DESIGUALDADES SÓCIO-EDUCACIONAIS E REPRESENTAÇÕES DO ESPAÇO VIVIDO



1. Introduçao
O estudo das Representações Sociais no âmbito da educação tem sido ferramenta de pesquisas que visam a melhorias do ensino, focando principalmente na análise dos discursos e práticas dos professores, onde podemos destacar as pesquisas de Penin (1989; 1995; 1999) com fundamentos metodológicos em Lefèbvre (1980) para invetigar práticas cotidianas na transformação da escola. Ao mesmo tempo, um maior número de estudos tem analisado as representações dos estudantes sobre os métodos de avaliação de rendimento escolar como Gazzinelli (2002) e Carbone e Menin (2004), que utilizam a Teoria das Representações Sociais para compreender como os jovens se sentem em relação aos métodos de mensuração de sua performance estudantil.
Temos como hipótese principal que a análise das representações do espaço vivido pelos jovens, pode permitir ao professor, compreender como se dá a formação do senso comum (visão de mundo) de seus educandos. Tal conhecimento pode ser ferramenta para melhorias do processo pedagógico, uma vez que este conhecimento permite ao professor fazer uma cartografia de subjetividades, o que conseqüentemente pode vir a ampliar um processo dialógico entre educador e educando criando novas formas de comunicação e de interação social e de práticas pedagógicas.
Teve-se por objetivo geral a análise das Representações Socias do espaço vivido no cotidiano escolar de jovens estudantes do ensino público da cidade do Rio Grande, uma cidade média no sul do Brasil, através da análise do material produzido pelos próprios educandos em suas atividades de aula, transformando assim as aulas de Artes em um lugar de pesquisa sobre as Representações Sociais através da própria prática pedagógica. Para tanto, foram realizadas intervenções pedagógicas com jogos dramáticos e linguagens artística (esculturas, desenhos, histórias em quadrinhos, fanzines, etc.).
A utilização da Teoria das Representações Sociais em Educação, possibilita ao professor estabelecer abordagens que buscam conhecer como os estudantes vêem e representam sua realidade, ou seja, como vivem, percebem e concebem a vida cotidiana, buscando compreender a partir das representações, quais são as possíves melhores condições pedagógicas que permitiriam aos jovens se engajarem em um processo de desenvolvimento educacional amplo, assumindo assim uma posição crítica diante do mundo, exigindo seus direitos e exercendo sua cidadania.
A partir desse conhecimento, é possível então ao professor estabelecer canais de comunicação, bem como a seleção de linguagens e materiais apropriados para trabalhos que possibilitem maximizar o desenvolvimento dos educando. O conhecimento da realidade vista do ponto de entendimento do jovem educando, é o que permite ao professor escolher ferramentas para lidar com as peculiaridades de cada turma e suas diferenciações.

