Nazismo E Liberdade De Expressão No Brasil Republicano



NAZISMO E LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO BRASIL REPUBLICANO

por Wdileston Gomes Batista[1]

* Este artigo não visa divulgar o Nazismo. Seu autor não pactua com nenhuma doutrina sectária nem pretende contribuir para a divulgação de teoria que objetive oprimir o ser humano. Pretende apenas, o autor, discutir a inconstitucionalidade de norma que restringe a liberdade de expressão. Entende o autor que a liberdade é melhor socialmente que a proibição. 31-01-2008.

I

O Brasil certamente é um dos países mais liberais do mundo. Em pouquíssimos lugares deste mundo é possível exercer a liberdade de expressão em tamanha dimensão como neste país. Neste aspecto, estamos à frente de muitas de pseudo-democracias. Somos um país tropical, de paisagem esplêndida e povo hospitaleiro. Temos espaço físico para toda a população. Não temos vulcões, terremotos, ciclones, tufões, maremotos, cataclismos, nevascas, dilúvios, secas, enchentes. Não temos epidemias ou pandemias significantes. Temos água em abundância, terra fértil, clima estável, poucas variações climáticas, boa localização. Não temos problemas raciais significativos. Não temos choques escancarados de classe apesar da desigualdade social. Nunca passamos por tiranias duradouras. Nunca fomos invadidos em circunstâncias beligerantes. Nunca travamos guerras que prejudicasse-nos diretamente. Nunca vivemos uma guerra civil no sentido amplo, exceto episódios menores. Não há segregação racial. A tolerância com as diferenças é ampla. Negros, brancos e nativos vivem pacificamente. A homofobia é desprezível estatisticamente. Não temos párias. Repelimos os crimes infamantes. Não temos pena de morte em tempos de paz. Temos o sistema eleitoral mais avançado tecnologicamente do mundo. Temos o melhor programa de combate ao HIV do mundo inteiro. Temos rios navegáveis. Temos o maior rio do mundo. Temos a maior floresta do mundo apesar da degradação em marcha acelerada. Somos tolerantes com o próximo no que concerne ao aspecto religioso. Cônjuges de religiões diferentes se casam e são felizes. Irmãos freqüentam orientações religiosas diferentes e se respeitam mutuamente. Temos o a maior festa popular do mundo. Temos a floresta com a maior biodiversidade. Temos o Pantanal. Temos praias paradisíacas. Temos um céu iluminado. Temos energia de sobra.Temos a cirurgia plástica de ponta apesar da beleza estética ímpar das mulheres brasileiras para mitigar a ingratidão da natureza com algumas poucas. Temos um futebol vencedor apesar de não investirmos no esporte e de sabermos que a maioria os jogadores são semi-alfabetizados e que o seu sucesso advém da falta de escola, lazer e cultura artística. Temos uma indústria fabulosa de reciclagem apesar de sabermos que a reutilização de materiais não provém de uma simples consciência ecológica, mas sim do desemprego dos catadores de lixo. Não temos tendência ao messianismo. Não toleramos doutrinas sectárias. Não nos adaptamos ao trabalho compulsório. Não nos regozijamos nacionalmente com o triunfo da indecência e da intolerância. Estamos acostumados à liberdade apesar de a usufruirmos há pouco tempo da nossa história. Não idolatramos ícones artificiais nem tampouco admiramos, por muito tempo a salvadores e afins. Não esperamos o advento de uma nova era. Temos o bio-combustível. Temos uma indústria aeronáutica que exporta um autêntico e sofisticado produto nacional..

