da cama cantarolando e abri a janela do quarto, deixando que os primeiros raios de Sol entrassem pondo fim ao restante das sombras do quarto fechado.

Eu era interna do Colégio São Germano ao norte de Goiás e hoje iria embora. Era término de aulas e isso significava rever a família e os amigos distantes à pelo menos 400 km.

Já deixara a mala arrumada na noite anterior e o diretor do colégio, num rasgo de bondade, providenciara a saída do meu carro do estacionamento para o pátio prevendo minha partida bem cedo, como em todos os anos nessa mesma época.

Tomei um banho rapidamente e, com mal disfarçada ansiedade forcei-me a engolir o lanche obrigatório.

Atravessei o pátio com a mala na mão pensando em como seria bom voltar para casa. Principalmente rever Miguel!

Ah Miguel! Crescêramos juntos brincando nas poças d'água da rua.

Meu primeiro amor concluíra a faculdade de medicina no ano passado e montara seu consultório em Pirenópolis, nossa cidade natal e meu destino nesse mesmo dia.

Há muito tempo eu não alimentava esperanças com relação a Miguel, pois eu sabia da sua paixão por Sara, a filha do prefeito. Apesar disso, Miguel transformara-se em meu melhor amigo, companheiro e confidente.

Dirigi sem pressa por mais de 4 horas. Dando-me conta de que estava com fome, parei em um restaurante à beira da estrada para almoçar mas não consegui comer direito. Sabia que tinha que seguir caminho rapidamente. O Sol esquentava mais a cada minuto e temi pela queda de pressão em decorrência disso.

Retomando a direção por mais 1 hora, renovei o ânimo ao avistar ao longe o trevo do km 10, porta de entrada para minha cidade. Do trevo até a minha casa e também na mesma rua o consultório de Miguel, distava apenas 3 km.

Quase não me continha de alegria, cortada repentinamente por um ruído seco. Um dos pneus havia furado já na entrada do trevo.

Sem tempo para lamentar a sorte e sozinha, preparei-me para a difícil missão, antevendo minhas mãos sujas de graxa e o sol escaldante à minha espera. Tomei fôlego para iniciar o trabalho quando alguém tocou minhas costas. Ante o susto e a surpresa, dei com Miguel bem atrás de mim. O medo foi substituído pela alegria e, após um abraço apertado, Miguel explicou-me que passava por ali e reconhecera meu velho carro.

Miguel trabalhava rápido, mais acostumado a esses afazeres de homem. Sorte a minha! Trocando o pneu contou-me que fora bom encontrar-me! Assim, poderia despedir-se. Estava mudando para longe, indo medicar em outra cidade.

Perguntei do retorno e ele respondeu-me evasivamente que não sabia.

Fiquei triste, mas mantive o bom humor pela gratidão ao meu amigo.

Despedi-me desejando-lhe boa sorte, retornando ao veículo com os olhos embaçados pelas lágrimas. Fora tudo tão rápido que eu esquecera de pedir-lhe o endereço para correspondências. Que pena!

Chegando em casa fui recebida com a costumeira alegria e com o cheiro do bolo preparado por minha mãe à minha espera. Com o ânimo mais calmo e após os cumprimentos, contei à mamãe o caso do pneu e a providencial ajuda de Miguel.

O espanto foi tão grande que o copo despencou das mãos de mamãe, que sentou-se pálida repetindo que "aquilo não era possível"!

Não era mesmo! Mamãe tinha razão!

Sua ajuda fora uma despedida.

Miguel sofrera um acidente a à cerca de 30 dias e morrera exatamente no trevo do km 10.


Autor: Gracia Tristão


Artigos Relacionados


A Viagem

Minha Triste Despedida

O Chão

Ramaras Do Amanhecer

Aquecimento Global - Positivando O Núcleo Externo (poema)

Entrega

''minha Triste Despedida''