BOITE MADRID - O AUGE DO CABARÉ EM CAXIAS: 1970 – 1974



BOITE MADRID - O AUGE DO CABARÉ EM CAXIAS: 1970 – 1974

 Jorge Luis Coelho Gomes

 

 

INTRODUÇÃO

 

O presente artigo tem como foco a cidade de Caxias¹, situada no leste maranhense, sendo o nosso recorte temporal os cinco primeiros anos da década de 70 do século XX. A intenção é observar e documentar os espaços de sociabilidades atrelados ao prazer na interiorana Caxias, tendo a nossa atenção voltada em um primeiro momento para um local específico, a BOITE MADRID, sendo importante ressaltar que de todos os prostíbulos existentes na cidade do período estudado, foi o único que resistiu a todos os prós e contras de uma sociedade pós-moderna. “Nessa rua, tudo era cabaré, todas as casas eram Cabaré, a única que resistiu foi eu!.” (DIRACI, 2009. Proprietária da Boite Madrid). Entretanto, percebemos que falar sobre o imaginário e as representações de um determinado local, se constitui numa tarefa de extrema delicadeza, pois entramos em contato com a mentalidade existente a respeito de tais lugares que se constituem como a zona de prostituição².

As relações sociais praticadas na sociedade caxiense no decorrer do século XX, nunca deixaram a desejar no que concerne ao requinte dos grandes centros urbanos, comparado, por exemplo, a São Luis, pois Caxias vivendo sua fase áurea, no que diz respeito as práticas fabris, reordenamento urbano e padrões culturais, era movida por uma euforia modernizadora que se alastrava por todo o Brasil e pelo mundo. Até meados da década de cinquenta, essas sociabilidades já não mais estavam restritas ao âmbito
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¹ Para entendermos com mais propriedade acerca dos espaços de sociabilidades, tanto do que tange ao prazer quanto ao lazer, faz-se necessário a leitura da Dissertação de Mestrado da Professora Jordânia Maria Pessoa intitulada: Entre a tradição e a modernidade: A belle époque caxiense: Práticas fabris, reordenamento urbano e padrões culturais no final do século XIX. Que nos possibilita um entendimento de como se deu a formação do imaginário do cidadão caxiense no final do século XIX e que ainda na segunda metade do século XX ainda vemos perpetuar as devidas representações.

² No que cerce ao significado da palavra zona de prostituição entendemos através da geografia de Caxias em um espaço situado no centro da cidade que desde a década de 1960 era intitulado de ZBM, (Zona do Baixo Meretrício) na qual nenhuma moça de família que se desse o devido valor, passaria pelo referido local, sendo que havendo alguma notificação de que uma moça de família tivesse passado por tal localidade, ficaria mal falada na cidade.

paroquiano (Igrejas), que era o maior centro social da cidade com seus festejos, procissões e etc. Com o advento da modernidade esses espaços, antes singulares, passam a ser ressignificados, por exemplo: as praças que saiam do âmbito do lazer para o âmbito do prazer, por meio de encontros de jovens apaixonados, ou até mesmo possibilitando a ocorrência de momentos triviais como as rodas de amigos, que serviam para distração e conversas banais.

 

RESSIGNIFICAÇÃO DO CABARÉ

 

Diferentemente de como era concebida a idéia de prostituição na Idade Média, tendo os cabarés a obrigação de ficarem localizados em áreas periféricas, ou seja, longe do perímetro urbano, na modernidade temos uma estruturação totalmente diversificada, pois no limiar do século XX os cabarés não mais ficam nas zonas suburbanas no intuito de ficarem longe das casas de família, e sim partem para o centro da cidade se constituindo dessa forma como uma prática comercial. “Por ser BR, o movimento era maior, todo carro tinha que passar por essa rua, aqui era o Centro de tudo” (DIRACI, 2009). Com base em depoimentos recolhidos tanto pela proprietária do cabaré Maria Diraci Barros³ (70 anos), como de outras pessoas que eram apenas “figurantes” nesse contexto, podemos perceber que a rua dos cabarés fazia parte da área mais movimentada da cidade e o principal alvo das fofocas corriqueiras de uma típica cidade do interior.

