Alianças Estratégicas: A Evolução do Relacionamento Entre o Fornecedor e o Varejo Supermercadista



1 INTRODUÇÃO

O propósito deste trabalho, que apresenta questões relacionadas às alianças estratégicas, está muito bem definido na seguinte frase: “A maneira menos atraente de tentar vencer em termos globais é pensar que você pode abraçar o mundo sozinho.” (WELCH, 1987 em palestra, citado por YOSHINO e RANGAN, 1996, p. 3)
O relacionamento entre a indústria e o setor supermercadista tem sofrido constante evolução. De ruidoso a desconfiado, ele hoje apresenta uma realidade diferente. Diante de um cenário de crescente competição, surge a necessidade de trabalhos cooperados, seja vertical ou horizontalmente. Com isto a confiança e a transparência estão se tornando palavras de ordem. E a aliança estratégica é a conseqüência desta transformação, hoje tida como fundamental para o desenvolvimento, tanto da indústria quanto do varejo.
No entanto, o mercado sente a necessidade de entender melhor este processo. É preciso saber os parâmetros sob os quais estas alianças estão ocorrendo e principalmente, quais benefícios elas têm gerado para os parceiros envolvidos.
Este artigo apresenta uma breve evolução do setor varejista brasileiro, destacando suas principais transformações e tendências, aborda o desenvolvimento no relacionamento entre os canais varejo e indústria, incluindo a influência de variáveis externas, como a tecnologia, para então, diante deste levantamento, penetrar no cerne de sua proposta, as alianças estratégicas, e mais estritamente as alianças entre o varejo supermercadista e seus fornecedores, procurando enfatizar a importância e evolução do relacionamento no desenvolvimento das organizações envolvidas neste processo.
O tema alianças estratégicas é bastante difundido e discutido em diversos países já há algumas décadas, sobretudo nos Estados Unidos. Em função disto boa parte do referencial utilizado neste trabalho é de autores americanos. No Brasil, o tema tem ganhado grande ênfase nos últimos anos e devido a isto ainda há poucos livros que tratam diretamente do assunto. Porém, é possível encontrar trabalhos acadêmicos recentes e de grande importância sobre alianças estratégicas, alguns dos quais, com contribuições presentes neste artigo.
Este é, portanto, um trabalho de pesquisa, com ênfase no relacionamento, e que visa elucidar questões propostas pela problematização do tema, sobretudo o desafio das organizações diante de um cenário de grande concorrência.
Neste aspecto Mckenna (1993) faz uma importante contribuição ao questionamento proposto, ao dizer que as empresas precisam praticar estratégias de marketing que representem as novas tendências de esforços para manter um relacionamento comercial duradouro e estável com seus clientes.

2 EVOLUÇÃO E TENDÊNCIAS DO VAREJO SUPERMERCADISTA NO BRASIL

Das vendas intermediadas por um balcão ao sofisticado atendimento prestado hoje pelo auto-serviço, muita coisa aconteceu em mais cinqüenta anos de história. São diversos os fatores que, de forma isolada ou conjunta, contribuíram para a transformação do setor, dentre os quais podemos destacar os econômicos, os mercadológicos, os tecnológicos e o comportamental.
No período inflacionário a principal atenção do varejo estava voltada para a gestão dos estoques. “As mudanças freqüentes nas tabelas de preços dos fornecedores fazia com que as empresas comprassem grandes quantidades de produtos, posto que viam seus depósitos valorizarem dia a dia.” (SANTOS, 2005, p. 2). Mais tarde, a mudança desta realidade econômica associada ao forte crescimento da concorrência, inclusive com a chegada de multinacionais, forçou um salto de qualidade na gestão de diversos setores, envolvendo principalmente a diminuição do nível dos estoques, a melhora nas condições físicas das lojas, a intensificação de promoções e uma gerência mais eficiente dos custos. Toda esta evolução foi fundamental para se criar as bases da etapa atual de evolução, cujo foco é o atendimento às demandas do consumidor.

