Notícias: Confiar ou duvidar?



É possível usar informações divulgadas pela imprensa para investir no mercado de capitais?

O tema “uso de notícias” é recorrente em minhas palestras e cursos no sentido de alertar o investidor para que as notícias não tenham uma influência decisiva em suas operações. Quando elas chegam até o investidor, já são velhas. Na verdade, não ter notícia alguma é melhor que notícia errada ou de fonte ruim, notícia já descontada, boato, interpretação errada de uma notícia ou opinião de guru/analista/banco. É claro que existem publicações sérias e bem-intencionadas. Matérias sobre avaliação de investimentos, novas técnicas, softwares e ferramentas serão sempre bem-vindas. Mas na era da internet, o investidor precisa ter muito cuidado para não ser manipulado.


E como diferenciar nas notícias o que é uma informação verdadeira e o que é boato ou interpretação errada?

Diversos sites, fóruns e blogs espalhados pela internet tentam manipular o pequeno investidor, levando-o a comprar empresas concordatárias ou que custam centavos exatamente pela facilidade e inocência dele. Minha sugestão é que o investidor dê preferência sempre para as instituições de maior liquidez e capitalização. Além disso, é muito importante fazer cursos sobre o mercado de capitais para poder usar sua própria opinião depois desse aprendizado. Ser autodidata no mercado financeiro pode custar muito caro. Duas das minhas frases preferidas são: “Tudo que é de graça vale exatamente quanto custa” e “Se você quiser ser seu professor em tudo, na verdade, será seu melhor aluno”. A manipulação acontece o tempo todo, seja em mídia nacional ou estrangeira. A educação financeira é a única forma de detectar se a notícia é realmente relevante. Não existe milagre.


Qual é a forma correta de usar notícias para tomar decisões ao investir?

O noticiário ideal é aquele geral, que mostra uma tendência econômica e financeira que demora para mudar, por exemplo: em fevereiro deste ano, foi publicado o seguinte: “Venda de carro zero bate novo recorde”. Essa informação impacta positivamente a indústria siderúrgica por um determinado tempo. Outro exemplo, em julho: “Aprovada a lei de tolerância zero do álcool na direção”. Essa impacta negativamente a indústria de bebidas alcoólicas. Ambas as notícias geram impactos a longo prazo. Já as factuais atrapalham mais que ajudam, por exemplo: no dia oito de novembro de 2007, numa quinta-feira, o Jornal Nacional da Rede Globo, que começa às 20h15, divulgou a descoberta do poço gigante de Tupi. Na abertura dos negócios do dia seguinte, a ação da Petrobras teve seu primeiro negócio com alta de 15%. Já no fechamento, a ação caiu e fechou em alta de apenas 1%. Dessa forma, quem comprou na abertura perdeu quase 14% num dia. E, o que é pior, esse preço da abertura só foi ultrapassado no dia nove de maio de 2008.


Como o investidor pode considerar essas informações ao comprar ou vender uma ação?

A decisão sobre compra ou venda de uma ação deve ser feita após uma extensa análise que leva em consideração o cenário macroeconômico e setorial, o balanço da empresa e de suas concorrentes, a tendência e a velocidade de aumento/descida dos juros e da inflação no Brasil e no mundo. Vale lembrar que a economia utiliza dados passados e o mercado trabalha com projeções futuras, ou seja, é a expectativa dele que determina o preço das ações.


Quais são os principais erros que um investidor pode cometer quando leva as notícias em consideração?

Comprar ou vender uma ação baseado somente em notícias e não verificar as informações com fontes respeitadas como a Bloomberg e a Reuters também são um erro. Não existe receita de bolo, e sim técnica e muito trabalho. Comprar por impulso é inerente ao ser humano. Joalherias não têm várias filiais dentro de um mesmo shopping por acaso. A compra da jóia é típica de um desejo, de um impulso. Mas agir por impulso no mercado financeiro pode custar muito caro.


Além dos exemplos já citados, você lembra de outros em que investidores perderam dinheiro depois de comprar ou vender ações baseados em notícias? Como deveriam ter analisado essas informações para que não tivessem prejuízo?

Sim, vamos lá. Primeiro exemplo, manchete em 01/5/2006: “Evo Morales anuncia nacionalização do gás e coloca tropas na Petrobras, na Bolívia”; manchete em 02/5/2006: “Petrobras sobe 3% depois da nacionalização”. A notícia parecia ruim. No entanto, na época, o que importava para o mercado era a expectativa dos preços do petróleo, que batiam seguidos recordes e impactavam diretamente as ações da Petrobras. A operação da Bolívia era ínfima para os resultados da Petrobras, logo essa notícia não impactou negativamente o mercado. Segundo exemplo, manchete em 12/06/2008: “Petrobras anuncia descoberta de águas profundas em Guará”; manchete em 30/06/2008: “Petrobras cai mais de 10% em junho, mesmo com várias descobertas de óleo e gás”. A notícia parecia ótima, porém os poços de petróleo descobertos eram muito profundos. Ainda não há tecnologia para serem explorados, e isso vai requerer tempo e investimentos altos. Além disso, agora estamos com perspectivas de aumentos de juros para segurar a inflação – o que pode diminuir o consumo, que no fim afeta a demanda por petróleo. Assim, quem se empolgou com a notícia não fez bons negócios.


Para finalizar, quais são os passos fundamentais para um investidor avaliar antes de usar uma notícia como mais um dos pontos na análise de compra ou venda de uma ação?

É importante que o investidor busque respostas para as seguintes perguntas: mudou algo no fundamento macroeconômico (renda, desemprego, PIB, inflação, juros, balança comercial)? Mudou algo em relação ao setor e seus concorrentes? A expectativa do mercado para as ações da companhia mudou? Vale a pena entrar ainda? Se subiu, será que já não subiu muito? Se caiu, por quê? O que estou vendo que ninguém está sabendo ainda? E lembre-se de que para saber quanto quer ganhar, você precisa saber quanto pode perder.

http://www.traderbrasil.com
Autor: flavio lemos


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