O Corpo: A História do corpo humano na ótica de José Carlos Rodrigues e a realidade Amazônica.



Rodrigo B. Froés


Resumo

Nosso interesse pela temática se deu a partir da observação de como o corpo humano passou a ser uma preocupação constante da sociedade atual, como as academias, praças de caminhadas, bem como lugares disponíveis as práticas esportivas estão cheias de amadores que buscam saúde e bem-estar, pretendemos visualizar através da História principalmente baseado na análise de José Carlos Rodrigues como o corpo ganhou seu espaço, lembrando que a História narra o “tabu” que se esta envolto essa temática.

Palavras-chave: Corpo Humano, História, comportamento.

Primeiramente, nossa análise parte de um importante trabalho relacionado a temática em que o autor José Carlos Rodrigues no livro O Corpo na História elaborou uma história da sensibilidade da cultura ocidental. Para dar liberdade às suas inquietações, assumiu fugir aos rigores que buscam delimitar disciplinas científicas, como a História e a Antropologia. O autor identificou a Idade Média como a época em que se ressaltaram maiores contrastes e antagonismos nos sensos estéticos. A Idade Média constitui "o outro específico da civilização moderna e contemporânea" (RODRIGUES. 1999, p. 17). Justamente por isso, ele escolheu esse período como ponto referencial, pois o contraste foi capaz de revelar mais claramente o que se busca renegar. Trazer à lembrança a Idade Média para compreender a subjetividade contemporânea é buscar decifrar o "que somos à luz do que pensamos que não somos mais" (RODRIGUES. 1999, p. 27).
Desse modo, entendemos que mesmo no século XXI o corpo continua a ser uma das maiores lacunas da história. Mesmo com trabalhos como Uma História do Corpo na Idade Média , obra conjunta de Jacques Le Goff, principal continuador da escola dos Annales, e Nicholas Truong, antigo diretor da revista Lettre, levantou a questão. O livro buscou o levantamento dos motivos que têm empurrado o corpo para fora da história, apontando-os, um por um, com expressa vontade de enumerá-los, de debatê-los numa perspectiva dinâmica e clara, a deixar para trás equívocos, mistérios, idéias feitas.
Pensar o corpo é uma tarefa complexa, dadas as diversas dimensões que podem ser exploradas. Além de ser o arcabouço físico do ser humano e marcar sua existência material, o corpo compreende as formas de se relacionar, de interagir, de refletir sobre e com o mundo (FERREIRA,1999). Trata-se de uma construção, obviamente concreta, mas moldável, conforme os valores e a cultura provenientes da sociedade onde está inserido.
A sociedade contemporânea tem sido testemunha de um crescente interesse em torno do culto ao corpo ou a cultuação do corpo, com destaque para a exposição do que antes era escondido e, aparentemente, controlado (GOLDENBERG; RAMOS, 2002).
Conforme Pereira (2002), a mídia é uma parceira estratégica para este contexto de alta visibilidade do corpo, característico da sociedade de consumo, por meio da qual divulgam-se formatos e padrões de corpo, bem como maneiras de ser tratado, modificado, produzido e, por que não dizer, reproduzido.
Para tanto a partir da ótica de Rodrigues foi no século XVII que emergiu uma nova forma de conhecimento que deu sentido ao mundo e irá conformar não somente a racionalidade, mas também posturas, representações e sensibilidade do homem ocidental moderno. Foi nesse século que se caracterizou uma ruptura indicada por outra maneira de produzir e conceber o saber no mundo ocidental. O saber, a partir de então, separa-se dos seres; distancia-se, dissocia e fragmenta, viabilizando o método analítico. Modifica-se toda forma de relação do pensamento com a cultura, que passa a ancorar-se em oposições: subjetivo x objetivo; natureza x cultura; sociedade x indivíduo; natural x sobrenatural.
