Fundamentos Da Celeridade Processual: Pioridade Na Tramtação Ao Idoso



FUNDAMENTOS DA CELERIDADE PROCESSUAL: PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO AO IDOSO

1. INTRODUÇÃO.

O curso normal de um processo quer administrativo, quer judicial[1], no Brasil, muitas vezes, quase que se eterniza, tendo as partes de tolerar a morosidade, infelizmente. Por conta disto, se o normal seria tão-somente provar o dissabor do litígio, têm de suportar, também, o inexorável e indeclinável desgaste psicológico que lhes é causado.

As causas de tamanho absurdo são notoriamente conhecidas, sendo inclusive forte argumento de diversos oradores em palestras nesse país a fora. Já assinalava o douto Ricardo Rodrigues Gama, com toda razão, que:

A morosidade dos processos tem duas razões de maior relevância, quais sejam, o número reduzido de juizes e o processo arcaico e ineficiente. É claro que, com o aumento do número de juizes para tornar o processo mais célere, exigem-se melhores condições físicas de trabalho e ampliação do número de servidores.[2]

E mais adiante arrebata:

Deveras, a estrutura do processo nacional eterniza o iter até a sua decisão final. Não bastassem o número de processos e a escassez de juizes, os atos processuais são projetados para que o processo se alastre indefinidamente, seguidos pelos recursos que o imortaliza de vez.[3]

Nesse contexto, forçoso é reconhecer que cada causa tem sua singularidade. Bem assim, cada parte litigante per si é diferente da(s) outra(s), de modo que infinitos fatores podem determinar tais desproporções. 

Diante disso, no processo judicial não há caminho senão tratar os desiguais desigualmente. Para tanto, é de bom alvitre se destacar, oportunamente, a diferença entre a desigualdade material e a formal. No que se refere à primeira, deve-se entender como sendo aquela no que tange ao respeito do princípio da isonomia[4] perante a lei; já quanto à desigualdade formal, ou substancial, por sua vez, traduz-se no respeito da igualdade quanto da elaboração da norma, ou seja, é a igualdade procedimental.

Nesse diapasão, insta observar que há uma dupla faceta na igualdade, a saber: a discriminação positiva e a negativa. A primeira é a hipótese permitida pelo ordenamento jurídico pátrio, inclusive para a concretização da igualdade, enquanto que a segunda é inconstitucional.

Em face desse aspecto, o legislador pátrio legislou algumas leis que visam a descompor tais diferenças, concedendo a determinadas pessoas o direito de requerer[5] seja observada certa condição e, assim, seja lhe conferido menor tempo aguardando o decurso de um processo.

É dizer, em que pese o princípio da paridade das armas, permite-se que se desigualem os desiguais a fim de que se persiga o encalço da igualdade, restando clarividente que o enfoque no caso em mote é dado à desigualdade positiva.  Neste contexto, quando da confecção da Lei desigualando o idoso - desigualdade formal -, buscou-se dar respaldo à idéia de que a pessoa senil é frágil perante as demais pessoas, no particular.

Com efeito, à pessoa decrépita deve ser concedido privilégio no que concerne ao trâmite processual, bem como nos demais atos e diligências, vez que já se encontra muitas vezes debilitada, não podendo, assim, aguardar a delongada busca da tutela jurisdicional para garantir o seu direito. Este, aliás, é o referencial aludido nas sábias ponderações de Humberto Theodoro Júnior, in verbis:

A razão do tratamento especial é intuitiva: o litigante idoso não tem perspectiva de vida para aguardar a lenta e demorada resposta jurisdicional e, por isso, merece um tratamento processual mais célere, a fim de poder, com efetividade, se prevalecer da tutela jurisdicional.[6]

Com vistas a isso, busca-se no presente trabalho estabelecer uma análise do tema em diversos aspetos, quais sejam, principiológicos, doutrinários, legislativos e jurisprudenciais.

2. EVOLUÇÃO - BREVE APANHADO HISTÓRICO.

1 - Ao tempo dos déspotas esclarecidos, Portugal teve também seu momento de transformação do Estado. Foi no reinado de D. José, quando pontificou a figura dominadora do Marquês de Pombal.

É daquela época, exatamente de 18 de agosto de 1769, a lei que cuidava do processo judicial, e que ficou conhecida como a LEI DA BOA RAZÃO, que expressamente previa o apenamento do advogado que se valia de interpretações maldosas e enganosas, nos processos judiciais.

Explicitamente, a LEI DA BOA RAZÃO previa:

“por quanto a experiência tem mostrado que as sobreditas interpretações dos Advogados consistem ordinariamente em raciocínios frívolos, e ordenados mais a implicar com sofismas as verdadeiras disposições das leis, do que a demonstrar por elas a justiça das partes: mando, que todos os advogados que cometerem os referidos atentados, e forem convencidos de dolo, sejam nos autos, a que se juntarem os Assentos, multados, pela primeira vez em $ 50000 reis (...).”

2 - A lei foi editada em agosto de 1769. Logo, ela estava cuidando de regular e coibir o que havia de errado antes dela.

