APLICAÇÃO DO DESIGN GRÁFICO NA ELABORAÇÃO DE PROJETOS QUE FACILITAM A VIDA DO DEFICIENTE VISUAL



Aplicação do Design Gráfico na elaboração de projetos que facilitam a vida do deficiente visual.

Abrahão Lincoln Ferreira*

Fabiana Simões Temponi Machado**

Luciano Apolinário Bicalho***

RESUMO

O conhecimento é construído à partir da interação do homem com o ambiente físico e social no decorrer de sua vida. Esta interação acontece através dos sentidos visual, auditivo, gustativo, olfativo, vestibular e tátil.

Todos os sentidos trabalhando juntos indicam as possibilidades e limites de um determinado objeto, à partir do momento em que o olhamos, escutamos, cheiramos, experimentamos e/ou tocamos. Mas e quando um destes sentidos nos falta?

Nos primórdios da humanidade, o portador de deficiência visual era considerado um peso para a sociedade. O cego era banido do convívio social, desprezado pela família e obrigado a viver como pedinte nas entradas das cidades. Quem tentava ajudar ou, simplesmente, tocava um deficiente visual era tido como "impuro", passando por vários rituais de purificação para que não se contaminasse com a maldição de nunca enxergar.

No globalizado mundo contemporâneo em que vivemos, a preocupação é contrária a estes ultrapassados estigmas sociais. Contribuir na busca de soluções para problemas enfrentados por pessoas com deficiência, seja ela física ou mental, é imprescindível para romper as barreiras pré-conceituais, sanar limitações e valorizar o potencial do deficiente.

Este é o universo do Design Sensorial, proposto neste artigo: explorar as sensações humanas e aplicá-las em peças gráficas e produtos, capazes de serem compreendidos e aceitos por qualquer pessoa, independentemente de suas limitações físicas.

Palavras-chave: Design Sensorial, Deficiência Visual, Acessibilidade, Inclusão Social

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* Estudante Univesitário Graduando em Design Gráfico Universidade Vale do Rio Doce

[email protected]

** Estudante Univesitário Graduanda em Design Gráfico Universidade Vale do Rio Doce

[email protected]

*** Estudante Univesitário Graduando em Design Gráfico Universidade Vale do Rio Doce

[email protected]

1. INTRODUÇÃO

Não há como definir qual é o sentido mais importante na vida de um ser vivo. Para os que pensam que o tato é o menos dispensável a alguém, podemos encontrar milhares de pessoas que não possuem os membros superiores e, mesmo assim, se adaptaram às condições do seu corpo e levam uma vida normal. Como, por exemplo, o cantor mexicano Tony Melendez, da Nicarágua, que nasceu sem os braços, mas guia seu carro normalmente (com um equipamento adaptado para dirigir com os pés), e toca violão brilhantemente. Ele é sucesso em seu país e já tocou até para o Papa – que o aplaudiu de pé e agradeceu pelo exemplo de superação.

Aos que defendem a audição como o principal sentido, podemos averiguar casos não raros de surdos que são excelentes profissionais, com alto poder de concentração e interação com a equipe de trabalho.

O importante é que cada um de nossos sentidos possuem um grau de relevância, que culminam em sucesso absoluto quando utilizados em conjunto. Porém, quando um destes sentidos é falho ou inexistente, é preciso buscar soluções sensoriais que possam suprir, de maneira satisfatória, a lacuna deixada por esta deficiência.

O objetivo deste presente artigo é utilizar-se dos sentidos não visuais, aliados ao design gráfico, para levar mais conforto e cultura para deficientes visuais. Para sua constituição foram realizadas análises bibliográficas e oficina prática.

