Currículo e Diversidade: a música africana no contexto escolar



A lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, tornou obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira, incluindo no conteúdo programático, dentre outras abordagens, o estudo da História da África e dos Africanos, partindo-se das áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras e contextualizando-se com as demais disciplinas.
No tocante à Cultura Africana, destaca-se o estudo sobre as produções artísticas tais como artes, plásticas, literatura, dança, teatro e música.
Sabe-se que a música desempenha um importante papel no contexto escolar, pois além de despertar a criatividade proporciona a interação entre os educandos.
Sabe-se ainda que o currículo escolar não é um produto pronto e acabado, mas algo a ser construído a partir da ação dos sujeitos envolvidos no processo educacional interagindo sobre e na realidade, conforme ressalta Esperidião (2002).
Nessa perspectiva, Faria (2001) destaca que a música acompanha as transformações da sociedade e está presente no contexto escolar dando vida ao ambiente e favorecendo a socialização dos alunos, além de despertar neles o senso de criação e recreação.
Desse modo, é válido afirmar que a música se configura como um elemento que facilita e amplia o conhecimento dos educandos uma vez que esta traz consigo característica de um povo, uma época, região etc.
Com efeito, Gainza (1988), acrescenta que a música é um elemento de fundamental importância por contribuir para a transformação e o desenvolvimento do educando.
Partindo-se dessa premissa, percebe-se então que através da música, pode-se desenvolver uma consciência política e histórica da diversidade, além de fortalecer a identidade e direitos de cada indivíduo, combatendo o racismo e as discriminações.
É nesse contexto que se destaca as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, que reforça a importância de se propagar conhecimentos, atitudes, valores e postura de respeito diante da pluralidade étnico-racial, através da interação e valorização da identidade.
Trabalhar a música africana no contexto escolar significa abordar de maneira lúdica, prazerosa e abrangente, a história da África, uma vez que, para os africanos, a música e a vida estão intimamente ligadas, sendo considerada como o elo entre o presente, o passado e o futuro e por isso tida como inseparável da vida humana.
Kubik (1981) apud Morais (1997) destaca que a música africana atual representa o resultado de várias mudanças históricas: ecológicas, culturais, sociais, religiosas, políticas e muitas outras, como por exemplo, a mudança dos ecossistemas, que afetou a longo prazo as deslocações dos povos, que provocaram por sua vez, mudanças nas suas manifestações culturais, incluindo a música e a dança.
Este autor acrescenta ainda que os grupos étnicos foram submetidos a um fluxo constante de influências e características musicais, fazendo com que modas fossem trocadas ao longo das fronteiras étnicas e linguísticas.
Nas palavras do autor:
É atualmente consensual que a música/dança africana de várias regiões do continente passou por mudanças decisivas ao longo da história. O que hoje se designa por música tradicional é com toda a probabilidade diferente do que se ouvia há alguns séculos. Também não se pode considerar a música africana como exclusivamente étnica, na acepção que é dado a este termo em etnomusicologia. As formas e características musicais não se encontram rigidamente ligadas a grupos étnicos; de referir ainda a importância de cada músico, com o seu estilo e criatividade próprias. (KUBIK apud MORAIS 1997)

Pucci (2008) destaca uma das características da música africana: a comunicação. Segundo ela, além de ser parte integrante da vida social e religiosa, a música africana tem o sentido básico de comunicação espiritual, mística ou cotidiana.
Não obstante, Warren (1970) apud (AFRICAN MUSIC), acrescenta que a música africana é altamente funcional, acompanhando nascimento, casamento, caça, e até mesmo as atividades políticas.
Observa-se então que a música africana representa uma parte da identidade, pois traz as tradições e valores que estão associados a cada pessoa.
Infere-se ainda que a música africana está vinculada a fatores culturais, que em conjunto demonstram os valores da sociedade, tais como visão de mundo, economia, sexo, idade, história e família.
Destaca-se nesse contexto a multiplicidade de estilos musicais presente na África devido à variedade geográfica do continente, tornando-a uma das regiões do mundo mais diversificadas musicalmente.
Contudo, apesar desta diversidade, é possível unificar uma de suas características: a percussão resultante da junção entre melodia simples, ritmo complexo e instrumentos como tambores, guizos, sinos, gongos dentre outros.
Em relação a tais instrumentos, Kubik (1981) apud Morais (1997), atenta para a forma como o africano toca seus instrumentos musicais.
Segundo este autor, o corpo interage com a música na medida em que o músico não produz apenas sons, mas também gestos, através das mãos, cabeça, ombros, ou pernas, de acordo com determinados motivos coordenados, durante o processo de produção musical.
Diante do exposto, percebe-se então outra possibilidade de se trabalhar com a música africana no âmbito escolar, através de oficinas de confecção de vários instrumentos musicais mediante um repertório específico da África.
Assim, o estudo sobre a música africana se constitui como uma das ações educativas de combate ao racismo e a discriminações que valoriza a oralidade e a corporeidade, conforme requer as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana.
REFERÊNCIAS:

AFRICAN MUSIC. Disponível em: Acesso em: 17 jun. 2009.

ESPERIDIÃO, Neide. Educação Profissional: reflexões sobre o currículo e a
prática pedagógica dos conservatórios. Revista da ABEM, n. 7, setembro de 2002

FARIA, Márcia Nunes. A música, fator importante na aprendizagem. Assis chateaubriand – Pr, 2001. 40f. Monografia (Especialização em Psicopedagogia) – Centro Técnico-Educacional Superior do Oeste Paranaense – CTESOP/CAEDRHS.

GAINZA, V. Hemsy de. Estudos de Psicopedagogia Musical. São Paulo: Summus, 1988.

KUBIK, Gerhard (1981). Música e Dança na África a Sul do Sahará. In: Cultural Atlas of Africa, Oxford, 1981. pp. 90-93. Tradução e digitalização de Domingos Morais, em 1997. Disponível em:

PUCCI. Magda Sobre a música africana. 2008. Disponível em: http://www.fluxosmusicais.com/debate/sobre-a-musica-africana/.Acesso em: 05 jun 2009.
Autor: Eliziane Castro


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