Noções introdutórias ao direito das sucessões



1. Noções Introdutórias ao Direito das Sucessões

Segundo o conceito amplo, “sucessão” no direito é quando existe uma substituição do titular de um direito. O autor Sílvio de Salvo Venosa (2003) diz se tratar da “... transmissão no direito [...] sempre que uma pessoa tomar o lugar de outra em uma relação jurídica, há uma sucessão [...] alguém toma o lugar de outrem” (2003:15).
Existem duas formas conhecidas de sucessão no direito, a que deriva do ato entre vivos (inter vivos - ex: contrato) e a que deriva de uma morte (causa mortis – ex: testamento). De qualquer forma, trata-se da transmissão de bens, direitos e obrigações (ativo e passivo).
Além disso, é interessante destacar que tanto na sucessão inter vivos quanto na causa mortis a sucessão pode ocorrer a “título singular” (com a transmissão de um ou mais bens determinados) ou a “título universal” (patrimônio, ou seja, passivo e ativo). Mesmo que haja mais de um herdeiro, no caso do testamento (causa mortis) o que ocorre por via singular (por testamento) é a sucessão a uma pessoa com um (ou mais) bem determinado. No caso da transmissão por universalidade causa mortis é chamada de “herança” a sucessão hereditária do patrimônio do de cujus.
A primeira idéia que se tem quando se fala em “sucessão causa mortis” é que o “legado” ou “herança” (“... conjunto de direitos e obrigações que se transmitem, em razão da morte, a uma pessoa, ou a um conjunto de pessoas...” Venosa, 2003:20) deve se transferir dentro da própria família do de cujus. Esta é, na verdade, de acordo com autor Venosa: “... chamada “sucessão legítima” (2003:19). No entanto, é preciso salientar que o legislador determinou a ordem dos familiares (“sucessores”) a receber o “legado” nos casos em que o de cujus não deixou “testamento” ou mesmo com a existência deste ato de última vontade, este não puder ser cumprido (por ser nulo por exemplo).
Disso conclui-se a existência de dois tipos de sucessão: “testamentária” (regulada pela vontade do falecido) e “ab intestado” (ou sem testamento) que deriva da lei. Importantíssimo distinguir aqui que “herança” diz respeito ao conjunto de direitos e obrigações que se transmitem em razão da morte; já a sucessão (apesar de ser muitas vezes confundida com a herança) não se trata desse “conjunto” citado mas sim ao “ato de suceder”, que pode ser entre vivos ou não.
Essa “herança” enquanto não realizada a “partilha” (divisão dos bens entre os herdeiros) é chamada de “espólio”: “....simples massa patrimonial que permanece coesa até a atribuição dos quinhões hereditários aos herdeiros” (VENOSA, 2003:21). O “legado”, por si só, diz respeito a “um determinado bem ou bens do patrimônio do de cujus que cabe a um determinado legatário que o recebe por testamento”. Ou seja, se não houver testamento válido não há nem legado nem legatário.
Merece consideração o fato de que em um testamento pode ocorrer a existência tanto de herdeiros quanto de legatários, como pelo exemplo dado pelo autor Venosa: “O testador poderá deixar 1/3 de sua herança a Fulano e o imóvel da Rua X a Beltrano, existindo aí um herdeira e um legatário, respectivamente” (2003:22). Como regra geral é de bom alvitre dispor que o legatário não responde pelo pagamento das dívidas do espólio, mas sim aos herdeiros (na proporção do seu quinhão).
Como visto em sala, o fato da morte – “Princípio da Saisine” (não existe herança de pessoa viva; direito que tem os herdeiros de entrar na posse dos bens que constituem a “herança”) – determina o momento em que ocorre a sucessão (art. 1784 do Código Civil), e esta deve ser aberta, em regra, no lugar do último domicílio do de cujus (art. 1785 CC). Decorrente desta abertura de sucessão é frisa-se que “...ninguém pode ser herdeiro contra sua vontade” (VENOSA, 2003:28).
Merece consideração, neste ínterim, que no direito moderno já não se conhece a morte civil; ou seja, é preciso que haja a morte física, o desaparecimento da vida do titular. Porém, admite-se a “morte presumida ” (art. 80 da Lei de Registros Públicos – Lei n.º 6015/73) que ocorre nos casos de ausência de pessoas desaparecidas em naufrágios, catástrofes, etc. Além disso, de acordo com o art. 426 CC não há herança de pessoa viva e esta não pode ser objeto de negociação (“pacta corvina”).