Este artigo foi desenvolvido durante a disciplina de Métodos e Técnicas de Pesquisa, no 6º período do curso de Design Gráfico da Universidade Vale do Rio Doce, em novembro de 2009.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 Contextualização Histórica dos Deficientes Visuais

A visão é o mais sofisticado e objetivo sentido do ser humano e é ela que nos permite o reconhecimento do mundo externo e fornece o relato, muitas vezes minucioso, que registra simultaneamente posição, forma, cor, tamanho e distância. A percepção visual é uma função bastante complexa e está estreitamente relacionada com outras atividades sensoriais, particularmente com o tato e a sinestesia.

Coloque uma venda nos os olhos e tente permanecer assim o máximo de tempo possível. Levante-se e caminhe, circule entre a escuridão. O objetivo deste exercício serviria para experimentar como é ser cego, mas não é completamente eficaz. Uma vez que, caso fique desorientado, assustado ou tropece sobre qualquer obstáculo, poderá imediatamente retirar a venda, abrir os olhos, respirar fundo e eventualmente imaginar que se não pudesse voltar a olhar o mundo, a sensação de medo consumiria os seus sentidos.

A falta de luz para aquele que está habituado a enxergar é, muitas vezes aterrador, encolhemos perante o gigante que é a escuridão total. Tudo parece ecoar no vazio e os sons se ampliam no espaço.

Tomamos nossos sentidos como produtos adquiridos e, por estarmos habituados às suas funcionalidades, nos falta sensibilidade para construirmos um mundo mais acessível e justo para todos. Mas, para que possamos entender as dificuldades diárias dos deficientes visuais precisamos, primeiramente, entender como a história tratou o deficiente até os dias de hoje.

2.1.1 Quebrando as barreiras

Em um passado ainda próximo, pessoas com deficiência visual, independente de idade ou classe social, eram tidas como fardos para a sociedade, que lhes negava o direito à vida. Tal situação se modifica no contexto religioso da Idade Média, que não mais os sacrifica porém, também não os aceita no convívio social. Desta maneira criou-se uma barreira entre os deficientes e o mundo.

Em meados do século XIX houve uma mudança significativa, mais especificamente em 1825, quando Louis Braille possibilitou o acesso dos cegos de todo o mundo à educação e à cultura, através da criação da escrita em Braille.

À partir de então muito progresso tem sido alcançado no estudo das pessoas com deficiência visual, desde serem tratadas não mais como doentes, até a possibilidade da inclusão social. Apesar de todas estas mudanças, ainda exista a discriminação dentro das próprias famílias.

"Sem informação e sem recursos financeiros, envolvidos em um contexto onde a sobrevivência é a principal luta, os portadores de deficiência ficam esquecidos num canto pela família, pela comunidade e pelas autoridades. Ficam marginalizados do convívio social, sem cidadania, sem dignidade." (RESENDE, 1996, p.16)

Nesta citação de Elisabeth Kátia Vianna Resende, em 1996, o mundo passava por uma atualização em relação aos deficientes e, atualmente, através de uma legislação específica que ampara os portadores de necessidades especiais, concretizou o ideal de uma vida melhor, de maior igualdade para todos – portadores de deficiência ou não. Assim, os cegos podem ter um emprego digno e estudar em escolas regulares, nas quais os profissionais procurarão empregar técnicas de ensino que favoreçam o desenvolvimento social desses indivíduos, evitando seu isolamento psicológico.

O amparo legal é um grande ganho, mas não supre todas as necessidades que um deficiente possuem. Dificuldades básicas existem e precisam ser enfrentadas com compromisso, competência e coragem, pelos familiares, colegas de trabalho e principalmente por profissionais que se dedicam ao atendimento deste grupo.

2.1.2 Ser cego

Uma vida sem graça e sem cores – Seria assim a vida de um deficiente visual? Em alguns casos talvez. Porém, a falta da visão abre a possibilidade de aperfeiçoar os outros sentidos. Ouvir, tocar, cheirar, degustar e sentir ganham uma dimensão toda especial. Neste universo nasce um mundo dinâmico e fascinante. O deficiente visual, impulsionado pela riqueza de experiências sinestésicas, é capaz de se adaptar e levar uma vida produtiva e feliz, mesmo com os obstáculos enfrentados diariamente.