A evolução das gestões citadas, tanto a comercial quanto a funcional, foi necessária para operacionalização da otimização dos recursos do varejo, mas o gerenciamento principal deve agora voltar-se para o entendimento das necessidades do consumidor. (SANTOS, 2005, p. 2)

Esta evolução com foco no consumidor tem ocasionado um fenômeno nesta última década, na qual se tem presenciado um grande crescimento da participação de lojas menores, conhecidas como lojas de vizinhança, que com um conceito renovado procuram atender com maior eficácia às exigências do consumidor. “É o renascimento de um estilo de comércio muito comum no passado, com atendimento personalizado, grande variedade de produtos frescos e conveniência” (PENTEADO, 2006, p.18).
As transformações sociais, as exigências da vida moderna, as mudanças nos padrões de consumo e suas conseqüências têm transformado o cenário supermercadista. Afoitos por bom atendimento, rapidez e praticidade, os consumidores do século 21 são os maiores responsáveis por esta evolução no setor, e o fortalecimento do pequeno varejo, que é comprovado por uma recente pesquisa da AC Nielsen.

Pelo segundo ano consecutivo os números do ranking mostram que as lojas de até 250 metros quadrados, ou seja, as pequenas unidades foram as que mais cresceram. Elas mantêm histórico de crescimento alavancado em 2001... (SUPERHIPER, 2006, p. 42)

Seja pela mudança na postura das grandes redes ou pelo fortalecimento do pequeno empreendimento supermercadista por meio de associações, a pesquisa revela números que constatam o crescimento deste formato de loja, cuja participação de mercado saltou de 16,9% em 2001 para 45,6% em 2005.
A edição anterior desta mesma pesquisa já apontava este movimento e mostrou que uma das principais razões do crescimento do pequeno varejo é a mudança do hábito de compra, com o grande aumento dos gastos com reposição. O consumidor está indo mais vezes às lojas e realizando compras menores. (LUKIANOCENKO, 2005)
No tocante às tendências deste mercado, além das exigências básicas de bom atendimento, variedade e preços competitivos, tem-se percebido que a integração social aparece como requisito de extrema importância para o setor.

Para o setor supermercadista, ações de fomento a educação e profissionalização de jovens e até mesmo adultos, preservação do meio ambiente e oficinas culturais são de suma importância e perfeitamente realizáveis. Afinal, um supermercado é parte integrante, atuante e influente na comunidade em que se insere (...). Ações efetivas de responsabilidade social já são praticadas por mais da metade dos supermercados brasileiros. (HILÁRIO, 2006a, p. 128)

2.1 Canais de distribuição

Importantes e necessários, os canais de distribuição, também conhecidos como canais de marketing, são os responsáveis pelo “caminho” seguido pelas mercadorias de suas fábricas até seus destinatários finais, os consumidores. No escopo desta pesquisa os principais intermediários que compõem estes canais são: os fabricantes; os atacadistas; os varejistas; os transportadores, tratados por Kotler (2000) como facilitadores; e os consumidores.
Os níveis dos canais podem ser maiores ou menores em função de fatores diversos, como o ramo de atuação, a disponibilidade financeira, estratégias de marketing, etc. Neste aspecto:

Um canal de nível zero (também chamado de canal de marketing direto) consiste em um fabricante que revende diretamente para o consumidor final. (...) Um canal de um nível conta com um único intermediário de vendas, como um varejista. Um canal de dois níveis conta com dois intermediários. Nos mercados de bens de consumo, estes são normalmente um atacadista e um varejista. Um canal de três níveis conta com três intermediários. (...) Há canais de marketing ainda mais extensos. (KOTLER, 2000, p. 512)

Um número maior de canais tende a aumentar a distância entre o fabricante e seu consumidor.