O que se buscava, então, era acabar com a eternização das demandas, levando LOPES DA COSTA a comentar o seguinte:

“Em 1341, para combater a chicana dos procuradores, que protelavam quanto podiam o andamento dos feitos, a lei de 23 de agosto proibiu-lhes receber honorários antes da causa finda, expediente que já em 1603, as Ordenações Filipinas ainda irão empregar (...). Para abreviar a marcha do processo, a lei de 15 de setembro de 1532 aplicou o depois chamado ‘princípio da eventualidade’ (no mesmo dia em que fosse citado, o réu deveria oferecer todas as exceções dilatórias) e não deu recurso das interlocutórias. Os longos prazos, a prorrogação deles, a necessidade de suavizar a rigorosa separação das fases processuais iriam entretanto impedir a celeridade do movimento dos feitos, determinando, muita vez, não um processo, mas um retrocesso na marcha regular das causas.” (1)

Desta forma, devo concluir que em nossa herança cultural-judiciária está o habitual abuso processual procrastinatório, que não foi debelado pela Lei da Boa Razão, e que não decorria exclusivamente da ação ou da má ação dos procuradores, mas também da intrincada estrutura processual, exageradamente dispositiva.[7]

2.1. ASPECTOS PRINCIPIOLÓGICOS.

2.2. ASPECTOS DOUTRINÁRIOS.

Nessa esteira vem defendendo, aliás, a doutrina pátria, conforme se pode vislumbrar da célebre lição de Humberto Theodoro Júnior, a saber:

“76-b Direito especial dos litigantes idosos

Em face da realidade de pouca operosidade do sistema judiciário nacional, sempre assoberbado com um volume exorbitante de feitos, a Lei n.º 10.173, de 09.01.2001, instituiu o direito dos litigantes idosos a uma preferência de tramitação, a ser observada nos procedimentos em que figure pessoa de idade igual ou superior a sessenta e cinco anos como parte ou interveniente (arts. 1.211-A, 1.211-B, 1.211-C, acrescentados ao Código de Processo Civil) [...].”[8]

2.3. ASPECTOS LEGISLATIVOS.

Note que, do mesmo modo que a doutrina, o ordenamento jurídico pátrio se enveredou para a garantia dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade, tão bem elencados, respectivamente, no Art. 1º, III, e Art. 3º, I, ambos da Constituição Federal/88.

Em sendo assim, “bons ventos trouxeram” a Lei n.º 10.173/2001, que, em alteração ao texto da Lei Processual Civil, qual seja, a Lei n.º 5.869/73, acrescentou a prioridade na tramitação processual em que se figura como parte ou interveniente pessoa idosa, bastando, para tanto, que o interessado, comprovando sua idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos, requeira o privilégio ora aludido à autoridade judiciária competente. Vejamos:

Art. 1.211-A. Os procedimentos judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a sessenta e cinco anos terão prioridade na tramitação de todos os atos e diligências em qualquer instância.

Art. 1.211-B. O interessado na obtenção desse benefício, juntando prova de sua idade, deverá requerê-lo à autoridade judiciária competente para decidir o feito, que determinará ao cartório do juízo as providências a serem cumpridas.[9]

Ademais, adveio o Estatuto do Idoso, previsto na Lei n.º 10.741/2003, e angariou, em seu Art. 71, o mesmo entendimento ao corroborar a prioridade na tramitação processual em que figura como parte pessoa idosa, todavia, com uma peculiaridade: diminuiu a idade mínima para se conferir tal privilégio processual, em outros termos, enunciou uma idade inferior a outrora prevista para se considerar a pessoa física idosa e, assim, permitir tais prioridades, por outro lado, estabelecendo os mesmos critérios acima referidos para a sua concessão, como se pode averiguar no artigo abaixo transcrito:

“Art. 71. É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer instância.

§ 1º O interessado na obtenção da prioridade a que alude este artigo, fazendo prova de sua idade, requererá o benefício à autoridade judiciária competente para decidir o feito, que determinará as providências a serem cumpridas, anotando-se essa circunstância em local visível nos autos do processo.”

Afora as leis supramencionadas que foram incrementadas no ordenamento jurídico pátrio, em bom tempo a Emenda Constitucional n.º 45/2004 incluiu no Art. 5º da Constituição Federal o inciso LXXVIII, em primazia à celeridade na tramitação processual. Isto, de certa forma, serviu de sustentáculo constitucional inexorável às leis esparsas retromencionadas. Vejamos:

Art. 5º ..................................................................

(...)

LXXVIII -  “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

É de se destacar, portanto, que a lei é clara ao preceituar que é preciso dar tratamento diferenciado aos processos em que figure como parte a pessoa senil, não propõe que, como alguns interpretam equivocadamente, faça o julgador malabarismos ao operar o precário sistema, dando celeridade ao processo. Não é isto que se pretende a priori! Isto é impossível! Entenda-se: é preciso tão-somente conceder a preferência na tramitação processual, sendo a celeridade mera, irrefutável e indiscutível conseqüência.