2. A Teoria das Representações Sociais (TRS) e as Contribuições de henri lefèbvre para as Pesquisas em Educação.

O estudo das Representações Sociais aplicado à Educação apresenta-se como um campo promissor para a produção de conhecimento sobre a realidade e as práticas escolares. Nos últimos anos, vem se confirmando a tendência de utilização de procedimentos de pesquisa sobre memória individual ou coletiva junto aos professores e estudantes, intentando fazer emergir as representações acerca das atividades, das práticas sociais e dos posicionamentos, a fim de serem redimensionadas em vista da melhoria do ensino. Podemos destacar os estudos de Penin (1989; 1995; 1999), Gazzinelli (2002), e Carvone e Menin (2004).
A Teoria das Representações Sociais (TRS), propriamente dita, surge como corpo teórico estabelecido em 1969, na obra de Serge Moscovici. O conceito de Representações Sociais foi forjado como o cerne de uma teoria que possibilitasse o entendimento das formas de raciocínio, superando as limitações das teorias existentes voltadas para a vida cotidiana. Para esse autor, o tema da relação entre grupos, atos e idéias e imagens resgata o conceito de representações coletivas (RC), inicialmente proposto por Émile Durkheim.
Para Moscovici e Hewstone (1984, p. 703) "uma teoria das Representações Sociais considera a realidade como algo produzido, constituído, durante a interação entre os indivíduos". Os autores observam que dessa produção pode resultar uma imagem deformada pela ideologia ou pela seleção/rejeição intencional de informações. Entretanto, eles realçam aspectos da realidade que, para serem esclarecidos, é preciso recorrer às representações sociais, como aqueles que estão por detrás das palavras; apontam, igualmente, algumas indicações que se prestam para imputar um certo grau de realidade aos elementos de uma representação social.
Essa vertente da TRS toma o sujeito como entidade coesa e una, com objetivo de superar a dicotomia no modo de pensar a relação entre indivíduo e sociedade, como ela se constrói e os produtos que dela advêm. Busca "um lugar para o mundo social e seus imperativos, sem perder de vista a capacidade criativa e transformadora de sujeitos sociais" (JOVCHELOVITCH, 1994, p. 64).
De acordo com Jodelet (1986, p. 43,), a representação, ao substituir mentalmente um determinado objeto (pessoa, coisa, idéia), reconstrói as cadeias de significação que o formam, restituindo-o simbolicamente e também inscrevendo no significante novos significados. Isso, por outro lado, nos traz a questão da dicotomia entre a representação e o objeto da representação, entre o real e o imaginário. O conceito de representações, tomado na sua significação filosófica, já possui uma história de dois séculos: Lefèbvre (1980) faz um estudo das contribuições, de diferentes filósofos, confrontando conceitos subjacentes (como senso comum e visão de mundo) ao de representação, formulando sua própria conceituação.
Como contribuições a teoria das representações, Lefèbvre (1980) acrescenta que uma representação se constitui do que é vivido, percebido e concebido, num movimento dialético que nunca cessa, ocupando os interstícios entre o vivido e o concebido. Para Lefèbvre (1980, p. 94) as representações “são fatos de palavras e de prática social", caracterizando-se por serem de natureza social, psíquica e política ao mesmo tempo.
Segundo Lefèbvre (1980) o espaço vivido é também lugar das ambigüidades das relações sociais, habitado pelas representações, cujos pequenos mundos se articulam com o saber, os sonhos, as lembranças e as ficções. É no espaço que se encontra a chave para a compreensão da (re)produção do homem em sociedade, e em decorrência do poder que a representação deste possui para transformar e substituir a realidade vivida e percebida, assim o espaço vivido é sem dúvida um meio de engajamento do homem na ação transformadora.
As representações sociais portanto, não são objetos sólidos, significados que, uma vez construídos, se transformam numa essência estática e imutável. Isso seria semelhante a pensar a dinâmica social como algo que em algum momento pára no tempo.
Mesmo uma tradição, que sugeriria mais fortemente essa característica, não pode ser pensada senão em termos da dinâmica de sua adaptação aos novos contextos, o que pressupõe, no mínimo, a necessidade de entrar em relação com novos elementos que vão surgindo, ainda que seja para reafirmar sua permanência.
Mediante essa conceituação de representação, torna-se necessário fundamentar a análise das representações do cotidiano escolar, não na avaliação escolar, que centra-se na avaliação de um conhecimento formal, mas em compreender como muitas vezes a prática do ensino formal entra em conflito com as representações dos grupos, e o conhecimento fica distante e inatingível para os educandos1.