Com a perda da visão, o indivíduo amplia outros sentidos extraordinariamente, a maioria das vezes negligenciadas por nós, que não temos problemas de visão. Ignorar as capacidades do deficiente é privá-lo de um desenvolvimento mais completo, tirando o foco do indivíduo em viver uma vida de descobertas constantes e, erroneamente, transferindo este objetivo em não ser um estorvo para os familiares, amigos e para o mundo.

Um dos objetivos deste artigo é abordar como os deficientes visuais compreendem o mundo que os cerca, como interagem socialmente, e o que anseiam para atenuar, ou até mesmo extinguir, as dificuldades que impelem seu crescimento sócio-cultural.

Por que vivemos em um mundo em que todos estão tão estressados? Por que as pessoas têm sempre tanta pressa? Governador Valadares não é muito diferente de Belo Horizonte ou, até mesmo, de São Paulo, pois faz parte do processo de globalização. Cada indivíduo busca o auto-crescimento: melhor emprego, melhor salário, posição social mais elevada – questões inerentes ao capitalismo, que ascende substancialmente. Estes anseios também fazem parte dos desejos de um cego.

Quando relacionamos a deficiência visual, com o cotidiano e o comportamento social - sentimentos, afetos, experiências, desejos, e história pessoal – entendemos que, simultâneo à capacidade de inter-relacionamento com outras pessoas, objetivadas nas relações e ações partilhadas socialmente, o que se busca é reduzir o impacto da deficiência, onde a perda sensorial e as dificuldades decorrentes são reais, e a forma diferente de aprender e construir conhecimento são essenciais.

As diferenças existem e são concretas, porém são dificuldades individuais e coletivas que podem ser, na realidade, mediadas pelas crenças e contexto social em que o deficiente está inserido, e superadas pelas atitudes sociais – sejam elas positivas ou negativas.

Este tem sido o conceito dos deficientes construído historicamente: a diferença pautada em comparação ao ideal estético, do previsível, do conhecido e, até mesmo, da forma de como agir em locais públicos.

Vamos então pensar que este conceito social possa fazer diferença individual e cultural, que irá enriquecer a vida humana e coletiva do deficiente visual. Isto nos colocará diante de um novo pensamento da deficiência, onde as pessoas diferentes encontrarão espaço para se desenvolver, participar de forma diferente da usual, exercitar sua singularidade e dignidade por caminhos diversos. E esse confronto com o desconhecido, com a diferença na maneira de ser, pensar, viver, agir e produzir, que provocará diferentes reações no cotidiano das pessoas com deficiências, de suas famílias e, em um contexto geral, da sociedade.

"OMS diz que há 600 milhões de deficientes físicos no mundo".

Cerca de 600 milhões de pessoas, ou seja, 10% da população mundial, são deficientes físicas. Segundo Organização Mundial da Saúde (OMS), 80% dessas pessoas vive nos países pobres ou em desenvolvimento. Deste número, apenas 1% a 2% tem acesso a serviços de readaptação. E foram assinalas disparidades entre países ricos e pobres e entre zonas urbanas e rurais.

Os movimentos de luta pelos direitos das pessoas com deficiência têm, muitas vezes, se limitados à busca de igualdade de oportunidades, respeito e reconhecimento das diferenças. Pouco se leva em consideração que o desenvolvimento da autonomia é a oportunidade da participação efetiva dos deficientes na sociedade, buscando sua transformação.

Talvez seja esse o grande desafio contemporâneo: buscar um espaço amplo, que não dê conta apenas da qualidade comportamental do indivíduo, mas que garanta a atuação das pessoas com deficiência nas discussões para formulação de políticas, elaboração de programas e tomadas de decisões como sujeitos co-participantes das alterações sociais.

