A Gruta Escondida



"Uma amizade sólida é algo que devemos preservar de todas as formas", esta ideia foi a primeira que cruzou pela minha mente ao acordar naquela sexta-feira de um feriado prolongado. Ao lado de minha cama minha mochila já estava pronta, estufada de tão cheia, com tão somente objetos essenciais para um fim de semana ansiosamente aguardado. Há cerca de quatro meses que vínhamos planejando esta aventura, que pelas nossas contas levaria todo o fim de semana para se concretizar. Um sopro longínquo de algum ancestral explorador de alguma forma havia atiçado nossas mentes, insuflado nossos corações e preparado nossos espíritos para aquela jornada. O tal dia chegara e às 6:30 daquela manhã, antes mesmo que o despertador tocasse, eu já estava desperto tal era o grau de excitação que me dominava. Um café da manhã reforçado, uma roupa confortável, calçados adequados e às 07:30hs eu , Blaise e Baruch já nos abraçávamos no ponto de encontro, para dar início a nossa longa caminhada. Meus grandes amigos, mais de dez anos de convívio, mais que irmãos. Arquivamos qualquer pensamento que envolvesse trabalho e preocupações para aquele fim de semana. Famílias e namoradas ficaram em segundo plano, mas só desta vez."Vamos celebrar nossa amizade" era o lema e a senha, nosso motivo e nossa desculpa para lançarmo-nos no caminho da trilha da Gruta Escondida, 20 quilômetros mata adentro, um caminho parcialmente mapeado, e aí estava o grande desafio, pois ninguém jamais havia conseguido mapear todo o trajeto. Algumas equipes haviam tentado mas desistiam após os 20 primeiros quilômetros. Uma mata fechada, quase impenetrável, ainda a salvo da ganância exploratória se tornara um obstáculo formidável ao descobrimento de suas riquezas. Lendas antigas diziam sobre povos muito mais antigos que as lendas que haviam construído cidades majestosas e subterrâneas, cuja entrada seria a tal Gruta Escondida. Porém ninguém até então havia visto a tal gruta, que já estava sendo considerada um logro, uma fraude. Nenhum sinal, nenhuma inscrição estranha havia sido localizada, somente os relatos dos últimos remanescentes dos povos locais, destruídos e absorvidos pela cultura local.

"Ainda existiriam lugares escondidos, achados arqueológicos, tesouros ? Não estamos tão longe da vida urbana intensa, nem tão longe de especialistas, museus e institutos com pessoas especializadas para este tipo de pesquisa. Nenhum de nós era especialista, apenas curiosos com muita leitura e muitas histórias ouvidas e contadas desde a infância. Parecia que o passado já havia ofertado seus presentes o suficiente para aquietar esta febre de descobertas. Os povos antigos e desaparecidos ainda teriam vontade de revelar sua história para uma época tão auto-complacente com sua tecnologia farta e seus avanços científicos? Bem, são muitas questões girando rapidamente em minha mente, mas vamos ao que interessa": - Todos prontos? Blaise tomou o primeiro gole de água dos muitos necessários para vencer aquele caminho íngreme, tortuoso, de mata fechada, cheio de obstáculos e tropeções. Baruch de óculos escuros, boné na cabeça e roupa de camuflagem estava paramentado como um explorador Hollywoodiano. Eu, precavido que sou, estava besuntado de repelente, tão besuntado que repeliria minha própria namorada, se ela aqui estivesse. Ao nosso redor alguns outros destemidos formavam outras equipes de exploradores amadores, trilheiros de fim de semana, caçadores potenciais de tesouros imaginários. Mas não muitos, pois a mata densa e cheia de lendas assustadoras não inspirava a um contato mais freqüente. E a jornada começa então, desejamos boa sorte entre nós todos, respiramos profundamente e a ansiedade e a excitação era tanta que mal dava para conter nosso entusiasmo.

Era uma clara manhã de Sol, os raios ainda oblíquos atravessavam os galhos altos e formavam uma cortina inclinada de luz. O silêncio respeitoso começou a ofuscar nossas vozes jovens e confiantes, exigindo nossa atenção ao zumbido dos insetos em atividade. O frescor da manhã impulsionava nossas pernas firmes, com passadas largas e logo nos distanciávamos dos demais grupos no caminho de inclinação suave mas constante. Tudo ao redor inspirava nossos passos rumo ao topo da colina. Árvores compactas com galhos entrelaçados disputando cada raio de Sol que descia ao solo, grama macia molhada ainda do orvalho como tapete aos nossos pés. No alto nuvens espessas se misturavam e formavam quadros móveis sob um fundo de azul tranqüilo. Algumas folhas mergulhavam em nossas cabeças como se as árvores estivessem lançando pétalas no cortejo de vencedores que voltam de uma guerra. Mas nenhuma guerra estava sendo travada naquele lugar, tão somente a busca por uma suposta caverna, ou mesmo, tão somente chegar ao fim de uma trilha que desafiava muitos exploradores experientes.

