Minha História



Minha História

 

 

Vou contar a minha história,

Quando tinha cinco anos.

Não era como criança,

Eu vivia trabalhando.

 

A família era pobre,

Precisava trabalhar.

Pra poder não passar fome,

Eu tinha que ajudar.

 

Levantávamos muito cedo,

Caminhávamos para a roça.

Às vezes meio dormindo,

Com a enxada sobre as costas.

 

Usava um calçonzinho,

Chamava de chita o pano.

Ali tinha muito espinho,

Chamado bosta de baiano.

 

Que grudavam nesse pano,

Não dava pra discernir.

Se for chita, ou era pano,

Ou era bosta de baiano.

 

 

Os pés eu nem vos conto,

Não podia nem calçar.

Não podia comprar calçado,

E os pés todo estourados.

 

Chegávamos tarde da noite,

Cansados sem alegria.

Sentávamos ali no chão,

Sem comer ali dormia.

 

Levantávamos pela manhã,

Antes de o sol nascer.

Começávamos tudo de novo,

Ate ao escurecer.

 

Não vou dizer que fui santo,

Sei que criança não é.

Sempre aprontava as minhas,

Só hoje sei como é.

 

Quando eu fiz oito anos,

Comecei a estudar.

Subia serra e descia serra,

Até a escola chegar.

 

Meus pais não tinham relógio,

Mas tudo era marcado.

Se atrasasse um pouquinho,

A surra era dobrada.

 

Andava com os pés descalço,

Os colegas riam de mim.

Ficava desesperado,

Por ter uma vida assim.

 

Mas no fundo eu sabia,

Não era culpa de meus pais.

Não sabiam planejar,

E tinham filhos demais.

 

Terminei a quarta série,

O que a escola oferecia.

Queria continuar,

Quem sabe crescer um dia.

 

Por muito pedir meu pai,

Até ele concordar.

Fui estudar na cidade,

Mas próxima daquele lugar.

 

Pra poder ir a escola,

Meu pai emprestou um cavalo.

Perdendo seu ajudante,

Que ajudava no trabalho.

 

Isso durou pouco tempo,

Eu parei de estudar.

Um pouco pela distância,

E tinha que trabalhar.

 

Eu ficava revoltado,

Queria muito estudar.

Precisei sair de casa,

Pra poder eu estudar.

 

Eu cheguei em uma vila,

Precisava trabalhar.

Fui trabalhar de vaqueiro,

Pra poder eu estudar.

 

Eu tinha uns quinze anos,

Quando isso aconteceu.

É uma história tão triste,

Que comigo aconteceu.

 

Levantava às três horas,

Para as vacas ordenhar.

Pra dar conta da tarefa,

Até o dia clarear.

 

Punha o leite sobre a banca,

O carro passava pegando.

Tomava café as pressas,

Continuava trabalhando.

 

Trabalhava o dia todo,

Até a tarde chegar.

A noite ia a escola,

Pra eu poder estudar.

 

Eu dormia na carteira,

E não aprendia nada.

Com tudo não bastasse,

Levantar de madrugada.

 

Não durou por muito tempo,

A lida não agüentei.

Sai daquela casa,

Nem a contas acertei.

 

Fui morar com um parente,

Na vila onde estudava.

Continuei a minha luta,

Para ele trabalhava.

 

Saia de madrugada,

Pela serra nós subíamos.

Só descíamos dessa serra,

Na boca da Ave Maria.

 

Pela manhã bem cedinho,

O chão quase não se via.

Fui picado por uma cobra,

Por pouco quase morria.

 

Comecei a enfraquecer,

Não agüentei trabalhar.

Mandou-me eu ir embora,

Sem quer nada me pagar.

 

Cheguei em uma colônia,

Que meu primo trabalhava.

Arrumou-me um lugar,

Pra poder eu trabalhar.

 

Roupa se quer não tinha,

Para poder vestir.

O novo patrão foi comprar,

Roupas para eu vestir.

 

Comecei a  trabalhar,

Amarelo como safrão.

Comia e estava fraco,

A ferramenta das mãos caia.

 

Mesmo fraco e amarelo,

Porem não desanimei.

Continuei minhas lutas,

Até que um dia parei.

 

Disseram  para meu pais,

Que Rondônia era bom.

Pra poder viver tranqüilo,

E poder ganhar o pão.

 

Era menor de idade

E não pude recusar.

Vim pra cá com os meus pais,

E parei de estudar.

 

Embarcamos em um carro,

Chamado Pau de arara.

Viajamos por dez dias,

Como uma carga fechara.

 

Ali tinha tanta gente,

Vínhamos nos bancos sentados.

Viajamos como porcos,

Ou escravos amontoados.

 

Foi no dia vinte e seis,

De Julho que avistei.

No ano de mil e novecentos e setenta e dois,

Que em Rondônia cheguei.

 

As matas eram tão lindas,

Não tinha desmatação.

Os rios eram tão limpos,

Não tinham poluição.

 

Os Índios andavam nus,

Pelo meio da floresta.

Tudo quanto os queria,

Liberdade, caças e pescas.