2.2 O Relacionamento entre os canais

A história do relacionamento entre a indústria e o varejo é secular e tem acompanhado as inúmeras transformações pelas quais os dois setores têm passado. Inicialmente esta relação tinha como marco a sensação criada pela indústria de que o varejo era quem consumia sua produção, “...sua atividade produtiva não estava centrada na visão direta das necessidades e desejos do consumidor final, ela simplesmente produzia aquilo que os atacadistas e varejistas demandavam.” (MIRANDA, 1997, p. 5)
Ainda segundo Miranda (1997) com o desenvolvimento dos mercados e os aumentos exacerbados de produção e concorrência, as indústrias foram gradativamente percebendo a necessidade de desenvolverem-se para suprir os anseios e desejos de seus consumidores finais, passando a enxergar a relação direta entre o atendimento deste consumidor e sua prosperidade.
Partindo desta nova percepção, foi preciso criar um ambiente mais favorável para que juntos, o comércio e a indústria conseguissem superar os desafios de manterem-se saudáveis em mercados tão competitivos. Diante desta necessidade nasce a idéia do varejista como integrador:

O comerciante tem que ser um integrador, tanto internamente – sintetizando os recursos tecnológicos e as necessidades de mercado – quanto externamente, levando o cliente para dentro da empresa como participante do processo de desenvolvimento e adaptação de mercadorias e serviços (MCKENNA ,1993, p. 5)

Ao tratar da nova relação entre o comércio e a indústria, Miranda (1997, p. 12) ressalta que “...se você tem uma loja que recebe a visita de consumidores interessados na aquisição de produtos capazes de atender às suas necessidades e alguém tem uma indústria que fabrica esses produtos, vocês são “aliados” naturais em potencial...”, e que as possíveis adversidades na relação entre os dois canais é fruto de uma distorção da natureza e objetivo de seus negócios.

2.2.1 O impulso dado pela tecnologia

A automação do setor supermercadista, que se acelerou na década de 90, permitiu ao setor várias evoluções. Angelo e Silveira (2001) citam, por exemplo, a maior dinamicidade no atendimento ao cliente nos check outs, e a maior, mais rápida e mais confiável, disponibilidade de informações gerenciais.
Além deste avanço, dois outros instrumentos, trabalhados de forma cooperada entre a indústria e o varejo têm contribuído para uma maior eficiência do serviço prestado ao consumidor: O EDI (Eletronic Data Interchange - Transferência Eletrônica de Informações); e a ECR (Efficient Consumer Response - Resposta Eficiente ao Consumidor).
O EDI é uma ferramenta de troca eletrônica de informações entre a indústria e seu revendedor, atacadista ou varejista, que permite, entre outras coisas, a transmissão eletrônica de pedidos, possibilitando uma redução no tempo entre a transmissão do pedido e a entrega da mercadoria, redução da possibilidade de erros e redução de custos (NAZEM, 1996, citado por ANGELO; SILVEIRA, 2001).
“A ECR é uma iniciativa da indústria, envolvendo processadores, atacadistas e varejistas, que objetiva melhorar a eficiência na distribuição dos produtos” (CONNOR; SHIEK, 1997 citado por ANGELO; SILVEIRA, 2001, p. 28)

Algumas vantagens do uso do ECR são: redução dos estoques de todo o sistema, promoções de produtos mais eficientes e introdução eficiente de produtos. Para atacadistas e varejistas: Melhor fluxo de caixa, maior eficiência dos estoques e redução dos custos administrativos. Para a indústria: maior eficiência da produção, melhor gerenciamento do inventário e melhor eficiência de promoção. (CONNOR; SHIEK, 1997 citado por ANGELO; SILVEIRA, 2001, p. 28)