Decorridos 40 minutos desde o início havíamos percorrido cerca de 1,5Km e já não ouvíamos mais os sons dos outros caminhantes, nem mesmo ouvíamos nossas vozes já que estávamos nos poupando para avançar até 10 Km no primeiro dia. As mochilas começavam a pesar um pouco carregadas com apetrechos para pernoite no meio da floresta: lanternas, fósforos, água, mapas, facas e muito espírito de aventura. Blaise trazia uma bússola e um GPS, dos três era o que se preparara melhor e por mais tempo, costumava acampar desde criança e sabia de muitas histórias acontecidas naquela floresta, se bem que algumas eram francamente inventadas por ele. Baruch, por ser filho de um imigrante historiador com muito conhecimento de arqueologia, havia herdado do pai o gosto por estes estudos e de longe é o que têm maior conhecimento sobre o assunto. E eu, bem, eu não costumo me perder facilmente. Prosseguíamos firmes, lépidos e confiantes, devorando o chão e deixando para trás nossa trilha e nossas pegadas Ouvimos um som de água corrente e poucos passos depois cruzamos um riacho de águas muito limpas. Resolvemos parar um pouco , tirar os calçados e molhar os pés pois uma chance desta não é muito freqüente. Aquela água gelada deu um fôlego extra para todos. Cinco minutos tão curtos mas intensos, tempo suficiente para algumas piadas sobre a indumentária de Baruch e seu boné da Legião Estrangeira com uma cortininha atrás.

Já estávamos de volta com os raios solares às nossas nucas. O caminho estava ficando mais inclinado e com algumas pedras soltas, com cuidado prosseguimos mas não distinguíamos o topo da colina, talvez pela barreira feita pelas árvores, algumas muito altas e muito copadas. Muitos metros adiante localizamos uma clareira que dava acesso para um mirante. Ainda tínhamos energia de sobra, pois o desejo acumulado era muito superior ao calor crescente e ao caminho tortuoso. Chegamos ao mirante chamado de Mirante da Solidão, assim chamado porque já neste ponto não era mais possível divisar a cidade ao longe, e a localização voltada para o lado oposto ao do formigueiro urbano acometia ao observador a sensação de estar muito distante de tudo que fosse familiar, civilizado e seguro, muito embora viver na cidade não fosse muito familiar, muito civilizado e muito menos seguro.

Uma manhã radiosa era a moldura perfeita para o espetáculo aos nossos pés. Sei que cada um no seu íntimo estava se sentindo o rei da floresta. Nenhum sinal, nenhum som por mais distante que fosse de presença humana chegava aos nosso ouvidos.

- Acho que os outros já desistiram, talvez já tenham se cansado, ou cheios de bolhas nos pés. Sem preparo para encarar a Mãe Natureza.

    -Já caminhamos 6 quilômetros, segundo meu GPS.: disse Blaise.- Está mais fácil do que parecia, se mantivermos este ritmo antes de escurecer já teremos andado cerca de 12 quilômetros. Poderemos acampar mais cedo e preparar uma bela refeição no meio do mato, o que acham?

    -Certo, concordo contigo: disse Baruch, já vermelho e suado.

    -Quem sou eu para contestar!

    O caminho continuava subindo e vários pássaros faziam vôos entre as árvores, alguns deles estavam muito alto no céu quase bicando as nuvens. Insetos em quantidade assombrosa atraíam nossa atenção. Teias enormes coalhadas de aranhas de diversos tamanhos brilhavam como prata incandescente nas clareiras e nos espaços entre as árvores. E quantas árvores! Muitas espécies diferentes com troncos majestosos e raízes que pareciam trançar todo o solo e mergulhar ao centro da Terra. Senti muita falta de ter prestado mais atenção nas aulas de Biologia, assim poderia reconhecer melhor estes seres encantados. Este era o seu domínio e tínhamos muito respeito. Tão dentro de sua casa éramos invasores potenciais, mas nossos espíritos estavam tranqüilos sem uma gota de vontade de fazer qualquer mal, pois tínhamos a nítida certeza de que muitos outros espíritos vagavam ao redor nos observando e avaliando. Estávamos mesmo muito longe do concreto e do asfalto e estes pensamentos tortos e estranhos aqui prosperam. " Espíritos ao redor, que coisa de maluco! O que você andou fumando, perguntariam alguns conhecidos meus, muito céticos, cínicos e terrestres?" Não preciso fumar nada quando o ambiente que nos cerca é tão poderoso e tão intimidador , ainda que pacífico. Sempre gostei de árvores, sempre desenhei árvores, sempre sonhei com árvores, até subi em muitas quando era um garoto atentado. Porque tanto ódio contra elas eu nunca entendi, porque deixá-las na horizontal quando na vertical é o seu destino e sua missão. Meus amigos e companheiros de jornada também partilhavam este amor vegetal, de outro modo não estaríamos aqui.

