O Dia Em Que Eu Perdi A Barca



Quando eu era menino, a travessia Rio-Paquetá-Rio era feita pelas velhas barcas da Cantareira, das quais ainda me lembro bem da TERCEIRA, da QUINTA, da SÉTIMA, da IMBUÍ, da GRAGOATÁ, da CUBANGO e da MARTIM AFONSO. 

Era uma viagem de duas horas e, às vêzes, ainda mais, quando as máquinas não estavam bem reguladas ou quando o casco das embarcações estavam cheios de “cracas” ( moluscos com uma carapaça em forma de concha e que vivem agarrados nos rochedos ou nos cascos das embarcações). 

Eu morava em Paquetá e estudava no Continente, no Colégio de São Bento e, geralmente, aproveitava essas viagens para fazer os deveres da escola ou para botar o meu sono em dia. 

E foi o que aconteceu certa vez, quando eu perdi a barca que saía do Rio às seis e meia da tarde e, então, tive que esperar pela próxima, que só sairia às dez e meia da noite.

Foi uma longa espera na estação da Praça XV, no Rio de Janeiro, onde eu fiz todos os deveres da escola e ainda conversei um bocado com outras pessoas que também haviam perdido a barca das seis e meia, de modo que quando chegou a que sairia às dez e meia, eu já estava exausto e a primeira coisa que fiz quando entrei nela foi me deitar num dos seus longos bancos de madeira e dar um “cochilo” para me restaurar do cansaço de toda essa longa espera ... Eu usei a maleta em que eu carregava os meus cadernos como travesseiro, me encolhi bastante e usei o meu casaco como cobertor. 

Foi um “cochilo” e tanto, e quando eu acordei, eu pensei que ainda estivesse dormindo ... e sonhando ... pois estava tudo muito claro ! ... 

E quando eu me levantei, reparei que a barca estava cheia de gente e que todos estavam se encaminhando para a proa ... 

Eu me levantei e, ao olhar para fora, vi a Ilha Fiscal, que fica na Praça XV , e só então é que eu me dei conta de que eu passara toda aquela noite dentro da barca, que ficava atracada em Paquetá durante a noite e que saía às cinco e meia da manhã, como estava fazendo agora, rumo à Praça XV, na sua primeira viagem do dia ... 

E só quando eu cheguei no Colégio é que eu vim a saber de toda a aflição por que passaram os meu pais naquela noite, pois que já haviam me procurado no Colégio, na Polícia, no Pronto-Socorro e até mesmo no Instituto Médico Legal ... 

COISAS DE PAQUETÁ...


Autor: Marcelo Cardoso


Artigos Relacionados


Embaixo Do Calçadão...

A Colônia Dos Pescadores

Doze Lugares Chamados ‘paquetá’

Camaleão

Theo De Carvalho - Segundo AniversÁrio

About Me

Despoética