 

Com essa nossa chegada,

A triste desmatação.

Pude ver que os homens,

Provocam destruição.

 

Quando cheguei em Rondônia,

Cacoal não existia.

Era Projeto Pic-Ji-Paraná,

O nome que ele tinha.

 

Isso foi por pouco tempo,

O lugar se povoou.

Existia cacau nativo,

Cacoal ele herdou.

 

Morávamos na Linha Doze,

Num lote que conseguimos.

Andávamos cinqüenta quilômetros,

Do lote a Linha Cinco.

 

Mudamos praquele lote,

Andávamos só em picadas.

A comida que comíamos,

Nas costas eram levadas.

 

Com o passar de alguns tempos,

As coisas se inverteram.

Maior parte da comida,

A terra nos ofereceu.

 

Nós colhíamos muitas coisas,

Não  podíamos transportar.

Só andávamos em picadas,

O que não comíamos estragava.

 

Às vezes comíamos sem olho,

Borracha ia tirar.

De Calço para vender,

Para o olho poder comprar.

 

Andávamos trinta e cinco quilômetros,

Do lote a Cacoal.

Pra poder vender borracha,

Pra comprar olho, açucara e sal.

 

Chegando dentro da vila,

O cacaio das costas caia.

Ficávamos atordoados,

Se tentasse andar caia.

 

Descalçávamos alguns minutos,

A pouca compra pegava.

Pegava nossos cacaios,

De volta pra casa voltávamos.

 

Completando ali dois anos,

A coisa modificou.

A estrada foi chegando,

O sofrimento melhorou.

 

Foi feita a primeira escola,

Ali naquele lugar.

Não havia professor,

E mandaram me chamar.

 

Quando cheguei na SEMEC,

Onde fui me apresentar.

Procuraram os documentos,

Pra poder me contratar.

 

Eu peguei os documentos,

Escolar que ali eu tinha.

Meu nome não era este,

Era João Martins de Lima.

 

Meu pai nada entendia,

Era chuco como eu.

Este nome que eu tinha,

João Martins não era eu.

 

O meu nome verdadeiro,

João do Rozario Lima.

Não pode ser contratado,

O tal João Martins de Lima.

 

 

Foi com esse meu problemas,

Que estudar desanimei.

Dediquei-me a lavoura,

Sofri tanto e me casei.

 

Com passar de alguns tempos,

Os filhos foram chegando.

A luta aumentava mais,

E os problemas aparecendo.

 

Tudo que eu plantava,

Não era valorizado.

O frete comia tudo,

Quase não sobrava nada.

 

Por média de uns dez anos,

Esta vida agüentei.

Quando eu vi que não dava,

Pra cidade se mudei.

 

 

Quando mudei pra cidade,

Não foi nada que pensava.

Trabalhar sem profissão,

É o pior que já enfrentei.

 

Trabalhava de sol a sol,

Não podia eu parar.

Enfrentava qualquer coisa,

Para não ter de roubar.

 

Fui servente de pedreiro,

Masseiro e não me envergonho.

Se que temos que lutar,

Pra poder não passar fome.

 

Consegui ter um trabalho,

De guarda pelo Estado.

Eu fiquei muito contente,

Sentia se amparado.

 

O salário que ganhava,

Pouco dava pra comer.

Eu senti necessidade,

De estudar para vencer.

 

Comecei por um estudo,

Que chamava Supletivo.

Tive que estudar de novo,

O que já tinha aprendido.

 

Nesse tempo de estudo,

Ninguém pode me ajudar.

Estudava uma noite,

A outra ia trabalhar.

 

Demoraram alguns tempos,

Este estudo terminou.

Até que eu consegui,

Esta etapa concluir.

 

Queria continuar,

Com toda dedicação.

Concluir o Magistério,

Era a minha paixão.

 

Só existia um colégio,

Que tinha o Magistério.

Eu não conseguia vaga,

Pra mim isso era um mistério.

 

Foi por muito implorar,

Que um dia consegui.

Meu sonho realizar,

Estudar o que queria.

 

As lutas não terminaram,

Mais pesadas elas ficaram.

Meus chefes não me ajudaram,

Ai que a coisa pegou.

 

Estagiava de manhã,

A  tarde ia estudar.

Não contando com o resto,

A noite ia trabalhar.

 

Tinha dia que pensava,

De aquilo eu desistir.

Para atrás então olhava,

E via estar aqui.

 

Consegui vencer um pouco,

Das lutas que comecei,

Espero chegar um dia,

No lugar que almejei.

 

Hoje sou um Pedagogo,

E tenho Pós-graduação.

Pra poder vencer na vida,

Tem que ter dedicação.

 

A pesar de algumas lutas,

Que hoje estou passando.

Despediram-me do Estado,

Mas continuei lutando.

 

Eu quero que o mundo veja,

O que eu escrevi.

Se eu parasse no caminho,

Jamais teria vencido.

 

Essa luta continua,

Todos nós vamos lutar.

Pra poder ser vencedores,

Em Deus temos que acreditar.

 

Autor: e Escritor.  João do Rozario Lima

E-mail. [email protected]

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Autor: João do Rozario Lima


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