Espécies de extra-atividade da lei penal



Extra-atividade da lei penal – espécies.

Este é o nome dado à capacidade dos dispositivos penais de atuar se "movimentando" no tempo. A extra-atividade demonstra efeitos da norma penal que vão além do normal em sua validade, quando considerados benéficos.

A norma penal pode gerar efeitos mesmo após a sua revogação, quando formalmente cessa sua vigência, o que é chamado de ultra-atividade. Quando uma lei penal age surtindo efeitos em fatos pretéritos à sua promulgação, fala-se em retroatividade. Ultra-atividade e retroatividade são espécies de extra-atividade do texto penal, e ambas caracterizam-se em exceção porque a regra estabelecida para a maioria dos casos é a da irretroatividade e da não ultra-atividade, protegidas pelo artigo 1º do código penal:

“Art. 1º Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”

Porém ao parágrafo único da lei seguinte do mesmo código, dá-se a entender de antemão algo totalmente diverso, prevendo um caso de retroatividade, apoiado pela Constituição (art. 5º, XL - "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu"):

“Art. 2º Parágrafo Único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”

Daí resulta a questão. Qual a hierarquia no que se refere aos princípios da irretroatividade e da retroatividade? Certo é que o código penal abarca ambos, que logicamente compreendem conceitos paradoxos. Mas quando se interpreta a vontade por trás da intenção literal da lei, conclui-se pela total coerência da defesa de ambos os institutos, que ficam no mesmo patamar de importância porque se direcionam a situações diferentes, embora pelo mesmo motivo.

No artigo 1º, decretando a irretroatividade, procurou-se defender a dignidade humana e a estrutura democrática brasileiras, ambos fundamentos cruciais à existência da nossa República federativa (Art. 1º, III e Parágrafo Único da CF-88), porque trata-se de uma barreira à discricionariedade estatal no que se refere à punição. Ele reflete o objetivo claro de controle dos bens jurídicos da sociedade. O que seria de uma nação se qualquer pessoa com poder pudesse escolher as condutas que devem ser punidas e assim fazê-lo do modo que lhe der mais satisfação? A autotutela acabou e é proibida expressamente pela Constituição Federal de 1988:

"Art.5º, XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção"

O artigo 2º, por sua vez, em seu parágrafo único, faz exatamente o mesmo do artigo 1º. A retroatividade que valida é restringida aos efeitos benéficos do dispositivo penal em questão, o que é relacionado com os objetivos da punição estatal e igualmente ao princípio da dignidade humana, porque evitar que as mudanças sociais se estendam àqueles que, por exemplo, têm o direito constitucional de ir e vir cerceado por uma conduta que não é mais considerada lesiva, é negar a igualdade de tratamento do Estado a toda a sociedade, sobretudo quanto à defesa da dignidade e quanto à justiça, ambos também explicitamente acobertas constitucionalmente:

"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
I - construir uma sociedade livre, JUSTA e solidária;"
(grifo meu)
Autor: Isabela Di Maio Barbosa


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