    Baruch olhava com mais atenção para a flora exuberante, olhava com olhos mais treinados do agrônomo que era. Seu pai mais do que um historiador era um naturalista apaixonado, herdeiro de uma linhagem de naturalistas europeus interessados no Novo Mundo, proto-ambientalistas de um mundo ainda repleto de florestas intocadas, hoje de saudosa memória. Diminuímos nossa marcha para saborear este momento raro. O silêncio envolvente na verdade era bastante enganoso, pois uma polifonia se revelava por trás daquela paz aparente, bastava apurar o ouvido para distinguir uma variedade riquíssima de sons, ruídos e cantos, de insetos, aves, pequenos animais escondidos na vegetação, de folhas caindo, dos galhos se movendo, enfim, uma sinfonia tão harmoniosa que compositor nenhum, por mais talentoso que fosse, conseguiria imitar, muito menos igualar.

    Blaise não desgrudava de seu GPS, de todos era o mais fanático por tecnologia, engenheiro eletrônico por formação e paixão vinha marcando nossos passos no banco de dados de seu aparelho. Se o danado do bichinho desse pau e se dependesse somente dele para nos situarmos estaríamos lascados e mal pagos, pois seu senso de direção era pouco mais que sofrível, ele se perdia até dentro da própria casa quando estava com muito sono. Mas era um entusiasta da natureza também, apesar de sua inclinação tecnológica. Só esquecera de trazer sua filmadora de última geração para registrar nossa aventura:" A mochila já estava muito cheia" ele dizia. Não importa, certas coisas são mais intensas quando somente na memória, e não embarcamos nesta para ter o que mostrar depois em alguma festa de confraternização.

    Nesta altura do dia conversávamos pouco absortos naquele cenário mágico. O Sol já se afastava do zênite e a fome dava mostras de estar muito viva. Com muito respeito havíamos colhido várias frutas e este seria nosso primeiro almoço na relva, um piquenique ecológico, frugal e básico. Caminhamos pouco mais até acharmos uma clareira sombreada onde fizemos uma refeição deliciosa e mais do que bem vinda, já caminháramos 9,5Km de um caminho belo mas tortuoso e cansativo. Não havia mais ninguém ao redor, apenas algumas placas de madeira espaçadas marcando a distância desde o início. Nossa fome era imensa, comíamos, ríamos e brincávamos, relembrando casos engraçados e alguns quase esquecidos. Depois da barriga cheia percebemos o cansaço acumulado depois de 6 horas de caminhada. Fizemos uma fogueira tosca e um sono quase imediato tomou posse de três amigos envolvidos por um cinturão verde sagrado.

    Pela próximas 3 horas os caminhantes animados ficaram tão apagados e desmaiados pelo cansaço que ficaram cobertos por folhas despencadas das árvores mais próximas, como se estivessem camuflados na espreita de alguma presa, sorte deles aquela floresta não abrigar animais selvagens possantes e famintos pois eles é que teriam sido presas fáceis, teriam sido devorados sonhando com os anjinhos, mas morrido em grande paz.

    Bom, como não existiam lobos, ursos, onças, tigres, ou o que valha ao redor, apenas no Zoológico Municipal, nosso heróis só foram despertados pelos primeiros pingos de chuva. Despertaram num susto e tiveram que correr para se abrigar daquela chuva branda à princípio, que logo foi engrossando. Escurecia rapidamente no meio daquela massa de árvores e os três após alguns tropeços conseguiram montar uma cabana improvisada e outra fogueira , esta um pouco melhor do que a primeira. Já mais calmos se preparavam para passar a primeira das duas noites previstas no passeio. Só não contavam com uma chuva que aumentava de intensidade abruptamente, o serviço meteorológico havia indicado apenas a possibilidade de uma chuva rápida no final da tarde mas isto parecia um princípio de dilúvio começando a encharcar os pertences. Blaise corria para salvar seus apetrechos eletrônicos, principalmente seu precioso GPS, sem o qual estaria como um inseto sem antenas, desorientado. Buscaram refúgio numa árvore mais baixa que conseguiram escalar. Precariamente instalados, bastante molhados e com o humor um pouco abalado, além de uma escuridão absoluta que a tudo envolvia, os rapazes perceberam que as comportas do céu não seriam fechadas tão logo e que a noite certamente seria passada num galho de árvore.