Na prática, as análises das representações pretendem apreender a estrutura discursiva e simbólica das representações sociais através da busca de unidades de conteúdo nucleares (referentes ao núcleo central da representação, formados pelos elementos estruturantes ancorados e objetivados) e seus respectivos significados e relações com aquilo o que foi dito e expresso pelos sujeitos. Ou seja, trata-se de uma apropriação do que foi selecionado pelo sujeito a respeito da realidade que o envolve, o lugar, as circunstâncias, os objetos da representação e das formas como o mesmo o sujeito combina, estrutura e reestrutura esses elementos.
O espaço vivido, para o presente trabalho é o objeto das representações, por esse ser o cenário de ação e meio para interação social; é no espaço que os indivíduos estão a viver, perceber e relacionar-se. Quando falamos de espaço vivido, estamos buscando no universo individual o experienciado, o espaço construído através da percepção do sujeito. Nesse sentido o espaço vivido nada mais é do que o espaço das relações sociais do dia a dia, é a casa, é o bairro, é o lugar, enfim, não pode ser confundido com o conceito de espaço social, ou simplesmente espaço, como é tratado nas ciências sociais.
A aproximação ao pesquisado-objeto se deu através da observação participante com dois grupos focais, para compreender os mecanismos de construção das explicações dos fatos vivenciados durante a intervenção pedagógica, por meio das múltiplas representações que foram analisadas, pela a tríade de categorias: distorção, suplementação e impressão proposta por Jodelet (1986).
Para Jodelet (1986), no processo de reconstrução do “objeto da representação”, ocorre a formação de um novo “objeto” que tem certa independência do original, pois geralmente as Representações Sociais dão-se já sobre ou acerca de outras representações sociais.
O movimento, que fazemos da representação para o seu objeto, e das “ações” para “mediações” e enfim para as práticas, remetem-se a mecanismos variados, sendo suas formas principais: a) distorção: quando todas as características do objeto estão presentes, umas mais exageradas ou minimizadas que outras; b) suplementação: onde seriam investidos aspectos inexistentes e imaginários no objeto, com a finalidade de torná-lo adaptado aos valores dominantes; e c) impressão: quando a representação, tem parte dos aspectos que formam os objetos, eliminada por critérios subjetivos por parte dos sujeitos
Portanto, a análise das representações sociais no cotidiano escolar estão imersas em um cenário, vivido e percebido, onde o espaço vivido é a categoria chave, para o estudo destas relações entre percepção e experiência, atrelados a construção de um conhecimento coletivo.

3. Comparação das análises entre Escolas e diferentes espaços vividos

Buscou-se fazer uma comparação analítica entre as falas, discursos, narrativas e representações plásticas e teatrais dos jovens educando das Escolas F e M. A Escola F, é uma escola estadual de ensino fundamental, localiza-se na periferia da Cidade do Rio Grande (RS), no centro do maior aglomerado de pobreza da cidade. A escola atende crianças e jovens do ensino fundamental, da rede estadual de ensino. A Escola F foi selecionada entre as escolas públicas da Cidade, porque apresentou os piores indicadores educacionais para o ensino fundamental (IDEB/INEP/MEC, EDUDATA-INEP/MEC). A Escola M, por oposição, foi escolhida por apresentar os melhores indicadores educacionais para a modalidade ensino médio. A Escola M localiza-se no centro da cidade, sendo uma escola federal, com acesso via exame seletivo.