2. Da Transmissão e Aceitação da Herança

Até agora foram dados os primeiros passos para o entendimento do que vem a ser a “sucessão” dentro do direito que ocorre com a sua abertura, seguida então pela “delação”, que segundo o autor já citado VENOSA “... é oferecimento da herança” (2003:29). Esta delação (ou simplesmente “aceitação”) ocorre de acordo com a ordem de vocação hereditária, fixada em lei ou de acordo com a vontade do “autor” da herança (de cujus) através do seu testamento. Essa aceitação pode vir a ser “tácita” ou “expressa” (muito raramente).
Na verdade a aceitação é essencial, necessária e ato unilateral – retroage à data da morte - é uma confirmação do direito do herdeiro, pois como já comentado anteriormente ninguém pode ser herdeiro contra sua própria vontade. Porém não depende de ato de comunicação a terceiros – art 1805 CC, parte final – mas também não significa dizer que ter realizado o funeral do de cujus, por exemplo, já significa ter aceitado a condição de herdeiro – art. 1805, § 1º do CC.
O art. 1807 do CC dispõe que se o herdeiro não se manifestar a respeito da não aceitação à herança esta será presumida. Além disso, de acordo com o caput do já comentado art. 1805 diz que para ser “expressa” a aceitação à herança deve ser escrita. Se por acaso o primeiro dos herdeiros vier a falecer sem ter feito a aceitação seus sucessores serão então herdeiros no seu lugar (art. 1809 CC).
Não existe aceitação parcial de herança ou condição para sua aceitação – art. 1808 CC, mas aquele que ao mesmo tempo receber legado e herança está autorizado a aceitar apenas um dos dois (§ 1º do art. 1808 CC).
Aliás, pode vir a existir a “renúncia” do herdeiro, ou seja, este renuncia ao direito que detém de sua parte da herança, fazendo-a através de escritura pública ou termo judicial (art. 1806 CC). O art. 1805, §2º similariza a renúncia à cessão gratuita da herança aos outros herdeiros, chamados de “co-herdeiros”.
Uma situação bastante interessante que pode ocorrer é da renúncia de um herdeiro que possui credores. Neste caso, disciplina o art. 1813 do CC que num prazo de 30 (trinta) dias do conhecimento da renúncia pelo herdeiro, seus credores, com autorização do juiz, podem aceitar essa herança renunciada até a quantia suficiente para cobrir o débito do antigo herdeiro.
Apesar de existir certa divergência entre os autores, de acordo com Venosa, é possível que também a pessoa “jurídica” seja herdeira através de testamento: “Desempenhará as mesmas funções de qualquer herdeiro, podendo ingressar com ações de defesa da posse” (2003:29). Além disso, conforme já explicitado anteriormente, a sucessão segue o “Princípio da Saisine”, segundo o qual, na transmissão da posse e propriedade, tudo se transmite do patrimônio do de cujus, sejam direitos, sejam obrigações.
De acordo com este princípio, o herdeiro é titular dos direitos em sua universalidade ou não. E desta forma tem total poder de aliená-lo, seja gratuitamente (“doação”) ou onerosamente (“compra e venda”). Quando isto ocorre dá-se a “cessão da herança” – art. 1793 do CC. Nota-se que só existe a cessão antes da partilha e que o cessionário participa do processo de inventário porque se sub-roga na posição do cedente (antigo herdeiro). Relevante salientar que como os herdeiros numa herança passam a formar um “condomínio”, não pode o co-herdeiro vender a sua parte para terceiro estranho à herança sem antes consultar a preferência dos demais herdeiros – art. 1794 do CC.