Caxias por ter vivido no final do século XIX e começo do século XX um intenso crescimento urbano impulsionado pelo ideal de modernização e por toda a representação que sua economia trouxe para o Estado permitiu que aos poucos os governantes fossem realizando obras que condissessem com a atual infraestrutura comercial da cidade. No entanto, apesar da abertura de indústrias têxteis e de todo um crescimento na economia da cidade, Caxias continua com seus aspectos provincianos, uma cidadezinha calma, sem muitas opções de lazer e uma sociedade imbricada de tabus e preconceitos. Com base no descrito acima Dona Diraci nos exemplifica que: “Naquele tempo não tinha
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³ Maria Diraci Barros, nasceu em Picos - PI e com 12 anos de idade fugiu para o Crato - CE, retornou a sua cidade e depois mudou-se pra Teresina - PI. Chegou em Caxias em fevereiro de 1962, e no ano seguinte construiu seu cabaré com a prostituição, onde trabalha até os dias atuais. Entrevista em 20/07/2009.

clube, não tinha carro, móvel, então eles gastavam o dinheiro com os cabarés”. Todavia, tinha-se um costume na época de dizer que era normal todo homem trair sua esposa, e que tal ato fazia parte do instinto masculino, no entanto, estudos anteriores comprovam que os cabarés se constituem com uma sim, porém um mal necessário para o bem da sociedade.

Com o passar dos anos a Boite Madrid que foi inaugurada em 1963, mas que obteve sua fase áurea nos anos de 1970 à 1974, se tornou mais que um local de divertimento, pois por conta da Estrada Ferro (sinônimo de modernidade para as sociedades do séculos XIX e XX), os trabalhadores quando recebiam seus salários se dirigiam para o bordel, pois segundo a sua proprietária “...aqui era  ponto de encontro, quase turístico, pois vinha mulher casada, com os filhos, todo mundo vinha conhecer minha casa.” Temos no entanto uma ressignificação do que vinha a ser os espaços de sociabilidades referentes ao prazer, locais que até anteriormente eram frequentados apenas por seus clientes passam a ser alvo da curiosidade de suas mulheres também ,que queriam saber onde seus maridos ficavam até tarde, fazendo o quê e com quem. Contudo que chegava ao cabaré apenas para visitação, se o objetivo de obter o que a casa tinha para oferecer, só tinha a liberdade de freqüentar o salão, as outras dependências do ambiente eram permitidas somente aos funcionários e aos clientes.

 

A ENTRADA NA “VIDA”

 

Antes de começar a falar sobre a história de vida de Maria Diraci faz-se necessário um entendimento teórico acerca do tema, pois trabalhamos com as categorias História Oral e Memória, que faz parte do que Le Goff (1995) aborda em seu livro A História Nova, que se constitui para nós, historiadores como uma história global, uma história total, que busca uma nova forma de constituição do campo da história. Entretanto, temos o conhecimento de que a história nova nasce como uma forma de contestação da história positivista, vindo a ampliar o campo do documento histórico, nos convida a sair do estigma fundado essencialmente em textos, em documentos escritos para uma gama diversificada de documentos, como: escritos dos mais variados tipos, documentos fotográficos, documentos orais, etc. E como a história vive hoje uma relação dialética com seus documentos (fontes) vemos a grande necessidade de sairmos da rotina qual os positivistas eram defensores ferrenhos e irmos em busca de um novo jeito de se fazer história.