2.2 Soluções e Aplicações

A vida de um deficiente visual é repleta de obstáculos. Para se ter noção, só é preciso atar os olhos, de forma a anular a visão, e tentarmos caminhar em local ao qual já estamos habituados. Fazendo essa experiência pode-se concluir que os móveis deixam de ser apenas objetos de decoração e passam a ser empecilhos que, por não enxergamos, só os identificamos ao tocarmos ou trombarmos. Mesmo com nossa lembrança visual e familiaridade do local, não nos sentimos confortáveis e confiáveis em nos locomover.

Para auxiliar os deficientes visuais a viver bem neste mundo repleto de obstáculos, foram criados alguns produtos, que tornam o seu dia-a-dia o menos árido.

 

2.2.1 Facilidade na locomoção

A bengala foi o primeiro produto criado para facilitar a locomoção do deficiente visual - inicialmente utilizava-se bastões ou varas, nada seguros ou confortáveis, porém, com o passar do tempo e o desenvolvimento tecnológico, surgiram mudanças úteis e práticas.

Por volta do século XIX registraram-se tentativas concretas e valiosas para descobrir um meio seguro e eficaz para locomoção dos deficientes visuais. Nos Estados Unidos, em 1930, o Lions Club Peoria Illinois, apresentou uma proposta de lei que, após ser aprovada, foi chamada Lei da Bengala Branca. A lei determinava a prioridade no trânsito ao deficiente visual que portasse uma bengala branca. Com o passar do tempo novas propostas foram aparecendo, a fim de facilitar e dar mais comodidade ao deficiente.

Como Leonardo Gontijo, por exemplo, oftalmologista da cidade de Belo Horizonte, que criou um produto intitulado de QUIRÓFARO. São aparelhos com sensores espalhados pelo corpo que permitem os deficientes visuais largarem a bengala e se locomoverem sozinhos.

"A idéia surgiu quando comprei um carro com sensores e percebi que podia ir mais além com aquela tecnologia. Mas esse projeto ainda estava adormecido, e foi acionado quando um senhor simples, que ficou sem visão por causa da diabete, passando a ser dependente dos filhos, entrou no meu consultório e prometi a ele que criaria algo que substituísse a bengala." Leonardo Gontijo.

Ele procurou um eletrotécnico para desenvolver a invenção: São quatro sensores espalhados pelo corpo. No protótipo uma caixa é colocada na cintura e se assemelha a um cinturão. Além de um sensor, dessa caixa, que serve como suporte para todo o equipamento, saem três fios que ligam a outros sensores: um na altura do peito, que se assemelha a um medalhão, e outros dois em cada joelho. Ao ser ligado, o aparelho oferece duas opções ao deficiente visual, que pode escolher entre a sensibilidade auditiva ou vibratória. Quando houver algum objeto a 1,5 metro de distância, soará um apito quando acionará as vibrações".

Gontijo lembra a invenção tem o objetivo de evitar que os deficientes visuais batam a cabeça e o tronco em objetos altos como orelhões, por exemplo, que ficam fora da área de identificação da bengala. Ele ainda observa que a novidade atinge, principalmente, aqueles que tiveram a cegueira adquirida ao longo da vida, uma vez que o cego de nascença é ágil e consegue se locomover com mais facilidade, portanto, raramente aceitam abandonar a bengala. Os que adquiriram a deficiência no decorrer da vida, se sente perdido, inseguro e não se adapta rápido aos auxílios de locomoção. "São para esses que o equipamento será essencial", ressalta Leonardo, que tem testes como base para comprovar a afirmação.