Ainda em evolução, estas duas ferramentas são grandes aliadas tanto da indústria quanto dos varejistas e distribuidores e permitem uma aproximação entre as mercadorias e os serviços entregues conjuntamente por estes canais na perspectiva de demanda cada vez mais apurada dos consumidores. A grande revolução neste setor porém, deve ocorrer com a adoção do código eletrônico de produto (EPC), também conhecido como etiqueta inteligente. “É o padrão que utiliza tecnologia de identificação por rádio freqüência (RFID), será a grande mudança no conceito de identificação de produtos e trocas de informações dentro da cadeia de suprimentos, e especialmente no varejo.” (MATSUBAYASHI em entrevista, citado por HILÁRIO 2006b, p. 62). Dentre as principais vantagens deste sistema, o destaque é novamente a agilidade na geração de informações gerenciais, principalmente as relacionadas à gestão de estoques. O desenvolvimento deste sistema exige um trabalho conjunto entre as indústrias e as redes de varejo e já está sendo testado, tanto no Brasil quanto no exterior. (HILÁRIO, 2006b)

3 ALIANÇAS ESTRATÉGICAS

Alianças estratégicas são frutos de uma necessidade mercadológica de ganho de competitividade. “...é a união de empresas em prol de um objetivo comum, utilizando-se para isso de suas competências individuais a fim de se fortalecerem mutuamente dentro do mercado no qual estão inseridas, sendo elas concorrentes ou não.” (PACANHAN; CHIUSOLI; STAHL, 2004 p. 3) Seguindo a linha dos benefícios do trabalho cooperado, encontramos a sinergia ao averiguar que “...um mais um deve resultar em mais do que dois. Essas alianças devem proporcionar aos parceiros maior probabilidade de sucesso em um contexto competitivo do que se entrassem sozinhas em um empreendimento.” (LORANGE; ROOS, 1996 p. 11) Lewis (1992) destaca que, com as alianças estratégicas as empresas provêm o acesso a uma gama maior de recursos, aumentando sua capacidade de expansão, produção, redução de custos, inserção de novas tecnologias, enfim, ganho de escala e uma situação privilegiada frente aos concorrentes.
As alianças estratégicas são motivadas por fatores diversos. E estes fatores estão relacionados basicamente à posição das empresas frente ao mercado, e à importância estratégica do negócio envolvido na aliança, em relação ao negócio da empresa como um todo. Estes fatores se inter-relacionam formando as quatro motivações genéricas das alianças estratégicas. Temos, portanto, a defesa, como a motivação principal das empresas para as quais o negócio envolvido apresentar aspectos estratégicos de grande relevância para a empresa, e esta ocupar uma posição de liderança frente ao mercado. Se o negócio apresentar característica apenas periférica para esta empresa, a motivação será classificada como de permanência. Já para uma empresa seguidora no mercado, um negócio de grande relevância será motivado pelo aspecto da aquisição. Para algo periférico a motivação, nesta empresa, estará caracterizada pelo aspecto da reestruturação (LORANGE; ROOS, 1996).

3.1 Tipos de alianças

As alianças estratégicas são classificadas fundamentalmente em função do grau de relacionamento, pela interdependência entre as partes envolvidas e pelo nível de envolvimento das partes no negócio. Porém, não há um consenso na classificação das alianças em função de alguns autores não considerarem joint ventures como alianças. Podemos perceber isso na definição do professor Júnior (em entrevista, GÔNDOLA, 2006) quando este destaca que as alianças precisam manter a independência de cada empresa para que nenhuma perca sua autonomia.
Partindo de acordos provisórios e informais, as alianças se estruturam de formas diversas chegando à formação das joint ventures plenas, este caminho é decorrente do grau de envolvimento e interdependência das partes na formação das alianças. Quanto maior o envolvimento, mais bem definida e estruturada tende a ser a aliança (LORANGE; ROOS, 1996).
Lewis (1992) em sua classificação dos tipos de alianças, primeiramente as difere entre cooperação informal e contratos formais, alianças caracterizadas pelo compromisso mútuo, em que maiores envolvimento e clareza estão presentes naquelas formalmente contratadas. Em seguida aponta as alianças de capital - investimentos minoritários, joint ventures e consórcios – nas quais temos a presença clara da divisão do controle, e este passa a exercer peso igual ou maior que o compromisso. Por fim, Lewis aponta as redes estratégicas, classificadas por ele como uma combinação entre os formatos anteriores, e um misto variado de compromisso e controle.
Há também a classificação das alianças entre verticais e horizontais. Pacanhan; Chiusoli; Stahl (2004) descrevem suas características e vantagens. As alianças verticais são as formadas entre a empresa e o fornecedor, ou entre a empresa e seu cliente. Sob o ponto de vista do cliente, entre as principais vantagens estão, a possibilidade de melhores condições de compra, exclusividade de revenda e aquisição de conhecimento e tecnologia. Por parte do fornecedor, destacam-se a criação de barreiras a seus concorrentes e a facilitação de ações estratégicas. Já as alianças horizontais são as formadas por empresas que atuam no mesmo canal, neste caso, por varejistas concorrentes. Entre os principais ganhos nesta parceria estão, o aumento da credibilidade junto aos fornecedores e a otimização em processos diversos, como compras, armazenamento, distribuição e ofertas, além da redução do ambiente de hiper concorrência.
Dentro deste aspecto de alianças horizontais e verticais, Júnior (em entrevista, GÔNDOLA 2006) nega a existência de distinção entre alianças e parcerias, e esclarece que há um posicionamento no mercado no sentido de enquadrar as parcerias como acordos verticais e as alianças como acordos horizontais. Porém neste trabalho o termo aliança é empregado para ambas as situações.

