QUERIDO PAPAI NOEL



QUERIDO PAPAI NOEL

de Romano Dazzi

 

É a primeira vez que lhe escrevo

Quando eu era menino, você ainda não existia; e minhas cartinhas iam para a Befana. 

Ela era uma velha, que nos descreviam como feia, desdentada, quase uma feiticeira, que descia das montanhas com um saco de brinquedos e um de carvão.

Não existia meio termo: foi bonzinho, ganha brinquedo; foi mau, ganha carvão.

E fim de papo.

Ela vinha, é sabido, só uma vez por ano, depois do Natal e do Ano Bom, para a última e mais desejada festa, antes de nos atirarmos ao trabalho do novo ano.

A data – seis de janeiro - era todinha e somente para nós, meninos.

 

Não sofríamos a concorrência do menino Jesus, que já naquela altura tinha crescido, pregava, fazia seus primeiros milagres, preparava o açoite  para tirar os mercadores do templo e  se encaminhava para o seu trágico e glorioso destino.

Também não era dia de Missa Solene,  com aquele lentos sermões, que nos davam uma clara amostra de quanto será longa a eternidade.

 

Era uma festa de verdade, tinha brinquedos bem modestos, mas eram mais sinceros e genuínos que os de hoje. Eram só latinhas e madeirinhas; mas juntávamos toda a nossa imaginação e ficavam maravilhosos.

 

Depois, chegou você, do frio Norte,  alegre e bonachão, vestido de maneira tão esquisita,  falando coisas  incompreensíveis, com um  sotaque engraçado e soltando seus já famosos: Oh! Oh! Oh!.

 

Hoje você fala português, mas naquele tempo era, no máximo, finlandês.

 

Mas preciso reconhecer que acabei simpatizando com  a sua figura.

Apesar de saber que você é, na realidade, um perdulário, um  gastador; que nos deixa sempre com um  monte de dívidas, que se arrastam pelo ano todo.

 

Puxa, agora que estou pensando: você deve ser o filho da Befana.

Com certeza, foi trabalhar na Alemanha, como tantos outros, ganhou um monte de dinheiro e voltou quando a sua mãe – que Deus a tenha - se foi.

Herdou a sua atividade comercial, e a desenvolveu como devia ser. Você é bom mesmo, viu? Como é que não percebi isso antes? 

 

Bem:  eu estava lhe escrevendo minha primeira cartinha e me perdi pelo caminho.

 

Muita coisa para pedir, não tenho, não.

Ou melhor, uma coisa eu teria, mas acho que nem você conseguiria fazer-me este favor: abrir o coração das pessoas, fazer com que consigam olhar um para o outro,  como...

Puxa!  Estava para dizer “como irmãos”, mas me arrependi; porque  irmãos são os que mais brigam, neste mundo.

 

Veja sérvios e croatas, palestinos e israelenses, italianos do norte e do sul, espanhóis e bascos; ingleses e irlandeses;  poderia contar outros mil...

 

Portanto, quero pedir que nos traga um tipo de presente diferente, uma espécie de benção, de dádiva: que não nos faça olhar e tratar os outros como irmãos, que é um desastre; mas sim, que nos permita  vê-los e tratá-los como amigos, como companheiros, participantes conosco desta longa marcha, que precisamos  tornar menos pesada.

 

Que nos dê o desejo e a alegria e o orgulho de carregar a mochila do vizinho; de dar-lhe água quando ele tiver sede;  de ajudá-lo a caminhar, quando lhe doerem os ossos; de sustentá-lo e apoiá-lo, enquanto subirmos, a duras custas, ou descermos, caindo  de roldão, pelas escadarias incompreensíveis da vida .

 

Mas talvez não seja a Você que deva pedir isso. Seria um milagre; e milagres, que eu saiba, você não faz, apesar de ser mágico.

 

Porém, quem sabe,.... poderia falar com alguém, lá em cima (e digo lá em cima, não no Pólo Norte, mas muito mais alto ainda) ... e oxalá.....

 

Juro, de dedos cruzados, que ficarei bonzinho o ano que vem, inteirinho; até promessas vou pagar,  para provar que sou sincero.

 

Tenho certeza que você vai fazer  que puder

Boa noite, Papai Noel ...... e bom trabalho. Amém.

 

 

 


Autor: Romano Dazzi


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