Foram convidamos alguns cegos da Santa Casa de Belo Horizonte para testar o protótipo e o resultado foi muito positivo entre eles. O fisioterapeuta Luiz Edmundo Costa, de 42 anos, teve a oportunidade de testar o aparelho e reconheceu que se trata de uma esperança, porém, se houver um nível mais alto numa calçada ou um buraco no chão, o equipamento não terá uma sensibilidade eficaz. Como se trata ainda de um experimento, Gontijo informou que fará mudanças e instalará um sensor a laser, na cintura do deficiente visual, capaz de fazer leituras do chão. "Assim, quando houver buracos, a pessoa será avisada", diz, acrescentando que os sensores do protótipo, que alertam sobre os obstáculos, são também capazes de ativar som ou vibrações quando o usuário subir degraus.

 

2.2.2 Empresas Conscientes

A cada cem brasileiros, cinco possuem alguma deficiência física. Algumas empresas acreditam que este público é lucro garantido. Pensando nos ganhos e nos deficientes visuais, algumas companhias se preocupam em facilitar a vida destes consumidores, adequando suas embalagens, caso das empresas Miolo Wine Group, Sadia, Natura e Laboratório Aché, que trazem as especificações de seus produtos em leitura braille.

A Miolo Wine Group lançou o primeiro vinho brasileiro com rótulo em braile. A comunicação em relevo traz informações sobre procedência, safra, tipo de uva e tempo de envelhecimento, e é parte integrante do design do rótulo desenvolvido pela Zorzo Design Estratégico.

Os últimos dados levantados pelo censo revelam que 24,5 milhões de brasileiros são portadores de necessidades especiais. Do total, 11,8 milhões, ou seja, 48,1% têm problemas visuais, e 159.824 (0,65%) são completamente cegos.

A Sadia lançou as primeiras embalagens com o braile em agosto de 2000, por sugestão de um deficiente visual, funcionário da Sadia. Hoje, todas as embalagens trazem a marca da empresa, o telefone do serviço de informação ao consumidor, tipo e peso do produto em Braille.

O Laboratório Aché foi o pioneiro a utilizar o sistema braile em suas embalagens, desde 1996. Em julho de 2006 o laboratório lançou a bula em áudio. Para receber o CD o paciente entra em contato com a central de atendimento a clientes, com a prescrição médica em mãos, o CD é enviado gratuitamente pelo correio.

Desde 2000, a Natura, tem se preocupado com clientes portadores de deficiência visual. As embalagens, com escritas em braile, têm o intuito, também, de ter consultores portadores de deficiência visual. A empresa criou o portfólio Natura Braille e Visão Subnormal, uma versão do catálogo de produtos adaptada às necessidades para esses consultores. Impresso em papel reciclado e acondicionado em uma luva de polipropileno oxidegradável, esta peça de inclusão social dispõe de um sistema de pasta fichário, que facilita a atualização do conteúdo. A produção da obra contou com a colaboração e consultoria de um grupo multidisciplinar de especialistas.

2.3 Como transformar o que não se pode ver

A criação de um produto que auxilie na vida de um deficiente visual coloca à prova a criatividade de um designer. Não pela dificuldade em gerar a idéia, mas pela inexperiência da falta da visão. Segundo Vanessa Freitag¹, no decorrer de nossas vidas, gravamos memórias sensoriais que influenciam diretamente na forma como expressamos nossas emoções e interagimos com o mundo. Uma vez que as referências visuais são tão fortes e presentes na vida de pessoas que não tem problemas de visão, como buscar solução para o que não se conhece? Que, neste caso, seria a ausência total das lembranças visuais?

O estudo do modo de vida e das dificuldades cotidianas dos deficientes visuais, podem gerar soluções práticas e simples. Como, por exemplo, o aparelho criado pela estudante de engenharia elétrica, Fabiane Kelle de Almeida¹, para seu trabalho de conclusão de curso na Universidade Positivo, em Curitiba, que facilita a identificação de objetos como roupas e medicamentos para deficientes visuais. O sistema é constituído por uma central eletrônica com um leitor magnético (como os utilizados em lojas, nos sensores de segurança), ligada a caixas de som, e pequenas etiquetas – do tamanho de um botão de camisa – que, ao serem passadas pelo leitor, são identificadas e imediatamente reproduz a frase programada para identificar o objeto em questão.