3.1. As Representações da Casa;
Escola F: Na dimensão da casa foram propostas atividades para suscitar representações. Diante destas atividades, foi analisado por meio de jogos de memória, a percepções e concepção das marcas de mercadorias de consumo que estão presentes no cotidiano da casa. As marcas foram utilizadas como elementos que acabaram se atrelando a diferentes representações do vivido, às vezes emergindo como elementos significantes e estruturadores das representações.
Os jogos com objetos e marcas do cotidiano presentes recuperados por jogos de memória, demonstraram que as marcas dos objetos lembrados na Escola F, são de menor custo e valor do que as dos jovens da Escola M, sendo esses elementos foram geradores de outras narrativas, que emergiram como elementos importantes na estruturação das representações, pois eles se tornaram até mesmo elementos de ponderação e significação, por exemplo, quando um jovem caracterizava um objeto de uso cotidiano pela marca do objeto e pelo valor que dáva a este objeto-marca, muitas vezes as marcas substituíam os nomes dos objetos.
As atividades e narrativas demonstraram que a maioria dos jovens educandos da Escola F, não estavam satisfeitos com a casa em que moravam. As famílias eram grandes e as responsabilidades tornavam-se equivalentes, como tarefas de cuidar dos irmãos mais novos e a limpeza da casa. Outra representação que se destacou foi a de elementos de valorização da casa e do lar, mesmo diante de elementos considerados negativos por eles, evidenciando uma intensa “impressão” sobre a casa, que superava as “distorções” e “suplementações”, onde os estudantes tendiam a valorizar alguns elementos em especifico, e omitindo outros.
Escola M: As representações da casa surgiu como sendo a casa um lugar legal. Emergiram elementos como as reclamações da mãe severa, do irmão que incomoda, da super-proteção do pai etc. Mas o espaço vivido da casa e seus elementos não surgem como características contraditórias ou negativas para eles. Ao contrario dos educando da Escola F, os jovens da Escola M, focaram suas representações nas relações sociais da casa e não na casa espaço físico e objetos.
Quando realizamos atividade utilizando a recuperação da lembranças e associações com as marcas encontradas no espaço da casa, marcas de objetos-produtos como: Dove, Omo, Tramontina, etc. todos muito presentes na publicidade midiática. Destacaram-se o aparecimento de elementos-marcas como Elma Chips e Trakinas associadas a casa.
Os jovens educandos da Escola M, não salientam “impressões” em suas representações, porém ocorre distorções e suplementações, de modo que suas narrativas de conflitos comuns ao cotidiano, fossem os conflitos de geração e de núcleos familiares. Tais conflitos eram representados mediante sucessivas suplementações e representações, de tal maneira que ganhavam conotações melodramáticas ou românticas.

3.2. As Representações da Escola;
As representações da escola na Escola F foram bem heterogenias, ora foi considerada um lugar chato para alguns, ora para outros é um lugar de conhecimento, ora para outros é um lugar de confraternização. Suas representações são bastante variadas, e muito atreladas a relação do sujeito com a escola.
Perante esse fato, destacou-se a individualidade do sujeito nas representações sobre a Escola, emergiram expressões, representações e discursos. Para análise, propomos o desenvolvimento de historias em quadrinhos, colocando como proposta que os estudantes procurassem representar seu cotidiano, e principalmente como se sentiam em relação a Escola. Os resultados foram satisfatórios como material de pesquisa.
Ao analisarmos as historias em quadrinhos, buscando seus sentidos e significados, a partir das categorias analíticas de Jodelet (1982). Foi possível encontrar representações da Escola como: Lugar de conhecimento e de interação (1 ocorrência); Fonte de identidade e auto-estima (1 ocorrência ); Perspectiva de futuro melhor (1 ocorrência ); Lugar de liberdade(1 ocorrência ); Um espaço físico, um lugar (3 ocorrências); Parte do cotidiano (3 ocorrências); Um lugar distante e com problemas (3 ocorrências); Um lugar de melhorias (2 ocorrências); Um lugar chato (2 ocorrências)
Escola M: Em relação as representações, discursos, falas e narrativas sobre o a escola, a Escola M, apareceu como um lugar de relações sociais, um lugar “maluco”, com histórias “mirabolantes”, cheio de gente chata, mas com poucos legais. As Representações Sociais sobre a escola, apareceram bem mais homogenias do que na turma da Escola F, sendo que os discursos sobre as escola tornaram-se rapidamente uníssonos na turma da Escola M, ao contrario da heterogeneidade da turma da Escola F.
Em relação as representações de afetividades, o gostar da escola é muito presente nos discursos, principalmente por que eles acreditam que a Escola M, “não é a melhor escola do mundo”, mas as outras escolas da Cidade sim seriam “as piores do mundo”.
Ao longo das atividades que focaram as representações sobre a Escola M, os jovens direcionaram suas representações para a estrutura social da própria escola. A Escola M, segundo os estudantes é divida em duas classes, uma dos “ricos e fúteis” e os “pobres conscientes”.