    O ruído daquela enxurrada, além dos raios e trovões que pareciam cair cada vez mais próximos, dificultava a comunicação entre eles. Pouco a pouco o desconforto foi dando lugar ao receio, que logo cedeu seu lugar a um medo real quando à menos de 50 metros uma das árvores foi atingida em cheio por um raio, e um clarão imenso subiu à grande altura e o fogo logo se alastrou. Neste momento a chuva torrencial foi providencial ao impedir uma propagação maior do incêndio. A madrugada já avançava quando Baruch só tinha em mente a sua cama quentinha e um sanduíche num prato, Blaise pensava num banho quente e Cedric, na namorada. Tudo isto parecia tão distante neste momento como se eles estivessem em outro planeta. O entusiasmo por vezes se esquece de contabilizar os percalços, os acidentes e o imponderável. Principalmente o imponderável. Um mutismo se instalou entre eles, paralisados e pendurados como macacos em galhos precários. Cedric esfregava os olhos pois parecia ver movimento entre as árvores, pensou mesmo que estivesse vendo figuras humanas vestidas com trajes estranhos. Blaise pensava estar vendo cobras se aproximando e ficou com muito medo. A chuva não diminuía e um vento muito forte começou a soprar, tão forte que sacudia as árvores. O barulho era enorme. Os três haviam deixado os celulares em casa pois queriam ficar realmente isolados, se deram conta de que ninguém os havia acompanhado e com toda esta chuva a trilha estava intransitável. Aquela aventura controlada do início se tornara um pesadelo e o sono castigava suas mentes sem piedade. Mas como dormir empoleirado deste jeito? Alguns milhões de anos de evolução cobrariam agora a inadequação de uns pobres sujeitos urbanos na essência, apesar do amor incondicional pela Mãe-Natureza, de se sentir à vontade nas árvores.

    No fim a exaustão fez sua parte e os três adormeceram do jeito que deu, e os sonhos breves mas intensos versaram sobre coisas como represas rachadas, escalada no pau-de-sebo, piscinas de geléia, entre outros. São curiosas as soluções e as situações que os sonhos apresentam para o pobre sujeito que dorme seu sono profundo. Mas os sonos aqui não foram nada profundos. A claridade ainda tímida de uma manhã repleta de nuvens grossas despertou os amigos de sua cama desconfortável. A mochila de Blaise havia caído durante a madrugada e o GPS jazia quebrado no chão. Batera em cheio em cima de uma pedra, para desconsolo do rapaz. Os três pareciam ter tomada uma surra de tão doloridos e amarfanhados que estavam, sem contar a fome descomunal que tomava de assalto suas mentes aturdidas. Desceram da árvore e fizeram um rescaldo dos pertences. A comida estava úmida mas foi comida assim mesmo. O chão da floresta estava encharcado e enlameado, os córregos haviam engrossado e muitas partes estavam alagadas. Árvores haviam caído por ação dos raios e da ventania. O quadro não era nada belo, muito pelo contrário. Depois de saciar a fome, ou enganá-la, era urgente decidir o que fazer em seguida, pois o céu não dava sinal de que pudesse melhorar, as nuvens estavam muito pesadas e baixas. Se o caminho que já era difícil com Sol imagine com chuva, dava até medo de pensar. Todo aquele ânimo do dia anterior ficara seriamente abalado após uma noite nos galhos de uma árvore. Os três se entreolharam esperando alguma sugestão e após alguns momentos de hesitação Baruch tomou a palavra:

    - Não estou vendo como a gente possa prosseguir até o fim da trilha, este caminho está um caos , olhem ao redor, só tem lama!

    - O Bá tem razão, falou Blaise . Acho que ninguém levava em conta essa chuvarada toda, eu tô com frio e com fome ainda, e nós só estávamos na metade do caminho. Não faço ideia de nossa localização e não tenho ideia de como voltar. Confesso que eu rezei pela chegada de um helicóptero de resgate... Eu tô apavorado!!!

    - Caras tenham um pouco de calma para raciocinarmos direito. Eu sei que o projeto mudou radicalmente, sei da situação e também tô apreensivo. Racionalmente seria melhor voltarmos, pois ninguém sabe o que têm pela frente. Mas alguma coisa me atrai e me diz para seguirmos em frente. É só uma intuição, não quero influenciar vocês pois a ideia inicial foi minha. Vocês estão péssimos! Parecem náufragos de tão abatidos. Também não consegui dormir direito mas não estou muito mal. Olhem agora, parece que não vai chover mais, as nuvens estão se afastando por causa do vento. Tem muita fruta pendurada nas árvores, nós podemos comê-las. Ainda tem muita água nas mochilas. Eu sigo em frente mas deixe ao critério de vocês.

    - Confesso que estou com medo de prosseguir, prefiro voltar.

    - Eu também. As árvores agora não estão sendo minhas amigas, disse Baruch.

    O impasse estava instalado na mente de Cedric. Os amigos tinham suas razões e a razão também dizia para voltar dali daquele ponto. Era mais seguro. Porém sua intuição ganhara como que uma voz interior que falava mais alto e o pedia para prosseguir. Queria achar a entrada da gruta, queria provar que ela existia de fato. Até onde a perseverança se aproxima e se confunde com a teimosia? Qual o ponto limite onde persistir pode significar um fracasso retumbante? Qual a chance de seguir sozinho? Estas perguntas giravam na cabeça de Cedric em frações de segundo.

    - Eu sigo sozinho. Eu preciso achar a gruta!

    Os amigos ficaram espantados com aquela decisão, fraquejaram um pouco, ficaram tristes mas já haviam feito sua escolha. E sua escolha era voltar para o conforto e a segurança de suas casas.

    - Você ficou louco! É muito difícil ir sozinho! Além do mais eu ficaria muito chateado de abandonar você.