Porém, usar apenas a audição como substituta da visão, não atende a todas as necessidades daqueles que tem o a visão comprometida e desejam conhecer e se adaptar ao ambiente em que vivem. O propósito do Design Sensorial é utilizar os princípios da Sinestesia como base para a implementação de ações que facilitem a interação do deficiente visual com o mundo que o rodeia.

2.3.1 Sinestesia

A palavra sinestesia vem do grego – συναισθησία: syn, que quer dizer união, junção; e esthesia, que significa sensação. Portanto, Sinestesia é a relação estímulos e respostas sensoriais diferentes. Algo como escutar um som e, imediatamente, sentir um gosto; ou ver uma cor e sentir um cheiro. São raros os casos de pessoas comprovadamente sinestésicas, contudo, em todos os casos registrados, este comportamento não pode ser controlado.

Aplicar a sinestesia ao design é dominar os estímulos sensoriais do tato, audição, olfato e paladar, para suprir a impossibilidade da visão.

2.3.2 Aplicando os outros sentidos

Quando se trata de sentidos, sempre nos lembramos de cinco deles: visão, audição, tato, paladar e olfato. Porém, fisiologicamente, possuímos seis: o último deles, e não menos importante, é o vestibular, responsável pelo equilíbrio e noção de profundidade.

Unindo o tato ao vestibular, um deficiente visual pode conhecer e delimitar o espaço em que

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¹ Mestre em Educação – Linha de Pesquisa 'Educação e Artes'/2008; Bacharel e Licenciada em Artes Visuais pela Universidade Federal de Santa Maria/RS; Professora Substituta de Metodologia do Ensino em Artes Visuais/UFSM.

ele se encontra. Ao entrar em uma sala, por exemplo, através do toque ele é capaz de identificar os objetos e, tomando seu próprio corpo como referência métrica, pode se ter a noção de distância entre um obstáculo e outro – este é o sistema vestibular em ação.

Para ambientação em geral, é possível implantar pisos especiais, em alto relevo. Através deste tipo de revestimento, o cego pode identificar que estará entrando em alguma zona diferente da que ele está no momento. Um bom exemplo, são as agências do Banco Real: todas elas assentaram na calçada um piso especial, com ranhuras e alto relevo, que entra pelo banco e leva a todos os pontos estratégicos (caixas, terminais eletrônicos, gerentes...). Cada vez que um determinado local se aproxima, o piso muda a textura e o deficiente pode guiar-se pela bengala ou, simplesmente, pelo toque dos seus pés (tato).

Outra aplicação arquitetônica de exploração dos sentidos é o uso de dispersores de odores. São pequenos aparelhos, com sensor de presença, que exalam um odor específico cada vez que alguém entra no cômodo. Utiliza-se um cheiro distinto para cada ambiente da residência, aguçando o olfato para reconhecimento e localização.

Os exemplos acima funcionam bem aplicados na arquitetura e urbanismos. Mas como levar o conhecimento através dos sentidos não visuais? Como estimular um cego a entender as pinceladas de um artista, o estudo das cores ou o movimento de uma textura, através das páginas de um livro?

Incitar o conhecimento através de estímulos sensoriais amplia a capacidade de entendimento e adaptação dos deficientes visuais às disciplinas que serão lecionadas. Explorar os materiais gráficos, texturas, tipo de impressão, aliados ao Braile, podem ajudar na educação de cegos e/ou indivíduos que tenham a visão muito comprometida.

Além destes estímulos táteis, o olfato também pode ser aplicado aos impressos. Agregar aromas aos capítulos ou a alguma ilustração, em específico, contribui para identificação de assuntos e paisagens.

