O PODER CONSTITUINTE NA CARTA MAGNA DE 1988



O PODER CONSTITUINTE NA CARTA MAGNA DE 1988

A Constituição é a lei suprema de um Estado: “É a lei fundamental do Estado [...] lei maior” (SOUZA, 1998:29). Para garantir a sua correta elaboração, para organiza-la, constituí-la, reestrutura-la (quando preciso e possível), “dar-lhe corpo”, como comenta o autor TEMER (2000), existe uma equipe de representantes eleitos pelo povo que detêm certo “poder”, chamado “Poder Constituinte”, que é a “Assembléia Constituinte”. De acordo com Emannuel Sieyès, comenta SARAIVA (1995) dizer o doutrinador que: o poder constituinte é um poder absoluto, incondicionado, criador da Constituição.
É de comum acordo entre diferentes autores esta posição, e também que existem duas espécies de poder constituinte: “originário e derivado”. Alguns ainda apresentam mais uma ramificação, conhecido como poder “decorrente” (SOUZA, 1998), que é exercido nos Estados Federativos pelos Estados-Membros, através de assembléias estaduais, sendo secundário e, também, subordinado e condicionado.
O poder constituinte originário é aquele inicial, que é feito pela primeira vez, instituindo possibilidades de sua reforma, com vistas a adaptar preceitos da ordem jurídica a novas realidades. Neste sentido é relevante citar: “Não está regido pelo direito positivo do Estado (estatuto jurídico anterior), mas é o mais brilhante testemunho de um direito anterior ao Estado” (BASTOS, 1988:145). Já o poder derivado é aquele pelo qual algo já constituído vem a ser “reformulado”. Diferente do poder originário, que é o poder de fato, como expõe TEMER (2000), o poder derivado é denominado de reformador.
Como comenta o mesmo autor, o poder constituinte originário tem a função de criar, pela “primeira vez” o Estado, com a sua “Constituição”, mesmo que existam outras (caso do Brasil que teve outras antes de 1988). Explica: “O Estado brasileiro de 1988 não é o de 1969, nem o de 1946, de 1937 [...]. Historicamente é o mesmo. Geograficamente poder ser o mesmo. Não o é, porém, juridicamente” (TEMER, 2000:33).
De forma simples, pode-se dizer que o poder originário edita uma Constituição nova em substituição a uma Constituição anterior, dando origem à organização jurídica fundamental (FERREIRA FILHO, 1999). Neste ínterim: “A ordem constitucional nova, por ser tal, é incompatível com a ordem constitucional antiga. Aquela revoga esta” (TEMER, 2000:38). Ocorre, então, o fenômeno da “recepção”, para dar continuidade às relações sociais, recepcionando os instrumentos normativos anteriores dando-lhes novo fundamento de validade.
O poder derivado ou instituído, é constituído, segundo FERREIRA FILHO (1999), pelo Poder Constituinte Originário e dele retira a força que têm, podendo modificar, completar ou institucionalizar os Estados federados da Constituição.
É relevante acentuar a posição deste autor, que garante que o Poder Constituinte se manifesta onde já existem instituições políticas, e contra elas, onde a Constituição já está estabelecida, editando uma nova Constituição, através de “revoluções”. Tal poder foi claramente utilizado no caso da Constituição Federal do Brasil de 1988, a qual tomou lugar da Constituição anterior, fazendo com que essa deixasse de ser verdadeiramente Constituição, com o estabelecimento da nova lei fundamental, a partir da convocação da Assembléia Constituinte. A atual Constituição foi convocada por meio da Emenda Constitucional n.º 26, de 27/11/1985, à Constituição que era vigente à época (1967), segundo FERREIRA FILHO (1999). Neste caso, inexistiu a ruptura revolucionária que condiciona, conforme o mesmo autor, “manifestações do Poder Constituinte Originário”. De maneira adversa, a Assembléia Constituinte foi “convocada” por intermédio da Emenda citada.
A este respeito é relevante:
A Constituição brasileira em vigor fixa limitações materiais e circunstanciais, além de prever uma revisão constitucional decorridos cinco anos de sua vigência (1993), ou seja, limitações circunstanciais – proibição de emendar a Constituição durante intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio (art. 60, § 1º); limitações materiais – proibição de sequer deliberar sobre propostas tendentes a abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos poderes.... (FERREIRA FILHO, 1999:30).
Não resta dúvidas, então, que a atual Constituição do Brasil foi estabelecida por um poder derivado, visto haver a convocação da Assembléia Constituinte, resultando em “reformas” da Constituição anterior, a atual sendo estabelecida, no entanto, com total obediência às normas que eram então vigentes, mas que, como cita FERREIRA FILHO: “... por resultar num texto totalmente refeito e profundamente alterado, deu origem a uma nova Constituição” (1999:32).
Do ponto de vista do autor BASTOS (1988), porém, a Constituição não pode ser “reformada”; pode sim ser suprimida, conservando-se o poder constituinte que é permanente, ou destruída de vez. Porém, ele comenta que há necessidade de pressupor uma norma básica, porque sem ela nenhum ato humano pode ser interpretado como um ato legal, ainda mais como um ato criador de norma. Seguindo a doutrina de Emannuel Sieyès, BASTOS diz, finalmente, que o poder constituinte tanto cria quanto modifica a Constituição.
Importante citar, para finalizar: “Não há falar-se, pois, em exercitação de poder constituinte originário, pelos parlamentares brasileiros que elaboraram e aprovaram a vigente Carta Magna” (SARAIVA, 1995:13). O poder que se manifestou na Constituição de 1988 foi caracterizado pela utilização do poder constituinte derivado, revisor e atualizador dos princípios e normas constitucionais, como expõe o autor TAVARES: “O poder constituinte derivado [...] designa a parcela de competência atribuída ao próprio corpo legislativo encarregado de elaborar as leis em geral, por meio da qual se confere a faculdade de modificação da Lei Magna.” (2002:45)
Desta forma, conclui-se então, que a Constituição Federal de 1988 foi “atualizada”, “reformada”, “reformulada” pela Assembléia Constituinte Nacional, como comenta SARAIVA (1995), que detém o poder derivado de atualizar os textos constitucionais, adaptando-os às novas realidades sociais, políticas e jurídicas, se respaldando na Constituição já existente.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives G. Comentários à Constituição do Brasil. Vol. 1, cap. 25. São Paulo: Saraiva, 1988.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Cap. 4. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
SARAIVA, Paulo Lopo. Manual de Direito Constitucional. Cap. 1. São Paulo: Editora Acadêmica, 1995.
SOUZA, Nelson Oscar de. Manual de Direito Constitucional. Cap.1. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. Cap. 3. São Paulo: Saraiva, 2002.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. Cap. 2. 16 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.
Autor: Silvana Aparecida Wierzchón


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