Juizados Especiais E Princípios Constitucionais
Os Juizados Especiais são órgãos previstos pela Constituição Federal, em seu art.98 que assim dispõe:
CF Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.
Parágrafo único. Lei Federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal.
Diante da necessidade de implementar a norma constitucional, o Congresso Nacional aprovou a Lei 9.099/95, que é resultado da fusão de dois projetos de lei: um que cuida dos Juizados Especiais Cíveis e outro que regula os Juizados Especiais Criminais no âmbito Estadual. No âmbito Federal, a lei 10.259/01 regula os Juizados Especiais Federais.
A inadequação dos procedimentos, o formalismo acentuado, o alto valor das custas processuais, a necessidade de advogado, além da indisponibilidade dos direitos e dos privilégios em favor da União, prejudicavam, em número significativo de casos, o acesso à justiça.
Com a implementação dos Juizados Especiais Estaduais, com sua competência opcional, não se desafogaram as varas cíveis tradicionais, mas efetivamente viabilizaram o acesso ao processo para um grande número de pessoas e em variadas questões de menor complexidade. A inadequação do procedimento, o formalismo, o custo e o ambiente da justiça afastam o cidadão comum.
Com os Juizados Federais, embora de competência obrigatória, acredita-se que haverá uma diminuição da carga de trabalho da Justiça Federal tradicional aquém das proporções esperadas. Mais importante do que a diminuição na carga de trabalho, tal qual a esfera estadual, se propiciará acesso à justiça a quem não tinha, devido a simplificação do procedimento, com a nova postura do juiz, com a facultatividade da representação por advogado, com a preservação do princípio da igualdade processual e com a gratuidade.
Parte dos obstáculos de acesso a justiça foram removidos. Dentre as principais características, apresentam-se:
- gratuidade processual em primeira instância;
- total remoção dos óbices processuais (formalismos inúteis);
- simplificação do procedimento;
- introdução dos critérios de oralidade, simplicidade, Informalidade e celeridade;
- composição pacífica das controvérsias;
- impossibilidade de intervenção de terceiros;
- impossibilidade de recurso contra decisão interlocutórias, que não precluem e podem ser reexaminadas ao final (recurso inominado);
- possibilidade de que a conciliação seja conduzida por um conciliador;
- incentivo à arbitragem;
- direção da instrução por juiz leigo.
Estrutura
Na Justiça Estadual, os Juizados Especiais funcionam em varas especializadas com competência específica, denominadas de "varas dos juizados especiais" ou "juizados especiais cíveis ou criminais".
Caso o movimento forense na comarca não comporte a criação de uma vara ou juizado especial, a demanda será distribuída, processada e julgada perante o juiz dotado de competência plena, hipótese em que o processo observará o rito sumaríssimo definido pela lei 9.099/95.
As leis estaduais (locais) poderão alterar a competência em sede de juizados especiais e criar Turmas de Uniformização de Jurisprudência.
Atos processuais
Alçada no princípio da celeridade, os atos processuais no juizado especial poderão realizar-se em horário noturno e a qualquer dia da semana serão válidos sempre que preencherem as finalidades e somente os atos exclusivamente essenciais serão escritos.
Custas
Se a tramitação do processo terminar em primeira instância, logo após a sentença do Juiz, as custas são dispensadas (art. 55, da Lei 9.099/1995).
Em caso de recurso haverá cobrança das custas dispensadas. O responsável por elas será quem perder o processo ou, eventualmente, como determinar o Juiz. Quem estiver recorrendo deve adiantar o pagamento das custas no momento da apresentação do recurso.
Quando se tratar de matéria previdenciária, em regra, não são cobradas custas.
Também não serão cobradas custas quando a parte for beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
Citação
É admitida uma única espécie: pessoal ou real, que pode manifestar-se das seguintes formas:
I. Pessoalmente: na sede do juizado, por ocasião da audiência preliminar, quando não houver transação penal, o Ministério Público oferecer, de imediato, denúncia oral.
II. Por mandado: na hipótese de o réu não ter comparecido à audiência preliminar e estiver no território dos Juizados Especiais Criminais.
III. Por precatória
Não há o cabimento da citação por edital.