Com base em leituras acerca da temática História e Memória temos Maurice Halbwachs, com o seu livro A Memória Coletiva que nos mostra que: “Recorremos a testemunhos para reforçar ou enfraquecer e também para completar o que sabemos de um evento sobre o qual já temos alguma informação, embora muitas circunstâncias a ele relativas permaneçam obscuras para nós” (HALBWACHS, 2006 P.29). E foi exatamente o que aconteceu; embora tenhamos na academia algumas produções acerca da temática prostituição fica extremamente difícil a localização desses estudos,e utilizando as palavras citadas acima permanecem obscuras a nós  pelo fato de apenas sabermos da existência dessas pesquisas mas sem termos acesso a elas, e partindo da afirmação de Halbwachs é que estamos nos propondo a tecermos uma escrita sobre o referido assunto.

Maria Diraci Barros no começo da entrevista foi perguntado a ela como ela tinha “entrado nessa vida” – a utilização desse termo se faz necessário por ser a linguagem utilizada por elas, prostitutas - e respondeu com muita calma e convicção: “Meu filho, minha mãe era pobre, eu pobre, então, pra me casar com um homem pobre e ir viver na roça, eu preferi entrar nessa vida, só tive uma saída. ” e logo depois relata qual foi sua primeira atitude:

 

A mamãe não sabia de nada, eu fugi com 12 anos, fugi pela necessidade de dinheiro, mamãe era pobre, fugi de Picos para Crato, passei três meses lá com a prostituição só pra faturar. De Crato voltei pra Picos e aluguei uma casa pra minha mãe e fui pra Teresina....

 

 

Durante toda entrevista se rememora de fatos de quando resolveu se prostituir, nos relatou angústias e aflições sofridas no começo de sua vida: “... eu sofri tanto, mais tanto, mas venci os preconceitos e não tenho nenhuma vergonha do que fiz”. Fato que nos chamou bastante atenção foi que quando obtivemos a entrevista, Dona Maria Diraci estava rodeada pelos seus netos, dois filhos e sua mãe, e durante toda a nossa conversa, não demonstrou em momento algum estar envergonhada de suas atitudes, mas sim orgulhosa de seus feitos, talvez isso tenho se dado pelo fato de que no decorrer de
nossa entrevista uma de suas netas falou: “Eita, a vovó vai ficar famosa...”. De imediato nos veio a mente o artigo de Janaína Amado, O Grande Mentiroso (1995) no qual ela nos mostra a questão da mentira na História oral e nos fez refletir se aquilo que nos estava sendo relatado seria verídico ou não. No entanto tendo como base a experiência de Janaína Amado com esse novo ramo da História Nova, que a documentação oral, e também trabalhado pela História Cultural (cf. PESAVENTO, 2005) tomamos o cuidado de verificar com outras pessoas e em outras pesquisas feitas sobre a mesma temática e envolvendo a mesma entrevistada para sabermos se seu discurso tinha legitimidade ou não.

Observamos também a necessidade de citarmos em nossa pesquisa um grande teórico participante dessa Nova História que é Peter Burke (2005), ele em seu livro, O que é História Cultural? Tece inúmeros comentários acerca da influência de Thompson sobre os historiadores mais jovens e nos mostra que: “...com seus inúmeros artigos e seminários, inspirou muitas pessoas a escreve história ‘a partir de baixo’.” (BURKE, 2005 p. 30-31).  E essa história vista a partir de baixo, não é nada menos que o lixo da história, que na nossa pesquisa se constitui como a prostituta, ser estigmatizado como algo impuro e maléfico(cf. ROBERTS p. 17) e que graças a esse novo olhar historiográfico recebe uma nova significação.

Outra parte da entrevista marcante foi quando perguntamos a entrevistada a quantidade de filhos que ela teve e se teve algum marido ou companheiro duradouro, e para nossa surpresa ela nos respondeu da seguinte forma:

 

Meu filho, eu não fui casada, mas tive um companheiro durante 10 anos, com relação aos meus filhos, dois são de um primeiro companheiro, ele era de Teresina, mas no total tive vinte e dois filhos, doze eu tirei ‘sondado’, dois eu perdi sem querer e nasceram oito.