3.3. As Representações do Bairro;
O bairro emerge como representação na Escola F em relação ao espaço vivido, como um lugar de muitas representações que marcam os educandos, emergiram elementos centralizadores de lembranças e representações como o campo de futebol, que se localiza ao lado da escola e enfrente a residência da maioria. Analisado a heterogeneidade dos discursos, e das atividades percebemos que as exceções são aqueles que vêem o bairro apenas como o lugar da sua casa e aqueles quais, conceberam maior destaque no bairro para o lixão da Cidade, localizado em outro bairro próximo, surgindo inclusive em maquetes e outro trabalhos plásticos, como se fosse parte do proprío bairro.
Quando na Escola M foram realizadas atividades focando as representações do bairro, pode-se observar que os elementos do bairro são dissolvidos entre elementos pouco significativos, onde muitas vezes acaba por surgir “impressões”, “suplementações” e as vezes “distorções”. O bairro é mais visto como um lugar de passagem e descanso. Vivem muito mais no centro e convivem com moradores de diversos bairros.

3.4. As Representações da Cidade
A Escola F em relação as representações sociais sobre a cidade, os estudantes conceberam em suas narrativas e representações a Cidade como um lugar de muita desigualdade social, contudo é também para muitos um lugar belo. Há também as representações em que a contradição entre a beleza natural, paisagística e as atrocidades sociais se dissolvem em representações idealizadas, emergindo “impressões” e “distorção” nas representações sociais, um exemplo disso foi a Cidade representada como um “lugar idealizado” e utópico, onde as contradições eram omitidas.
A cidade emerge na Escola M como um lugar cheio de coisas a serem descobertas. Os educandos sabiam que a cidade é diferente para cada olhar, carregada de imagens e lugares que ainda são invisíveis para eles, gostavam de trocar informações e conhecimentos sobre a cidade e seus diferentes bairros, gostavam de debater a conjuntura política e sobre as empresas e comércios locais. A cidade era concebida como um lugar, mas um lugar amplo e complexo, receptáculo de conflitos e poderes, cuja o conhecimento amplo, inclusive de problemas atuais da cidade é fundamental para entenderem o mundo real a sua volta, e assim poderem viver plenamente suas vidas.

3.5. As Representações do País
Com relação as representações sociais sobre o País, na Escola F emergiram inúmeras representações de sentimentos negativos e de impotência e de exclusão. A maioria percebe e concebe sua relação vivida com o País, por meiode um mal estar. Embora todos gostem do futebol e da novela. Um exemplo disso é a tendência dos jovens se representarem como “pedra” (coisa imóvel) diante do País.
A atividade proposta para suscitar falas, e representações para ambas as turmas foi utilizado um jogo de desenho coletivo, onde cada participante tinha que completar com um elemento livre, mas com sentido, de forma a criar um desenho coletivo. Essa atividade demonstrou em ambas as turmas excelentes possibilidades de análises, na Escola F, a turma criou uma paisagem estática, onde a maioria dos elementos desenhados eram coisas ou objetos, por exemplo: boneco, pedra, lua cheia, estrela, carro, arvore, óculos, maçãs etc.
Na Escola M o País foi representado como um lugar formado por um grande número de pessoas, que se comportam igual, segundo o modelo imposto pela mídia, pela classe, pelo grupo e pela profissão. Perceram e conceberam o país como “a massa” ou “consumidores”. As representações focaram a população, concebendo-a como isolada, onde todos observam tudo de fora, distantes apesar de fazerem parte do País.
A atividade proposta para suscitar falas, e representações semelhantemente a proposta feita para a turma da Escola F, foi utilizado um jogo de desenho coletivo, onde cada participante tinha que completar com um elemento livre, mas buscando sempre dar sentido ao desenho coletivo. Essa atividade demonstrou excelentes resultados também com a turma da Esola M, inclusive suscitando discussões e contrapondo discursos e representações. O desenho desenvolvido foi um grupo de pessoas, uma multidão, onde cada um se desenhou, indentificando-se e separando-se da multidão.
Diferentemente da turma da Escola F, a turma da Escola M utilizou elementos abstratos e simbólicos além de buscar conexões mais amplas, na Escola F, os elementos desenhados eram coisas ou objetos sem significado intencional, por exemplo: boneco, pedra, lua cheia, estrela, carro, arvore, óculos, maças etc.
A análise de suas narrativas e representações, possibilita-nos colocar que os jovens da Escola M, são percebem e concebem suas capacidade de transformação social, mas em suas representações, não se vêem ainda como um agente social, ou seja, enxergam o país como se estivessem simplesmente observando, entretanto acreditam que no momento certo, poderão transformá-lo mas acreditando que sempre serão diferentes dos outros, por que não pensam como a “massa”.

