Os pés na terra e o resto...



  Desde sempre ouço falar do eterno conflito entre aquilo que é cientifico e aquilo que é poesia. Na cabeça de muita gente, parece que essas duas coisas jamais podem andar juntas.

            Pessoalmente discordo de tudo que é extremista, pois toda expressão, inclusive artística, traz algo de coerente.

            Nessas horas os concretos de plantão costumam afirmar o quanto é preciso sempre se estar com os pés no chão, e a cabeça nunca na lua, mas como estarmos sempre com os pés no chão, se somos compostos por setenta por cento de água?

            Tudo bem que a mistura de terra e água seja barro e que dele viemos, mas se esse líquido é tão fundamental em nossa composição, deve haver algo de especial, além do mero significado do barro.

            Chega mesmo a ser maluca a idéia de que toda essa massa de músculos, gordura e ossos possa ser essencialmente água. 

            Diante dessas questões resolvi então pesquisar sobre qual deve ser o significado disso tudo.

Porque Deus nos teria feito a partir de tanta água? O que será que Ele nos quis dizer com isso?

            Primeiro busquei analisar a intrínseca relação entre o líquido e lua. 

Não sei se científica ou poeticamente, dizem que tanto as marés quanto os cortes de cabelo e até mesmo o comportamento dos “loucos” são diretamente afetados pelas fases de nosso satélite natural. Cabelo e comportamento são coisas de humanos que sendo compostos de tanta água, nessas horas muito se assemelham às marés.

Se a lua dos poetas mexe com as águas, então também mexe com os homens, o que significa dizer que ela não é só do lirismo. Estar com a cabeça nela também deve ter algo de necessariamente científico.

Em um segundo momento, me lembrei da música “Planeta Água” em que o compositor Guilherme Arantes descreve de forma poética, todo o científico ciclo vivido por esse mineral sem contra indicações.

O que mais achei curioso é que no final de cada um dos dois trechos da letra, depois de se transformar e interferir em todos os cantos por onde passa, a água descansa.

           No final do primeiro trecho está escrito que depois de tanto fazer, as águas “dormem tranqüilas no leito dos lagos”, enquanto que no final do segundo lemos que elas “sempre voltam humildes pro fundo da terra”.

           Já que somos compostos por tanta água, será que não seria esse o divino recado em que devemos nos pautar?

           Devemos nos transformar diante de cada nova dificuldade, afinal elas existem justamente para que tenhamos a oportunidade de vermos despertadas nossas mais inusitadas capacidades. Devemos também interferir no mundo em que estamos inseridos, afinal de contas é na permuta de conhecimentos que podemos fazer diferença.

           As águas nunca passam despercebidas.

           Talvez você já esteja cansado de saber disso tudo, então só falta cumprir a última parte, descansando em paz.

            Isso mesmo, quando temos a certeza de estar buscado fazer o melhor, precisamos descansar, pois o restante que não está em minhas mãos em boas deve estar.

           Outro detalhe interessante está no uso da palavra “humilde” que vem de “húmus”, ou seja, terra fértil. Humilde é aquele que acreditando em sua fértil competência humana, não tem a necessidade de mostrar nada para ninguém.

           Não coloque antagonismos entre as palavras terra e água (como já disse elas se completam desde aquele barro), pois o mais correto é sempre buscar o equilíbrio entre as duas.

           Fique com os pés no chão e o resto na água; se diluindo, moldando e penetrando em todos os espaços possíveis, para depois voltar humilde pro fundo do próprio ser.

           Tenho certeza, depois de tanto pensar sobre nossa aqüífera formação, sem me esquecer daquelas medicinais, de cheiro e até do dilúvio, que não foi à-toa que fomos feitos de tanta água.

            Já que dizem que do pó viemos e para o pó voltaremos, eu acrescento “aproveite o exemplo das águas”.

           Nesse misto de ciência e poesia, fique com a letra de Planeta Água:

 

“Água que nasce na fonte serena do mundo e que abre um profundo grotão

Água que faz inocente riacho e deságua na corrente do ribeirão

Águas escuras dos rios que levam a fertilidade ao sertão

Águas que banham aldeias e matam a sede da população

Águas que caem das pedras no véu das cascatas, ronco de trovão

E depois dormem tranqüilas no leito dos lagos, no leito dos lagos

 

Água dos igarapés, onde Iara, a mãe d'água é misteriosa canção

Água que o sol evapora, pro céu vai embora, virar nuvem de algodão

Gotas de água da chuva, alegre arco-íris sobre a plantação

Gotas de água da chuva, tão tristes, são lágrimas na inundação

Águas que movem moinhos são as mesmas águas que encharcam o chão

E sempre voltam humildes pro fundo da terra, pro fundo da terra...”


Autor: Guilherme Davoli


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