Intimações
Formas:
- Por ciência automática dos atos praticados em audiência, dispensada qualquer outra formalidade;
- Por correspondência, com aviso de recebimento pessoal ou protocolo com identificação do recebedor;
- Por correspondência, tratando-se de pessoa jurídica ou firma individual, mediante entrega ao encarregado da recepção, que será obrigatoriamente identificado;
- Por oficial de justiça, independentemente de mandado ou carta precatória;
- Por qualquer outro meio idôneo de comunicação.
Algumas críticas surgem na medida que se entende que:
a) A indisponibilidade da ação penal pública é abrandada pela Constituição Federal ao acolher a transação penal;
b) Mitiga-se o princípio da obrigatoriedade, discricionariedade regulada por lei;
c) Há um desrespeito aos direitos constitucionais:
I - ampla defesa e contraditório;
II - devido processo legal;
III - presunção de inocência.
A transação penal é instituto decorrente do princípio da oportunidade da propositura da ação penal, que confere ao seu titular, o Ministério Público, a faculdade de dispor da ação penal, ou seja, de não promovê-la sob certas condições. Trata-se de medida de despenalização. Ao aceitar a proposta de transação penal, o autor não está confessando culpa sobre os fatos que lhe foram imputados. Inexiste provimento condenatório, não havendo violação ao princípio da presunção da inocência.
A Lei dos Juizados Especiais Estaduais introduziu ao Ministério Público duas possibilidades antes de acusar alguém, quais sejam: transação penal e suspensão condicional do processo. Apesar de mitigar a obrigatoriedade da ação penal, não a torna totalmente indisponível, visto que o membro do parquet atua de acordo com uma oportunidade regrada.
O autor Nereu José Giacomolli1, discorda da violação dos princípios constitucionais acima citados e afirma:
"A ampla defesa não é violada porque o envolvimento é esclarecido, no início da audiência, a respeito de todas as possibilidades disponíveis; obtém acompanhamento e orientação de advogado (defesa técnica); tem a opção entre a estigmatização do processo, de uma possível sentença condenatória ou de uma sentença homologatória. Não é obrigado a aceitar a transação criminal.
O princípio do contraditório também é assegurado na medida em que, acompanhado de advogado, o envolvido tem a possibilidade de aceitar ou não a medida alternativa proposta".
A Lei 9.099/95 estabelece a forma de se processar e julgar as infrações de menor potencial ofensivo, não havendo, desta maneira, desrespeito ao devido processo legal.
De acordo com o princípio da proporcionalidade, deve-se analisar e sobrepesar os valores principais que se buscam com a implementação dos Juizados Especiais. Apesar das críticas, busca-se com a criação dos Juizados Especiais ilidir a prática de "renúncia aos direitos ou a procura por soluções encontradas à margem da ordem jurídica, como tem ocorrido em algumas comunidades brasileiras, onde prospera a anomia (ausência de lei ou regra)"2.
Os Juizados Especiais não foram criados para mitigar ou desrespeitar princípios constitucionais, mas sim para dar real aplicação aos princípios básicos de justiça universal, deixando de lado a justiça formal, tardia e muitas vezes ineficaz.
"O objeto maior do direito material e processual e da própria justiça é a pacificação".
Bibliografia:
1. Jesus, Damásio E. de, Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada – São Paulo – Editora Saraiva, 1995.
2. Marino Pazzaglini Filho e outros autores. Juizado Especial Criminal: aspectos práticos da Lei nº 9.099/95 – São Paulo: Atlas 1996.
3. Bacellar, Roberto Portugal. Juizados Especiais: a nova mediação paraprocessual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003
4. Pitombo, Antônio Sérgio A. de Moraes e outros: Juizados Especiais Criminais: interpretação e crítica. São Paulo: Malheiros Editores LTDA. Composição: PC Editorial LTDA, 1997.
5. Giacomolli, Nereu José. Juizados Especiais Criminais: Lei nº9.099/95. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.
1 Giacomolli, Nereu José. Juizados Especiais Criminais: Lei nº9.099/95. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.
2 Bacellar, Roberto Portugal. Juizados Especiais: a nova mediação paraprocessual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003
Autor: Giovana Benevides Sales
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