O Instituto Da Guarda



Não é muito simples conceituar o instituto da guarda, por isso a lei faculta ao juizes enorme discricionariedade para que deslinde a maioria as questões sobre a guarda que emerge a todo instante nas Varas de Família, nas suas mais variadas hipóteses, exigindo do magistrado, cuidados e bom senso extraordinários.

Durante muito tempo, a guarda foi tida como um dos efeitos do poder familiar, seus textos foram interpretados no sentido de vincular o direito de guarda do menos ao pátrio poder, desta forma, o titular do poder familiar teria um direito de guarda quase absoluto, porem, a partir dos anos 50, este conceito foi sendo abrandado, passando a ser vista a guarda como sendo não de essência, mas de natureza deste, a ser permitir a concessão da guarda da criança ou adolescente mesmo contra a vontade do titular do poder familiar, se isso atendesse melhor ao interesse do infante.

Segundo Ana Maria Milano,

No sentido jurídico, guarda é o ato ou efeito de guardar e resguardar o filho enquanto menor, de manter vigilância no exercício de sua custodia e de representá – lo quando impúbere ou , se púbere,  de assisti – lo, agir conjuntamente com ele em situações ocorrentes.[1]

Silvana Maria Carbonera define guarda como :

Um instituto jurídico através do qual se atribui a uma pessoa, o guardião, um complexo de direitos e deveres a serem exercidos com o objetivo de proteger e prover as necesssidades de desenvolvimento de outra que dele necessite, colocada sob sua responsabilidade em virtude de lei ou decisão judicial.[2]

Desta forma, utiliza – se deste instituto jurídico para que se coloque a criança ou o adolescente em uma família substituta, visando proporcionar a estes, o que lhes negado por suas famílias biológicas.

2. A Guarda no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Com a Constituição de 1988 assegurou –se a criança e ao adolescente, como dever de família, da sociedade e do Estado, o direito a convivência comunitária e familiar. Daí ter procurado o Estatuto aprimorar o instituto da guarda, buscando tornar efetivo estes direitos fundamentais da criança e do adolescente, o que já havia sido confirmado no art. 19 do ECA:

“Toda a criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes”[3].

Na verdade, o Estatuto veio a disciplinar a guarda destinando –se a regularizar a posse de fato de uma criança ou adolescente para que possa o guardião ou guardiães prestarem – lhes a devida assistência material, moral e educacional, e ainda visando atender situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsáveis legais, podendo ser deferido o direito de representação para a pratica dos atos determinados ( Lei n° 8.069, de 13.7.1990, ECA, art. 33 §§1° e 2°). Ou seja, é possível que alguém que toma a posse de fato de um menor de um menor adquira a guarda jurídica do mesmo.

Assim sendo, com ou sem animo de adotar ou de tutoria, quem quiser regularizar a posse de fato de uma criança ou adolescente para lhe dar assistência material e moral, seja ou não parente, deverá requerer ao Juiz da Infância e Juventude a Guarda do infante, fundamentando o pedido nos art. 33 a 35 do ECA, lembrando –se que a competência para a causa se determina pelo domicilio dos pais ou responsável, ou pelo lugar onde se encontra a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável ( ECA, art. 147). A propósito da matéria inerente à competência para o conhecimento e julgamento de pedido de guarda quando os próprios pais são os que disputam pelo filho, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que :

“Competência – Guarda de menor – Disputa pelo pai e mãe – Art. 147, inciso I, da Lei n° 8.069 de 13.7.1990 – Inteligência. Em caso de disputa do menor por seus pais, não sendo possível definir – se a competência de juízo em face do pátrio poder, já que exercido por ambos, cabe lançar –se mão do domicilio daquele que tem a guarda, para fins de determinação dessa competência.” (STJ, 2ªSeção, Conflito de Competência n° 18967 – MG, Rel. o Ministro Barros Monteiro, em 13.2.1998 )[4].

A guarda prevista no ECA pode ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado e gravados nos autos que foi deferida (ECA, art. 169, parágrafo único), ouvindo – se antes o representante do Ministério Publico (art. 35 ).  A característica da Guarda, portanto, é a sua revogabilidade a qualquer tempo, além da possibilidade de ser concedida liminarmente numa ação principal de Guarda, ou como medida incidental em ação de Tutela ou Adoção.

