Caverna Digital



INTRODUÇÃO

A Realidade Virtual se apresenta como o mais recente desenvolvimento de uma linhagem de tecnologias de comunicação cuja principal intenção é propiciar ao receptor a ilusão de estar na presença imediata do objeto da representação. Tal enquadramento na linhagem predominante da história dos meios visuais de representação determina que, pelo menos inicialmente, os sistemas de realidade virtual permaneçam atrelados a formas de representação espacial consideradas 'realistas' e 'transparentes' no presente contexto cognitivo e cultural. Lévy (1996) afirma que o virtual envolve novas formas de espaços e velocidade, surgindo um compartilhamento de tudo, tornando difícil distinguir o que é público e privado, o que é próprio e comum, o que é subjetivo e objetivo.

A expressão realidade virtual é utilizada para denominar um conjunto bastante amplo de aplicativos e sistemas de base digital. As definições mais rigorosas restringem o campo da realidade virtual a sistemas digitais tridimensionais multi-sensoriais e imersivos. Segundo essa abordagem, são considerados sistemas de realidade virtual apenas aqueles que:

...aumentam a intensidade [da representação] através de técnicas descritas como imersão sensorial – ao invés de olhar para uma tela, por exemplo, uma pessoa fica cercada por imagens e som estereoscópico percebidos com auxílio de fones de ouvido e visores. Utilizando equipamentos especiais para entrada de dados, como luvas e roupas especialmente instrumentalizadas, as pessoas podem mover-se e interagir diretamente com os objetos do mundo virtual (Laurel, 1993, p. 54).

Conceituações mais abrangentes não são incomuns. Um número crescente de aplicativos e usuários considera que o campo da realidade virtual inclui as mais variadas estratégias para representação do espaço tridimensional, inclusive as descrições exclusivamente textuais típicas dos Multi-User Dungeons (MUDs), é um RPG multijogadores, que normalmente é executado em um servidor na Internet, e afins. Uma ordenação conforme os graus de envolvimento sensorial possível permite identificar pelo menos nove tipos diferentes de sistemas de realidade virtual atualmente disponíveis (Fragoso, 2002). Todos esses sistemas, assim como as diversas definições e conceitos de realidade virtual, têm em comum, como ponto fundamental, a intenção de produzir a sensação de estar 'circundado' por um ambiente definido tridimensionalmente e com o qual é possível interagir.

1. Artistas Multimídia

Rejane Cantonifocaliza sua pesquisa na engenharia dos sistemas de realidade virtual, instalações interativas com dispositivos de aquisição e manipulação de dados em ambientes sensorizados e automação. É artista e pesquisadora de sistemas de informação. Doutora e Mestre pelo Programa de Comunicação e Semiótica da PUC-SP; Mestre em Visualização e Comunicação Infográficas pelo Programa de Études Supérieures des Systèmes d? Information da Universidade de Genebra, Suíça; e Professora do Departamento de Ciências da Computação da PUC-SP.

Daniela Kutschat Hanns É artista e pesquisadora de mídias e tecnologias digitais. Desenvolve sistemas de integração corpo-espaço de dados (interfaces homem-computador) para ambientes interativos e de realidade virtual. Tem se dedicado também à implementação de robôs autônomos adaptativos (Behaviour Based Robotics). Artista em Residência no Centre for Advanced Inquiry in Interactive Arts (CaiiA-STAR) em 1998, Doutora em Artes pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo em 2002, é professora dos Cursos de Design Multimídia e Especialização em Design do SENAC Comunicações e Artes e da Pós Graduação em Design/Arte Tecnologia da FEBASP.

2. O Projeto OP_ERA

É uma ferramenta de experimentação multisensorial de conceitos de espaço.Desenhada como um ambiente imersivo-interativo para sistemas de realidade virtual, a implementação de OP_ERA compreende a pesquisa e o desenvolvimento de: modelos científicos e artísticos de espaço; interfaces homem-computador (hardware e software) através dos quais agente humano e agente artificial (computador) estão interconectados simbioticamente; formas alternativas de percepção e de cognição espacial através da experimentação de modelos conceituais de espaço.

Um aspecto muito importante no trabalho das artistas é a experimentação multisensorial. Em que ambas tentam criar sistemas em que a expressão não é só visual. Ou seja, todos os sentidos do corpo podem ser ativados e podem colher informação do ambiente. E é exatamente o trabalho com computadores, que possibilita transformar o pensamento do artista em diferentes formas de respostas para o espectador.

Vivemos em um mundo analógico e recebemos as informações de uma forma analógica. É justamente por isso que as interfaces são importantes. Ou seja, o computador capta informações analógicas, as processa de uma forma absolutamente abstrata e depois dá um retorno, também analógico, que permite ao usuário sentir o que o artista propôs. Johnson (2001) define interface, em seu sentido mais simples, como software que permitem a interação entre usuário e computador, atuando como uma espécie de tradutor, ou seja, a interface traduz a linguagem da máquina para uma linguagem humana, sendo responsável na tradução dos zeros e uns para uma linguagem compreensível às pessoas.