Segundo o autor a base dessa ruptura foi a cisão que divide o homem em corpo e alma, questão trabalhada no capítulo 3 e que traz um ponto polêmico: o autor argumenta que o século XVII foi o período que inaugurou a divisão entre corpo e alma.
Ao recuperarem-se a história e imagens dos tempos medievais, podemos entrar em contato com dimensões que foram negadas e interrogar a pertinência das opções culturais do ocidente. Esse foi um dos pontos mais bem desenvolvidos em O Corpo na História. A constituição da individualidade implicou mudanças radicais nos modos de pensar e sentir. O refinamento dos costumes vinculou-se ao desenvolvimento de lógicas e técnicas de proteção do corpo. As fronteiras corporais tenderam a tornar-se progressivamente mais demarcadas e os corpos mais defendidos.
Michel Foucault , precursor dos estudos referentes à sexualidade, problematizou as questões da sexualidade humana e sua relação com o corpo. A sexualidade, para ele, não é uma qualidade herdada da carne que várias sociedades louvam ou reprimem – não como pensava Freud, um impulso biológico que a civilização canaliza em uma direção ou outra. Mas sim, uma forma de moldar o self “na experiência da carne”, que por si só é constituída em torno de certas formas de comportamento. O sexo, assim como o ser humano, é contextual. É impossível isolá-lo de seu meio discursivo e de sua caracterização socialmente determinada, ao tentar fazer isso incorre ao erro.
Para Foucault até o século XVII as questões da sexualidade ainda não buscavam pelo segredo, vigorava-se uma certa franqueza em relação ao “uso dos prazeres”, e as palavras não eram tão disfarçadas a ponto de serem reduzidas a um vocabulário do que era ou não permitido dizer. Todavia, no início do século XVIII o pensamento burguês dá origem à Idade da Repressão, que coincide com “o desenvolvimento do capitalismo essa repressão que se pode ainda fazer coexistir, discretamente, em que o medo do ridículo ou o amargor da história impedem a maioria dentre nós de vincular: revolução e felicidade; ou então, revolução e um outro corpo, mais novo, mais belo; ou, ainda, revolução e prazer” (FOUCAULT, 1989: 11-12). Como o próprio autor mostrou, designar o sexo seria cada vez mais difícil. Para domá-lo num plano real torna-se necessário reduzi-lo ao plano da linguagem, ou melhor, controlá-lo na sua livre circulação no discurso. Dessa forma, percebe-se que Foucault considera o silêncio como um conjunto de estratégia empregada para a montagem do discurso. O modo como uma sociedade lida com o saber e o poder (termos sinônimos) se realiza através da montagem de dispositivos discursivos (FOUCAULT, 1989: 181).
O autor Nei Alberto Salles em seu artigo Leituras Sobre o Corpo: Aspectos na História nos apontou que para Crespo o corpo é um dos temas mais discutidos no mundo contemporâneo, sendo objeto de estudos cada vez mais freqüentes no domínio das ciências humanas e sociais. A emergência das reflexões sobre corpo processa-se num quadro de profundas mudanças na civilização - costumes, valores, categorias de análise. Em qualquer caso, julga-se que as novas maneiras de pensar, sentir e agir o corpo são indicadores de uma mudança.