3. Da Capacidade para Suceder

Assim como para demais áreas do direito civil a pessoa tem que ser apta para determinadas situações, também para suceder é preciso que o herdeiro ou legatário seja “apto” ao ato. Pela lei – art. 1829 do CC – são herdeiros “necessários” os descendentes - em concorrência com o cônjuge (ressalvado o disposto no inciso I do referido artigo), - ascendentes, cônjuge, colaterais até o quarto grau e por fim o Estado. Observa-se que o “nascituro” também tem legitimidade para ser herdeiro – art. 1798 e 1799 CC. Caso haja a herança para um filho ainda “não nascido ou concebido”, dentro de 2 (dois) anos os bens reservados a ele caberão aos herdeiros legítimos desde que não haja cláusula específica em testamento a respeito – art. 1800, § 4º CC.
3.1 Condições para Suceder
Para que possa suceder é preciso que a pessoa a ser herdeira seja: viva, capaz e digna (ou não indigna). Uma exceção a esta regra, de acordo com o autor Venosa se dá no caso do nascituro: “Os direitos do nascituro só ganharão forma com o seu nascimento com vida.” (2003:74). Ou seja, ao lado do sucessor esperado – art. 1800 do CC, o nascituro faz distinção à regra que exige que o herdeiro esteja vivo no ato da morte do de cujus.
O art. 1801 do Novo Código Civil nomeia quais são os entes que não podem vir a ser herdeiros ou legatários. Estas possuem “incapacidade relativa”.
Pode acontecer de serem praticados atos de indignidade por pessoas a serem sucessoras; nestes casos pode se recorrer ao processo de “indignidade”, por sentença judicial. Essa indignidade se posiciona na sucessão legítima e seus casos são vistos pelo padrão da moral ou a vontade presumida do de cujus.
Ao lado da indignidade figura a “deserdação” – art. 1814 CC que só ocorre no testamento e tem por objetivo afastar os herdeiros necessários da herança: “... tirando-lhes a legítima, ou seja, a metade da herança que, afora tal situação, não pode ser afastada pelo testamento” (VENOSA, 2003:76). O artigo acima citado serve tanto para a deserdação quanto à indignidade, no entanto, para deserdação ainda ocorrem os casos elencados nos artigos 1962 e 1963 do CC.
Muito importante salientar que a deserdação é específica para afastar os herdeiros necessários, pois para afastar os herdeiros não necessários (colaterais) basta que o testador não os beneficie no testamento.
Interessante notar que quando da geração da indignidade (por ação ordinária – art. 1815 CC), ocorrem resquícios da morte civil, pois de acordo com o art. 1816 CC “os descendentes do herdeiro excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão”. Pode acontecer o “perdão do indigno” – art. 1818 CC – autêntico ou por testamento. Segundo Venosa: “O perdão deve ser inequívoco, mas, uma vez eficaz, reabilita o indigno, não podendo ser impugnado por nenhum outro herdeiro, a não ser em caso de nulidade do próprio ato” (2003:77).
É muito importante observar que na indignidade preza-se pela indivisibilidade da ação, ou seja, mesmo que um só interessado tenha promovido a ação, a declaração de indigno se aproveita para todos os demais.
Quanto à reabilitação do indigno ninguém melhor do que o de cujus para conceder o perdão, e é por isso que se trata de um ato formal e privativo da vítima, é ato personalíssimo! Com isso, uma vez existente o perdão, silencia-se sobre o fato de deserdação, não se admitindo mais a ação de exclusão.

VENOSA, Silvio de S. Direito das Sucessões - 2003.
Autor: Silvana Aparecida Wierzchón


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