II

Temos problemas em relação à criminalidade que é assombrosa em números, mas que refletem, estes números, a desigualdade social e lei frágeis. Ninguém tem no mundo o know how da insegurança pública como nós. Temos leis inócuas. Temos um sistema legislativo falido. Estruturas políticas em autólise. Descrédito das instituições. Inoperância do Estado. Corrupção em escala incomensurável. Conivência cultural com a corrupção e criminalidade. Elite egoísta. Analfabetos diplomados. Incompetência. Negligência. Imprudência. Arrogância. Truculência. Pobreza. Parcialidade. Sonegação de impostos. Temos o aborto como crime hediondo e nenhum só caso levado a júri por isto. Temos o Estado atrapalhando as obras sociais do Estado Paralelo. Assistimos e aplaudimos anualmente o desfile carnavalesco da lavagem de dinheiro sujo do jogo e outros esquemas. Temos a polícia mais violenta da América. Temos a mais sangrenta guerra civil não declarada do mundo. Temos um trânsito louco de veículos e condutores movidos a álcool. Temos subserviência aos ditames internacionais das nações imperialistas de hoje. Temos o capitalismo fraco que não inseriu e não inserirá todos. Temos um bolo que ainda não foi partido. Temos a hereditariedade na política partidária. Temos uma contradição no combate aos entorpecentes quando ao mesmo tempo permitimos a venda da cachaça. Temos a pirataria de software. Temos a pirataria das mídias. Temos as violações de direitos autorais em larga escala. Pouco produzimos em ciência, mas por falta de investimento que por falta de vocação. Não fabricamos um carro nacional, exceto por curta e sabotada experiência. Temos soterramento de favelados mesmo sem termos terremotos ou fenômenos semelhantes. Termos enchente de esgotos que invadem as grandes cidades.

III

A Constituição brasileira certamente é uma das mais garantistas que existem no mundo inteiro. Foi feita, após o processo de redemocratização, com o espírito de garantir o máximo possível de direitos sociais aos cidadãos. São tantos os direitos que a efetividade de alguns deles se perdem no plano do abstrato. Muitas são normas, que os doutrinadores do direito constitucional chamam de "programáticas" e que um dia serão cumpridas na medida do possível. Não obrigam o Estado a cumpri-las uma vez que demandam gastos que dependem de dotação orçamentária em verba restrita.

Verdadeiro pecado se abate sobre a norma jurídica brasileira. Entre muitas contradições encontramos uma que fere de cheio a Constituição Federal. A Lei Maior garante ao cidadão, no art.5º. IV a plena liberdade de expressão. O texto legal, ipse liters diz o seguinte: "Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". A Constituição é muito clara. Não resta dúvida que a liberdade de pensamento é livre. Resta-nos saber se a liberdade de pensamento contém a liberdade de expressão. Contribui a CF mais adiante com o inciso VI. "VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;" Mais adiante: "VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei" E ainda: "IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;" Mais: "XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;". "XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;" e de forma quase esquecida a maior de todas as pérolas da CF: "Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.§ 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade" . Ora, se a própria CF em diversas oportunidades é clara em relação a não tolerar qualquer restrição à liberdade de expressão, nenhuma lei infraconstitucional tem o poder de restringir esta liberdade, ou, do contrário, a CF não é a maior de todas as leis de um país.

A liberdade de expressão só não é plena no Brasil por que uma lei infraconstitucionalse sobrepõe à CF.