Nesta perspectiva, as práticas do corpo não se podem compreender enquanto realidades simples e homogêneas, mas, sim, no entrecruzamento dos múltiplos elementos econômicos, políticos e culturais de uma totalidade. Portanto, a história do corpo é sempre uma história incompleta, sempre por fazer. Assim, torna-se indispensável aprofundar as investigações sobre as práticas e as representações do corpo, dado que ainda muito há por conhecer numa área em que a “dimensão escondida” das condutas humanas é de uma riqueza imprevisível.
No sentido de indicar possíveis caminhos para se construir a história do corpo, Crespo salienta que é importante nunca esquecer que esta história do corpo deve encontrar a sua principal justificação nos problemas que se colocam aos homens do mundo atual. Em segundo lugar, a história do corpo deve ser perspectivada na “longa duração” e confrontada com a multiplicidade de tempos, de espaços e de técnicas elaboradas a partir de atitudes mentais que não é fácil delimitar.
Além disso, sem esquecer a importância de certos dados quantitativos, a história do corpo é essencialmente de natureza qualitativa, nem sempre dispondo dos materiais mais evidentes e exigindo interpretações cautelosas e rodeadas de grande rigor crítico, sugerindo a permanente distanciação do historiador, muitas vezes até ao limite da sua própria mudança de atitude mental, alteração que poderá ser a fonte de novas descobertas ou a confirmação da inutilidade e falsidade de certezas que se julgavam obtidas em definitivo.
Por fim, a história do corpo não pode deixar de ser uma história diferencial, em busca das desigualdades entre os tempos de vida humana, os lugares e os grupos sociais; entre o saber dos eruditos e a espontaneidade das práticas tradicionais, entre o real e o imaginário; enfim, entre mentalidades diversas, maneiras opostas de representar o corpo ou de o exercitar por múltiplas técnicas.
Cabe, então, perguntar: entende-se mais do corpo vivendo-o ou discursando sobre ele? Para compreender o corpo é preciso falar dele? Não basta senti-lo? Estaria certo Descartes (1596-1650) quando define o homem como sendo fundamentalmente espírito (penso, logo existo) ? Ou estaria mais perto da verdade Merleau- Ponty (1908-1961) dizendo que “eu sou meu corpo” (existo, logo penso) ? O que é verdadeiramente o corpo? Como a humanidade o concebeu através dos tempos? (MEDINA, 1987).
Estas questões, colocadas por Medina servem para pensar à respeito da dualidade do corpo sempre discutida e que perpassa o pensamento ocidental a séculos. Para Medina, durante muito tempo a doutrina da instrumentalidade do corpo (o corpo como instrumento da alma) perpassa os pensamentos dos grandes filósofos antigos e medievais como Platão, Aristóteles, São Tomas de Aquino, Hobbes entre outros; e diz que é só com o dualismo cartesiano que se abandona o conceito de instrumentalidade do corpo.
Sendo assim, notamos como se fez complicado a análise acerca do corpo, mas de grande importância, pois seja com fins estéticos, esportivos, de saúde, qualidade de vida ou sociabilização, entre outros, o fato é que tem havido um aumento considerável da prática de atividades físicas, evidenciado na proliferação de academias de ginástica ou na simples observação de pessoas praticantes em locais públicos, como praças, parques e praias.
Para ligar a História do corpo e compreender a realidade amazônica nesse contexto se fez necessário viajar na História partindo a etimologia do no nome Amazonas e a lenda que sugere ser a origem é visualizar belas guerreiras corpo perfeito que guerreavam e conquistavam sempre vitórias, notar um biótipo próprio e peculiar nas nortistas, que as diferenciam completamente das demais mulheres do pais, na história vista como feiticeiras