Na ação de Guarda, não há necessariamente declaração da perda do poder familiar dos pais naturais, podendo ate haver concordância destes com a medida especial e transitória (ver ECA, art. 166, parágrafo único, que dispõe sobre a concordância dos pais com a colocação do filho em família substituta).

Havendo a concordância dos pais biológicos, o pleito judicial se transforma em autentica providência de jurisdição voluntária (CPC, arts. 1.103 e segs.), ou seja, uma Guarda Consensual, onde não existe lide nem partes litigantes, apenas interesses privados e partes interessadas. É o que ocorre quando os pais vão trabalhar fora do País e precisam deixar seus filhos com alguém por tempo superior a 6 meses, um ano ou mais.

Todavia, nos casos em que seja impossível conseguir o consentimento dos pais naturais quanto à guarda de seus filhos para terceiro, é prudente que se determine a citação dos referidos genitores biológicos por mandado ou por edital, para, querendo, impugnarem o pleito em 15 dias, que é o prazo para a defesa em processo de rito ordinário (CPC, art. 297), resguardando –se os direitos a ampla defesa e ao devido processo legal.

Assim, é necessário se perceber que o interesse do criança deve se sobrepor a qualquer outro, assim, se os pais não podem ser bons exemplos deve o juiz deferir a guarda à pessoa que revele a compatibilidade com a natureza da medida. Ou seja, a Lei 6.515/77, em seu artigo 13, já previa que, havendo motivos graves o juiz já poderia dispor das guarda da criança ou adolescente da maneira que achasse mais conveniente, mas sempre levando em consideração o interesse da mesma.

Isto demonstra que as crianças e o adolescentes não são mais objetos de direitos dos pais, mas, sim, sujeitos de direitos que merecem proteção integral do Estado. O art. 6° do ECA ratificou este entendimento.

A tônica do Interesse da Criança e do Adolescente foi priorizada pelo ECA, na medida em que, serve de escopo aos juízes no momento de decidir a guarda analisar sempre o que melhor vier a ser para o interesse do infante, seja ele na companhia dos pais ou de terceiros.

Ana Maria Milano disserta que:

A palavra “interesse” engloba uma gama variada, absorvendo os interesses materiais, morais, emocionais e espirituais do filho menor, não se pode esquecer que cada  caso é um caso e deve seguir o critério de decisão do juiz[5].

É importante frisar que, os pais biológicos que perderam a guarda dos seus filhos sem motivo grave,  não obstante, tem direito de visitá – los, ate porque, como já foi dito acima, a Guarda não pressupõe a perda ou suspensão do poder familiar, como ocorre com a Adoção, por exemplo.

Em suma, deferida a guarda de uma criança ou adolescente, os guardiães prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenharem os compromissos que tal situação exige, e terão um termo de guarda assinado pelo Juiz, podendo ser por prazo indeterminado ( art. 32), embora revogável a qualquer tempo.

Nota –se, adiante, que o legislador também estabeleceu uma outra espécie singular de guarda de adolescente trazido de outra comarca para a prestação de serviços domésticos, ainda que autorizado pelos pais ( ECA, art. 248). A pessoa que traz uma ou um adolescente de uma cidade para que lhe preste serviços domésticos, deve não só cumprir integralmente a legislação trabalhista, como também regularizar a guarda do adolescente no prazo de 5 dias contados da fixação do domicílio em determinada cidade, sob pena de incorrer em infração admistrativa punida com multa de três a vinte salários mínimos, tudo conforme o art. 248 do ECA.

[1] Silva, Ana Maria Milano

[2] CARBONERA, Silvana Maria. Guarda de Filhos na Família Constitucionalizada. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris. 2000, p.47.

[3] BRASIL, Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n° 8.069, de julho de 1990. Vade Mecum. São Paulo: Rideel, 2007.

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2ªSeção, Conflito de Competência n° 18967 – MG, Rel. o Ministro Barros Monteiro, em 13.2.1998.

[5] SILVA, Ana Maria Milano, op. cit.. p51.

Autor: Leonardo Ribeiro


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