A dura vida dos fundos hedge



Valor Econômico
11 de julho de 2005

A maioria dos gestores independentes de fundos multimercados - carteiras de maior risco que investem em todos os mercados - terminaram o primeiro semestre perdendo depósitos e com rentabilidade abaixo do CDI.

Um levantamento feito pelo Valor com base em dados do site Fortuna com 45 desses fundos mostra que, neste ano, essas carteiras perderam R$ 1,313 bilhão em aplicações, encerrando o semestre com patrimônio de R$ 5,605 bilhões. Do total, apenas 16 conseguiram ficar acima do CDI. A mostra revela ainda que três fundos fecharam o trimestre com perdas: um fundo cambial da GAP Asset Management e dois de arbitragem ("long/short") da Questus Asset Management.

A rentabilidade média dos multimercados já vinha piorando desde o ano passado, como mostra o Índice de Fundos Multimercados (IFM) da empresa de consultoria RiskOffice*. No acumulado de 2003 para cá, porém, o investidor ainda ganha, com um retorno de 60,20%, ou 107,85% do CDI até junho.

A rentabilidade média dos multimercados neste ano está abaixo do CDI pela própria dificuldade em superar uma taxa de juros de quase 20% ao ano, diz Rafaela Vitória, superintendente de Wealth Management do BankBoston, que acompanha diariamente cerca de 200 gestores. "Com um juro desses e com o Ibovespa caindo 4,37% e o dólar 11,45% no semestre, é muito difícil o gestor conseguir bater o referencial", diz Rafaela, que é também responsável pelo Boston Fund of Funds, o fundo de fundos destinado aos clientes do private bank, apelidado de "Fófi".

Uma das alternativas para melhorar o desempenho da carteira do Fófi foi aplicar em fundos de arbitragem, diz Rafaela. "Hoje 40% de nossa carteira está em long/shorts", afirma a executiva.

A maioria dos gestores independentes aproveitou a falta de tendência dos mercados para lançar long/shorts. Esses fundos alugam ações que acham que vão cair, vendem os papéis no mercado à vista e compram as que acham que vão subir. Outros compram uma carteira de papéis que acham que vão subir e vendem o Índice Bovespa futuro.

Essa estratégia tem dado um ótimo resultado para alguns gestores, como para a Pólo Asset Management. O fundo Pólo HG acumula 19,16% no ano. Já outro long/short, o Questus 30, não teve a mesma sorte e acumula 5,38% de perda no semestre. "Perdi com uma aposta em siderurgia, acreditei que ia recuperar as perdas de fevereiro e só desfiz a posição em maio", diz Luiz Carlos Barroso Simão, responsável pelo fundo. A estratégia do Questus 30 é montar uma carteira de ações e vender Ibovespa futuro. O problema é quando a ação escolhida não vai bem. Em março, a carteira perdeu 3,8%. "Mas isso é típico desses fundos, ele pode recuperar tudo em um mês", diz Simão, lembrando que o fundo foi criado em 2002 e acumula um retorno de 158% do CDI até hoje.

Esse é um dos riscos desses fundos de arbitragem: em geral, as carteiras são alavancadas e, se errarem as apostas, podem ter perdas. Além disso, há muitas estratégias diferentes - ações com ações, setor com setor, ações ONs com PNs da mesma empresa e ações com índice futuro. Por isso o investidor deve ficar atento para ver o risco que está correndo.

Rafaela, do BankBoston, acredita, porém, que os long/shorts não são uma moda e devem se tornar parte da estratégia das carteiras. "Talvez com o mercado acionário melhorando, os fundos 'macro' passem a render mais que os long/shorts, mas eles são uma alternativa de diversificação", diz.

Olhando o período de um ano e meio, os fundos multimercados até que não vão tão mal, diz Marcelo D'Agosto, sócio do site Fortuna. Ele lembra que muitos gestores se especializaram em fundos de baixa volatilidade, como Pactual Asset Management e Neo Investimentos. Essa estratégia, em um mercado tumultuado como o do ano passado para cá, atraiu os investidores e tornou esses fundos os maiores do mercado. Somados, os fundos High Yield e Hedge do Pactual somam mais de R$ 5 bilhões, com volatilidade de 0,83% e 1,45% ao ano, respectivamente. Para efeito de comparação, o CDI tem uma volatilidade de 0,08%, o Ibovespa de 31,97% e o dólar de 10,40%. "Isso mostra que esses fundos têm uma posição muito pequena em ativos de risco", diz D'Agosto. Em compensação, de dezembro de 2003 a junho deste ano, o High Yield acumula retorno de 27,26% e o Hedge, 27,78%, para um CDI de 26,75%.