IV

Sabemos que os judeus foram perseguidos na Alemanha hitleriana por razões injustificáveis. Se por intolerância religiosa ou por expurgação em processo político, de qualquer forma não são aceitáveis as razões. O holocausto vitimou, aproximadamente, seis milhões de judeus, a maioria não fazia parte da classe dominante alemã e não eram responsáveis pelos problemas da República de Weimar[2], pelo contrário. A maioria dos judeus não era responsável pela opressão do povo alemão, mas sim vítima de uma classe, sem cor, que tem na ideologia da multiplicação do capital sua única bandeira. A perseguição aos judeus foi obra da insanidade de um povo. A Alemanha não é um lugar qualquer. O povo alemão não é de fato superior a nenhum outro. Nunca existiu a tal raça ariana. O home não é bicho. Não existem raças de humanos, só existe a raça humana. O conceito de raça não tem aplicabilidade em relação aos humanos. Mas os alemães tinham, naquele momento todo o direito de se sentirem especiais: reedificaram a Alemanha após a destruição provocada pela derrota na 1ª Guerra Mundial. Após as imposições (proibição de ter exército, perda das colônias, indenização aos vencedores) do Tratado Versalhes em 1918, que impôs severo fardo à Alemanha, outro país não teria se soerguido com tamanha vertigem. O alemão se considera especial desde a guerra franco-prussiana quanto a Prússia (Alemanha) tomou a Alsácia-Lorena da França. Mas os alemães demonstraram que realmente são diferentes quando conseguiram se levantar após a 2ª. Guerra Mundial. Grandes gênios que produziram ciência, arte, filosofia e revolução vieram da Alemanha.É o celeiro de grandes gênios. Grandes cientistas, filósofos, artistas são de pátria germânica e muitos deles e não poucos de ascendência judaica.

V

A lei 7.716/89 editada após a entrada em vigor da CF que deu plena liberdade de expressão, define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Essa lei no seu art. 20 § 1º. Proíbe a utilização da suástica que por conta dos fatos recentes representa, quase que exclusivamente, o nazismo. Certamente esta doutrina representou a maior de todas as insanidades da história da humanidade, mas a sua proibição não contribui em nada para o impedimento do ressurgimento do nazismo. Não é proibindo a utilização dos símbolos que impediremos o retorno de tão maléfica doutrina. Impede-se o retorno do nazismo não permitindo o retorno das condições históricas e circunstâncias que favoreceram o aparecimento desta doutrina. Nenhuma doutrina que surgiu ou ressurgiu encontrou obstáculo na proibição da utilização de seus símbolos. A história do cristianismo prova isto. Foi proibido em Roma o culto cristão até a época do Imperador Constantino que se converteu e permitiu que a prática livre. Com o Imperador Teodósio o cristianismo torna-se religião oficial do Império Romano. Os cristãos através dos símbolos mitológicos deram continuidade a sua fé até que foram permitidos. No Brasil escravocrata, os negros não podiam, na maioria das vezes, cultivar as imagens de seus deuses e mantinham a sua fé orando para as imagens dos deuses cristãos associando uma imagem cristã a uma imagem de um deus do candomblé. Isso se chama sincretismo. Num país livre e democrático, plural e pacífico a proibição da utilização do símbolo da suástica constitui uma mácula muito grande num sistema de normas tão favorecedor das liberdades. É necessário que se retire do ordenamento jurídico tal dispositivo. Certamente o autor desta proposta ficará muito mal com a comunidade judaica, que com toda razão teme o retorno do fascismo alemão e ficará muito mal também com aqueles que sofrem naturalmente de mania de perseguição. Diz a lei: " art. 20. § 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa". O mais interessante de tudo é que a lei não definiu com precisão qual cruz gamada ou suástica é proibida. A proibição atinge, por falha da lei, as duas suásticas, pois não diz qual está proibida excluindo assima outra cruz gamada que estaria, conseqüentemente, permitida. A seguir vamos expor os fatos por último abordados para entendermos onde estão as falhas da lei.