A sociedade colonial de estrutura indo-européia é responsável pela formação da visão de que a mulher amazonense é permissiva sexual. É perceptível o propósito da dominação portuguesa em buscar construir um plasma social em torno da imagem das índias, associada ao papel de mulheres parideiras e fogosas, para promover a política de povoamento da região que utilizavam o corpo para atrair os europeus.

Outra peculiaridade na formação do biótipo amazonense foi sob os imperativos da colonização, os homens portugueses foram persuadidos a contrair laços matrimoniais com a mulher índia, ao mesmo tempo em que se dificultava o vínculo matrimonial de índios com negros, que eram excluídos da política de reprodução física da região.
Sendo assim A propaganda do exotismo feminino e da suposta inclinação das índias para os prazeres sexuais – somada aos incentivos e prêmios oferecidos pela Coroa aos patrícios que contraíssem laços matrimoniais ou relações de concubinato com a mulher nativa – contribuíram efetivamente para o deslocamento de inúmeros portugueses para a Amazônia. Aqui na nova terra, poderiam “ter vinte ou mais índias escravizadas e usá-las todas como concubinas” (GAMBINI, 2000:140). A nudez feminina era, contraditoriamente, objeto de desejo dos colonos incentivados pelo próprio poder local, e perversão pecaminosa aos olhos da Igreja.
O corpo foi utilizado como subsistência, pois participar do comércio sexual tornou-se uma condição compulsória às famílias indígenas que precisavam garantir a sua sobrevivência naquela sociedade, quer seja no aspecto material de inserção no processo produtivo, quer seja no âmbito do reconhecimento político que lhes permitiria estreitar laços e estabelecer relações com o poder hegemônico. Formou-se, então, um verdadeiro comércio sexual na Amazônia colonial.
De acordo com o relato do padre Daniel, que viveu no Amazonas no século XVIII, muitos pais eram compelidos a oferecer suas filhas aos homens brancos – que visitavam seu povo por razão de algum negócio – em troca de gêneros alimentícios, bebidas alcoólicas e outras quinquilharias. Maridos ofereciam suas mulheres, e moças solteiras recorriam ao padre para pedir o batismo, dadas as dificuldades e obstáculos que se impunham no plano da exclusão social. Daniel (1976:211) sinaliza para o fato de que o comércio sexual era uma prática franca na Amazônia, pois, “por essa mesma razão estão os mesmos já nascidos, e creados nas missões, e todos os dias doutrinados oferecendo as filhas, e talvez as mesmas mulheres por qualquer ridicularia, como é um frasco de ágoa ardente” .
A partir dessa miscigenação o biótipo corporal amazonense se fez de um misto como narra os poetas: A mulher Amazonense “Essa mulher é morena, baixinha, perna grossa, cabelos lisos e negros, sorriso largo e bonito. É também branquinha, cumprida, cabelos cacheados, olhos castanhos e cintura fininha” .
Considerações Finais
As questões apresentadas neste esboço se constituem em impressões iniciais, procurando estar atento às questões do corpo. Algumas alternativas se abrem para a continuidade destes estudos, como a preocupação com o corpo historicamente “construído” reflete todas as representações as quais foi submetido, através de seus movimentos e gestos, e isso não pode deixar de ser considerado.
Esta foi a intenção deste trabalho, onde os pressupostos com relação à história de forma geral e a história do corpo foram colocados com o objetivo de obter subsídios para estudar um momento histórico particular.



Livro Base
RODRIGUES. José Carlos. O CORPO NA HISTÓRIA. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1999. pp. 198.
Autores que fundamentaram
CRESPO, Jorge. A História do Corpo. Lisboa - Portugal : DIFEL, 1990.
DANIEL, Padre João. Tesouro descoberto no rio Amazonas. Tomo 1, 1ª, 2ª e 3ª partes. Separata dos Anais da Biblioteca Nacional. V. 95, t. 1 – 2, 1975. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1976
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade. O uso dos prazeres. 9ª ed. Rio de Janeiro: Edições Graal. 1989.
FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

LE GOFF, Jacques & TRUONG, Nicolas. História de um esquecimento. Uma história do corpo na Idade Média. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. p. 15-32.

MEDINA, João Paulo S. O Brasileiro e seu Corpo: educação e política do corpo. Campinas-SP : Papirus, 1990.

PEREIRA, C. A. M. Cultura do corpo em contexto de alta visibilidade. In: CONGRESSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTO DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA, 9., 2002, São Luís. Coleção Prata da Casa. Edição Especial.

GOLDENBERG, M.; RAMOS, M. S. A civilização das formas: o corpo como valor. In: GOLDENBERG, M. (Org.). Nu & vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio de Janeiro: Record, 2002.

TORRES, Iraildes Caldas. As novas amazônidas. Manaus, Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2005.
Autor: Rodrigo Froes


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