    - Não tem problema, nossa amizade não vai acabar por causa disto. Além do mais me ocorreu que ninguém sabe de nós, ninguém sabe onde estamos e seria melhor vocês voltarem para informar à Polícia Florestal caso seja necessário o resgate. Sigam em paz que eu vou deixar rastros pelo caminho, para me localizarem mais facilmente. E se eu achar o que estamos procurando eu juro que direi que vocês fizeram parte da expedição.

    As palavras de Cedric foram tão veementes que os outros dois acataram facilmente, junto ao fato de que estavam bastante fragilizados para debater e contestar. Vinte minutos depois, após um breve descanso e uma rearrumação da bagagem os amigos se abraçavam fraternalmente naquela despedida. Combinaram os procedimentos de rastreamento e voltaram pela trilha meio encoberta. Baruch ia na frente guiando Blaise. Voltar foi mais rápido e em menos de seis horas eles alcançaram o ponto inicial da trilha, onde uma agitação incomum tomara conta do posto de polícia pois o zelador, muito zeloso como a função já diz, havia feito uma contagem dos trilheiros e dera falta de três rapazes, tendo avisado a Polícia Florestal. Os dois rapazes foram recebidos, contaram sua história e se prepararam para resgatar o amigo teimoso.

    Cedric permaneceu no ponto da despedida durante algum tempo descansando, respirando e avaliando suas palavras e seu ato. Após refletir longamente ele caiu em si. Mas não se arrependeu nem um pouco de sua decisão, pelo contrário, ele tinha certeza de ter feito a escolha certa. Aquele desejo havia inoculado seu sangue com uma determinação que ele próprio se espantara de estar vivenciando, pois até então jamais em sua vida estivera tão aferrado a alguma coisa, seja trabalho, estudo ou relacionamentos. Sempre fora honesto e responsável, é claro, mas neste caso havia alguma coisa além e ele queria saber o que era.

    A manhã começava a trazer sinais de melhora daquela calamidade da noite anterior, as nuvens se esgarçavam e esbranquiçavam, com um fundo azul claro se insinuando por detrás. Mas o caminho seria difícil com muitos galhos caídos, muita lama, pedras soltas e solo escorregadio. E ele foi em frente, sempre em frente, riscando aqui e ali alguns sinais que permitissem sua localização. O frescor desta manhã e o perfume renovado das folhas das árvores impeliam Cedric a avançar com firmeza e velocidade e antes do meio-dia ele caminhara cerca de 6 quilômetros, mesmo parando de tempos em tempos para uma pequena pausa."Eu fiz o que era mais certo, sozinho estou indo mais rápido e não vejo perigo algum. Era o momento de arriscar, tenho certeza disto e eu sei que vou achar a tal gruta, algo me diz isso só não posso dizer o que é." O trajeto voltava a se tornar íngreme, era um pedaço de trecho bastante difícil, Cedric deu um escorregão e quase caiu. O susto acelerou seu coração e ele deu uma pequena parada quando percebeu que havia uma descida bastante pronunciada que levava a uma trilha bem definida e plana. Uma vez nela Cedric vê um caminho muito reto e com a vegetação mais espessa do que o usual. Um pássaro solitário emite um pio longo seguido de um pio muito curto e repete isto seguidamente. Isto chama a atenção de Cedric. Apura o ouvido para definir de onde está vindo aquele piado. Cerca de 100 metros à sua frente a trilha muda para um caminho ainda mais plano, ainda mais reto e com uma relva macia e convidativa aos pés cansados de um caminhante. Nas margens se encontram árvores apinhadas de frutas. Um som de águas correntes também se faz ouvir e uma placa novamente é vista depois de quilômetros sem marcação alguma.

    "Será que é mesmo por aqui? Está parecendo muito bom para ser verdade".

    A placa somente indicava a distância percorrida e a altitude. Estava gasta pelo tempo e pelo clima. Marcava 20 km e era a última placa conhecida. "Estou perto, eu sei disso". O piado longo e curto, longo e curto voltou aos ouvidos de Cedric e vinha do meio da mata. O instinto é uma ferramenta poderosa ainda que atenuada pelo desuso. Instintivamente Cedric olha para o emaranhado de árvores, cipós e arbustos repleto de teias de aranhas como redes de pesca, formigueiros imensos e casas de marimbondos pendendo das árvores mais baixas à sua esquerda. O pássaro emite novamente seu pio, Cedric sente que é um chamado. Subitamente um estrondo quase faz Cedric sair correndo. Uma pedra gigantesca rolara por trás das árvores e parara no meio da trilha. Com o coração disparado e a respiração ofegante Cedric observa figuras entalhadas naquela pedra, uma pedra muito plana parecendo esculpida. "Parece uma porta!". A pedra obstruíra quase toda a trilha. Um calafrio como um raio atravessou todo o corpo de Cedric num momento de iluminação raramente experimentado por ele ou por qualquer pessoa. Uma clareira havia sido aberta no meio da mata pelo deslocamento daquela pedra maciça. Cedric em pé olha diretamente para aquele caminho e percebe o significado daqueles eventos. Mecanicamente, como que puxado por alguma força maior, ele vai em passos tímidos para a margem da trilha com um sopro de ar constante que atinge seu rosto. Vários metros depois o emaranhado de árvores dá lugar a uma clareira , só que coberta pelas copas das árvores como um toldo, ou um dossel de folhas e cipós. A excitação voltou a seu peito com toda a força, a mesma excitação que ficara abalada pela noite desastrosa mas que não desaparecera, apenas refreara. Ele segue firme e decidido por aquele caminho escondido como que por encanto, um caminho que de certa forma fora escondido intencionalmente, com facilidades atraentes para um caminhante já cansado, que preferiria mais um caminho de relva macia do que atravessar teias de aranhas ou formigueiros, ou que preferiria ouvir sons de água corrente e ver frutas suculentas dispostas como doces numa vitrine do que se arranhar num tronco espinhoso de uma árvore.