 

 

E durante todo o nosso encontro que durou cerca de uma hora e meia Dona Diraci não mostrou em momento algum estar arrependida de ter realizado uma quantidade demasiada de abortos, pois a sua justificativa era a de que na época não se tinha métodos contraceptivos e muito menos condição financeira para sustentar todas essas crianças.

 

 

COTIDIANO DAS PROSTITUTAS

 

Mulheres belas, atraentes e formosas, dentre outros adjetivos era o que suas moças recebiam, com base em alguns freqüentadores que não autorizaram a divulgação de seu nome, nem mesmo atreves de pseudônimos. Mas um deles, Seu Tinoco4 (66 anos) natural da ilha de São Luis nos relatou da seguinte forma:

 

Rapaz, lá só entrava homem engravatado, se tivesse sem terno, ele nem chegava perto, ainda tinha mais, o sapato tinha que tá engraxado, brilhando, porque se não tivesse desse jeito, era como se o homem fosse sujo, todos os homens, principalmente os mais velhos andavam com um bastão ou um guarda-chuva, mas todo mundo tinha que andar elegante, pelo menos nesse cabaré era assim...

 

Com base novamente na experiência de Janaína Amado podemos comparar o relato de seu Tinoco com o da proprietária da Boite Madrid, e verificamos que no que concerne a indumentária dos fregueses, ambos os entrevistados relataram da mesma forma.

No entanto, não era somente a forma de vestir dos clientes que fazia parte do cotidiano da prostitutas, seus afazeres era o que mais preocupava a dona do prostíbulo, a qual tinha uma forma severa de educar suas moças para o trabalho. Como a noite era a principal fonte de renda da cafetina (cf. ALMEIDA, 1981) ela tinha que zelar pela saúde de suas funcionárias, obrigando todas elas a dormirem o dia todo para que a noite pudessem estar dispostas para atender seus clientes, conforme Dona Diraci afirma: “...durante a manhã não tinha movimento, toda vida foi assim, movimento só a noite. Pela manhã a gente dormia, fazia almoço, tinha uma vida normal”. Contudo, essa vida normal significa dizer que elas não poderiam ficar andando pelas ruas a vontade não, pois eram descriminadas e vitimas de “piadinhas” como a própria dona da Boite Madrid nos relatou que já foi vítima.

Tratamos também de uma questão trivial, as festas na cidade, quando tocamos no assunto imediatamente veio um tom quase de espanto: “Ah... meu filho, festa? Rum, a gente evitava até ir no centro, quanto mais em festas, pois quando a gente entrava
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4 Trata-se de pseudônimo, o informante pediu que não fosse identificado. Entrevista da qual foram retirados alguns trechos de sua fala realizou-se no dia 22/08/2009.

nelas, nós éramos descriminadas pela população, tanto pelo olhar quanto pela fala.” Com base nessa parte da entrevista fomos levados a procurar por um artigo produzido no ano de 2006 por dois alunos do CESC/UEMA, e nele encontramos a seguinte passagem que segundo Cavalcante: “Muitas vezes vi mulheres da vida serem expulsas da União Artística Caxiense, e de forma bem agressiva”. (apud, LEITE & SANTOS, 2006 p. 4 ).

 

 

PRESENTES E REGALIAS

 

O cabaré em análise era um dos mais famosos da cidade no período em questão, e até hoje quando alguém fala em cabaré o primeiro nome que bem a nossa mente é a Boite Madrid, no entanto ele era frequentado pelos homens mais ricos e poderosos da cidade, que Dona Diraci os chama de “coronéis”, que iam a esses espaços de sociabilidades trajando as melhores roupas e sendo recebido pelas prostitutas com as suas melhores roupas também. Tudo consistia numa relação de reciprocidade, o homem vai bem vestido, se recebe ele bem vestido, se paga bem, ela os tratam ainda melhor.