3.1.1 Alianças entre fornecedores e supermercadistas

Alianças estratégicas é tema cada vez mais presente no dia a dia do acirrado setor de supermercados. Através de pequenos acordos informais ou grandes contratos de parceria, os supermercados e seus fornecedores buscam uma saída para manterem-se vivos neste mercado.
Simpósios, convenções e matérias em revistas ajudam a disseminar a idéia, esclarecer dúvidas e combater o grande entrave às parcerias no setor, a desconfiança. Tomando com exemplo a reposição de estoques “o ambiente de desconfiança chega a ser tão grande que o varejista tende a recusar as informações do fabricante sobre as perspectivas de giro de cada produto.” (MIRANDA, 1997, p. 88).
Fruto das incertezas e consequentemente, do risco, a desconfiança é um fenômeno muito debatido e está intimamente ligado às relações de parceria. Lane (1997, citado por Rodrigues, 1999) “...identifica três perspectivas sobre as bases da confiança”: a calculista; a cognitiva e a normativa. Rodrigues (1999) as diferencia da seguinte maneira: a confiança calculista está baseada na garantia de que as partes agirão conforme o combinado porque a punição pela violação é maior do que os ganhos, ou porque as recompensas por preservar a confiança compensam qualquer tentativa no sentido de quebrá-la. Já a confiança cognitiva prevê a certeza adicional de que um dos parceiros pode predizer razoavelmente as atitudes dos outros com base nas expectativas compartilhadas. E a confiança normativa possui característica ainda mais interpessoal, estando baseada no relacionamento e até mesmo no afeto entre as partes. Rodrigues (1999) ressalta ainda que o estabelecimento da confiança em uma parceria interorganizacional estará fortemente amparado na relação interpessoal daqueles que estão à frente do processo e a união não pode sustentar a confiança se a base calculativa ou cognitiva desaparecer.
Estabelecida a confiança, são diversas as vantagens que podem ser obtidas através das alianças estratégicas, afinal “ao estabelecer alianças estratégicas com seus fornecedores, o varejista coloca todo o universo de empresas com as quais trabalha a serviço do sucesso de seu negócio” (MIRANDA, 1997, p. 76).
Miranda (1997) discorre de forma bastante detalhada sobre os benefícios destas parcerias, sempre destacando a nova realidade do relacionamento entre o varejo e a indústria, na qual, cada vez mais a indústria produz esforços no sentido de criar instrumentos de apoio às vendas dos varejistas e o encontro do denominador comum através da abertura do diálogo entre as partes. Neste sentido o autor aponta situações como: a utilização de materiais e ações promocionais que podem divulgar os produtos (de forma complementar ao conjunto de ações de divulgação planejadas pelas indústrias) e esclarecer dúvidas dos clientes; disponibilização de mão-de-obra para as atividades de merchandising, que inclui o abastecimento e organização das gôndolas; utilização de espaços para montagem de balcões ou quiosques específicos para alguns fornecedores; melhor ajustamento na reposição de estoques, evitando faltas e diminuindo a necessidade de estoque; a venda de espaços publicitários por parte dos varejistas, como sacolas e placas luminosas entre outras.
No tangente à exposição das mercadorias, a ferramenta do gerenciamento por categoria merece especial atenção. Miranda (1997) destaca a importância do desenvolvimento de um trabalho correto de exposição de mercadorias e alerta que apenas uma em cada cinco pessoas que não virem um determinado produto na gôndola irá perguntar por ele.
