O “linguistismo” e as novas ideias para o ensino de língua materna nas escolas.



(Joel Carlos Santana Santos/06.04.09 – escrito de acordo com as novas regras ortográficas.)


A nova era da Educação vem cheia de boas intenções e alicerçada em teorias que visam à liberdade discente na produção do conhecimento. Quando o assunto-alvo é a linguagem, surgem ainda mais teorias, complexas e cheias de falas ‘do politicamente correto’. Muitas teorias baseadas no conceito de comunicação exclusivamente pela comunicação, em favor da passagem da informação como ela se configura, mas em detrimento da Norma, do veículo através do qual essa informação chega.

O certo é que como estava não poderia ficar. Como versa Nicolau Maquiavel em um de seus pensamentos, extraído do romance O príncipe: “se os tempos mudam e os comportamentos não se alteram; então é a ruína!”. Entretanto, há que se medir o tamanho dessa mudança, pesar seus prós e contras, definir sua razão de ser e sua viabilidade. Com o desenvolvimento das ciências e o advento da tecnologia, tornou-se mais eminente a preparação para “o conhecimento de mundo”, o que inclui o poder de comunicação escrita e, principalmente, falada; contudo, a teoria do contrário vem agarrando suas raízes no solo da consciência discente. Contribuindo para isso, estão os novos professores linguistas, que vêm apregoando nos quatro cantos do planeta a abolição das normas gramaticais na fala, que deve ser livre. Com o discurso embasado no dito popular “faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço”, já que nenhum deles fala com tal liberdade ou a aceita sem dogmas na fala alheia, eles vêm apresentando teorias que (re)produzem ideologias como a de que “qualquer falante é capaz de compreender um texto, dizer se está coerente, resumi-lo, dar-lhe um título e etc. (Chomsky)”, que “o falante é senhor de sua linguagem (Celso Luft)” visto que a linguagem lhe é imanente, ou que “a gramática traumatiza o aluno e paralisa seu aprendizado” e tudo isso vem sendo ditado a graduandos das áreas afins da educação, que aceitam religiosa e incontestavelmente.

Maquiavel, quando disse nas entrelinhas do seu texto que a evolução era necessária para evitar a estagnação e consequentemente o caos, não fez alusão ao detrimento do velho em nome do novo. É sabido que mesmo um erro serve de apoio ao aprendizado, à adequação. Fato que não ocorre com a visão substitutiva desse modismo linguístico em cuja bibliografia predomina a desconsideração da dicotomia mais eminente em qualquer aprendizado: ‘acerto-erro’. O que se deveria fazer era transformar o conhecimento sem deteriorar o vetor de condução do conhecimento; no caso das novas teorias da linguagem, a ausência dos conceitos de ‘certo e errado’, se abolidos como querem os adeptos do linguistismo, levaria a língua a um nível de imprecisão sem tamanho. Imagine-se: um país como o nosso, detentor de 80% dos falantes do português, se impregnado de liberdade para gerir a língua e ‘produzir’ sentido sem a tutela da Gramática, com tantas maneiras de se falar e – mais preocupantemente – de registrar o que se fala, com a pobre cultura estudantil e os altos índices de evasão escolar e analfabetismo, além também do hábito da leitura chegando às raias do ridículo, onde pararia a língua? Como ficaria o vernáculo português no mundo?

Há muito tempo, a responsabilidade dos baixos números da educação brasileira está na falta de investimento. O que sempre se alega é que o pequeno percentual do dinheiro público separado para a educação, cujo montante ainda sofre desvios fraudulentos vergonhosos, só contribui para a deterioração das inter-relações entre governo, escolas e professores. Implicações como “O governo finge que me paga (com um salário de miséria) que eu finjo que ensino e vocês fingem que aprendem” tem como resultado anos de uma escola caótica, abandonada pelo poder público; entretanto, a língua sempre foi ensinada na medida do possível e com a estrutura viável para o momento, para o investimento. O tempo passou. Agora o comportamento dos professores terá que mudar, porém o dos governantes se mantém intactamente inalterado, os alunos estão piores do que antes em vários fatores (cultural, educacional, sócio-moral, ético e legal, indo da crise das relações até à agressão) e, desta vez, a ruína se instaurará em outro ambiente: o da linguagem. As diretrizes do momento são ‘divertir para atrair’ ou ‘mudar para encantar’. A educação tem que ser atraente, ainda que isso desfaça o foco da relação ensino-aprendizagem, prescinda-se de coisas importantes, como as peças do processo, e não se saiba da eficácia da técnica (muitas vezes experimental).

Mudar virou uma obrigação, uma determinação. E se o professor não se propuser a isso, será considerado obsoleto, haja vista a frequência com que se convertem ao linguistismo alguns e se doutrinam outros ainda no processo de graduação. O pressuposto de mudar nem sempre é rejeitar o velho, principalmente quando este é parte essencial do “foco” do câmbio; Já o pressuposto de se ensinar gramática é saber gramática. O de uma boa leitura ou o de uma boa produção é o reconhecimento básico da estrutura do texto (falado ou escrito). E é inconcebível que se possa fazê-lo sem tais bases. E, para o professor-linguísta, é muito mais cômodo se liberar da obrigação de corrigir certos e errados de gramática e estrutural-textuais, e focam sua aula na interpretação, que depende da leitura do aluno e do professor, que não leem. De olho em justificar tudo o dito, não é, entretanto, papel da Gramática nem dos que a estudam e tornam públicos seus postulados, cantar as virtudes do seu teor normativo como solução única para os problemas da língua. O que se intenciona com ela é dar apoio à comunicação (passagem) e à produção (criação) do sentido da linguagem. A linguística faria sua parte catalogando as variações e desfazendo o processo de depreciação preconceituosa e rechaço em relação à língua coloquial.

Toda a teoria linguística teria plena validade e incontestável ideologia, vista a nobreza da ideia subliminar à radicalidade da mudança, se primasse pela aglutinação de seu objetivo com o da gramática, ou seja, se ambas cooperassem sem o discurso liberalista inconsequente que tem, sem a negativa à norma. O certo é que a Gramática Tradicional não deprecia ou despreza totalmente a ideia linguística, tampouco a intenção do método mais atraente para o ensino de língua. Entretanto, na contramão do lógico, a tese da comunicação por si, dissociada da estrutura, não condiz com a realidade estudantil. No que tange a concursos, a vestibulares, ao Enem (prova gerida pelo governo com vistas a testar a capacidade do alunado, principalmente, de baixa renda e para dar acesso às universidades) e às próprias avaliações colegiais, o cabedal dos estudantes gera índices vergonhosos; e tal tese nem viabiliza um ‘aprendizado para a vida’, uma vez que já se construiu uma cultura de ‘rotulação’, parafraseada aqui numa máxima da literatura: “tu és responsável por aquilo que falas”. E os linguistas tomarão para si a responsabilidade?
Autor: Joel Carlos Santana Santos


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