Colapso francês: o nosso estado de polícia é mais sofisticado?



Warley Belo
Advogado – Mestre em Ciências Penais

A França vive as revoltas dos excluídos. Pobreza, discriminação, falta de perspectiva social, péssimas condições de vida, alto índice de desemprego em meio a uma sociedade consumista formam o manancial de ingredientes explosivos. Parece que estamos falando do Brasil. Mas, por que aqui não há revoltas similares? Seria o nosso estado de polícia mais sofisticado ou eficiente do que o francês?
A exclusão, nas cidades brasileiras, é explícita. As comunidades (nome politicamente correto para designar favelas), muitas vezes, estão incrustadas em bairros nobres. “O neguinho vê por cima do muro” (Racionais MC). Mesmo assim, nossos favelados não reclamam da falta de hospitais, seguridade social, lazer, escola, transporte etc. e, ainda, pagam impostos. Em Paris ou Lyon, ao revés, não se vêem pobres ao lado dos ricos. Vivem fora do anel periférico. Têm melhores condições sociais. Mas, lá há distúrbios nos moldes de Los Angeles, EUA (LA Riots, 1992).
O nosso estado de polícia é mensurável. Efetivamente castiga e ensina aos súditos a serem pacíficos e a se submeterem ao Estado paternal. Entretanto, o estado de direito não existe para essa parcela discriminada da população. Impossibilita-se a constituição de uma visão fraterna, horizontal da sociedade. Só se permite e se estimula a visão vertical. Os excluídos não se reconhecem como tais, raríssimas exceções: grupos de Rap, movimentos sociais politizados ou quando fecham avenidas e ateiam fogo em ônibus em resposta às agressões policiais.
O estado de direito e o estado de polícia agem antagonicamente. Naquele se perseguem as soluções para as causas dos problemas e se limita o poder, nesse há pura repressão dos conflitos se reforçando o poder vertical arbitrário (Nilo Batista). De forma que, se o favelado permanece na favela, não há risco de conflito. Aqui se aceita isso; na França, não.
Não é o nosso estado de polícia mais eficiente ou melhor. Ocorre é a inexistência do estado de direito para os excluídos. Ou seja, ser excluído francês é ter a possibilidade de experimentar parte do estado de direito, mas não todo.
O estado de direito e o estado de polícia co-existem tanto aqui como na França. Mas, lá se pressupõe ser assegurado a todos o acesso ao estado fraterno. No Brasil, o povo habituou-se a ter apenas o estado de polícia porque nunca experimentou o estado de direito, que não lhe pertence. Os nossos outsiders (Howard Becker) não são discursivos, são reais.
Autor: Warley Belo


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