Olhando os grandes fundos que não estão sob gestão de grandes bancos, D'Agosto destaca o Verde, da Hedging Griffo, com patrimônio de R 1,390 bilhão, rentabilidade de 26,31% no período e uma volatilidade de 7,15%. O CS Absolut, do Credit Suisse, com volatilidade de 7,15% e rentabilidade de 44,28% em 18 meses, tem patrimônio de R$ 964 milhões. Entre os independentes, gestores novos também tiveram maior captação neste ano, caso da Mauá Asset Management.

D'Agosto separou 52 fundos multimercados com maior volatilidade, que reúnem R$ 8,990 bilhões, incluindo Hedging Griffo, CSFB, Gávea, JGP e Cláritas. Com baixa volatilidade há 15 fundos com patrimônio de R$ 8,488 bilhões, o que mostra a preferência do investidor pelo risco menor. Há ainda 28 fundos novos, sem histórico de um ano e meio, com patrimônio de R$ 1,888 bilhão.

No período, os fundos com baixa volatilidade captaram R$ 2,2 bilhão de dezembro de 2004 para cá. Os com alta volatilidade perderam R$ 1,853 bilhão e novos captaram R$ 1,735 bilhão. "Aparentemente fundos com desempenho pior abriram espaço para gestores novos", diz D'Agosto.

Índice ajuda gestores a acompanhar desempenho

Com R$ 113 bilhões de patrimônio, ou 17,67% do total investido em fundos, o segmento de multimercados se sofistica com a criação de carteiras com estratégias diferenciadas e agora também com novos mecanismos de acompanhamento. O objetivo também é reduzir a comparação com o CDI, que acaba fazendo o investidor confundir essas carteiras com fundos de renda fixa.

Mais recentemente, o Banco Pactual criou um índice público de fundos hedge, como acontece nos Estados Unidos com o Tremont, do CSFB. Agora, a consultoria RiskOffice está lançando dois índices de multimercados para servir de referenciais para os investidores em geral. Um deles, o Índice de Fundos Multimercado (IFM), leva em conta apenas fundos abertos para aplicações. Já o IFM-Não Replicável (IFM-NR) inclui fundos fechados.

O índice será coordenado por um comitê de cinco pessoas de fora da empresa - gestores e distribuidores - e duas da RiskOffice. O grupo vai analisar o comportamento do índice, que será revisto a cada quatro meses. "Seria incoerente olhar fundos agressivos em um período curto", diz Fernando Lovisotto, sócio da RiskOffice.

Os índices levam em conta mais de cem fundos de investimento com características de multimercados. São elas: buscar ganhos em diversos segmentos; ter gestão ativa, ou seja, não replicar nenhum índice ou referencial; apresentar maior nível de risco em busca de retorno diferenciado; e, na sua maior parte, ser gerida por gestores independentes.

Os multimercados foram então separados em cinco grupos em função da volatilidade: Desprezível (VD), Baixa (VB), Média (VM), Média-Alta (VMA) e Alta (VA). Os de baixa volatilidade foram desprezados, apesar de seu grande patrimônio, pois muitos não são multimercados, mas fundos de renda fixa com algum risco. "Se considerássemos todos, teríamos um índice que chegaria muito perto do CDI", diz Lovisotto.

Os índices da RiskOffice mostram que os fundos multimercados abertos apresentam um retorno em queda. Em 2003, o resultado médio foi 27,56%, ou 119,12% do CDI. Já neste ano, até junho, o retorno de 8,24% representa 92,38% do CDI. Incluindo os fundos fechados, o IFM-NR tem desempenho melhor em 2003, mas, neste ano, perde para o de fundos abertos, com 7,64%.

Lovisotto destaca também que houve um aumento de patrimônio dos fundos long/short. A maioria das carteiras não tem ainda 12 meses, mas ajudam a puxar a rentabilidade da categoria, juntamente com os mais agressivos. "Os long/shorts devem representar 8% a 10% do índice", diz.

O índice mostra ainda que, apesar deste ano estar sendo mais difícil, os multimercados superam o CDI de 2003 para cá, com 60,20% acumulados, ou 107,85% do referencial no IFM, e 113,49% (63,35%) no IFM-NR, diz Lovisotto.

Marcelo D'Agosto, do Fortuna, lembra que a maior parte dos R$ 113 bilhões dos multimercados é de fundos exclusivos, de fundações e clientes private, que usam as carteiras como fundos de renda fixa. E isso contamina os dados gerais de rentabilidade. (AP)

*Um dos sócios da RiskOffice é o consultor Marcelo Rabbat, especialista em hedge, risco de crédito e mercado.
Autor: Agência Goodae


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