3.6. As Representações do Mundo;
Quando buscamos as representações sobre o mundo, na Escola F ele é percebido e concebido como “algo”, como uma abstração muito distante, completamente fora da compreensão e do cotidiano de abstração da turma, mas envolto em intensso mal estar. Um exemplo disso é a tendência dos jovens se representarem a si como fezes (“merda”) diante do Mundo.
Para a atividade utilizada para suscitar as representações dos estudantes sobre o mundo, como eles o vivem, percebem e concebem, foi utilizado uma atividade com modelagem com argila. A proposta foi a para procurarem expressar como se sentiam com o mundo. Para proporcionar ambientação sonora para a atividade foi utilizado um CD de áudio com gravações de musicas e cânticos de nações indígenas brasileiras.
De semelhante forma ao desenho coletivo, essa atividade demonstrou em ambas as turmas excelentes possibilidades de análises, porém diferentemente do desenho coletivo, a produção simbólica foi igualmente intensa e desenvolvida com os estudantes das duas turmas.
Com elementos que se destacaram por meio da modelagem, pode-se observar a tendência dos jovens a fazer crianças, fetos e fezes como representações de como se sentem com relação ao Mundo.
Na Escola M o mundo surgiu como o espaço de todas as coisas, lugar das guerras, dos povos e da natureza. O que mais os indignavam eram suas concepções sobre as guerras, suas percepções sobre as mortes violentas e o bioterrorismo (no sentido de armas bioquímicas de extermínio em massa), além de discutirem as origens das guerras, seja o petróleo, a água, a religião ou a invasão territorial. Comentaram a beleza do mundo e da natureza. Percebendo com indignação a barbárie do mundo atual, mas ainda com esperanças em um mundo melhor.