Batizado de OP_ERA, arte óptica, o projeto premiado é também objeto de pesquisa científica da dupla. Cantoni define o projeto como uma "ferramenta de experimentação multisensorial de conceitos de espaço".
OP_ERA é uma espécie de instalação imersiva que, através da sincronia de feixes de luz, simula a revelação de uma nova dimensão onde se criam objetos artísticos essencialmente geométricos que elevam o ato da percepção visual, ao passo de que a experiência do espectador dá-se a nível óptico, normalmente pela contemplação de composições de elementos modulares. Essas composições são resultados de sistemáticos estudos de linhas, cores e formas que criam efeitos visuais que renunciam a qualquer necessidade de repertório.

A artista busca com o uso dos elementos tridimensionais virtuais, a mesma interação que os trabalhos da Arte Op, corrente estilística que surgiu por volta dos anos 50 nos EUA que propunha as variações dos elementos de acordo com a movimentação do espectador pelo espaço.

A idéia de OP_ERA é investigar as questões relativas ao corpo e ao espaço colocadas pela física e pela arte.
Para alcançar esses objetivos, as artistas com sólida formação em arte e tecnologia – utilizam como principal recurso a realidade virtual.

Fruto de uma parceria que começou a tomar forma em 1999, a instalação do OP_ERA é a sexta montagem do projeto, e leva o nome de Sonic Dimension (dimensão sônica).

A cada nova versão, Kutschat e Cantoni procuram discutir diferentes aspectos relativos a modelos científicos e artísticos de espaço.

2.1 OP_ERA 2001

Desenhado como um sistema de realidade virtual portátil (formato palco) OP_ERA 2001 foi implementado em três etapas simultâneas: a primeira etapa foi dedicada ao desenvolvimento de uma interface háptica. Esse dispositivo é uma matriz de sensores infravermelhos que funciona como uma superfície sensível capaz de detectar a posição e orientação do interator no espaço. A segunda etapa focalizou o desenvolvimento do agente artificial, computador (hardware e software). A arquitetura dessa máquina é capaz de converter e interpretar inputs sensórios; simular modelos de espaço; renderizar e apresentar dados como gráficos e elementos sonoros em tempo real. A especificação do hardware dessa máquina é : 1 chip Intel Pentium III 800Mhz; memória RAM 256Mb; 1 Hard Drive 6.4Gb; 1 placa gráfica Matrox (dual head); 1 placa PCI Matrox, 1 placa de som sound blaster PCI 128 e uma porta paralela. O computador foi programado utilizando as linguagens C e C++ em ambiente LINUX, tendo uma biblioteca Open GL como estrutura primária construtiva. Esta arquitetura foi desenvolvida no Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. A última etapa compreendeu a construção do ambiente onde agente humano e agente artificial interagem.  O espaço físico foi concebido como uma caixa, na qual o piso é a face sensível; as faces do fundo, lateral direita e boca de cena compõem três planos de projeção.

2.2 OP_ERA 2003

A Caverna digital brasileira é um sistema imersivo composto de 5 telas de projeção de 3x3x3m– um grande campo visual que possibilita ao usuário a sensação de imersão em imagens que parecem ser 3D. Uma das inovações dessa CAVE é que ela não utiliza enormes computadores. Seu processamento utiliza um cluster de computadores PC, que estão precisamente sincronizados. O desenvolvimento desse sistema representou um grande desafio para a equipe uma vez que não existia software disponível para fazê-lo.

O cluster de computadores foi programado utilizando as linguagens C e C++ em ambiente Windows, tendo uma biblioteca Open GL- DiceLib como estrutura primária construtiva.

Essa versão do projeto também envolveu a pesquisa e o desenvolvimento de software específico para modelagem das dimensões visual (estereoscópica) e sonora. Óculos especiais e dispositivos de rastreamento que medem a posição do usuário dentro da Caverna, por exemplo, foram utilizados para produzir sensações de profundidade e de interação em tempo real, respectivamente.

A interface sonora também foi desenhada e implementada especialmente para o  projeto. A arquitetura de áudio utiliza uma placa MOTU que prevê 8 in/out canais sonoros independentes.

Esse sistema octofônico (espacial) também varia, em tempo real, conforme a posição do usuário. O áudio foi programado em software Max MSP para plataforma Macintosh, interfaceado ao cluster via MIDI.

O output sonoro, assim como o visual obedece a arquitetura lógica do projeto, i.é, suas regras. O esquema sonoro se estrutura: (1)  na evolução de um som puro, um som senoidal que se transforma em um som complexo, (2) na história da música e do som.