Exemplo de capital importância para entendermos como se concebia essa política de presentes e regalias era na hora do atendimento e do pagamento do serviço, que Dona Diraci nos relata de seguinte forma:

 

Filho, quando o coronel chegava, eu mandava uma das meninas ir atender ele, ela dava tudo o que ele precisava, bebida e coisas desse tipo, e se durante a noite ele gostasse dela ela levava ele para o quarto e na hora dele ir embora era que ele pagava ela. E dependendo do pagamento, dos presentes que eles davam para as meninas era que eles “seguravam” suas prostitutas. Esperava-se a consciência do coronel.

 

 

 

Podemos entender com base nesse relato de que no período abordado era de suma importância o coronel ter uma prostituta fixa, pois era sinônimo de que ele a pagava bem e de que ela estava satisfeita em estar com ele. Posteriormente a essas confirmações perguntamos apenas para ter uma ideia de como era hoje e ela nos disse novamente com um tom de espanto: “Rum..., meu filho, hoje é muito diferente, o preço é as meninas que combinam, e outra, até mesmo antes de ir pro quarto”. Não nos restando nenhuma dúvida podemos comprovar o quanto a vida no cabaré sofreu as consequências da modernidade, e como nossa entrevistada nos disse:

 

Meu filho, com a invenção desses motel, todo mundo tendo carro, moto, e dinheiro no bolso, ninguém mais quer saber de prostituta não, tudo hoje é mais fácil, as meninas que antes de casar não podiam ir pra cama com seus namorados, hoje, quem quiser tem a liberdade de ir, não se liga mais pra essas coisas não.

 

 

Todavia, ainda podemos perceber uma fala de contentamento ao saber que o seu cabaré foi um dos espaços mais antigos e mais movimentados da cidade no que se refere à temática sociabilidades atreladas ao prazer, e retomando aos presentes que suas meninas recebiam ela nos conta que: “Muitas mulheres tinham inveja da gente, as prostitutas luxavam muito, no vestir, no calçar, jóias (anel, relógio, pulseira, tudo de brilhante, a gente usava os presentes que os coronéis davam), mas hoje não se anda assim não.”

 

 

MOMENTO ÁUREO DO CABARÉ

 

No decorrer na entrevista Dona Diraci citou o momento mais estupendo de seu cabaré, que foi nos primeiros quatro anos da década de 1970, logo após a morte se seu companheiro, onde não cansava de repetir: “...a noite aqui era lotada de gente...”. Percebemos com base nas leituras de História Oral o cuidado que devemos ter quando trabalhamos com histórias de vida, no entanto, vemos também a impossibilidade de demonstrar a emoção tanto que o entrevistado sente quanto a que o entrevistador sente, ambos se emocionam.

De uma forma bem súbita ela nos fala o seguinte: “Filho, eu comprava era de carradas de cerveja, essa casa que tu ta aqui hoje, eu fiz só pra guardar a bebida.” Valendo ressaltar que a casa a qual a entrevistada  se refere se encontra situada na mesma rua de seu prostíbulo e hoje constitui o seu domicílio.

Nos contou que o movimento começava as sete e meia da noite e atingia o ápice entre as nove e as dez e meia, onde os homens da cidade tinham o acesso livre e essa ida ao cabaré era algo comprobatório de que  alguém com influência e status social elevado era freqüentador assíduo de um local elitizado do ponto de vista do prazer. Corroborando com as afirmações acima Cavalcante nos relata que:’

 

 “Os políticos da cidade, os homens importantes, a maioria eram freqüentadores dos cabarés, e muitos deles até fechavam os cabarés por sua conta para fazer festas pessoais. Os homens não sofriam discriminação pro frequentarem a rua, a eles, era permitida a passagem a qualquer hora do dia, porém as moças para irem  a igreja e ao festejo de São Benedito, deveriam escolher uma rota que não tivesse que passar por lá” (apud, LEITE & SANTOS, 2006 p. 4 ).

