Gestão Educacional — Desafios e Possibilidades



Este artigo terá como objeto de estudo a Escola Estadual Thomé Ferreira Santiago, sita na cidade de Careiro, no Estado do Amazonas. Uma escola de Ensino Fundamental e Médio, com um largo histórico de liderança autocrática, onde interesses político-partidários sempre estiveram à frente dos interesses político-pedagógicos. Além disso, acrescenta-se ainda a falta de líderes com formação específica. Esperamos que as considerações aqui apresentadas sirvam de reflexão para um estudo aprofundado sobre o tema onde soluções a médio e a longo prazo possam ser encontradas.
Durante muito tempo a escola esteve às voltas com o conceito de “administrador educacional”. Trata-se daquela figura centrada na administração, mormente burocrático-administrativa da escola, onde não havia espaço para a valoração do indivíduo enquanto pessoa. Os resultados escolares eram buscados independentemente de as pessoas estarem ou não sendo percebidas, valorizadas, assistidas. As ações constituíam-se em atos mecânicos.
Quando assumi a direção da Escola Estadual Thomé Ferreira Santiago, em Careiro, Amazonas, havia uma realidade herdada de gestões anteriores: o diretor estava acima de todos, os alunos e a comunidade não participavam das decisões da escola, os professores eram apenas comunicados a respeito daquilo que seria realizado e cada um recebia suas tarefas pré-estabelecidas pela direção escolar etc. Todos, funcionários, professores e alunos eram tratados como coisa sem importância. Em verdade, não havia gestão escolar. O diretor era absoluto em suas decisões. Tudo era uma imensa balbúrdia. Não havia harmonia entre os atores da escola, e a escola, por sua vez, não comungava com a comunidade externa — moradores adjacentes, comerciantes, poderes públicos municipais, estaduais e federais etc.
Curiosamente, mesmo a escola estando sendo prejudicada por esse modelo atroz de liderança, contudo, era um padrão com o qual todos estavam acostumados. Daí a grande dificuldade de absorção de um novo modelo, a de “gestão educacional”.
Heloísa Luck (2006) diz que “gestão é [...] caracterizada pelo reconhecimento da importância da participação consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre a orientação e planejamento de seu trabalho”. Foi o que passamos a fazer na escola Thomé. Os professores não estavam acostumados a tomar parte nas discussões e decisões importantes da escola. Os alunos não estavam acostumados a serem ouvidos e participarem de reuniões com a direção e os professores para decidirem os rumos da escola. Os pais nunca antes haviam sido chamados para serem ouvidos e opinarem sobre a escola. Tudo isso foi recebido com estranheza.
Tratava-se de uma mudança de paradigma. A questão agora não era mais o que um queria e achava melhor para a escola. Mas, o que os pares queriam e entendiam ser o melhor para a escola. A “administração educacional” tornou-se em “gestão educacional”. Luck diz que gestão educacional surge “em substituição a ‘administração educacional’, para representar não apenas novas idéias, mas sim um novo paradigma, que busca estabelecer na instituição uma orientação transformadora, a partir da dinamização de rede de relações que ocorrem, dialeticamente, no seu contexto interno e externo” (HELOÍSA LOCK, 2006).
Essa substituição, contudo, não pode ser vista como a simples troca de uma terminologia por outra, por questões puramente semânticas. “Trata-se, sim, da proposição de um novo conceito de organização educacional”, como diz Luck. A idéia de gestão é superar limitações e ousar mais, onde tudo é responsabilidade de todos, mormente do gestor. Não pode ser confundido, no entanto, com um abrir mão de responsabilidades. Mas, permitir que todos partilhem de idéias, sugestões, planos e realizações em prol do desenvolvimento educacional. Entenda-se com “todos”: gestor, professores, técnicos, funcionários, alunos, pais, comunitários e demais parceiros da escola.
Uma escola autônoma exige uma gestão compartilhada. E essa gestão requer um gestor que necessariamente tenha uma visão holística da escola e da educação. Alguém que seja capaz de acompanhar as mudanças que estão ocorrendo não apenas em sua área de conhecimento e ambiente de trabalho, mas também em outras áreas do saber e na sociedade como um todo. Daí torna-se importante rever a formação desse líder. “Verifica-se, então, que a formação do gestor precisa estar atrelada ao nível de escolaridade que priorize a visão e a compreensão desse líder educador para que sua ação seja efetivamente de qualidade ao acompanhar as modificações que estão ocorrendo na sociedade como um todo e no grupo em que interage” (RIBEIRO e MONEZI, P. 41, 2002).
Para tentar dirimir o problema, a SEDUC/AM tem oferecido cursos de capacitação para gestores educacionais da rede estadual, visto que a grande maioria desses profissionais não tem formação em Pedagogia, mas, sim, em outras licenciaturas. Apesar de todos os esforços ainda é mister que sejam revistos os currículos dos cursos de formação de gestores educacionais e que tais conteúdos se voltem para uma visão que se coadune aos novos paradigmas.
Com o novo modelo de gestão implementado na E. E. Thomé Ferreira Santiago, os professores, funcionários, alunos e pais de alunos, por estarem participando das discussões e das decisões, passaram a valorizar mais a escola e, por conseguinte, tornaram-se mais críticos e exigentes quanto aos seus direitos, não só no que diz respeito a educação, mas no que tange a sua cidadania como um todo.
Uma outra característica que se espera encontrar no gestor é a capacidade de ser resiliente. “Ser resiliente [...] seria desenvolver capacidades físicas ou fisiológicas conducentes a determinados níveis de ‘endurance’ física, biológica ou psicológica e até a uma certa imunidade que lhe possibilite a aquisição de novas competências de ação que lhes permitam adaptar-se melhor a uma realidade cada vez mais imprevisível e agir adequada e rapidamente sobre ela resolvendo os problemas que esta lhe coloca” (TAVARES, 2001, P. 45).
Acredito que esta seja uma das mais importantes qualidades do gestor, pois não há nenhuma possibilidade de se realizar um trabalho de qualidade sem que haja conflitos. Tais conflitos são inerentes ao processo de mudança e necessários, pois possibilitam novos conhecimentos e, conseqüentemente, crescimento e desenvolvimento. No entanto, se não estamos abertos para as contradições e conflitos, agimos inadvertidamente, nos precipitamos e perdemos a oportunidade de aprender algo novo, e de propiciar melhorias. Portanto, ser resiliente é condição indispensável, como se pode perceber nas palavras de José Tavares: “[...] trata-se também de uma qualidade, de uma capacidade de as pessoas, pessoalmente ou em grupo, resistirem a situações adversas sem perderem o seu equilíbrio inicial, isto é, a capacidade de se acomodarem e reequilibrarem constantemente” (TAVARES, 2001, P. 46).
Em suma, o líder escolar precisa desvencilhar-se dos ranços da administração educacional e incorporar a concepção de gestor educacional. Não deve, contudo, substituir uma terminologia por outra de modo mecânico e despropositado. Mas, carregando com a terminologia toda uma filosofia nova, uma proposta nova, um significado novo que implica em mudança de paradigma. Isto é, um novo modelo de liderança, uma nova visão, novos desafios, novos métodos.
Associado a isto, o gestor educacional precisa ter claro e incorporado o conceito de resiliência. Ele precisa, de fato, ser capaz de conviver com diferentes tipos de situações e de tensão, sem, contudo, perder o equilíbrio e o poder da racionalidade. Precisa ser capaz de lançar aos outros os mesmos desafios e produzir neles as mesmas qualidades.
Autor: Rubem Menezes


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