    "É isso então, algo ou alguém não queria que o local exato fosse revelado. Mas agora eu cheguei aqui e por algum motivo o acesso me foi mostrado. Só pode ser por aqui"

    Uma jaca enorme espatifou-se no chão quase atingindo o ombro de Cedric, que deu um salto para o lado. Mais uns passos a frente outra jaca desabou próximo dele. E logo outra e mais outra, parecendo um bombardeio. Pelo tamanho destes frutos, se um deles atingisse uma pessoa seria morte certa pois caíam de uma altura de cerca de 15 metros. Cedric começa a correr para o fim da nova trilha sendo perseguido por uma saraivada de jacas e mangas, que estariam muito melhores num prato, partidinhas e descascadas. Mas nesta situação era risco de morte. Ah, também caíam pinhas ponteagudas e uma seiva pegajosa ainda que de cheiro muito agradável.

    Com a ataque frutífero aumentando Cedric aumenta sua corrida e percebe o final daquela trilha, mas não vê nenhuma entrada. Para piorar um pouco mais a situação uma nuvem de marimbondos vêm em sua direção, num zumbido assustador, e cipós caem como chicotes para atingir as costas do intruso. Cedric se vê numa sinuca, pois não pode voltar e não vê uma saída. E então ele pisa numa poça de lama que milagrosamente faz abrir uma porta naquela parede aparente. Sem piscar nem pensar ele entra na escuridão e num instante tudo fica em silêncio. Ele encontrou a entrada da gruta, meio por acaso, meio no susto mas tem certeza disto. Está ofegante e suado em bicas e se agacha num reflexo de proteção, avaliando o ambiente que o circunda. Abre bem os olhos mas não enxerga nada tamanha é a escuridão, pois logo depois de entrar a porta de entrada se fechou automaticamente. Ele não se deu conta no momento mas era um prisioneiro, só não sei de quê ou de quem. Passado o impacto inicial um desconforto começa a avançar em seu pensamento, pois ele entrara ao acaso e não tinha a mínima noção de como sair e parecia estar sepultado dentro de uma montanha. O organismo precisa de algum tempo para se adaptar à novas condições de iluminação e Cedric já começa a distinguir o espaço onde está, com paredes irregulares e um chão de terra batida que aponta para um túnel em descida. O teto mede cerca de dois metros e meio de altura e o ar no interior, apesar de abafado era perfeitamente respirável. Algumas pedras soltas pelo chão e nada mais que indicasse alguma presença humana recente.

    O túnel que desce atrai a atenção de Cedric que caminha ereto agora, se sentindo mais confiante. Dentro do túnel o ar circula de forma surpreendente, indicando que alguma passagem ou alguma saída deveria estar próxima pois o ar está fresco. As paredes se mostram levemente úmidas e lisas. Ainda está bastante escuro e nenhum ruído é ouvido, nem de animal nem de água corrente, até agora nenhum morcego foi percebido, nem mesmo um inseto. Parece um lugar estéril. Cedric segue em frente por um túnel reto e com uma inclinação constante mas não muito pronunciada. À medida que vai avançando a claridade vai aumentando gradativamente e aos poucos percebe-se figuras geométricas gravadas na pedra, figuras simples no início como círculos isolados, depois círculos duplos, triplos, depois círculos entrelaçados, dois círculos, três círculos, quatro círculos. Depois desta seqüência começam a aparecer quadrados menores que vão aumentando de tamanho, formando conjuntos mais complexos, seguidos de triângulos com base na posição horizontal, depois vertical, inclinados, depois uma composição cada vez mais intrincada de triângulos que circundam composições de quadrados com círculos no seu interior. Tudo isto faz com que o rapaz aumente seu passo para descobrir onde vai dar isto tudo, e agora começam a aparecer figuras humanas, animais estilizados e estranhas figuras parecendo seres humanos mesclados com animais e seres humanos mesclados com máquinas. Arte rupestre desconhecida e intocada bem diante de seus olhos.