 

Entre os clientes de maior prestígio tanto social quanto econômico a entrevistada nos citou apenas um, se tratava de Alderico Silva, que era comendador e cliente assíduo de seu cabaré, nos revelou que ele quase todos os dias ia no seu cabaré; contudo sabemos da existência de outras personalidades caxienses que frequentavam seu prostíbulo, mas que no entanto ela não quis revelar e nós a respeitamos.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Analisando sob um olhar historiográfico observamos que segundo Certeau (2008), “...a imagem do passado mantém o seu valor primeiro de representar aquilo que falta”. E conseguimos observar durante a criação desse artigo que falta ainda para a cidade de Caxias uma escrita historiográfica acerca da temática em questão, pois o historiador quando estuda o passado, produz de forma intencional uma escrita para aqueles que ainda não nasceram, ou seja, as gerações futuras.

Verificamos também de uma forma bem particular que é através do confronto entre o presente e o passado que o objeto de estudo é desvelado, ou seja, presente e passado se relacionam dialeticamente, se determinam mutuamente como categorias idênticas. E trabalhar com a prostituição se constitui como algo fundamental para os adeptos da história nova, que é trazer para a História as memórias que foram silenciadas, negligenciadas, seja voluntariamente ou não.

Observamos também que a prostituição, principalmente no auge da Boite Madri foi um palco gigantesco na formação de identidades (cf. HALL, 2006), havendo casos de algumas jovens, como a própria proprietária do cabaré, que escolhem a zona como uma opção de vida, ora atraídas pelas riquezas e facilidades que o cabaré pode trazer, ora pelo desejo de não ter o mesmo destino da maioria das moças pobres da época.

Por fim entendemos como o campo das representações tem influência nas ações e discursos de uma sociedade, que arraigada por tradições religiosas condena o simples fato de se transitar por uma rua a qual apenas os moradores das casas praticam ações não agradáveis aos olhos da maioria, mas que no entanto, os que se diziam contra tais ações, na maioria das vezes eram os seus principais frequentadores.

 

REFERÊNCIAS

 

ALMEIDA, Horácio de. Dicionário de Termos Eróticos e Afins. Rio de Janeiro. Ed. Civilização Brasileira, 1981.

 

AMADO, Janaína. O grande mentiroso: tradição, veracidade e imaginação em História Oral. In: História. São Paulo, vol. 14, 1995.

 

BURKE, Peter. O que é história cultural?. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed.,2005.

 

CERTEAU, Michel. A Escrita da História. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.

 

FILHO, Bernardo Pereira de Sá. Cartografias do Prazer: Boemia e Prostituição em Teresina. Dissertação (Mestrado em História do Brasil) UFPI, Teresina, 2006.

 

HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

 

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

 

LEITE, Caribe Franco. SANTOS, Natasha Brasil. Travessa São Benedito: A rua dos cabarés e suas representações no imaginário da sociedade caxiense (1960 à 1980). Artigo (Licenciatura Plena em História) UEMA, Caxias, 2006.

 

LE GOFF, Jacques. A História Nova. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

 

PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e História Cultural. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

 

PESSOA, Jordânia Maria. Entre a Tradição e a Modernidade: A belle époque caxiense: Práticas fabris, reordenamento urbano e padrões culturais no final do século XIX. Imperatriz: Ética, 2009.

 

PRIORE, Mary Del. História das Mulheres no Brasil. 9. ed.- São Paulo: Contexto,2008.

 

ROBERTS, Nickie. As Prostitutas na História. Rio de Janeiro: Record, Rosa dos Tempos, 1998.

 

RAGO, Margareth. Do Cabaré ao Lar. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

 

 ______________. Os prazeres da noite. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.      

 


Autor: Jorge Luis


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