Combate a Fome ou Combate à Corrupção?



Para combater um problema sério se deve, antes de tudo, investigar o motivo causador do problema. A pobreza e a fome não são problemas que tivessem surgido do nada, não são epidemias que surtem de repente. São males que evoluem pouco a pouco, e a cada ano aumenta sua intensidade. A miséria do mundo sempre foi gerada por motivos graves e somente com a erradicação da raiz do mal e do motivo original é que se pode eliminá-la.

A Europa, por exemplo, experimentou décadas de miséria e fome. O povo da França, da Itália e Espanha durante longos tempos viveram na pobreza absoluta, e o motivo era as constantes guerras. Quando estes países erradicaram as guerras conseguiram acabar com a miséria, especialmente, quando surgiram governos com projetos voltados para o bem estar do povo. E assim, uma prosperidade relativa reinou nestes territórios.

A miséria na Índia e na África tinha como principal razão a dominação por alguns países europeus, quando a riqueza era exportada. A força do trabalho também era explorada nestas regiões. Assim, estes paises que eram prósperos se tornaram pobres, e continuam pobres, porque seus recursos naturais e riquezas foram explorados de forma devastadora.

Mas, hoje o motivo principal de miséria e fome em todas as regiões é a corrupção. A corrupção é enraizada em maioria das instituições. As empresas privadas de grande porte, por sua vez, se alimentam das máquinas do governo, e assim os cofres públicos se esvaziam. Vejamos o exemplo de bancos que durante décadas eram os campeões de lucro e agora os governos derramam o dinheiro público em seus cofres para salvá-los. Sendo assim, os recursos que sobram não ajudam na construção do país. Nas escalas menores também os recursos são mal administrados e até desviados do seu objetivo.

Na verdade, quando num país a corrupção se instala de forma devastadora e os governantes não punem os responsáveis, não restam dúvidas que o espírito da honestidade morre e se perde as diretrizes que direcionam o povo. A prática de ética se torna impossível, quando os responsáveis por desvio de verbas e os exploradores de recursos não são apontados e punidos.

Quando a corrupção se enraíza nas instituições do governo, o país perde a cultura de moralidade e a riqueza do caráter. Diversos grupos, em todas as regiões devastam os recursos da nação, de acordo com sua força e poder de ação. Os sistemas grandiosos de corrupção alimentam os subsistemas de corrupção. Quando o diretor de uma escola pública desvia os recursos de merenda escolar, é o sinal de que centenas de instituições superiores a ela estão contaminadas com a corrupção.

Acontece que ninguém acredita que o pequeno desvio de verbas possa causar muito prejuízo para o país. Mas, a soma dos prejuízos que todos os oportunistas proporcionam é muito grande, é mais devastador do que uma guerra. A guerra ainda é melhor, por que tem início e fim, ao contrário de um modelo de administração sustentado pela corrupção ao longo de décadas. É impossível um país sobreviver por muito tempo com canais de corrupção abertos o tempo todo. O resultado, sem dúvida, é a miséria que se instala.

A miséria e a fome são efeitos colaterais de corrupção e na medida que a corrupção se alastra em diversas camadas da sociedade elas seguem juntas. E nesse cenário vão se somando a violência, as epidemias e as doenças.

Neste processo devastador, todos os meios de desenvolvimento da cultura e da cidadania são prejudicados, como também os da educação, da saúde, da justiça, e dos direitos humanos. As falhas e lacunas que a corrupção causam no sistema de um país acarretam danos diretos e indiretos no desempenho das instituições governamentais e graves problemas sociais, como desvalorização de padrões sociais e morais, empobrecimento da cultura, generalização da violência em diversos aspectos, e falta de constância nos planos de governos, além da própria miséria.

Para combater a miséria e a fome num país há apenas um caminho: o de combater a corrupção interna. Essa tarefa é das mais árduas, e é por isso que combate à corrupção faz parte dos discursos e debates, mas não dos planos do governo.

O que proporciona progresso e prosperidade de uma nação é firmeza na justiça e seriedade no estabelecimento de leis e decretos – a punição dos corruptos através de um judiciário ágil e imune à corrupção. Num futuro breve palavras como a democracia ou ditadura, comunismo ou capitalismo, monarquia ou república; e socialismo ou liberalismo todas perdem seu sentido, por que as coisas que vão definir a aceitação do povo serão a política de ações dos governantes e seus planos que buscam mudar o modo de vida para melhor, que realmente visam a qualidade de vida. Quanto mais eficientes, justos, honestos e sinceros, mais aplaudidos serão pelo povo.

Bahá’u’lláh (1817-1892) escreveu: “Embora o mundo esteja cercado de miséria e angústia, homem algum fez pausa, entretanto, para ponderar qual seria a causa ou origem disso. Nutrimos a esperança de que a luz da justiça possa brilhar sobre o mundo e o santificar da tirania.” Ele afirmou ainda: “Se os governantes e reis da terra se levantarem e resolverem dedicar-se a qualquer coisa que promova os mais altos interesses da humanidade inteira, o reinado da justiça seguramente se estabelecerá entre os filhos dos homens e a fulgência de sua luz envolverá toda a terra. A estrutura da estabilidade e ordem do mundo se erigiu sobre os pilares gêmeos da recompensa e da punição, e por estes continuará a ser sustentada. Atendei, ó assembléia dos governantes do mundo! Não há na terra força alguma que possa igualar, em seu poder conquistador, à força da justiça e sabedoria. Bem-aventurado é o rei que marcha com a insígnia da sabedoria desfraldada em sua frente, e os batalhões da justiça aglomerados em sua retaguarda. Ele, verdadeiramente, é o adorno que embeleza a fronte da paz e o semblante da segurança. Não pode haver dúvida alguma de que, fosse o sol da justiça - que as nuvens da tirania obscureceram - irradiar sobre os homens sua luz, a face da terra seria completamente transformada.” (1)

Por natureza, as pessoas querem preservar sua dignidade, gostam de manter sua integridade e almejam por trabalhos honestos, para se sustentar e garantir a honra da sua família. A prova disso é que os povos sempre aceitaram qualquer trabalho, mesmo com salários abaixo do mínimo, de tal forma que em muitos países os governantes, cientes das necessidades da camada trabalhadora, sem piedade, vêm diminuindo a cada ano o valor real de sua remuneração. E ainda assim, as pessoas fazem de tudo para terem a chance de trabalhar. Isso mostra que elas não querem ser mendigas dos governos, mas, não querem ser também escravas de um sistema; o que elas precisam é ter o direito à cidadania de volta.

(1) Seleção dos Escritos de Bahá'u'lláh – Editora Bahá’í do Brasil

Autora: Felora Daliri Sherafat
Autor: Felora Daliri Sherafat


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