4. Considerações Finais
Com relação à análise das categorias “distorção”, “suplementação” e “suplementação” das representações sociais proposta por Denise Jodelet (1986). Está foram correlacionadas as leituras possíveis dos sentidos e significados aos objetos de representação, por meio das categorias: vivido, percebido, concebido e representado, Lefèbvre (1980). Essa relação teorica permitiu o avanço do pesquisa no entendimento do complexo campo das representações sociais, que se vinculam ao âmbito relações sociais do coletivo e do sujeito.
Em relação às representações sociais da casa, encontramos diversas suplementações com valores e elementos significantes ancorados e objetivados nos grupos sobre suas casas e famílias.
Nas representações sociais sobre a casa, nos jovens estudantes da Escola M, destacou-se a presença de distorções, onde os familiares e as condições familiares ganham conotações melodramáticas, onde situações cotidianas ganhavam contornos intensificados como o conflito pai-filho e o conflito de gerações. as representações sobre a casa-familia, foi frequentemente utilizada para justificar ações e práticas, como o afastamento dos familiares, e o querer estar a maior parte do tempo na rua, justificando a importância das amizades.
Observamos que as distorções das representações também têm caráter simbólico, com uma carga subjetiva de percepções e concepções, que podem ser expressas de formas simples, como por meio de esculturas modeladas em argila. A modelagem em argila permitiu expressar complexidades de sentidos, que muitas vezes o domínio da linguagem verbal não permitiu, a modelagem dispensou para a expressão a necessidade de conhecimentos técnicos ou de linguages artíticas.
Portanto foi possível utilizar as categorias propostas por Jodelet (1986) e as contribuições de Lefèbvre (1980), como auxilio analítico para as representações sociais, permitindo o esclarecimento sobre as representações sociais que não estão contidas somente em material discursivo e narrativo, mas também em material expressivo e produção simbólica.
Contudo a utilização destas categorias para análise simbólica e de conteúdo das representações, se faz certamente necessários maiores discussões sobre seu papel explicativo, pois as categorias evidenciam a estruturação das representações, mas os mecanismos nas quais os elementos dessas representações são estruturados e ancorados envolvem muitas possibilidades de conexões e interpretações, que devem ser analisadas nas narrativas e nos discursos com maior profundidade.
A diferença entre a investigação pedagógica realizada com as duas turmas, está principalmente na diferença dos níveis e fluxos discursivos, narrativos e metanarrativos dos estudantes da Escola F e Escola M. Na Escola F, para suscitarmos as falas, os discursos e as narrativas, tivemos que focar nossos esforços em atividades de expressão artísticas, além das explicações dos temas e das atividades propostas, que encontravam resistência para a realização.
As analises apontam para um sistema de representações sociais atrelado a função de exclusão/inclusão social. As conseqüências de tais fatos, são evidenciadas na descrença e no mal estar, como elementos estruturadores relevantes. A força dessas representaçãos foram tão presentes, que na Escola F os jovens não acreditavam ser capazes de realizar nenhuma das atividades propostas e muito menos desejavam aprender e ouvir o professor ou o outro.
A turma da Escola F tinha ancorado nos núcleos centrais de suas representações, elementos de grande descrença com relação ao seu futuro. Em relação as representações sobre o futuro de suas vidas escolares, apenas um estudante pretendia seguir estudando, e se deslocar até o centro da cidade para cursar o ensino médio, após a conclusão do ensino fundamental. Tasi representações vão muito além do tédio sociológico, adentrando problemas como a dificuldade e negação do aprender o novo ou de perceber e conceber o diferente e as diferentes possibilidades de ser e de se viver. As representações dos jovens da Escola F limita as práticas cotidianas a se direcionarem a busca de um futuro melhor, reduzindo a realidade a esteriótipos em meio aos processos produção de novas representações sociais de subordinação a uma realidade injusta e cruel.
As conseqüências destas representações são que os pensamentos e práticas dos indivíduos parecem “girar” em torno da realização de prazeres imediatos e desejos primários. Os jovens discutiam e criticavam tudo, mas superficialmente, e sempre jogando com esteriótipos, de modo a possuir muito medo de enfrentar os problemas de forma objetiva, diante da possíbilidade da frustração e do fracasso, evita-se a ação. Nega-se uma nova prática. O risco do fracasso era sempre evitado, uma vez que subjugavam suas próprias condições intelectuais e de conhecimento como incapazes.
A presente pesquisa tentou buscar em suas limitações, um outro prisma para o estudo das representações sociais no âmbito da educação, ao focar análises no estudante, buscando compreender o seu posicionamento diante de um mundo vivido, percebido e concebido por ele.
Portanto, tivemos por objetivo a análise das representações sociais de jovens estudantes em ambiente de sala de aula, focalizando o estudo das representações do “espaço vivido” pelos educandos em sua vida cotidiana, de modo a buscar através desse caminho investigativo o entendimento de como se dá a estruturação do senso de realidade e a percepção de “si” no e do “mundo”.
A partir desse conhecimento, foi possível então estabelecer canais de comunicação entre professor-pesquisador-estudantes, bem como a seleção de linguagens e materiais apropriados para as atividades pedagógicas e de pesquisa científica que possibilitassem melhorar o desenvolvimento dos educandos e da prática pedagógica. Foi o conhecimento da realidade do ponto de entendimento do jovem educando, fazendo valer as tese freireanas do processo dialógico, que permitiu criar e organizar ferramentas para lidar com as peculiaridades de cada turma, e suas diferenciações e polarizações mediantes os contextos de exclusão/inclusão social e educacional.

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Autor: Raquel Valerio


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