2.4. ACEITAÇÃO NOS TRIBUNAIS.

A jurisprudência, por seu turno, veio fornecer, abastadamente, o agasalho para arrefecer a celeuma jurídica que porventura poderia vir a ser causada no tocante à idade mínima prevista para se conceder tal prioridade, conferindo primazia ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos, ao dar respaldo à interpretação que expomos:

“(...)A lei n° 10.173/2001, ao conferir às pessoa maiores de 65 anos a faculdade de solicitarem a prioridade de tramitação dos processos em que figurem como partes estipulou essa idade como limite aos idosos, que, graças idade à avançada, não têm muito tempo para aguardar por provimento jurisdicional, geralmente demorado. A idade de 65 anos, portanto, passou a ser parâmetro objetivo para se verificar a condição de "idoso" (...).” (JEF/AM, 1ª T., Proc. 200232007001497 – Recurso Cível, 05/08/2002, Rel.ª  JUÍZA FEDERAL MARIA LUCIA GOMES DE SOUZA). (nossos grifos)

“PROCESSUAL CIVIL - PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO PROCESSUAL – IDOSOS (MAIORES DE 65 ANOS) - ABRANGÊNCIA DO BENEFÍCIO - INTERVENÇÃO DE TERCEIRO - ASSISTÊNCIA. 1. O art. 1.211-A do CPC,  acrescentado pela Lei n.º 10.173/2001, contemplou,  com o benefício da prioridade na tramitação processual, todos os idosos com idade igual ou superior a sessenta e cinco anos que figurem como parte ou interveniente nos procedimentos judiciais, abrangendo a intervenção de terceiros na forma de assistência, oposição, nomeação à autoria, denunciação da lide ou chamamento ao processo. 2. Recurso especial provido.” (Superior tribunal de Justiça, 2ª T., REsp. 664899/SP, 03/02/2005, Rel.ª: Min.ª ELIANA CALMON). (nossos grifos)

3. CONCLUSÃO.

justiça tardia não é outra coisa senão a maior das injustiças.[10]

Como se verifica, embora ciente da notória e sabida realidade que passa o judiciário brasileiro, tão bem denunciada pelo doutrinador citado nesta, qual seja, acúmulo excessivamente fora do razoável de processos ante o precário sistema - a jurisprudência é certeira ao enveredar para o entendimento de que urge a necessidade de se dar primazia às demandas em que são parte o idoso. Para tanto, nota-se como requisito imprescindível para se conceder o privilégio da prioridade da tramitação processual apenas o fator etário, vale dizer, seja observada idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos. Destarte, como já minuciosamente transcrito no item anterior, ao dar primazia a determinado processo, confere-se maior celeridade na tramitação deste. Eis o que se busca por meio desta peça postulatória!

REFERÊNCIAS

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 39ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, vol. I, pág. 23.

http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/CELERIDADEPROCESSUAL.pdf - HISTÓRICO: CELERIDADE PROCESSUAL E SEGURANÇA JURÍDICA OK

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5922 -  Ineficácia material do art. 71 da Lei nº 10.741/2003

http://bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/676/1/O_Acesso_+do_+Idoso_+ao_Judiciario.pdf – O acesso do idoso ao judiciário OK

http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/cleutonbarrachisilva/celeridadeprocessual.htm - A CELERIDADE E A EFETIVIDADE PROCESSUAL

GAMA, Ricardo Rodrigues. Efetividade do Processo Civil. Campinas: Bookseller, 2002, pág. 21.

[1] No singelo trabalho daremos enfoque maior ao processo judicial, embora sabido que no administrativo também é necessária a celeridade, sendo inclusive tratado no relativamente recente inciso LXXVIII do art. 5º da CF/88, introduzido pela EC n.º 45/2004.

[2] GAMA, Ricardo Rodrigues. Efetividade do Processo Civil. Campinas: Bookseller, 2002, p. 8.

[3] Ibid., p. 9.

[4] Este princípio também é conhecido como da igualdade, da paridade das armas e de tratamento equânime.

[5] Sabe-se que o papel do legislador, neste sentido, limita-se à edição da lei, cabendo, então às partes requer o direito da prioridade na tramitação processual e ao Judiciário cumprir. De mais a mais, não se deve olvidar, também, que talvez o simples fato de surgir uma nova lei não resolverá o problema. Pelo contrário, muitas vezes se reveste de mera falácia. É dizer, para se desincumbir de eventuais críticas populares, o legislador legisla nova lei e, com ela, “vende” a idéia fantasiosa de que com isto alcançará o que ora se busca. Ideologia revestida de panacéia, fruto de um papel muitas vezes descomprometido com a realidade social!

[6] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 39ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, vol. I, pág. 23.

[7] http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/CELERIDADEPROCESSUAL.pdf

[8] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 39ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, vol. I, pág. 23.

[9] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 39ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, vol. I, pág. 23.

[10] GAMA, Ricardo Rodrigues. Efetividade do Processo Civil. Campinas: Bookseller, 2002, pág. 21.

Autor: João Batista Rios Júnior


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