Esse conjunto de regras se traduz em sons puros na primeira dimensão sonora. Na segunda dimensão sonora o output conta a história dos instrumentos que produzem a música ocidental. A terceira dimensão sonora parece com um repertório típico do século 20 e a quarta é baseada em partículas sonoras orientadas no espaço.

2.3 OP_ERA 2004

Esse trabalho compreende 3 ramificações: OP_ERAHAPTIC INTERFACE (é um experimento que utiliza uma luva de dados e sistema estereoscópico para visualizar e manipular atratores de Lorentz); OP_ERA HAPTIC WALL (apresenta uma parede-interface desenhada para produzir no usuário estímulos táteis a partir de dados sonoros que são capturados por meio de um conjunto de microfoens localizados dentro e fora do ambiente expositivo. Quando um microfone captura um som o software o sampleia e o converte em outputs que controlam uma matrix de atuadores embutidos na parede. A arquitetura desse projeto é uma parede 8 x 2m revestida por uma pele artificial de latex natural); OP_ERA HYPERVIEWS ( instalação imersiva, desenhada para explorar representações de objetos de 4D via interfaces multimodais (visual e sonora). A arquitetura desse projeto é um cubo escuro de 3x3x3m. Em 5 paredes desse espaço, um sistema automatizado dispara flashes sincronizados de luzes que representam projeções temporais de vertices de objetos de 4D.

Esses estímulos visuais são programados para proporcionar nos usuários efeitos de pós-imagens. Para construir figuras mentais de dimensões superiores o programa utiliza 3 regras: (1) desdobramento do hipercubo em dimensões inferiores; (2) exame de projeções e sombras; (3) análise de interseções e cross section.

2.4 OP_ERA 2005

OP_ERA SONIC DIMENSION é uma instalação imersiva e interativa desenhada como um instrumento musical. O instrumento tem a forma de um cubo preto e aberto (três paredes de 4x3m cada), preenchido por centenas de linhas que se parecem com as cordas de um violino. Afinadas com a tensão adequada, essas cordas virtuais vibram com uma freqüência (de luz e de som) que varia de acordo com sua posição relativa e modo de interação.

Em OP_ERA SONIC DIMENSION existem dois modos de interação: no primeiro modo, a interface de entrada é um conjunto de microfones. que coletam sons produzidos pelos interatores. Quando um microfone captura um som, o software analisa, filtra e converte a informação em um output visual correspondente. Isto é, se o interator produz um som, ele verá as freqüências vibrando como cordas de acordo com os postulados Pitagóricos.

No Segundo modo, a interface de entrada é uma malha de sensores. Utilizada para detectar a posição do interator, esta interface permite ao sistema interpretar qualquer ação como uma força gravitacional. Quando o interator aponta para uma corda, por exemplo, além de fazer a corda correspondente vibrar, esta ação modifica a forma do espaço tempo. O objetivo desse projeto é pesquisar a geometria de espaços sônicos e desenvolver interfaces sônicas.

Totalmente suportado por Controladores Lógicos Programáveis, sensores e outras soluções de automação da Atos Automação, líder no mercado brasileiro de controle de processos e automação industrial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 A multimídia não é uma evolução direta de outras mídias, tais como o cinema, o rádio e a pintura, entre outras, mas sim das interfaces e interatividades existentes entre elas. Desde o primeiro manuscrito, passando pelo surgimento da imprensa, até os modernos computadores, deu-se um processo que culmina, com a evolução tecnológica, na interação entre todos os meios e formas de comunicação já criados pelo homem. Portanto, os conceitos de interface e interatividade assumem crucial importância para compreendermos que tipo de atitude devemos assumir perante as mudanças que a introdução destes conceitos provocarão na relações humanas e consequentemente nas relações sociais a curto e longo prazos.

Dinâmicas maiores deverão ser exploradas na evolução dos processos considerando o desenho do espaço, ângulo de projeção, temperatura do ambiente, áudio, tempo de imersão, disponibilidade do usuário, aparatos eletrônicos, sensores, texturas, cheiros, entre outras questões pertinentes ao design.

A transformação de gestos físicos em códigos binários e de informação binária em estímulos sensoriais cria um novo estágio de familiaridade com a máquina, a partir do momento em que lhe confere a capacidade de responder de uma forma quase-humana, corporificada. Assim , Rejane Cantoni e Daniela Kutschat modelam novas perspectivas para o ciberespaço.

REFERÊNCIAS

FRAGOSO, S. Lembranças dos Mídias Mortos. Revista do DECO. Caxias do Sul:EDUCS, 2002.

 JOHNSON, Steven. Cultura da Interface. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001

 LAUREL, B. Computers as Theatre. New York: Addison-Wesley, 1993

LÉVY, Pierre. O que é virtual? SãoPaulo: Ed. 34, 1996.

STRICKLAND, Carol. Arte Comentada: Da pré-história ao pós-moderno. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

Autor: Rafaelle Ribeiro Rabello


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