VI

A cruz gamada ou suástica ou svástica ou swástica não foi um símbolo criado pelos fascistas alemães. Existe há milhares de anos. Diversos povos a utilizaram e/ou ainda a utilizam. Nunca foi uma exclusividade dos fascistas. Pelo contrário, os nazistas se apossaram de um símbolo mitológico asiático e universal para representar a sua atividade insana. A cruz gamada pode ser encontrada em diversos povos e lugares em diversas épocas e representando simbolismos diferentes. O símbolo utilizado pelos nazistas foi importado por Karl Houshofer, geógrafo e amigo de Rudolf Hess. Rudolf Hess foi o escriba de Adolf Hitler e que anotou a obra Mein Kampf que Hitler ditou nos tempos que ficou preso, na Alemanha, por tentativa de golpe de Estado. A cruz gamada é antes de tudo um símbolo religioso, da maior de todas as religiões do mundo. De uma das mais antigas das grandes religiões contemporâneas. A proibição da utilização desta simbologia não só fere os comandos constitucionais por colisão direta como também por implodir o próprio sentido da lei que o criou. A lei visa impedir a multiplicação do preconceito, mas é exatamente isto que faz. A lei objetiva combate o preconceito racial e cria outro preconceito ao proibir o uso de um símbolo que foi usurpadopelo fascismo alemão. Mas a lei não foi de toda absurda. Vejamos só: " art. 20. § 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa".Ela faz uma ressalva: a proibição se dá apenas para fins de divulgação do nazismo. Mesmo assim o problema persiste. O problema reside no fato da carência de informação. A suástica se tornou o ideograma do nazismo por está eivada de uma carga simbólica tão grande, que a norma ao carecer de uma função didática necessária, passa a pecar demasiadamente a ponto de tornar-se inconstitucional. A clareza é um elemento imprescindível da lei. Parece simples: a proibição refere-se tão somente à suástica sinistrógira quando usada para fins de divulgação do nazismo. O problema não está aí somente. O problema está, também,na proibição do seu uso. Seja lá a suástica sinistrógira ou dextrógira o seu uso não fere nenhum bem jurídico. Pelo contrário, a proibição é que fere um bem jurídico: a liberdade de pensar e externar o pensamento, traduzidos como liberdade de expressão. Dois são os problemas deste comando normativo: falta de clareza em relação a que símbolo se está proibindo e a própria proibição em si. O problema será solucionado com o simples banimento deste parágrafo. A proibição do uso da cruz gamada para fins de divulgação do nazismo ou não representa o germe da proibição de outro símbolo quando alguém entender que este outro também representa uma doutrina malévola para a humanidade. Logo após se proíbe a doutrina. Logo em seguida cassa-se direitos, liberdades, etc. Isto não é esquizofrenia. Basta abrir uma brecha na cerca para o rebanho inteiro passar. A história do Brasil possui mais de um episódio que exemplifica perfeitamente a ilustração acima. O mundo varreu os elementos históricos que justificaram o aparecimento do nazismo no ocidente. A permissão para a livre manifestação da doutrina nazi nem significa a abertura da "guarda" para a instalação desta ideologia. O nazismo não vai voltar tão somente pelo uso do símbolo ou pela liberação da manifestação pública destas idéias sem que elas representem apologia ao crime. Do mesmo modo acontece com as drogas. A proibição certamente diminui o consumo, pois dificulta o acesso, mas a mesma proibição desperta no usuário ou candidato a usuário o desejo pelo entorpecente. A proibição também é elemento de incentivo ao consumo de drogas. Não sendo proibida haveria certamente um aumento no consumo, mas se perderia, embora poucos, aqueles que se decepcionariam com a inexistência do proibido. As proibições despertam o desejo e a resistência. Isto é típico do ser humano. É o desafio. É a luta contra as convenções sociais. É a dialética da vida. O homem é assim.

A lei 5.250/1967, que regula a liberdade de manifestação do pensamento e a divulgação da informação, foi editada nos anos turbulentos do regime militar que se iniciou em 1964. Esta lei que está em vigência até hoje, uma vez que não foi expressamente revogada, representou um acinte à liberdade de expressão no Brasil. Aparentemente veio normatizar a liberdade de expressão apenas restringindo os seus excessos. Na realidade, representou o controle do Estado sobre a atividade artística e intelectual. O art. 27, IX desta lei colide visceralmente com o disposto na CF/88.

Épremente a necessidade da adequação legislativa da Lei infra para a Lei Máxima.




Autor: wdileston gomes batista


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