    E muito mais estava por vir naquele túnel que não parecia ter fim. Por algum processo químico pouco comum a tinta usada para fixar aquelas imagens tinha uma luminescência, o que permitia a iluminação tênue mas suficiente para caminhar rumo ao interior daquela caverna. A noção de tempo naquele ambiente escuro e confinado era um tanto diferente da superfície pois Cedric caminhara cerca de 2 horas descendo pelo túnel sem se dar conta dos minutos, para ele pareciam poucos minutos gastos na observação das figuras. Muito mais foi visto, desde linhas verticais com símbolos desconhecidos parecendo letras de um alfabeto esquecido, plantas arquitetônicas e mapas estilizados, rostos geometrizados, animais em cenas de caça, cenas de trabalho agrário, colheitas, números ou símbolos que lembravam numerais arábicos, entre muitas imagens que estavam atiçando a curiosidade crescente de Cedric. De tão absorto e maravilhado Cedric não sentia fome nem sede e também não se preocupara mais em saber como iria sair dali, isto deixara de ser importante para ele depois desta descoberta, seu objetivo, seu desejo maior estava alcançado. "Eu fiz a maior descoberta arqueológica dos últimos cem anos talvez, eu sozinho consegui achar a gruta mítica, que já estava sendo considerada uma fraude ou um delírio. Eu consegui provar que é de verdade!" Mesmo no meio desta euforia Cedric conseguiu se lembrar que não havia trazido nenhuma máquina fotográfica, nem mesmo seu celular de última geração com câmera embutida. Somente um bloco de anotações e um lápis com ponta afiada.

    O túnel chegara ao fim e um portal ricamente decorado com inscrições e entalhes convidava o visitante a adentrar àquele mundo desconhecido. Cedric parou na frente do portal, num misto de respeito, dúvida e curiosidade de saber o que significavam todos aqueles símbolos e aquele alfabeto. Será que haveria alguém que pudesse decifrar o significado, algum especialista paleolinguístico? Após alguns minutos ele avaliou o que se desenrolara até então desde que decidira seguir só. Uma hesitação tomava-lhe o corpo quase entorpecendo suas pernas, seus pés não estavam obedecendo a seu comando mas seus olhos continuavam maravilhados com tudo que estivera vendo naquele túnel de cerca de 5 quilômetros terra abaixo e terra adentro. Neste instante parado em pé junto ao portal , como um relâmpago, um estranho efeito se espalha pela mente do rapaz e seu corpo experimenta uma mistura de euforia e orgulho que cegam seus sentidos e seu raciocínio. Ele entra impetuosamente agora, deixando sua cautela costumeira do lado de fora daquele portal. Um salão gigantesco é o que o esperava, com colunas, arcos e construções sólidas à primeira vista. Edifícios de 4 e 5 andares com varandas e terraços, colunas retas, portas decoradas com várias figuras geométricas, e entre os edifícios ruas com cerca de 6 metros de largura e perfeitamente retas. Cedric calcula que o salão tenha cerca de 3 quilômetros de largura mas não consegue enxergar o fim do mesmo. Entra por uma das ruas e seus olhos já acostumados com a luminosidade conseguem ver com bastante clareza aquela cidade subterrânea. O tal efeito luminescente impregna tudo portanto é fácil se localizar neste ambiente. Ele anda entre as construções dobrando esquinas e observando os desenhos e o estilo predominante. No final de uma das ruas num espaço como de um praça interna ele vê algo como uma fonte feita de mármore e pedra basáltica. Ao lado e no chão estranhos desenhos lineares com inscrições que acompanham algumas das linhas. Segue em frente explorando aquela cidade fantasma até chegar numa rua mais larga que as demais.

    Esta rua tem quase três vezes a largura das demais e no meio canteiros abaulados espaçados formando um padrão constante. A sua esquerda no final desta avenida há uma construção maior e mais alta que a maioria vista até agora. Vista de longe o seu interior parece conter uma luz mais forte que pulsa regularmente. Cedric segue em sua direção, com a euforia que lhe dominava o espírito cada vez mais intensa. Tudo parecia estar completamente vazio, mas não eram ruínas e sim construções muito bem preservadas, mais parecendo terem sido abandonadas às pressas com tudo deixado para trás. Na direção do prédio imponente ao final da alameda Cedric percebe um dos prédios com a porta aberta e resolve entrar para explorar o interior. " Há quanto tempo isto estará desabitado? E eu tenho o privilégio de estar aqui para ver isto tudo!". O edifício têm um hall de entrada com pinturas de figuras humanas coloridas, parecendo terem sido retocadas há pouco tempo de tão nítidas e ao fundo uma escada com alguns degraus rachados, mas isto não impede a subida para os andares superiores onde existem vários cômodos amplos com janelas retangulares verticais. O piso dos pavimentos é de uma pedra muito lisa e brilhante. Cedric sobe ao último andar, um terraço com uma vista mais ampla daquele sítio arqueológico.