Outro recurso que pode ser aplicado é o paladar. O Gadest é um aparelho que, ligado a um computador por uma entrada USB, libera substancias que geram impulsos cerebrais capazes de criar imagens na mente do usuário. Tomando este princípio, pode-se atribuir um gosto para cada cor, local, data ou clima contido nos textos.

Um bom exemplo de como aliar o design ao conhecimento, são as aulas de Artes Plásticas, ministradas pelo professor Álvaro Picanço, da USP. Suas aulas não se restringem ao trabalho

com modelagem e argila, o professor introduz os alunos em um contexto maior, ensinando-os a tocar o próprio corpo, o outro e os objetos; visitam museus e ambientes culturais; exploram tipos de argilas para diferentes formas de modelagem e executam as etapas necessárias à modelagem (conhecer a embalagem e dimensão da argila, cortar a argila para trabalhar, amassar e tirar as bolhas de ar, modelar com molde e livremente).

Junto com as outras crianças, passando pelo preparo da argila até a fase livre de criar e conhecer o que o outro realizou, falando de sua experiência, a criança aprende a conviver, a relacionar-se, a ter disciplina e a acreditar que é capaz de fazer. (MASINI, Elcie F.S. O perceber e o relacionar-se do deficiente visual. Brasília: Ministério da Ação Social, CORDE, 1994.)

2.4 Oficina

O processo de criação do designer é, principalmente, visual. Mas, para criação de peças abrangentes, deve se levar em conta as possibilidades e os limites, da sua criação, e do seu consumidor final. Para tal, é importantíssimo que se envolva todos os sentidos na concepção de um projeto.

Através da aplicação desta oficina no RValadares (Encontro Regional de Estudantes de Design, realizado em Governador Valadares-MG, em outubro de 2009), pretendíamos instigar em nossos companheiros de estudos e profissão, o anseio em utilizar os sentidos para a captação das informações do ambiente que nos cerca e estimular a observação minuciosa da interação entre pessoas e ambiente físico/social, em busca de um Design abrangente, multisensorial e inclusivo, em especial para portadores de deficiência visual. A oficina consistiu em coletar informações de imagens sonoras, palatais, olfativas e táteis (uma de cada vez) e traduzi-las em representações visuais - buscando a inter relação entre estes estímulos.

Trinta pessoas, entre estudantes e profissionais, foram vendados e separados em pequenos grupos, na primeira atividade, os grupos eram munidos de uma caixa escura, com um objeto complexo em seu interior. Cada pessoa do grupo deveria tatear o objeto, tentando memorizar a textura, forma, tamanho, etc. Os encontristas analisaram o objeto com o tempo cronometrado, igual para todos. Depois, transferiram essas informações para o papel. Foi interessante notar o quanto a falta da visão dificultou o processo do desenho. Alguns participantes não se aproximaram em nada do objeto real.

Na segunda atividade, tocou-se uma música instrumental, com trocas de escala e ritmo, e
que os participantes tiveram que transferir a impressão auditiva para o papel, por meio de manchas feitas com giz de cera, sem se preocuparem com formas específicas, apenas com intensidade, ritmo, altura etc. Para estimular o uso do olfato, na terceira parte da oficina, os participantes receberam suportes impregnados com cheiro de substâncias diversas, e conceberam uma embalagem ideal para o cheiro em questão, não se limitando a frascos ou vidros, porém, utilizando apenas formas geométricas.

Durante um quarto momento, distribuímos sucos feitos a partir da mistura de mais de uma polpa de fruta.Os participantes tomarão e idealizaram, através do desenho, o que este sabor representava, suas texturas, cores etc.

Na quinta, e última atividade, os participantes ficaram vendados enquanto eram trocados de lugar e posicionados em duplas, para que se conhecessem através do uso de todos os sentidos disponíveis – excluindo-se a visão.