Conseqüência quase sempre de trabalhos realizados em parcerias entre indústrias e supermercadistas, o gerenciamento por categoria tem como objetivo básico a organização da exposição das mercadorias no intuito de criar um cenário de compras no qual o consumidor consiga com naturalidade encontrar o que procura. “O gerenciamento por categoria agrupa os produtos em uma exposição que obedece a lógica de compras do consumidor” (FREITAS, 2006, p. 11). Sua implementação contribui com a diminuição das rupturas, e faz aumentar as vendas por impulso e de produtos de maior valor agregado, somando-se a isto, o aumento da satisfação do cliente. Porém, o uso desta ferramenta de gestão não se resume à simples organização das gôndolas. Para gerir uma categoria, é preciso conhecer e compreender as vendas dos itens, tanto individualmente quanto em grupo e conhecer suas margens de contribuição. Este conhecimento proverá condições de definir prioridades e necessidades no momento da exposição e na gestão dos estoques. É preciso também definir um mix adequado de produtos para atender melhor às necessidades dos clientes. Mas fundamentalmente, é preciso conhecer os desejos e expectativas dos consumidores. Enfim, trata-se de uma gama de informações que precisam ser observadas para que se possa maximizar os benefícios do trabalho de gerenciamento.
Outra oportunidade de ganhos que resultada de uma parceria entre o varejo e a indústria é a marca própria, que atravessou um período turbulento no setor supermercadista e busca estabelecer-se como uma alternativa estratégica interessante para ambos os canais. As marcas próprias participam com 6% do faturamento do setor supermercadista nacional, o que corresponde a quase R$ 7 bilhões de reais, e a previsão é de que alcance R$ 8,1 bilhões em 2006 (LUKIANOCENKO, 2006). Em cobertura a um simpósio sobre marcas próprias realizado pela Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), Lukianocenko (2006) destaca que as marcas próprias representam uma grande oportunidade de fidelização da clientela. E ressalta que as marcas próprias deixaram de ser um artifício para o aproveitamento da ociosidade por parte da indústria, tornando-se uma oportunidade de estreitamento das relações com os supermercados. O novo papel inovador da marca própria é destacado por Klots (em seminário, citado por LUKIANOCENKO, 2006), que afirma que “A detentora e a fabricante da marca própria precisam estar atentas ao desenvolvimento do produto. Não é só copiar e sim pensar em pesquisar e dar margem também à inovação”.

3.2 Desenvolvimento, gerenciamento e mensuração de alianças

A analogia entre o desenvolvimento das alianças estratégicas e aspectos cotidianos de nossas vidas está presente na bibliografia que discute o assunto.
As alianças são, em certos aspectos, comparáveis ao nascimento e crescimento de uma criança. Ao nascer necessitam de acompanhamento mais próximo, sendo extremamente dependentes de seus progenitores. E com o seu desenvolvimento, ganham aspecto de auto-sustentação, chegando em alguns casos à total independência (LORANGE; ROOS, 1996). Outro aspecto cotidiano apontado como comparação às alianças é o casamento. A idéia é apresentada em função de a cooperação fundamentar-se na necessidade de confiança e compreensão mútuas, que se desenvolvem através de esforços ao longo do tempo levando a parceria à eficácia (LEWIS, 1992).
Lorange e Roos (1996, p. 38) destacam ainda a importância vital da fase inicial da aliança:

Em nossa experiência, a criação de uma aliança estratégica bem-sucedida é definida durante seu processo inicial de formação. É nessa fase que as dimensões analíticas e políticas e os assuntos devem ser discutidos com clareza e que a base de confiança e harmonia comportamental é estabelecida.

