Linhas Tortas



O vento era forte e o frio vinha de encontro ao seu rosto mesmo naquele calor de rachar, era um vento que incomodava, também na altura que estava mesmo que não estivesse ventando qualquer ser humano estaria sentindo aquele calafrio causado pela adrenalina.

 

Os carros que passavam atrás dele também causavam um ventinho que sacudia a sua roupa. Denílson Ignácio Batista dos Santos estava sobre o parapeito de uma das pontes mais movimentadas de sua cidade, essa ponte fazia ligação do leste para o oeste e no horário de pico todo mundo sabe como é que fica esses lugares, um trânsito infernal. Mas até aquele momento tudo caminhava bem, até curiosos pararem para ver qual o motivo daquele louco estar lá em cima de braços abertos, cabeça erguida para o céu com os olhos fechados.

 

Denílson havia chegado no fundo do poço. A empresa onde trabalhava devia pra deus e o mundo, fechou as portas e se mandou pra sua terra natal, Alemanha. Não recebeu um centavo sequer, tudo está nas mãos da justiça e já faz dois anos. Seu salário não era o ideal, mais dava pra manter as coisas, sem ele claro não dava para nada. E tudo que ele havia mantido até então foi por água a baixo. A luz a uns seis meses no gato, a água cortaram ontem, a casa já estava indo pra leilão, cartão de credito acima do 5.000. Com o nome sujo numa loja de varejo onde ele comprou a geladeira e o sofá por 10,00 reais ao mês, não tinha como pegar um empréstimo para começar um negocio. Com a mãe doente não podia comprar remédio, a mulher caíra batera a boca perdera o dente da frente e ficou sem ele não tinha o que fazer. A seis meses nem o cabelo corta, as crianças maltrapilhas, falta material pra escola, tomaram o último copo de leite que sobrara.

 

Sem qualquer vontade de voltar pra casa ele decide subir no parapeito. Se jogar era uma opção ótima por fim a tudo aquilo. E aqueles que dependem de você? “A eles vão se virar melhor sem mim, e eu não os veria sofrerem”. E a fé? E a esperança? Mortas! Numa daquelas igrejas que você encontra na esquina de seu bairro ele ouve “primeiro o dinheiro depois Deus dará seu emprego”. Meio confuso isso não? Estava decidido, a semanas passava ali e cobiçava àquele lugar alto, um bom fim pra vida rápido sem dor.

 

Antes mesmo de se ouvir a sirene dos bombeiros ele se joga, a multidão grita, mães tapam os olhos de seus filhos, senhoras ficam histéricas, e lá se foi mais um cidadão brasileiro. Foram 15 segundos longos, ele nem abriu os olhos, manteve eles fechados desde o parapeito, lá de cabeça erguida para o céu orava: “Pai nosso que estais no céu... seja feita a tua vontade...”. As testemunhas esperavam um baque, freadas brusca, afinal pulara sobre uma avenida. Nada. Absolutamente nada. Todos correram, olharam, e cadê? Do outro lado da ponte uma criança de uns 5 anos puxava o rosto da mãe que não queria ser interrompida, a criança só queria mostrar o homem que pulara caído em cima de um caminhão de areia estático. Morto? Não, ele simplesmente desmaiou e foi levado. Onde? Bem o caminhão foi até uma obra, estavam construindo um prédio enorme não muito longe dali. Quando chegou lá o caminhão manobrou e se pois a despejar a areia. Quando Denílson caiu junto houve uma gritaria de “para, para”, ele estava entupido de areia, tinha areia até na orelha. Deram um jeito de acordar ele, e acordou tossindo, cuspindo, deram-lhe água, e chamaram o engenheiro:

-- O que você estava fazendo lá meu filho?

--Tinha me jogado da ponte.

-- Mas porquê?

 

Não precisava de muita explicação o estado dele ra claro, mais o engenheiro ouviu pacientemente e se condoia no intimo com o choro de Denílson. Todos em volta não acreditaram na história. Hoje Denílson até ri do que lhe aconteceu. E tem motivos para isso, afinal hoje ele é braço direito do tal engenheiro, vai com ele para cima e para baixo nesse Brasil grande, e tirou uma grande loção disso tudo também:

 

“Nesse mundo maluco um dia está empregado outro não, mas por mais que o mundo te desampare Deus nunca te deixa na mão, não que ele quer que você coloque sua vida em risco, não, mas escrevendo certo por linhas tortas ele sempre mostra a solução”.


Autor: Carlos Alberici


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