Ao final de cada momento, os grupos discutiram as dificuldades encontradas e percepções sentidas durante o processo e partilharam as conclusões com o restante da turma.

Pelos depoimentos, durante a partilha, pudemos notar que o objetivo da oficina foi alcançado: os participantes sentiram-se motivados a abraçar projetos que estudem e melhorem as condições de vida dos deficientes visuais. Segundo os relatos alguns alunos, pela primeira vez, sentiram o desejo de utilizar o conhecimento na área do design (gráfico e de produto) para ações com efeitos socioculturais que, verdadeiramente, influencie positivamente na sociedade como um todo.

3. Conclusão

"O propósito de um designer é agregar estética e função a um produto, tornando-o eficiente e atraente para o usuário." (Franchin, Juliana. Sexto Sentido. design-sensorial.blogspot.

com.Rio de Janeiro/RJ. 2008)

Recolher informações, definir uma ordem hierárquica, conceituar, agregar valor, criar, satisfazer o público alvo: tarefas rotineiras (ou, pelo menos, deveriam ser) na vida de um designer. Traduzir através de símbolos, cores e composições a pretensão de um cliente não é tarefa fácil mas, geralmente, o trabalho é voltado para um público considerado normal – que escuta e enxerga bem. A tendência, neste caso, é a execução de projetos semelhantes, quase automatizados. Mas, quando o público-alvo possui restrições sensoriais graves, o planejamento deve ser outro. É necessário imergir no mundo do deficiente, pensar como ele, agir como tal e buscar soluções úteis para seu cotidiano. O design sensorial pode ser mais que boas peças gráficas, pode ser um recurso poderoso no auxilio àqueles que precisam romper suas limitações físicas para que, incluídos na sociedade, sintam-se parte importante e indispensável do mundo que nos cerca.

4. Bibliografia

Borges, J.A, Paixão, B. e Borges, S. - Projeto DEDINHO - Alfabetização de crianças cegas com ajuda do computador - Anais do Congresso Estadual de Educação - Rio de Janeiro - 1998

Borges, J.A. - DOSVOX - um novo horizonte para deficientes visuais - Revista Técnica do Instituto Benjamin Constant - no. 3 - 1997

Borges, J.A. - Projeto Intervox - Documentação Interna da Rede Nacional de Pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia

Leontiev, Luria, Vigotski - Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem - São Paulo, Scipione, 1988

Pimentel, M.. - DOSVOX - O que você deseja - Revista Técnica do Instituto Benjamin Constant - no. 71997

Stillman, R. A. Y. B. e Battler, C. W. O desenvolvimento da comunicação pré-lingüística em deficientes graves - uma interpretação do método Van Dijk. Tradução: Mary Inês R. Mendes Loschiavo. Annals of the Seminars in Speech and Language . 1984.

Torres, I e Corn, A. - Quando houver crianças deficientes da visão em sua sala de aula: sugestões para professores - Revista Técnica do Instituto Benjamin Constant - no. 9 - 1998

BENGALA. Disponível em: http://intervox.nce.ufrj.br/~jrgm/bengala.html

DOSVOX. Disponível em: http://www.nce.ufrj.br/aau/dosvox

EMBALAGENS em Braille. Disponível em: http://valoresdefatos.blogspot.com/2008/06

ESTIMULOS Áudio Visuais. Disponível em: http://www.iel.unicamp.br/revista/index.php

EXPERIÊNCIAS Visuais. Disponível em: http://www.ufsm.br/lav/noticias1_arquivos

IDENTIFICAÇÂO de objetos. Disponível em: http://tecnologia.terra.com.br/interna

INCLUSÂO Social. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/022/22crozicki.htm

PRODUTOS para deficientes visuais. Disponível: http://www.andafter.org/publicacoes

SENSORES Bengala. Disponível em: http://www.redetec.org.br/inventabrasil/sensbenga.htm


Autor: Fabiana Simões Temponi Machado


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