Porém estes mesmos autores dão destaque a uma etapa anterior e fundamental ao sucesso de uma aliança estratégica, o planejamento. Eles ressaltam a importância de entender a capacidade e as forças conjuntas envolvidas. E a necessidade de que a aliança seja benéfica a ambos os lados. É preciso discutir aspectos como o enfrentamento da concorrência, a análise do cenário e as vantagens competitivas trazidas pela aliança. Estas vantagens são apresentadas pelos autores em quatro áreas: O ganho na relação com os fornecedores, principalmente no condizente ao poder de barganha; a possibilidade de entregar maiores benefícios aos consumidores, procurando satisfazê-los de forma plena; o desenvolvimento de novas tecnologias, podendo levar a uma diferenciação frente aos concorrentes; e o bloqueio a novos entrantes, com a diminuição dos espaços para a ação dos concorrentes.
Outro aspecto crucial, cuja discussão deve acontecer ainda na fase inicial da formação da aliança, é a clareza dos objetivos. Lewis (1992) relata a importância de um esclarecimento entre as partes no condizente a seus objetivos na formação daquela aliança estratégica e alerta para o risco de um não esclarecimento na fase inicial poder desencadear uma situação conflitante, diminuindo o potencial de ganhos da aliança. Além de necessário para evitar conflitos futuros, a clareza na definição dos objetivos é também fundamental na mensuração dos resultados em uma aliança, conforme veremos adiante.
Também digno de destaque, o desenvolvimento estratégico é colocado como essencial no desenvolvimento e condução de uma aliança:

Uma aliança sem boas bases estratégicas ficará perdida no mercado competitivo, e nenhuma quantidade de “química” irá salvá-la. A menos que tenham motivação estratégica, as alianças tornam-se dispositivos táticos, adquirindo um caráter momentâneo, deixando de produzir os resultados desejados e acabando por desfazer-se. (LYNCH, 1994, p. 124)

Porém, apesar de todos os aspectos positivos das alianças estratégicas já apontados, os riscos também estão presentes neste empreendimento, e sua divisão entre as partes é apontada como a consolidação do vínculo. O compartilhamento de riscos é necessário, deve acorrer de forma justa, e tende a funcionar como um encorajador no enfrentamento dos desafios e busca pelo sucesso. (LEWIS, 1992).
Feito o planejamento e definidas as prioridades e objetivos das partes na aliança, o gerenciamento deve ocorrer de forma a facilitar o desenvolvimento do acordo. Lewis (1992) destaca vários aspectos que devem ser considerados e que podem agir como agentes facilitadores neste processo de gerência. Ele cita a necessidade de compreensão por parte dos envolvidos da necessidade de transformação de cada um, para um ajustamento às suas novas e conjuntas necessidades. Também é preciso que se tenham definidos de forma explícita os papéis de cada pessoa envolvida no projeto, procurando sempre designar atribuições aos mais capacitados para cada tarefa, independente de seu poder econômico ou político. A comunicação entre os envolvidos nas tarefas deve ser direta e dinâmica, dispensando a unificação das informações em gerentes de projetos, que poderia enfraquecer o entendimento mútuo e diminuir o interesse dos times. Porém, os gerentes envolvidos devem acompanhar de perto o desenvolvimento do projeto, buscando de forma conjunta fazer uma revisão dos progressos alcançados.
Apesar da definição de diversos processos a serem seguidos para um resultado mais eficaz em uma aliança e da reconhecida importância destes processos. Lewis (1992) admite que, mesmo nas alianças contratualmente formalizadas, o desenvolvimento dos processos tendem a fazer com que o relacionamento torne-se o fator preponderante no alcance dos resultados.