    A vista é majestosa e todo aquele brilho fosforescente dá um efeito visual magnífico. Cedric mal se lembra que está dentro de uma caverna, encerrada dentro de uma montanha. Seu batimento cardíaco vai aumentando imperceptivelmente. Aquela cidade encapsulada têm uma estranha aura, efeito talvez daquele brilho irreal."Que povo terá construído esta maravilha aqui neste lugar tão escondido? Uma cidade tão bem planejada, tudo tão retinho, ainda tão bem preservada, quase dá a sensação que alguém virá a qualquer momento, um guia para mostrar a cidade e contar a história deste povo. Ah, que maluquice! Não têm ninguém aqui comigo, isto tudo é meu agora, vou batizar de Cedriclândia. Meu nome estará nos livros de história no futuro, posso cobrar pela entrada da gruta, posso vender meus direitos por muitos milhões, posso vender os direitos para um filme de Hollywood, E tudo isto eu fiz sozinho, sozinho, eu vim sozinho, eu cheguei aqui sozinho, ninguém me ajudou!" A euforia havia subido tanto à cabeça de Cedric, que ele pulava sozinho e ria descontrolado. Seus dedos estavam azulados pelo contato com a tintura nos muros e nas paredes. Ele olhou para o teto daquela caverna colossal e parecia ver luzes multicoloridas girando e ao mesmo tempo voltou a ouvir aquele piado de um pássaro desconhecido, o mesmo que o havia atraído para dentro do bosque. Num ímpeto descontrolado ele desceu correndo pelas escadas, chegou na rua e foi em direção à construção imponente no final da alameda. Seu pulso estava tão acelerado que parecia prestes a explodir quando chegou nas portas do palácio. Sorrindo descontrolado ele dá os primeiros passos em direção à escada que circunda toda a construção. Sobe correndo quase sem ver as colunas quadradas que sustentam todo o peso do edifício e um grande olho de cristal, pedras preciosas e uma íris de ouro, posicionado bem em cima da porta principal, que estava toda aberta revelando um interior resplandecente, tal a quantidade de peças de ouro, prata e jóias dispostas pelas paredes e pelos corredores. O piso era de mármore branco e vermelho tão polido e liso, até perigoso de tão escorregadio. Os lábios de Cedric tremem e começa um formigamento crescente que se espalha pelos dedos das mãos e dos pés.

    Distraído pela quantidade de jóias ele então se depara com o objeto principal daquele salão: Um enorme pássaro esculpido num bloco de mármore, cujos olhos incandescentes pareciam ter vida e movimento, dois olhos que lançavam raios de luz em todas as direções. Cedric vê vários pássaros saindo do corpo principal daquele ídolo em pedra, pássaros translúcidos que voam ao redor do teto formando uma espiral que se afunila em direção ao topo vazado da construção. Ao mesmo tempo ele começa a ver lagartos rajados translúcidos subindo pelas paredes e rastejando pelo chão, e vozes e sons agudos. " O que será isto? Estou tendo alucinações?" Agora ele percebe seus dedos azulados pela fosforescência da tinta das paredes mas não percebe que seu corpo todo está azulado como seus dedos e seus olhos saltados quase pulam fora das órbitas. No teto daquele templo, pois sem dúvida que era um templo, ele vê uma projeção de imagens assustadoras onde inúmeras pessoas com feições tristes e crispadas de medo, trajando roupas desconhecidas e adornos pelos corpos participam de um ritual oferecido ao grande pássaro de mármore, onde filas imensas destas pessoas desconhecidas esperam em silêncio para entrar no grande templo e beber taças de algum veneno poderoso, pois caem fulminadas ao fim do conteúdo. Antes tomado pela euforia ele agora está horrorizado pela compreensão súbita revelada a ele, e somente a ele, do relato do fim daquele povo, dizimado em poucos dias num suicídio coletivo ordenado por quem? Isto ele não sabe e isto não lhe foi revelado. Os sinais da intoxicação avançam rapidamente pelo seu corpo jovem e ele se ajoelha pois o ar já lhe falta. O desespero chega sem piedade e toda a euforia escorre e desaparece naquele túmulo coletivo. Cedric olha ao redor e está completamente sozinho, pois ele havia chegado sozinho e ali permaneceria sozinho, outro pássaro translúcido voando em espiral rumo ao teto do templo numa viagem rumo ao desconhecido. Antes de fechar seus olhos pela última vez ele olha para o teto do templo onde lê e entende em seus momentos finais o que estava escrito no portal de entrada: " Mais uma alma curiosa que chega para alimentar a fome sem fim".

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Blaise e Baruch auxiliaram a Polícia nas buscas pelo amigo desaparecido. Rastrearam os sinais deixados por Cedric na mata durante vários dias, a apreensão crescia e o desânimo aumentava com o insucesso da localização de quaisquer indícios, apenas algumas pegadas que terminavam na direção da mata fechada e uma marca de alguma coisa bastante pesada no solo com leves traços de uma tinta azulada na terra e só. E por fim, como nada foi encontrado a polícia suspendeu as buscas e a imprensa deixou de cobrir o fato pois outros assuntos sempre surgem e sempre hão de surgir.


Ivan Henrique Roberto

23/02 a 07/03/2009


Autor: Ivan Henrique


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