Os compromissos verdadeiros são desenvolvidos, não decretados. As alianças não podem funcionar sendo gerenciadas de cima para baixo por cada uma das empresas. A dedicação real deve vir daqueles que estarão diretamente envolvidos. As empresas fazem acordos, as pessoas os implementam. (LEWIS, 1992, p. 110)

Por fim, a mensuração de resultados é, também nas alianças estratégicas, de extrema relevância na composição do negócio. E a aferição dos resultados está intimamente ligada à clareza dos objetivos. Financeiros ou não, os principais objetivos de uma aliança devem ser definidos de forma muito clara, respeitando as peculiaridades de cada aliança e procurando estabelecer parâmetros quantificáveis para cada uma das dimensões definidas como foco. (LYNCH, 1994)
Em continuidade a sua idéia, Lynch (1994) destaca dois fatores fundamentais no acompanhamento e mensuração das alianças estratégicas: a formulação de metas, que devem funcionar como uma tradução detalhada do caminho a ser percorrido para o alcance dos resultados previamente definidos; e a criação de marcos de referência, capazes de permitir que os resultados sejam medidos por etapas, dando condições às partes de avaliarem o retorno e o caminho percorrido até então para decidirem se continuarão trabalhando da mesma forma, se farão ajustes na condução, ou mesmo se cessarão a aliança.

4 CONCLUSÃO

Os trabalhos cooperados, sob a forma de alianças estratégicas representam de fato uma grande oportunidade de diferenciação e vantagem competitiva em um mercado de acirrada concorrência como o de supermercados.
Através das abordagens relatadas neste trabalho percebemos - ao estudar o desenvolvimento do setor supermercadista brasileiro - que ele tem enfrentado uma grande transformação, sobretudo no que diz respeito às mudanças e lapidações das preferências dos consumidores. A mudança no hábito de consumo com ascensão das pequenas compras em um número maior de visitas às lojas transformou o formato das lojas, aumentando seu número e diminuindo seu tamanho. Tal fato tem dado aos pequenos varejistas a oportunidade de explorar o conhecimento de sua região e seu público frente às grandes redes. E as associações, tanto entre lojistas quanto sob a forma de alianças com os fornecedores, têm dado ao pequeno e médio varejo condições de competir, também em termos comerciais, com as grandes redes.
Vimos também que as alianças não são simples, envolvem riscos, decorrentes das incertezas e estarão sempre amparadas no desenvolvimento do relacionamento entre as partes, incluindo aí o desenvolvimento da confiança nas relações.
Este estudo nos mostrou ainda o quão essencial é o planejamento e a exposição clara das necessidades e objetivos de cada um, fatores que permitirão um acompanhamento mais preciso no desenrolar da parceria.
Mesmo tratando-se de um tema relativamente novo, principalmente no Brasil, a discussão sobre as alianças estratégicas já é alvo de importantes trabalhos acadêmicos e ocupa espaço de destaque na nossa mídia, sobretudo na impressa. Porém, percebe-se ainda grande espaço para exploração deste tema, que cada vez mais, deve ser discutido no intuito de esclarecer dúvidas e criar condições de desenvolvimento de novos modelos de negócios.

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Orientador: Carlos Calic

NUNES, Neimar Rodrigues, graduado em Ciências Contábeis pela UFMG, pós-graduando em Marketing e Comunicação pelo Centro Universitário UNI-BH e membro do time de vendas da Unilever Brasil.
CALIC, Carlos, graduado em Administração e Ciências Contábeis pela PUC Minas, Especialista em Administração com ênfase em Marketing pela Fundação João Pinheiro, Mestre em Engenharia
da Produção pela UFSC, Professor de Marketing da Pós-Graduação da UNI-BH, IEC PUC Minas e Centro Universitário Newton Paiva.
Autor: Neimar Nunes


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